Ser viril e ter bom desempenho na cama não é garantia de fertilidade. Grande parte dos barbados inférteis nem mesmo chega a investigar o fato por associá-lo à performance sexual. Especialistas garantem, no entanto, que o problema nada tem a ver com disfunção erétil – e que a infertilidade atinge igualmente homens e mulheres.
O tabu de associar impotência a incapacidade de ser pai faz com que a dificuldade de engravidar recaia sobre elas, ainda que as estatísticas mostrem que dentro dos 10% de casais com dificuldades de concepção, 50% é por causa deles e 50%, delas, de acordo com o urologista, andrologista e professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) Ernani Luis Rhoden.
– Potência e capacidade reprodutiva são aspectos muito distintos, embora sejam culturalmente confundidos e sua associação gere reflexos psicológicos – complementa.
Para o urologista Fabio Firmbach Pascualotto, quando o homem recebe a notícia de que está infértil, na maioria das vezes não consegue isolar o fato de algum problema de ereção. Assim, o impacto da infertilidade, para alguns deles, pode ser semelhante ao baque do diagnóstico de câncer:
– Na cabeça dos homens, uma coisa é igual à outra (infertilidade e impotência). Por isso, evitam falar do assunto – alerta o especialista.
Mas uma questão não tem nada a ver com a outra. No rol de motivos que levam à infertilidade masculina estão disfunções hormonais, infecções genitais, causas congênitas e fatores como uso de anabolizantes, tabagismo, consumo de maconha, cocaína e exposição à radiação, a temperaturas elevadas e à poluição ambiental. Doenças sexualmente transmissíveis e inflamações nos testículos são outras causas.
No primeiro lugar do ranking das causas está a varicocele – um processo relacionado com a dilatação nas veias que fazem a drenagem de sangue dos testículos e que pode ser tratado com uma cirurgia ambulatorial (leia mais no texto no alto da página).
Por meio de tratamentos clínicos, procedimentos cirúrgicos e fertilização assistida, as chances de reverter um caso de infertilidade masculina são muito maiores hoje do que antigamente, de acordo com Rhoden.
Reversão de uma vasectomia
A realização de uma vasectomia (método contraceptivo cirúrgico masculino) é outro motivo que, aparentemente, pode impossibilitar que um homem se torne pai. Entretanto, por meio da cirurgia de reversão, é possível religar os dutos dos canais deferentes e voltar a ser fértil.
Da totalidade de homens vasectomizados, de 6% a 10% se arrependem e buscam a reversão. As principais causas são recasamento, morte de um dos filhos ou arrependimento do próprio casal. Dados da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva indicam que, com o passar do tempo, as chances diminuem.
Estatisticamente, com menos de três anos, a chance de aparecer espermatozoides na ejaculação é de mais de 90%. Um estudo realizado em 1991 mostrou que a chance de reversão da vasectomia chega a 97% com menos de três anos e a taxa de gravidez é de 76%. Com o tempo, a fertilidade cai. Para quem realiza a cirurgia de reversão mais de 15 anos após a cirurgia, a taxa de permeabilidade é de 71% e a taxa de gravidez, de 30%.
– A cirurgia funciona, mas quanto mais tempo deixar passar, menor é a chance de sucesso – explica o urologista Fabio Firmbach Pascualotto.
A vasectomia custa aproximadamente R$ 1 mil, e muitos convênios cobrem esse valor. Já a reversão pode variar de R$ 6 mil a R$ 15 mil, e o procedimento não é coberto pelos convênios.
Depois da chegada de seu primeiro filho, há 16 anos, Jeferson Rocha de Oliveira, 42 anos, achava que não veria a família crescer mais.
– Quando o Matheus nasceu, realizei operação de vasectomia para evitar a utilização de outros métodos contraceptivos. Na época, fiz uma cirurgia rápida de 30 minutos e tudo estava resolvido – disse o comerciário.
Passados 14 anos do nascimento do primogênito, Rocha e a mulher, Cíntia, mudaram de ideia e começaram a repensar a decisão. Queriam encomendar um irmão para Matheus e, por isso, decidiram reverter a operação, mesmo que as chances de fertilidade fossem pequenas em função do tempo já passado da vasectomia.
A cirurgia, dessa vez, foi mais demorada: durou cerca de cinco horas. Passada a operação, ele e a mulher tornaram-se pais novamente apenas três meses depois, quando nasceu Marina, para completar a família.
A grande vilã
Causa mais recorrente da infertilidade masculina, a varicocele é uma dilatação das veias testiculares. De 19% a 41% da população masculina apresentará alguma dificuldade de fertilidade por causa desse problema de anatomia. As veias do testículo esquerdo são maiores e, por questões anatômicas, mais suscetíveis à varicocele. Aparece, geralmente, no início da adolescência.
Qualquer homem que procura um urologista pode identificar por meio de diagnóstico clínico ou exames de imagem como ultrassonografia (ecografia testicular) e cintilografia dos testículos. Mas atenção: um contingente significativo dos homens que têm varicocele não apresenta problemas de fertilidade.
