“O Sanches, o Adalberto e o Dibel, era a família, as referências dele. Encontrei cartõezinhos de campanha do Sanches entre as coisas dele. Ah, meu Deus! Luís via longe, era um visionário — esta é a palavra certa. Ele defendia as coisas para os outros, não para si.”
Margaret Valente, sensível, prestativa, falava com voz embargada. Falava andando, rumo a um lugar onde pudessem lhe dar carona para acompanhar o cortejo e enterro do corpo de Luís Brasília — na certidão Luís Bezerra da Silva Filho –, jornalista, radialista, escritor bissexto, leitor diário, produtor cultural, diretor de TV, pensador, polemista e colega de Margaret, funcionária do Sistema Mirante em Imperatriz e pessoa que, nos últimos dias, mais próximo esteve com o Luís, da sua internação ao falecimento, na madrugada desta segunda-fera, dia 14 de fevereiro de 2011.
Luís Brasília, o Luís BSB, como eu o chamava quando estava com ele, completaria 54 anos em 11 de abril. Em 1985 ele tinha 28 anos. Foi quando o conheci.
Naqueles meados da década de 1980 eu alugara grande parte dos altos da Casa São João, frente ao antigo Cine Marabá, na avenida Getúlio Vargas. Naquele lugar eu montara a redação do Jornal de Negócios e do Jornal de Açailândia, semanais. Um dia desses, adentra (Luís Brasília adorava dizer para mim essa palavra, lembrando do fato), adentra aquele jovem franzino procurando por Edmilson Sanches. Entre cumprimentos e elogios, coloca-se à disposição. Disse-lhe que os jornais estariam de páginas abertas para receber sua contribuição. Naquela época já trabalhavam comigo, como funcionários, recebendo regularmente e mensalmente seus salários, o José Bonifácio Cézar Ribeiro (o Zeca Tocantins), o Paulo de Tasso Oliveira Assunção, a Domingas (hoje proprietária de empresa de publicidade), o Nilson Takashi Hamada (ex-presidente do Sociedade Imperatriz de Desportos e proprietário também de empresa de comunicação e marketing).
Com as atividades que eu desenvolvia, de organização da categoria jornalística e dos profissionais de Comunicação Social em geral, fundação e ação da Associação de Imprensa etc. etc., mais e mais Luís Brasília ampliava espaço no meu tempo, ou aumentava o tempo no meu (pouco) espaço. Agíamos de modo diferente, mas pensávamos igual.
Ele defendia um espaço para eu fazer comentários à maneira (mas sem a competência) de Arnaldo Jabor, na TV Globo. Depois, Luís queria um programa semanal comigo. Uma vez, quando eu morava em Brasília, ele foi até o meu apartamento porque soubera que eu tinha a coleção completa (intitulada “Shine On”) do Pink Floyd e, sem se importar com meus rogos, levou-a para um amigo que também seria fã da banda de rock britânica. Depois, ele reembolsou-me o valor.
Passava horas conversando comigo, ou em seu apartamento no Imperatriz Shopping, ou onde eu morava, ou nos dois ao mesmo tempo, via telefone. Ligações de madrugada, então, era praxe. Nem a cada vez mis habitual bebida lhe tirava dos trilhos sólidos em que ele assentava suas crenças, seus pensares, seus pesares, seus penares. Às vezes falava, e escrevia, poesia pura. Lia muito (livros). Ouvia muito (música). Via muito (filmes). Recomendava-me alguns e, em troca, recebia de mim sugestões. Deixava comigo livros — e dos meus os levava também, vários. Mandava bilhetes… e nem sempre recebia resposta — que eram cobradas, e dadas, por telefone.
Relatava-me que se expunha em minha defesa. No Bar do Olímpio, nas praças e ruas ele trazia-me as conversas e debates em que se “metia”, em resguardo ao meu nome, seja como político ou jornalista ou escrevedor de escritas às vezes escrotas (termo que Luís também soltava fácil).
Uma vez, nessas sadias loucuras luisianas, ele ligou lá da lanchonete do Raimundo, na praça Brasil, ligou para um ex-prefeito, fez-lhe uma pergunta-afirmação do tipo: “Você já sabe em quem eu vou votar e para quem eu vou trabalhar”. Na mesma hora, passou-me o telefone, apenas para eu ouvir o ex-prefeito confirmando do outro lado que Luís Brasília, espontaneamente, continuaria “trabalhando” para Edmilson Sanches na campanha. Ele não recebia nada. Eu também não lhe pedia nada. Se, e quando, Luís quisesse, ele me solicitava mais cartões, único material de campanha de que eu dispunha. E eu fazia chegar até ele. Era assim, do jeito dele.
Uma vez, quando eu era presidente da Academia Imperatrizense de Letras pela segunda vez, Luís tentou perturbar a reunião. Eu disse a ele, com vigor, que ou ele acabava com aquele comportamento ou ali acabava nossa amizade. Ele baixou a cabeça, silenciou. Eu senti pelo ocorrido, levantei-me, fui até ele, abracei-o pelos ombros e o conduzi a outro ambiente do prédio da Academia, onde pedi-lhe que me aguardasse, para tratar do assunto que ele quisesse. Não houve qualquer seqüela emocional, apenas rimos das lembranças do episódio tempos depois. Luís sabia que eu era da turma do BBB, dos que são Bons, fazem o Bem e admiram o Belo que Deus fez. Enfim, artistas.
Luís não concordava com muita coisa. Parecia ter a fórmula para salvar, ou, ao menos, melhorar o mundo, o Brasil, o Maranhão, Imperatriz. Acreditava fortemente na Arte. Embriagava-se mais com a Cultura do que com álcool.
Luís Brasília não morreu. Sempre pioneiro, ele apenas foi na frente.
Viva, Brasília!
Por EDMILSON SANCHES, Imperatriz, Maranhão, 14 de fevereiro de 2011.