Triste interlúdio

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Por José Sarney

Vou hoje interromper a minha série de reminiscências sobre o meu governo para falar sobre o pânico que invade o mundo todo: o Coronavírus, que fez o mundo entrar em choque.

Mas vou também no rumo das reminiscências. Em 1994 eu estava em Xangai numa reunião do InterAction Council, uma Fundação de ex-Chefes de Estado e de Governo do mundo, de que faço parte – naquele tempo tendo a companhia na representação da América Latina de meus saudosos amigos De La Madrid (México) e Alfonsín (Argentina) -, reunidos para discutir os problemas da humanidade. Entre os convidados, como experts globais, estavam McNamara, Kissinger, Lee Kuan Yew, o fundador de Singapura, grande político e intelectual. O tema era os problemas que ameaçam o futuro da humanidade.

O assunto fascinante já vinha de reuniões anteriores. A lista era longa: armas e vetores nucleares, guerras globais, crime organizado, drogas e muitos e muitos outros.

Presidia a reunião Takeo Fukuda, ex-primeiro ministro do Japão, grande e famoso estadista. Era copresidente Helmut Schmidt, da Alemanha, o maior orador que conheci. Ele colocou no debate as doenças desconhecidas e as migrações massivas. Dizia ele que a espécie Homo Sapiens era fruto de um acaso da evolução, na mutação genética, e que nada nos garantia que no futuro não tivéssemos mutações que implicassem em doenças desconhecidas que ameaçassem a nossa espécie. Quanto às migrações massivas, estas seriam causadas pela quebra do balanço alimentar e hídrico de populações, que, desesperadas, se deslocariam em busca de sobrevivência. Todos nós ficamos inquietos com a pauta das discussões, uma vez que julgávamos vir o perigo dos conflitos globais, a China potência naval, a disputa pela hegemonia mundial e as armas de destruição em massa.

Com o Coronavírus atual lembro a genialidade de Helmuth Schmidt, que nos dizia que, nessa busca do poder e do dinheiro com que vivemos, nos esquecemos de que nos milhões de anos que virão poderemos acabar com nossa espécie pela própria evolução, como desapareceram tantas ao longo dos milhões de anos que percorremos até chegarmos ao que somos hoje: uma espécie nova, de apenas cem mil anos!

O professor Hermann G. Schatzmayr, convidado por mim, quando presidente do Senado, para participar do livro Profecias para o Século XXI, que editei – uma obra notável, em que reuni os melhores cérebros do Brasil para fazerem suas previsões -, disse que era necessária uma ação coordenada mundial para vigilância e pesquisa, porque todo dia surge uma doença nova.

No passado existiram muitas doenças novas que foram letais. Mas o mundo era pequeno, e hoje vírus e bactérias viajam de avião e se transportam para toda parte.

Talvez seja hora de todos pensarmos numa Terra mais solidária, que se preocupe com a vida que a graça de Deus nos possibilitou e não com a ambição e sublimação dos prazeres. Enfnm, um mundo melhor que não nos conduza ao Juízo Final.

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