Paz & Amor
“Quem não vai à Nova York vai de Madureira“. Se eu não pude ir a Broadway vim ao Teatro Oi Casa Grande, no Leblon, assisti a remontagem, a adaptação e versão à brasileira de Hair. Logo no início fiquei assustado, pois achava que não conseguiria entrar nas sessões de sábado, pois a lotação da casa estava esgotada. E ai, o que restava era o outro fim de semana, quando não estaria mais no Rio de Janeiro. O que me restou foi correr atrás do lucro, pois um dos objetivos nesse passeio de férias seria curtir o espetáculo, tendo em vista a curiosidade e o burburinho via imprensa. No apagar das luzes surgiu uma vaga para um jornalista ávido por informação e da eterna busca pelo conhecimento, pois entende como a tatuagem da alma.
Não comungo com o ser intectual ou intelectualóide, dono da verdade absoluta. Também não concordo em ser uma topeira. Tenho como ideologia para viver: comida, diversão e arte. E já que pensar não traz infelicidade e tampouco dói, ir ao teatro é uma terapia saudável e perfeita para que gosta de refletir sobre comportamento, costumes, entre outros temas do cotidiano de uma civilização cuja história é camaleonica por natureza.
Hair, na versão de Charles Moeller e Cláudio Botelho, é um programa obrigatório para quem estiver no Rio de Janeiro. Um peça, que desde que entrou em cartaz, têm levado muita gente famosa para prestigiá-la. Na sessão deste de fim de semana, os atores Reinaldo Gianechinni, Carmo De La Vecchia, entre outras celebridades televisivos, interagiram como plateia. A princípio, o temor de que o musical envelhecera e perdera a validade, ainda que com suas canções clássicas, mas ao perceber a primeira cena, a primeira canção, foram quebrados os paradigmas.
Aquarius é o cartão de visita de Hair, apresentando alguns aspectos que serão explorados em seguida. A canção, poderosa, é interpretada de forma vibrante pelo elenco de 30 atores, todos caracterizados como hippies dos anos 60. A apresentação também anuncia o que o espectador pode esperar: um elenco afiado, afinado, motivado. E, para aproveitar tamanha energia, Charles e Claudio empenharam-se no que pode ser seu melhor trabalho.
Fiquei maravilhado com os todos os protagonistas do musical, mas fiquei vidrado nas performances de Hugo Bonemer, como Claude. Ele reproduz a instabilidade emocional de seu personagem, dividido entre a tribo de hippies e as exigências paternas para se alistar na guerra. Igor Rickli faz Berger, o chefe da tribo, encarregado de manter firme a convicção de lutar contra a absurda guerra com o Vietnã. Ele equilibra bem o sex-appeal (bem utilizado por Berger) com a emoção exigida por um final trágico. Entre as cenas do musical, um outro momento marcante é a nudez dos personagens. Em “Hair”, ela não é erotizada. Ao contrário, é politizada, como forma de protesto e de desapego.
O nível é mantido pelos demais atores, como Marcel Octavio como Woolf e especialmente Letícia Colin, excepcional como Jeanie, personagem que beiraria a caricatura não fossem seus belos dotes de humor. É uma figura que não se esquece facilmente.
O ativismo pela paz é importante e sempre atual. Hair, repaginado por Charles e Cláudio, soube acrescentar particularidades brasileiras. É emocionante o final do espetáculo, quando os atores convidam a plateia para subir ao palco, derrubando a quarta parede e convocando a todos para uma rara comunhão e reflexão. Enfim, ninguém sai ileso depois de assistir a Hair. E se o musical da era de Aquarius não veio para mudar o mundo, pelo menos convida você a abrir a janela de suas mentes e deixar o sol entrar sempre. (Let The Sun Shine In Original Version).
Fotos: Divulgação