Os riscos do anticoncepcional: quem deve se preocupar

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Os riscos do anticoncepcional: quem deve se preocupar

A pílula anticoncepcional chegou ao mercado no início da década de 60 e foi uma das principais responsáveis pela emancipação feminina. Ao longo dos anos, a ciência aprimorou o método contraceptivo oral, com redução drástica de efeitos colaterais e até resultados estéticos extremamente positivos para as mulheres – como diminuição de inchaço, menor impacto na libido e na oleosidade da pele, problemas causados pelas pílulas antigas.

Todo método hormonal tem impacto na coagulação sanguínea, aumentando o risco de trombose. A comunidade científica sempre soube disso. O que mudou agora é que sabemos que a nova geração de pílulas aumenta ainda mais esse risco em função do tipo de hormônio utilizado

Surgidas nos anos 90, os anticoncepcionais mais recentes diferem dos antigos no tipo e na quantidade de hormônios utilizados. Em sua formulação, há a combinação de dois compostos: o estrogênio e a progesterona. Com isso, reduziu-se a dose hormonal e também o número de efeitos adversos. O que se revelou, no entanto, foi que os hormônios utilizados podem causar riscos em algumas mulheres

Assim como qualquer medicamento, seu uso é seguro desde que ela seja bem indicada. Antes de prescrever o remédio, o ginecologista precisa analisar o histórico do paciente para ver se não existe alguma e contraindicação. Mulheres que sofrem de enxaqueca, fumam e têm histórico de trombose na família, possuem um risco 20 vezes maior de ter um acidente vascular cerebral. Ou seja, no caso delas, nada de pílula moderna. Outros fatores também devem ser considerados: histórico de câncer de mama ou no fígado, presença de mutações genéticas que aumentam o risco de trombose, hipertensão e diabetes.

A anticoncepção tem a finalidade de impedir uma gravidez indesejada durante uma relação sexual. Por isso, a escolha do método contraceptivo deve ser individualizada e decidida pela paciente em conjunto com um ginecologista. Os métodos contraceptivos hormonais ainda são os mais utilizados no Brasil e podem ser encontrados em diferentes apresentações: oral, injetável, adesivo e implante – que agem impedindo a ovulação – ou o dispositivo intrauterino (DIU), com ação hormonal local. Como a dosagem hormonal é baixa, este DIU pode ser utilizado por pacientes com alguma contraindicação para uso hormonal e até mesmo com trombofilia. Além disso, ao contrário da pílula e de outros métodos hormonais, o DIU de progesterona não é um método antiovulatório e, por isso não interfere, na libidoEstima-se que 25% das brasileiras utilizem anticoncepcionais por via oral, enquanto 30% das mulheres em idade reprodutiva optam pela laqueadura.

Agora no início de dezembro de 2017 um grande estudo publicado na revista LANCET, mostrou que mulheres que usam pílulas ou dispositivos anticoncepcionais que liberam hormônios enfrentam pequena mas significativa  risco de câncer de mama.

O estudo, que acompanhou 1,8 milhão de mulheres dinamarquesas por mais de uma década, derruba suposições comuns sobre os efeitos dos anticoncepcionais nas gerações mais jovens de mulheres.

Muitas mulheres acreditavam que os anticoncepcionais hormonais mais modernos eram muito mais seguros do que os usados por sua mães ou avós, que tinham dosagem muito mais alta de estrógeno.

O novo estudo estima que o uso de anticoncepcionais contendo hormônios eleva em 13 casos por cada 100 mil mulheres a incidência de câncer de mama.

Ou seja, para cada 100 mil mulheres que usam controle hormonal da concepção, há 68 casos anuais de câncer de mama, ante 55 casos entre as mulheres que não usam esse método.

Embora a correlação entre pílulas anticoncepcionais e o câncer de mama tenha sido estabelecida já há muito tempo, o estudo é o primeiro a avaliar o risco associado às formulações atuais das pílulas e dispositivos anticoncepcionais, em um universo amplo.

O estudo constatou pouca diferença de risco entre as diferentes formulações: as mulheres não se protegerão mais caso empreguem implantes ou dispositivos intrauterinos que liberem hormônio diretamente no útero.

A pesquisa também sugere que o hormônio progestina, amplamente usado nos métodos atuais de controle da natalidade, pode elevar o risco de câncer de mama.

“O estudo é importante porque não tínhamos ideia de como as pílulas modernas se comparavam às do passado, em termos de câncer de mama, e não tínhamos informação sobre os DIUs”, disse Marisa Weiss, oncologista que fundou o site breastcancer.org e que não participou do estudo. “Os ginecologistas presumiam que uma dose menor de hormônio significa menor probabilidade de câncer. Mas o risco continua elevado.”

“É um efeito pequeno mas mensurável, e se você considerar os milhões e milhões de mulheres que usam pílulas, essa é uma preocupação significativa em termos de saúde pública”, disse Weiss.

O estudo foi limitado, de acordo com os autores, por eles não poderem levar em conta fatores como atividade física, amamentação e consumo de álcool, que também podem influenciar o risco de câncer.

Dirigentes do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas disseram que avaliariam cuidadosamente as novas constatações, mas enfatizaram que os anticoncepcionais hormonais estão “entre as opções mais seguras, efetivas e acessíveis”, para muitas mulheres.

Os especialistas também apontaram para alguns benefícios dos anticoncepcionais orais, que estão associados a reduções na incidência de câncer ovariano, endometrial e possivelmente de câncer colorretal, em anos posteriores da vida das participantes.

