Notícia X Versão
Por Joaquim Haickel
Dia desses conversei demoradamente com um jornalista, meu particular amigo e muito ligado à oposição. Nós falamos sobre um assunto que para ele tem importância vital e que em minha opinião deve ser observado com bastante cuidado, mas de forma totalmente imparcial.
Trata-se na verdade de um desdobramento da grande judicialização das campanhas eleitorais. Neste caso específico, precipitado por uma vigorosa ação midiática, ancorada em matérias jornalísticas através de meios impressos, programação televisiva e radiofônica, postagens em blogs e nas redes sociais, no sentido de atingir a imagem de um determinado candidato, e que como consequência disso desencadeou uma ação de igual força e direção contrária por parte dos adversários.
Acredito que já foi verdadeiro aquele velho discurso que pregava que, os meios de comunicação, concentrados nas mãos de um dos grupos contendores em uma campanha eleitoral, fazia com que a eleição ficasse desequilibrada. Essa realidade é bem diferente hoje. Em primeiro lugar, porque a concentração dos meios midiáticos em um dos lados já não é tão significativa. Em segundo lugar pela incompetência desses antigos grupos midiáticos em fazer valer o poderio que detinham. Em terceiro lugar, pelo imenso e avassalador poder da informação instantânea e independente da internet e das redes sociais, que horizontalizaram o acesso à informação.
Mas voltemos a minha conversa com aquele meu amigo jornalista. Nela ele me dizia de sua preocupação com uma ação movida por um candidato contra um grupo de jornalistas e radialistas, através de seus blogs e seus programas de rádio, no sentido de fazer com que estes não dessem publicidade ou comentassem a respeito de uma determinada matéria.
De um lado, os advogados do candidato acreditam que essa ação jurídica resguarda um direito que está sendo prejudicado, por outro, o jornalista acha que essa ação é um grave atentado contra a liberdade de imprensa.
Os advogados que defendem o candidato argumentam que em uma campanha eleitoral, cuja duração não chega a 90 dias, a apuração da verdade, em casos de injúria, calúnia e difamação é praticamente impossível de ser concluída, uma vez que causas dessa natureza costumam se alongar e esses processos se arrastam por meses.
Ora, se existe uma campanha midiática sistemática que visa fragilizar e enfraquecer a imagem de um determinado candidato, algo deve ser feito no sentido de impedir tal ação, com isso preservando o direito do cidadão, sempre respaldado nos preceitos constitucionais fundamentais.
Do ponto de vista daquele que se sente prejudicado pelo noticiário, que alega ser faccioso, o direito à informação está sendo superlativamente privilegiado em força e importância, em relação ao direito à justa defesa, uma vez que a boataria, as notícias falsas, as colocações dúbias e as interpretações facciosas venham comprometer a sua imagem, não lhe dando tempo nem condições, de no meio de uma campanha eleitoral, elucidar essa onda de notícias inverídicas.
Do momento em que se publica uma matéria jornalística até o momento em que a justiça tenta impedir que o uso inadequado desta traga prejuízo a alguém, há uma espaço de tempo no qual o direito do ofendido está sendo definitivamente prejudicado. É nesse sentido que é usada a Ação de Obrigação de Fazer.
No caso de notícias verdadeiras, bem embasadas, respaldadas por provas consistentes, nesses casos não vejo como conter-se o direito constitucional à informação.
Imagine se um grupo de jornalistas, todos eles muito competentes, resolvesse agir, através de notícias aparentemente genuínas, comprometendo a imagem de um determinado candidato. Isso se consubstanciaria em um golpe baixo respaldado na legítima liberdade de imprensa. Em minha opinião a notícia não pode ser colocada a serviço da versão sabidamente facciosa e quem quer que aja assim deve ser impedido de fazê-lo também por força de lei e por ordem da justiça.
Alguns dos jornalistas listados nessa ação são bons e velhos amigos meus e os respeito como profissionais de seu ofício, mas o que está acontecendo aqui é uma guerra eleitoral e duas das batalhas mais importantes desse conflito serão travadas nos campos do Judiciário e do jornalismo. No caso em tela, os dois se misturam e se confundem.
O uso da justiça em qualquer setor, a qualquer nível, não pode, de modo algum, ser confundido com quebra de respeito para com a democracia e o estado democrático de direito. Recorrer-se à justiça para tentar impedir que um direito líquido e certo seja prejudicado é totalmente legítimo, mesmo que essa ação pareça ferir um outro direito, que de modo algum pode se sobrepor a este.
O juiz eleitoral responsável pela análise de um dos casos citados acima, negou o recurso do candidato, não levando em consideração o mérito da causa. Esse fato por si só prova que buscar a justiça não ameaça a consumação dela.
Fato relevante: outro candidato já deu entrada em mais de 20 ações no sentido de impedir que outros jornalistas publiquem matérias que segundo ele e seus advogados, usam do mesmo expediente, provando assim que a propaganda jornalística e a judicialização da campanha eleitoral são dois dos mais importantes ingredientes desse e dos próximos pleitos eleitorais. Pior para os eleitores.
No frigir dos ovos fica aquela minha velha sensação sobre a política: com algumas poucas diferenças cosméticas, são todos iguais.