Nos últimos meses tenho utilizado esse veículo de comunicação para manifestar minha indignação sobre as incongruências da política brasileira que trata das questões da saúde mental. Dada a complexidade desse assunto e sua abrangência epidemiológica, a política de saúde mental deveria ser uma das políticas prioritárias dos governos, todavia verifica-se o contrário.
Especificamente sobre saúde mental, é lamentável aonde chegamos. Uma política mal aparelhada, desarticulada, sem referência, com poucos recursos financeiros e, confusa em sua aplicabilidade. A situação é mais preocupante quando se trata de saúde mental na infância e na adolescência. Etapas da vida que pela sua natureza deveriam dispor do que há de melhor nesse sentido, para dela desfrutarem. Mas, aqui reina o contrário, crianças e adolescentes estão literalmente desassistidos quanto aos seus direitos constitucionais de ter acesso á saúde no mais amplo sentido. É mais um setor que vai muito mal nesse país entre tantos outros e, algumas iniciativas aqui tomadas pelo poder público passam á margem da tolerância quanto aos cuidados que deveriam ter sido tomados em benefícios de crianças e adolescentes. Dão-nos a impressão que os problemas nessa área não existem ou não tem a menor importância.
O Brasil, segundo a UNICEF, possui uma população de quase 200 milhões de pessoas, dos quais 60 milhões têm menos de 18 anos de idade, o que equivale a pouco mais de um terço de toda a população de crianças e adolescentes da América Latina e do Caribe. São dezenas de milhões de pessoas que possuem direitos e deveres e que necessitam de condições para se desenvolverem com plenitude.
Segundo ainda a UNICEF, essas crianças estão especialmente vulneráveis às violações de direitos, à pobreza e à iniquidade no País. Por exemplo, 29% da população vivem em famílias pobres, mas, entre as crianças, esse número chega a 45,6%. As crianças negras, por exemplo, têm quase 70% mais chance de viver na pobreza do que as brancas; o mesmo pode ser observado em crianças que vivem em áreas rurais, onde 70% das 13 milhões que vivem nessas condições são classificadas como pobres. Essas condições socioeconômicas são absolutamente desfavoráveis e incompatíveis à um bom desenvolvimento emocional, social e comportamental do ponto de vista psiquiátrico e da saúde mental, fatos que agravam mais ainda o problema.
Em, nosso país, 21 milhões de adolescentes com idade entre 12 e 17 anos e as crianças são especialmente afetados pela violência. As estatísticas mostram um cenário desolador em relação à violência contra esses jovens. A cada dia, são registrados 129 casos de violência psicológica e física, incluindo a sexual, e outras negligências contra esses jovens, conforme o Disque Denúncia 100. Isso quer dizer que, a cada hora, cinco casos de violência contra meninas e meninos são registrados no País. Imaginem o impacto dessas experiências na mente de um ser em desenvolvimento, pois tais ocorrências poderão também marcá-las para sempre.
Tanto as injúrias socioeconômicas quanto as violências dos quais são vítimas esses pequenos seres humanos provocarão uma carga muito grande de dor e sofrimento que interferirá na sua estrutura afetivo-emocional, comportamental e na própria formação da personalidade dos mesmos, com consequências imprevisíveis em sua dimensão moral, comportamental e biopsicossocial.
Por conta dessas experiências traumáticas e muitos outros fatores psicopatológicos que esses jovens são vítimas, estima-se que entre 12 e 20% da população infanto-juvenil apresentará na vida, algum transtorno mental e entre esses: autismo, depressão, distúrbios ansiosos, distúrbios hipercinéticos, distúrbios da atenção, distúrbios de comportamentos, alcoolismo, esquizofrenia, retardo mental e outras dependências químicas. Entre esses que apresentam tais distúrbios, 2 a 3 % exigirão cuidados intensivos para seu enfrentamento, portanto apresentarão condições psiquiátricas graves que necessitarão atenções especiais.
Só o alcoolismo, doença mental severa e prevalente entre nós, será desenvolvido por 7% da população masculina até 17 anos e, uma em cada 4 crianças e adolescentes, com idade entre 10 e 18 anos, estarão expostos ao abuso de álcool no ambiente familiar. Os índices de consumo de outras drogas crescem assustadoramente, sem qualquer controle.
E o que está sendo feito a essa juventude enferma em matéria de assistência, de prevenção ou de reabilitação psicossocial? Para onde os pais dessas crianças e adolescentes portadoras desses transtornos estão levando seus filhos na área pública? E os dependentes de álcool e outras drogas, onde estão sendo tratados? E os pais angustiados e desesperados como os vejo quase sempre, onde irão buscar apoio? Se houver necessidade, onde internar os mais graves? As perguntas estão postas, o desafio agora é saber quem do poder público vai responder. Essa população de jovens brasileiros e maranhenses sofredores desassistidos que estão a mercê da sorte ou da boa vontade dos outros, quem vai cuidar? Eles estão aí entre nós. Precisamos dá um rumo decente, digno e humanizado á politica de segurança, social e de saúde para essa juventude que tanto esperam da gente, nesse estado e nesse país.