Para outros a infertilidade pode ser reversível após procedimento cirúrgico, que consiste em ligar as veias com auxílio de um microscópio cirúrgico, ao nível da região subinguinal, abaixo da virilha. É uma cirurgia ambulatorial, conhecida como varicocelectomia, que pode ser feita com anestesia geral ou local.
Fique atento
Quando o casal deve fazer exames de fertilidade?
Quando há atividade sexual sem proteção há mais de seis meses e não se consegue conceber, recomenda-se o início da investigação sobre a fertilidade. É indicado que, diante de qualquer sinal de doença sexualmente transmissível, o homem e a mulher procurem um médico para realizar avaliação urológica e ginecológica.
Sou um homem saudável. Por que devo procurar o médico?
O homem funciona de maneira um pouco diferente da mulher. Elas têm uma educação mais relacionada à avaliação ginecológica e se cuidam desde mais cedo, geralmente, quando ocorre a primeira menstruação. O homem só vai ao consultório quando enfrenta algum problema. A fertilidade sempre foi uma “responsabilidade da mulher”. No entanto, há problemas assintomáticos que podem causar a infertilidade masculina.
A que tipo de exames o homem é submetido durante a investigação de infertilidade do casal?
O principal é o espermograma, que avalia o volume do sêmen e também o número, a concentração, a movimentação e a forma (morfologia) dos espermatozoides, além da presença de inflamação ou infecções no sêmen.
Se vou fazer quimioterapia, devo congelar meus espermatozoides?
É indicado que se discuta e se ofereça a pacientes com câncer, especialmente jovens que ainda planejam ter filhos, a opção de congelamento de espermatozoides quando submetidos a quimioterapia (que pode ter efeito tóxico). Em alguns casos, o paciente pode ficar azoospermico (ausência de formação de espermatozoides) de forma definitiva e irreversível.
Quem tem impotência pode ser estéril?
Não necessariamente. A dificuldade de ereção, muitas vezes, pode ser solucionada com o uso de medicamentos que causam alguma alteração na movimentação do espermatozoide. Mas não é essa alteração que irá causar dificuldade de fecundar a mulher. Quando ministrado em baixa quantidade, o medicamento não será causador de infertilidade. Pílulas para impotência podem, sim, ser recomendados para uma tentativa de gravidez.
(Fonte: Fabio Firmbach Pascualotto, urologista)
Principais causas
O que pode deixar um homem estéril – Fatores congênitos, adquiridos antes ou logo após o nascimento – Anormalidades nos sistemas urológico ou genital – Infecções no sistema genital – Varicocele – Distúrbios endocrinológicos como obesidade, diabetes mellitus, alterações no colesterol, hipotireoidismo e hipertireoidismo – Problemas genéticos – Fatores imunológicos (doenças autoimunes) – Doenças sistêmicas como insuficiência renal e hepática, câncer – Fatores exógenos (medicamentos, toxinas, irradiação) – Fatores relacionados ao estilo de vida como tabagismo, uso de drogas, anabolizantes e esteroides – Doenças idiopáticas, sem origem conhecida
(Fonte: Diretrizes para o diagnóstico e tratamento da infertilidade masculina )
Entendendo um espermograma
– O manual da Organização Mundial da Saúde (OMS) é mundialmente utilizado por laboratórios de análise seminal. De 2010 para cá, ele preconiza que o volume total de sêmen deve ser de pelo menos 1,5ml a cada ejaculação. Em 1999, tinha sido estabelecido um mínimo de 2ml. Já a quantidade de espermatozoides por ml de sêmen, que antes era considerada normal quando acima de 20 milhões/ml, hoje, quando acima de 15 milhões/ml, já é aceitável.
– Outro parâmetro importante é a motilidade, que analisa o tipo de movimentos dos espermatozoides, dividindo-os em quatro grupos. O Grupo A (progressão linear rápida) é considerado o melhor por ter a maior chance de fertilizar o óvulo. O Grupo B (progressão linear lenta) é considerado bom e deve estar em uma proporção que, somado ao tipo A, totalize 32% segundo parâmetros atuais, menos rigorosos que os 50% de A+B exigidos anteriormente. O Grupo C (motilidade não progressiva) tem menor chance de fertilização, mas, ainda assim, tem chance. São considerados “espermatozoides móveis” o somatório dos grupos A, B e C que antes deveriam totalizar 60% e hoje somente 40%. O Grupo D é totalmente imóvel e incapaz de fertilizar o óvulo. Já a vitalidade, ou seja, a porcentagem de espermatozoides vivos, antes exigida de 75%, mudou para 58%.
– Por último, analisa-se a morfologia de Kruger: os espermatozoides com a cabeça de formato oval e com a parte intermediária e cauda perfeitas são os que têm maior chance de fertilização. Pelo critério antigo de Kruger, a morfologia deveria ser igual ou maior que 14% e hoje aceita-se 4%.
(Fonte: Clínica do Homem