Para o renascentista Leonardo Da Vinci, os olhos eram a principal via do conhecimento, a janela do corpo humano para a beleza do mundo. “A visão se deixa iludir menos do que qualquer outro sentido”, registrou o artista. Cinco séculos depois, suas constatações ainda representam a melhor definição para o ato de ver. Afinal, grande parte do que sabemos levamos ao cérebro por meio da visão. Sorrimos com os olhos, podemos dizer tudo com um único olhar.
Esse maquinário no qual o mundo se espelha, no entanto, precisa de cuidados na segunda metade da vida, pois, como qualquer órgão, começa a sentir os efeitos do tempo. Mas há pouco ao alcance da mão, a não ser algumas mudanças no estilo de vida.
A manutenção da saúde ocular passa pela necessidade de visitar anualmente o oftalmologista a partir dos 45 anos, de forma a garantir o bom funcionamento dessa janela do corpo e rastrear sinais de doenças relacionadas ao envelhecimento.
A mais corriqueira delas, e que deve afetar todas as pessoas entre 36 e 45 anos, é a presbiopia, conhecida como vista cansada. Nessa condição, o indivíduo começa a experimentar um enfraquecimento do mecanismo usado para ver de perto, que depende de um músculo e da elasticidade do cristalino, a lente natural que serve para focar as imagens na retina. “Há uma perda da potência para enxergar de perto”. Para tais casos, o tratamento se baseia apenas na prescrição de óculos ou de lentes de contato.
Visão nublada
Já na terceira idade, outro problema freqüente é a catarata que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), afeta 80% da população com mais de 80 anos. Nessa doença, o cristalino começa a ficar opaco, perdendo a transparência e ganhando uma cor amarelada. Como resultado, a visão se torna embaçada e piora progressivamente.
O tratamento da catarata é cirúrgico, mas evoluiu tanto que nem parece uma intervenção. O procedimento, denominado facoemulsificação, leva cerca de meia hora, incluindo a etapa de anestesia, que consiste na instilação de algumas gotas de colírio em 90% dos casos. É usado uma caneta de ultra-som, que quebra o cristalino em partes pequenas e as aspira completamente, e coloca-se no lugar uma lente intra-ocular que substitui o poder de focar a imagem na retina. O melhor é que, em geral, as pessoas já saem do hospital sem tampão e com a visão de volta – muitas vezes melhorada.
Em silêncio
Se na vista cansada e na catarata a dificuldade de enxergar soa o alarme, no glaucoma, ao contrário, não há sintomas, aumentando a necessidade de check-up oftalmológico rotineiro. Causado por um desequilíbrio na pressão intra-ocular, o problema provoca lesões irreparáveis no nervo óptico e a pessoa vai perdendo o campo visual periférico – enxerga o que tem na frente, mas não o que está ao redor. No entanto, quanto mais cedo se descobre que a pressão do olho está elevada, menores são os danos.
Inicialmente o tratamento é feito com colírios, que servem tanto para baixar a pressão intraocular quanto para drenar o humor aquoso, líquido que preenche o olho e que, em tal situação, não pode ser escoado naturalmente, causando hipertensão. Se os medicamentos não derem resultado, o próximo passo é recorrer a técnicas cirúrgicas e terapias a laser para promover o escoamento do humor aquoso, todas passíveis de execução em regime ambulatorial.
Outra condição na qual o diagnóstico precoce tem importância capital é a degeneração macular. Nesse processo, as células da retina não conseguem se livrar das impurezas de seu metabolismo que, assim, vão se depositando na parte central da retina, a mácula, responsável pela nitidez da visão. Exames periódicos de fundo de olho são importantes para a detecção da doença e para a monitoração de evolução para fases mais avançadas.
A degeneração começa com pequenos depósitos, denominados drusas, que são controláveis com avaliações periódicas e outras estratégias, como o uso de suplementos polivitamínicos. Essas drusas, porém, podem evoluir para a formação de uma membrana de vasos sangüíneos embaixo da retina, o que causa embaçamento, mancha no campo visual e distorção das imagens, determinando importante perda da visão.
Evolução
A boa notícia é que, mesmo nessa fase, já existem modernos tratamentos que ora usam mecanismos para causar trombose nos vasos, ora recursos para impedir seu nascimento – a angiogênese. O mais recente consiste na aplicação intraocular de uma substância chamada pegaptanibe, técnica que o oftalmologista Francisco Max Damico trouxe para São Paulo em 2006. Embora não se trate de uma cirurgia, Damico utiliza a estrutura do Fleury Hospital-Dia para realizar o procedimento devido à obrigatoriedade de fazê-lo em um ambiente cirúrgico para evitar o risco de infecções.
O oftalmologista explica que o pegaptanibe inibe o surgimento dos vasos embaixo da retina em médio prazo, reduzindo o ritmo de progressão da doença e, em um terço dos casos precoces, até melhorando a visão. “Saímos de uma realidade em que a evolução natural da degeneração, por pior que fosse, era a melhor opção e chegamos a um ponto em que conseguimos até recuperar a visão perdida em alguns pacientes, algo impensável há pouco tempo”, compara Damico.