Por Felipe Camarão
O escritor colombiano Gabriel García Márquez, Nobel de Literatura (1982) e um dos criadores da corrente literária conhecida como realismo mágico, declarou certa vez que: “sempre acreditei que o poder absoluto é a realização mais alta e mais complexa do ser humano e que por isso resume ao mesmo tempo toda a sua grandeza e toda a sua miséria”. Essa é, indubitavelmente, a frase que melhor caracteriza o atual cenário de crise política e financeira no país.
Estamos a menos de um ano do encerramento da vigência do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e, sob as mãos daqueles que têm a investidura dos mais altos cargos eletivos, urge a necessidade de recriar o Fundo.
Permita-me, leitor, explanar sobre o Fundeb. Foi criado em 2006 por uma emenda à Constituição e regulamentado em 2007 por lei e decretos federais. Substituiu o antigo Fundef – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, que vigorou oito anos e redistribuía, entre Estados e municípios, parte dos recursos constitucionalmente vinculados à educação para financiamento do Ensino Fundamental. Já o Fundeb, mais robusto, com vigência de 14 anos, redistribui uma parcela maior dos recursos vinculados à educação e contempla todas as etapas e modalidades da educação básica, da creche ao ensino médio.
Vale destacar que esse “bravo” Fundo, objetivando a universalização do ensino, precedeu o processo de municipalização do Ensino Fundamental, com transferência desse nível às prefeituras, ficando o Estado responsável, exclusivamente, pela oferta do Ensino Médio.
O Fundeb repassado aos entes federados é o montante arrecadado com os impostos, portanto, há variação no valor dos repasses, de acordo com o comportamento da atividade econômica; o total arrecadado é multiplicado por um coeficiente de distribuição, a cada ano, obtendo-se, assim, o valor que será repassado. O Fundo é constituído pela contribuição dos estados, DF e municípios, correspondente a uma parte dos recursos constitucionalmente vinculados a despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE), conforme o art. 212 da Constituição Federal.
Resulta da receita de impostos e transferências de estados e municípios, na proporção de 20%. Compõem, também, o fundo as receitas da dívida ativa de juros e multas, incidentes sobre estas fontes. A União complementa com 10% do total de recursos do Fundeb, para os Estados e Municípios que não atingiram o valor mínimo anual por aluno, estabelecido nacionalmente.
Cada fundo estadual distribui seus recursos de acordo com o número de estudantes que estão matriculados em sua rede de Educação Básica. Na soma de estudantes matriculados de cada rede de ensino, é atribuído um peso diferente a cada matrícula, considerando suas especificidades (da pré-escola integral e no Ensino Fundamental II parcial).
Em 2018, o Estado do Maranhão recebeu do Fundeb o montante R$1.382.219.125,15, considerando as 357 mil matrículas (Censo Escolar). Como vem ocorrendo nos últimos anos, 100% desse recurso foi destinado ao pagamento de professores efetivos e o Estado ainda precisou aportar R$ 11.700,000,00 para o fechamento total da folha do magistério. Para se ter ideia, de 2015 até o ano passado, foram aportados cerca de R$ 452.852.000,00 à folha de professores efetivos.
Faz-necessário, portanto, frisar que estamos na “última hora” para a (re) criação do Fundeb e, caso isso não ocorra urgentemente, já a partir do ano que vem, poderá haver consequências reais e nefastas para a educação brasileira. Salvo alguns poucos estados, a maioria das Unidades Federativas não poderá manter a folha da educação em dia, diante da baixa arrecadação própria de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). E, em se tratando dos municípios maranhenses, os mesmos não terão condições, nem mesmo, de arcar com suas folhas. Será o sepultamento da educação básica brasileira.
Defendo, assim como o governador Flávio Dino, que o Fundeb precisa ser (re) criado, a partir de um modelo que atenda a atual conjuntura econômica dos entes e que seja estabelecido um novo pacto e repartição dentro da cooperação federativa. E, em vez de ser extinto, incrementado, ampliado e aprimorado. São necessários mais recursos para o Fundeb, a fim de garantir, de uma vez por todas, a universalização tão almejada por todos nós, gestores educacionais e, sobretudo, a qualidade da educação pública.
Finalizo com mais uma de Márquez, ao definir bem o processo de (re) criação, tão necessário neste momento. “Mas se deixou levar por sua convicção de que os seres humanos não nascem para sempre no dia em que as mães os dão a luz, e sim que a vida os obriga outra vez e muitas vezes a se parirem a si mesmos.”
*Felipe Costa Camarão é professor, secretário de Estado da Educação e membro da Academia Ludovicense de Letras e Sócio do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão