Por Joaquim Haickel para o Blog do Marco D’Eça
Estando eu fora de São Luis e não podendo acompanhar de perto o desenrolar dos acontecimentos posteriores ao ato brutal e covarde ato que tirou a vida do jornalista Décio Sá, comentei, assim que acordei hoje cedo, uma notícia postada em seu blog que dava conta de uma infeliz postagem que o colega advogado, presidente da Comissão de Direitos Humanos da seccional maranhense da Ordem dos Advogados do Brasil, Antonio Pedrosa, fez no blog dele, que transcreverei em parte:
“… Não adianta agora, por outro lado – em nome da justiça que deve necessariamente ser feita – alçar o jornalista/vítima à condição de baluarte da democracia, o que nunca foi.”
Fica uma certa impressão de que jornalista que não seja do ponto de vista do autor do texto, um baluarte da democracia, pode ser assassinado. Que o homicídio deve ser apurado, mas que de pronto fique claro, que ele de certa maneira mereceu o que teve, pois não era um baluarte da democracia.
Ele continua:
“…O crime contra Décio Sá deve indignar, como deve indignar qualquer crime, sem fundamento em nenhum espírito de corpo, ou privilégio que esconda as mazelas do jornalismo marrom…”
Ao contrário do que sugere a primeira frase, mais uma vez fica uma certa impressão de que o jornalista, que do ponto de vista do autor do texto, seja marrom, deve ser tratado de forma diferente daquele que o autor identifica como sendo azul ou vermelho ou da cor que ele escolha como aceitável.
Agora vem o pior:
“Não derramei lágrimas de crocodilo no velório, no qual não aceitaria confortavelmente comparecer. Sempre discordei dessa linha de jornalismo, que, no Estado, é composta por um pequeno número de gorilas diplomados. Não me surpreenderia se ao cabo das investigações se descobrissem motivos bem menos nobres para o assassinato”.
A quem interessa se o autor do texto se sente mais ou menos confortável em comparecer a um velório? Com toda certeza o falecido não daria a menor bola para sua presença. Era totalmente desnecessário dizer essa grosseira. Coisa feia!
No final ele diz claramente que Décio pode ter sido assassinado por um motivo menos nobre, como se houvesse nobreza em um assassinato, como se matar um jornalista marrom ou um gorila diplomado por um nobre motivo fosse aceitável. Que absurdo!
Discordar-se da linha jornalística, política ou ideológica de alguém é algo salutar.
Inadmissível é que alguém, principalmente um advogado, que está cansado de defender indiciados e réus sabidamente culpados, ainda por cima sendo presidente da Comissão de Direitos Humanos da seccional maranhense da Ordem dos Advogados do Brasil, segregue jornalistas- gorilas de jornalistas-lobos, de repórteres-ratos, de radialistas-cães, de blogueiros-chipanzés, de assessores de imprensa-lebres, praticando assim preconceitos previstos como crimes em nossa constituição.
Eu não estou falando do racismo, como alguns possam imaginar, mas do preconceito quanto a liberdade de escolha no seu mais amplo sentido, pois o jornalista que quiser ser um gorila marrom, pode sê-lo e assumir os riscos de ser assim, mas não pode ser assassinado por isso e muito menos pode ser cerceado de seu direito de escolher ser gorila e marrom, da mesma forma que ninguém pode ser cerceado em seu direito de ser um veado lilás.
Quem se sentir prejudicado pelo fato de ele ser como escolheu ser, que busque na justiça a devida reparação, e que todos nós defendamos o estado de direito a qualquer custo, menos ao custo da aceitação da intolerância.
Posso até admitir que o Pedrosa tenha sido infeliz no que escreveu, que tenha até pensado uma coisa um pouquinho diferente do que está escrito em seu texto, mas infelizmente o que está contido no seu subtexto é algo da maior periculosidade, algo que extrapola os limites do possível na vida em sociedade.
O que é pior é que ao invés dele refletir sobre o equívoco que cometeu, desculpar-se e colocar as coisas de maneira mais aceitável, ele postou em seu blog dois outros textos onde reafirma o que disse antes.
Pedrosa tem que entender que ele não é tão somente ele.
Ele é o presidente da Comissão de Direitos Humanos da seccional maranhense da Ordem dos Advogados do Brasil, secção do Maranhão. Ele nos representa.
Um jornalista pode escolher ser marrom e assumir os riscos de sua escolha.
À uma entidade como a OAB não é dada a possibilidade dessa escolha…