Sons dos emergentes

1comentário

Escrito por: Sérgio Martins

Como gênero de mercado, a world music tem certidão de nascimento com data e local registrados. Ela veio à luz em 29 de junho de 1987, em Londres, durante uma reunião de gravadoras inglesas às voltas com uma charada: como vender artistas de países periféricos que, por um motivo ou outro, constavam de seus catálogos? O plano de ação foi modesto. Inventou-se o rótulo e uma verba de 3.500 libras foi direcionada à sua divulgação. Poucas ações de marketing devem ter sido mais efetivas na história da indústria de entretenimento. Depois que algumas publicações da época, como o New Musical Express, se converteram à causa, a onda cresceu sozinha. Grandes lojas de discos como a Virgin criaram seções específicas e de repente lá estavam, surgidos do nada, o mistério das vozes búlgaras e o falsete esquimó. A world music era uma espécie de contraparte sonora de outra invenção da época, o politicamente correto: finalmente a akadinda africana, o dan bau chinês e a flauta de junco sufi tinham sua dignidade intrínseca reconhecida; eles nunca mais seriam desprezados pelo Ocidente. A moda rendeu dividendos, mas, em meados dos anos 90, começou a arrefecer. Embora o gênero houvesse chegado para ficar, parecia que ninguém mais conseguiria ganhar dinheiro com ele como nos primeiros tempos. Até a entrada em cena do americano Dan Storper (foto). Com o selo Putumayo, que passou a ser distribuído no Brasil no fim do ano passado, ele dá a impressão de ter descoberto uma fórmula eficaz de vender a world music no século XXI. Como diria o Dr. Smith, do seriado Perdidos no Espaço: “Oh, dor”.

Storper é um empresário com antecedentes de bicho-grilo. Em 1973, formou-se em estudos latino-americanos pela Universidade Washington, nos Estados Unidos, e quis conferir na prática o que conhecia na teoria. Pôs a mochila nas costas e partiu para a América do Sul. Conheceu o Equador, o Peru, a Bolívia e a Colômbia. De volta aos Estados Unidos, descobriu que bolsas e ponchos que havia trazido na mala podiam causar comoção. “Quando uma loja de departamentos me ofereceu 5.000 dólares por uma bolsa que havia custado tostões, me vi diante de um belo negócio”, diz. Storper criou a rede Putumayo (nome de uma localidade da Colômbia), especializada em artigos do Terceiro Mundo. A música entrou na história – como não poderia deixar de ser – no começo dos anos 90. Depois de visitar uma das lojas de sua rede, em Los Angeles, e se assustar com a trilha sonora escolhida pelo vendedor – um rock pesado, com guitarras estridentes –, Storper passou a escolher pessoalmente a música ambiente e logo fundou um selo. Em 1997, a gravadora tornou-se mais rentável do que as lojas, das quais Storper se desfez. Hoje, álbuns da Putumayo não vendem menos do que 100.000 unidades por título. Em 2006, o empresário embolsou um lucro de 24 milhões de dólares.

Storper tem uma receita. Ele não produz discos inéditos, apenas licencia faixas de outras gravadoras para criar compilações. Alguns de seus álbuns são dedicados a regiões específicas do mundo, mas uma boa parte deles tem espírito ecumênico, de modo que o americano Moby pode aparecer lado a lado com Angélique Kidjo, do Benin. O ponto crucial da estratégia é deixar para trás o engajamento da world music dos anos 90. O selo não existe para educar o ouvinte inculto nem para brigar pela dignidade dos músicos africanos. “A principal missão é criar discos que façam o comprador se sentir bem”, diz Storper. Algumas coletâneas, como Asian Dreamland, têm apelo esotérico. Outras têm apelo hedonista. Com essas a Putumayo conseguiu conquistar um público de “descolados” à procura de tempero musical para um jantar ou uma festa. Em títulos como Música de Terras que Produzem Vinho, o mundo da Putumayo cabe confortavelmente em qualquer sala de jantar.

Som ambiente

Onde ouvir as coletâneas da gravadora Putumayo

MÚSICA PARA O QUARTO

Canções que ajudam a namorar – ou dormir
Exemplos: Dreamland e Blues Lounge põem as crianças a nocaute
Artistas: a beninense Angélique Kidjo e o DJ americano Moby

MÚSICA PARA A COZINHA

Coletâneas inspiradas por certo tipo de comida
Exemplos: Música de Terras que Produzem Vinho,
Música de Terras que Produzem Chocolate
Artistas: Pauline Croze e Susheela Raman

MÚSICA PARA A SALA

Serve de fundo ao bate-papo ou então anima festas
Exemplos: French Café e Cuba, repletas de canções suaves, e as sacolejantes Arabic Groove e African Groove
Artistas: o cubano Ibrahim Ferrer e o argelino Khaled

1 comentário para "Sons dos emergentes"


  1. Alessandra

    Professor!!! ô professor vou arrancar um dente hj, não poderei ir assistir sua aula. Num fique zangado naum ó. Naum me dê falta tá bem?

    Jornalismo Noturno-5 ª 😉

deixe seu comentário

Twitter Facebook RSS