Chris Zahn, vice-presidente clínico do colégio de obstetrícia, reconheceu que existe uma correlação entre o risco de câncer de mama e o uso de hormônios, mas instou as mulheres preocupadas com isso a que consultem um médico de confiança antes que alterem seus regimes anticoncepcionais. “É importante que as mulheres se sintam confiantes e confortáveis com sua escolha de anticoncepcionais”, ele disse.

Porque o risco cresce com a idade, Weiss sugeriu que mulheres mais velhas deveriam considerar a adoção de métodos anticoncepcionais que não dependam de hormônios, como um diafragma ou DIU que não libere hormônios, ou camisinhas. “Não é como se não existissem opções”, ela disse. “Por que não buscar outra opção?”.

Em um comentário publicado em companhia do novo estudo, publicado pelo “New England Journal of Medicine”, David Hunter, professor de epidemiologia e medicina na Universidade de Oxford, Inglaterra, disse que o novo estudo não havia encontrado quaisquer métodos anticoncepcionais modernos completamente livres de risco.

“Havia a esperança de que os preparados contemporâneos pudessem estar associados a risco menor”, ele disse em entrevista. “Esse é o primeiro estudo com dados substanciais que demonstra não ser esse o caso.”

Quase 10 milhões de mulheres norte-americanas usam anticoncepcionais orais, entre as quais 1,5 milhão que os empregam por motivos não relacionados ao controle da natalidade. O número de mulheres norte-americanas que usam dispositivos intrauterinos, muitos dos quais liberam hormônios, cresceu nos últimos anos, como o número de mulheres que usam outros tipos de implantes anticoncepcionais hormonais.

Ainda que os anticoncepcionais orais mais antigos estivessem associados a um risco maior de câncer de mama, muitos médicos e pacientes presumiam que a nova geração de pílulas disponível no mercado oferecesse mais segurança.

Mas o novo estudo identificou que os riscos continuam tão mais altos quanto foi constatado em pesquisas anteriores, sobre pílulas anticoncepcionais usadas no passado, nos anos 80 e ainda antes, disse Hunter.

“Na verdade esperávamos constatar que o risco adicional era mais baixo, porque temos doses menores de estrógeno nos anticoncepcionais hormonais, e por isso é surpreendente que tenhamos identificado essa correlação”, disse Lina Mørch, pesquisadora sênior da Universidade de Copenhagen e principal autora do novo estudo.

O trabalho também constatou que o risco crescia em proporção à duração do uso de anticoncepcionais hormonais pelas mulheres, o que sugere uma relação causal, disse Mørch. “Para nós é um quadro muito claro, muito convincente”.

O estudo, cujo universo abarcava toda a população dinamarquesa, acompanhou cerca de 1,8 milhão de mulheres em idade fértil por em média mais de uma década, extraindo dados dos registros nacionais de receitas médicas e pacientes de câncer. No período, foram identificados 11.517 casos de câncer de mama.

Os pesquisadores concluíram que as usuárias de anticoncepcionais hormonais registraram 20% adicionais de risco de câncer de mama, comparadas às não usuárias, ainda que o risco cresça com a idade e varie de acordo com a formulação dos anticoncepcionais usados.

Ainda assim, o risco adicional poderia resultar em comparativamente poucos casos adicionais de câncer de mama, afirmam os pesquisadores.

O aumento na incidência de câncer de mama associado aos hormônios também foi pequeno porque as mulheres jovens são um grupo de baixo risco. Mas a probabilidade cresce entre as mulheres que usaram anticoncepcionais hormonais por mais de 10 anos, constatou o estudo.

Entre aquelas que usaram anticoncepcionais hormonais por cinco anos, o risco adicional de câncer de mama persiste mesmo depois que o uso dessa categoria de medicamentos é descontinuado, de acordo com Mørch.

O que realmente surpreendeu os pesquisadores foi que o risco ampliado não se confinava a mulheres que usam contraceptivos orais, mas também se aplicava às mulheres que usam DIUs que liberam o hormônio progestina. (Nem todos os DIUs liberam hormônios.)

As mulheres que usam um dispositivo intrauterino que libere apenas progestina enfrentam risco de câncer de mama 21% mais alto que o das não usuárias, segundo o estudo.

As constatações apontam que a progestina eleva o risco de câncer; muitas das pílulas anticoncepcionais e DIUs contêm apenas progestina, segundo Mørch.

Um risco relativo 20% mais alto pode ser pequeno, em termos absolutos, mas o cálculo muda com a idade. Para uma mulher de 20 anos, por exemplo, a probabilidade de desenvolver câncer de mama nos 10 anos seguintes é de 0,06%, ou uma em 1.732, de acordo com o site breastcancer.org.

Mesmo com uma elevação de 20% no risco relativo, ele continua abaixo de 0,1%.

Mas quando a mulher chega aos 40 anos, a probabilidade de que ela desenvolva câncer de mama nos dez próximos anos é de 1,45%, ou um em 69. Uma elevação de 20% no risco eleva a probabilidade a 1,74%, ou um em 57.

Mulheres que usaram anticoncepcionais hormonais por dez anos ou mais elevam em 38% seu risco relativo de câncer de mama, ante as não usuárias. Em contraste, não existe alta no risco de câncer de mama para mulheres que tenham usado anticoncepcionais hormonais por menos de um ano.

 

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