Adiar a maternidade: até quando?
Marcelo Oliveira Ferreira
Engravidar mais tarde é uma forte tendência, e parece ser irreversível. Os casamentos ficaram para mais tarde e os filhos, para mais tarde ainda. Na Suécia, a média de idade das mulheres no primeiro filho subiu de 24 para 31 anos entre 1970 e 2008. No Brasil, os dados refletem a mesma tendência, a proporção de mães com idade de 30 a 39 anos em 1999 era de 21%, em 2009 subiu para 25%. Mas, como todos sabem, a fertilidade feminina diminui com o tempo. O início deste declínio se dá por volta dos 30 anos, de uma maneira mais significativa após os 35 e mais acelerado a partir dos 40. Consequentemente, há uma demanda crescente para tratamentos de infertilidade. Enquanto que entre 2003 e 2009 houve um aumento de somente 9% na procura de tratamentos de fertilização in vitro com 35 anos, com 41 anos este aumento foi de 42% (CDC, EUA).
Devido à divulgação dos grandes pregressos, existe a idéia de que com reprodução assistida, a fertilidade feminina pode ser manipulada em qualquer idade, porém esta é uma idéia equivocada. Houve sim grandes avanços, mas as mais beneficiadas foram as mais jovens. As taxas de gestação com a fertilização in vitro com óvulos próprios também declinam com a idade: aos 30 anos são de 48%, mas aos 42, são somente de 14%.
Entre as causas apontadas para a esta postergação, a capacitação profissional, a busca de estabilidade financeira e a procura do parceiro ideal são comumente referidas, mas há outras razões. Muitas mulheres não têm a exata percepção sobre as limitações da sua capacidade reprodutiva. Afora isso, há uma errônea avaliação do potencial dos tratamentos de reprodução assistida. Hoje é bastante comum a divulgação de gestações com 45, 50 anos, e os especialistas são confrontados com estas informações. No entanto, estas gestações são predominantemente resultantes de óvulos doados. Tratamentos com doação de óvulos têm as melhores taxas, mas é preciso aceitar gerar um filho sem a sua carga genética. Além disso, devido às limitações existentes no Brasil para a obtenção de óvulos doados, há uma longa fila de espera para esse tipo de tratamento. Uma alternativa concreta é o congelamento de óvulos, pois os resultados atuais são comparáveis aos tratamentos com óvulos frescos. A mulher, congelando os óvulos enquanto é jovem e fértil, pode resgatar a chance de gestar no futuro, quando já estiver estabilizada profissional e afetivamente.
A mulher que adia a maternidade não deve ser rotulada de egoísta ou que, irresponsavelmente, não esteja preocupada em formar uma família. A pressão social a leva nesta direção. No entanto, esta deve ser uma escolha livre, baseada no adequado conhecimento dos seus limites naturais e do real potencial da medicina reprodutiva. É chegada a hora de refletir sobre este tema porque muitas mulheres estão ficando sem filhos involuntariamente. No intuito de preservar a fertilidade feminina, médicos, outros profissionais da saúde e até a mídia devem iniciar uma ampla discussão, com a divulgação de dados e fatos reais sobre a postergação da maternidade e suas conseqüências.
* Médico, especialista em reprodução humana