Brasil: matança geral

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Por José Sarney

Foi um tema que combati muitas vezes: a violência. Hobbes apontava o medo da morte violenta como a razão para a existência do Estado. Quando vivemos em constante medo da morte, esta imensa estrutura que criamos está abalada em seu fundamento.

Vejo na pesquisa mundial de homicídios da ONU o índice corre em torno de seis por cem mil habitantes até 2007; a partir daí ele pula para oito por cem mil. O que aconteceu para que aumentasse de um terço? Nesse ano passaram a ser computados os dados do Brasil. É como se o Brasil fosse responsável por um quarto dos homicídios do mundo. Passamos vergonha no mundo.

Há pior: o homicídio é responsável por metade das mortes de nossos rapazes entre 15 e 29 anos; foram assassinados, nos últimos 20 anos, mais de 1 milhão de brasileiros; passamos dos 60 mil mortos por ano em 2014; nossa taxa de homicídios por cem mil habitantes passou de trinta em 2016. As armas de fogo se tornaram responsáveis por mais de 70% dos homicídios.

Um dos mais graves aspectos dessa tragédia imensa é a falta de proteção às vítimas. Aos criminosos, a Constituição assegura vários direitos. Às vítimas, a “assistência aos herdeiros e dependentes carentes de pessoas vitimadas por crime doloso”, conforme o artigo 245 da Constituição, ficou no papel. Apresentei, em 2003, projeto para criá-la, mas está há quinze anos na Câmara. Assim os que perderam esposos, filhos, irmãos só têm o direito de chorar e ver a impunidade.

E o que faz o Estado? Para começar, não investiga. Nossa taxa de resolução de homicídios é ridícula: cerca de 6% (ninguém sabe direito). Em 94% dos casos o Ministério Público não apresenta denúncia. O assassino tem a quase certeza de que nada acontecerá com ele.

O Estado brasileiro prende, e muito. Somos os terceiros em número de presos no mundo, percentualmente e em números absolutos. São 741 mil presos, mais do dobro da capacidade de nossos presídios.

Pode ser pior? Pode: 40% dos presos não estão condenados! Outros 23% não têm condenação transitada em julgado. Prendemos de menos os assassinos (homicídios, latrocínios e feminicídios respondem por 12,2% das penas), e prendemos demais os que não foram condenados.

Não há solução fácil. Precisamos aprimorar as leis, mas o cerne do problema talvez esteja numa foto recente do local, no Rio, onde foram mortas 13 pessoas por policiais: um cenário de sangue e farrapos, sem o menor sinal de investigação científica.

Aqui no Maranhão toda semana, apenas em São Luís, temos uns seis homicídios.

Na corrida dos números — Nabuco, quando falava da escravidão, dizia para não esquecermos as lágrimas —, morrem no Brasil, por ano, tantas pessoas quanto nas guerras do Afeganistão e da Síria juntas.

O Brasil precisa acabar com isso, e o Maranhão também.

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