Meu destino é sofrer

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Por José Sarney

A cena trágica do assassinato cruel de George Floyd em Minneapolis, nos Estados unidos, mais uma vez põe como fratura exposta a situação racial americana, viva em seus requintes de brutalidade e sordidez. Em nenhum lugar do mundo esse problema de discriminação permanece com as características de tanta violência quanto ali. As raízes remontam à escravidão — como aqui —, que precisou de uma Guerra Civil para ser legalmente banida e teve como um de seus marcos o assassinato do grande presidente Lincoln, que teve a coragem de enfrentar o problema.

Sempre fui muito ligado à causa negra no Brasil. Escrevi bastante sobre o assunto e considero a ausência de resgate da escravidão como a maior mancha de nossa História. Desde a Lei Afonso Arinos, que criminalizou a discriminação racial, até hoje, apenas arranhamos a superfície do problema.

Eu era Presidente do Brasil quando ocorreu o centenário da abolição da escravatura e, em vez de fazer festas na data, resolvi marcar o meu ponto de vista de que só se resolve o problema com a ascensão da raça negra, inserindo-a na sociedade de maneira a que ela possa ser realmente colocada em igualdade com a raça branca. Criei então a Fundação Palmares, que infelizmente desviou-se de seus objetivos. Há quase duzentos anos, José Bonifácio afirmou que a Independência não estava completa porque não enfrentara e resolvera a questão da escravidão e a política de brutalidade seguida durante a Colônia, com a dizimação de tribos indígenas inteiras.

Com essa visão, fui eu quem levantei no Brasil a política de cotas, não somente nas universidades, mas também nos financiamentos e concursos públicos e alcançando as empresas privadas. Apresentei o primeiro projeto de lei estabelecendo cotas, que foram implantadas por iniciativas esparsas e só passaram a vigorar no Brasil quando, com o meu acordo, foram incorporadas parcialmente no Estatuto da Igualdade Racial.

Ao lado de Zumbi — recebi o prêmio que tem seu nome — coloco como símbolo o Negro Cosme, maranhense que fundou o maior quilombo do Brasil e cuja primeira iniciativa foi fundar ali uma escola, enforcado em Itapecuru Mirim.

Fico solidário e, se fosse mais novo, ia engajar-me no movimento mundial de protesto pelo assassinato de George Floyd. Recompensa ver o mundo inteiro levantar-se e unir-se nessa revolta.

Nabuco disse que o assunto “versa sobre as aspirações, os sofrimentos, as esperanças, os direitos, as lágrimas, a morte de milhares e milhares de gentes como nós; que não é mais uma questão abstrata, mas concreta, e concreta no que há de mais sensível e mais sagrado na personalidade humana”. Não há como negar o que aconteceu: uns foram escravos, outros foram senhores. Uns eram negros, outros eram brancos. O trabalho de resgate não aconteceu, nem no Brasil nem nos Estados Unidos. Portanto, a nossa tarefa é fazê-lo.

Os pretos, de todos os discriminados no mundo, são os que mais sofreram. Seu destino tem sido esse. Vamos acabar com isso e colocar os pretos entre os que formam a elite brasileira. É o mínimo que se pode fazer para pagar a impagável dívida do sofrimento da raça negra.

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Plano lançado no Rio será desenvolvido no país

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O Plano Juventude Viva, com foco no combate à violência contra jovens negros, foi relançado hoje no Rio de Janeiro. Logo após a divulgação do Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência e Desigualdade (IVJ), em dezembro, que comprovou que morrem mais negros do que brancos no Brasil, a Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), em conjunto com 11 ministérios e a Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racaial, revisou todo o programa, lançado em 2012, e estipulou como meta de reduzir em 15%, até 2022, os índices de violência contra os jovens negros, por meio da inclusão social.

Segundo o secretário nacional de Juventude, Assis Filho, esta é a principal estratégia do governo federal para enfrentar a violência contra jovens negros. Ele informou que o programa inclui ações de 11 ministérios e duas secretarias nacionais, que terão recorte racial e abrangerão a faixa etária de 15 a 29 anos.

“As ações serão pactuadas com estados e municípios para que aconteçam do ponto de vista do governo federal. Com a pactuação, espera-se que os governos e prefeituras também possam desenvolver planos estaduais de enfrentamento à violência, desenvolvendo ações e financeiro para executar essa política”, acrescentou o secretário.

Para tocar o programa, a SNJ dispõe neste ano de R$ 50 milhões, além de verbas das outras pastas. A secretaria usará o IVJ para definir as localidades que terão prioridade no recebimento das ações. Lançado em dezembro, o IVJ atualizou os dados sobre violência no Brasil, lembrou Assis Filho. “As estatísticas têm que ser atualizadas, se não envelhecem. Agora, com o IVJ, o governo começa a desenvolver políticas públicas justamente nos territórios e nos grupos sociais mais vulneráveis”, acrescentou. O secretário disse que, como não há orçamento para tudo, é preciso conhecer o território e o grupo social mais vulneráveis para aplicar os recursos público nas áreas que mais precisam.

De acordo com o secretário, o objetivo é atingir todos os 27 milhões de jovens do país que se autodeclaram negros, o que corresponde a 54% do total de 51,4 milhões de pessoas com idade entre 15 e 29 anos, começando pelos grupos em maior vulnerabilidade social.

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