Esse fenômeno é também designado de Transtorno de Escoriação (TE), skin picking, escoriação neurótica (neurotic excoriation), escoriação patológica, dermatotilexomania, acne escoriada (acne excorieé) ou ainda escoriação psicogênica. É uma condição médica e psicossocial que está no âmbito da saúde mental que requer tratamento e medidas preventivas no âmbito da saúde individual e coletiva.
Sobre a saúde mental da população, estima-se que 50% dos transtornos mentais de adultos tem início antes dos 14 anos de idade e 75%, até 24 anos. Muitos estudos longitudinais demonstram que 40 % dos jovens com até 16 anos apresentam pelo menos um transtorno psiquiátrico na vida. Um, em cada 4 adultos e uma em ada 5 crianças apresenta uma doença mental conforme a OMS.
Se considerarmos esses indicadores e cruzarmos com suicídio a OMS informa que é ele é a segunda causa de morte entre adolescentes e que mais de 90% dos que cometem suicídio apresentam algum transtorno mental. Entre as causas mais importantes apontadas nas pesquisas, os preconceitos, os estigmas, o retardamento no diagnóstico médico da doença que a ocasionou o suicídio, a busca de culpados, as restrições nas redes de apoio e cuidados a esses enfermos e poucos dispositivos de prevenção, são os fatores predisponentes mais relevantes, no cometimento e suicídio.
Entre os fatores de risco e os transtornos mentais destacam-se: ambiente familiar disfuncional, dificuldades financeiras, abuso ou violência doméstica, uso de álcool e de outras drogas e tentativas anteriores de suicídio.
Sobre a automutilação, ela é definida como qualquer comportamento intencional envolvendo agressão direta ao próprio corpo sem intenção consciente de suicídio. Portanto, suicídio e automutilação são eventos psicopatológicos distintos um do outro. Os atos automutilatórios, geralmente têm como intenção o alívio de sofrimento e tensão emocional. As formas mais frequentes de automutilação, destaca-se: cortar a própria pele, queimar-se, bater em si mesmo, morder-se e arranhar-se e as áreas mais comuns são: braços, pernas, barrigas e peitos.
O diagnóstico da automutilação de conformidade com o (DSM-5) que é um instrumento de diagnóstico da Associação Psiquiátrica Americana – APA, está incluída no Transtorno de Escoriação- TE é “beliscar a pele de forma recorrente, resultando em lesões; tentativas repetidas de reduzir ou parar o comportamento de beliscar a pele; o ato de beliscar a pele causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento pessoal, social, profissional”.
Do ponto de vista das ocorrências da automutilação na população em geral, ainda não há um consenso seguro sobre o mesmo. Em nosso país há poucos estudos. Espera-se, que agora com a obrigatoriedade de notificação dessas ocorrências impostas pela nova Lei Federal nº 13.819, de 26 de abril de 2019, sobre suicídio e automutilação, que em breve possamos ter acesso a dados importantes e fidedignos dessas ocorrências em nossa população.
Sabe-se, que na área da educação essa prática é uma ocorrência, frequente, levando ao aumento da prevalência. Taxas de 26% a 37% foram relatadas para comunidade nos EUA em classe média a alta (9º ao 12º ano) (Yates et al, 2008). No entanto, a prevalência varia entre amostras e regiões. Estudo em andamento em muitos países, inclusive UNIFESP estudos prevalências variando entre 13% e 23%. (Jacobson & Gould, 2007). A prevalência é maior no final da adolescência na prática cada vez mais precoce.
Quais são os fatores de risco mais importantes na prática da automutilação? Destacamos: Transtornos Psiquiátricos, sobretudo Transtornos Obsessivo-Compulsivo- TOC Transtornos de Ansiedade, sobretudo Stress pós traumático e Transtorno de Ansiedade Generalizada – TAG. Transtorno do Humor, especialmente, depressão e Transtornos de Personalidade do tipo Boderline. Pacientes limítrofes, com retardo mental e alterações cognitivas, também são apontados como fortes candidatos à automutilação. História de abuso sexual ou físico são ocorrências frequentes entre esses pacientes.
Quais os fatores psicossociais relevantes para a automutilação? Eventos estressantes, conflitos interpessoais, perdas afetivas e emocionais significativas, discórdia e conflitos familiares e problemas escolares. Esses são apontados como os fatores mais relevantes. A baixa autoestima, comportamento antissocial, uso de tabaco, álcool e outras drogas, déficits em regulação emocional e outros fatores inter e intrapessoal como necessidade de autopunição, necessidade de relaxar, obter atenção ou ajuda de outras, irritar os outros, puni-los ou exercer controle, distrair pensamentos e sentimentos negativos, sentir algo, mesmo que seja a dor, são também fatores muitos relatados por esses enfermos.
Quais os tratamentos da automutilação? Considerando que a automutilação tem um espectro sindrômico, as recomendações para seu tratamento são amplas, gerais e específicas. Nessa perspectiva, estão incluídas procedimentos médicos e recomendações psicossociais. Entre as recomendações médicas, destaca-se o uso sistemático e regular de medicamentos que modifiquem as condições gerais de humor, da cognição e da ansiedade desses enfermos. Fármacos como os ansiolíticos e antidepressores bem como os estabilizadores do humor são os fármacos mais prescritos, com resultados muito satisfatórios no manejo clínico desses pacientes.
Constrangimentos no ambiente familiar e social, bullyings em ambientes escolares devem estar na meta dos psicoterapeutas, considerando que são condições desfavoráveis nessas instâncias, as quais podem funcionar como “gatilhos” nessas pessoas.
A psicoterapia, especialmente a Terapia Cognitivo-Comportamental – TCC, é considerada um instrumento indispensável para manejo adequado e recuperação desses enfermos. A orientação parental ou familiar, também são instrumentos relevantes no manejo da situação. Técnicas de relaxamento e de atenção plena (Mindfulness), atividades físicas, terapias ocupacionais, são recomendações especiais e importantes no tratamento desses enfermos.