“Sétimo no gosto do brasileiro, mas continua soberano”

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O Prêmio da Música Brasileira festeja 25 anos, como um dos mais conceituados eventos musicais do país, e terá o samba como o grande homenageado na versão de 2014, em cerimônia a ser realizada no dia 14 de maio, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. O mesmo evento traz o sambista Wilson das Neves como o artista com mais chances de ser premiado, totalizando seis indicações, Gilberto Gil também reverencia o gênero, juntamente com a bossa nova, em seu mais recente álbum, “Gilbertos Samba”.

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Pesquisa

Uma primeira análise levará o leitor à conclusão de que o mais genuínamente brasileiro dos ritmos tem desfrutado de prestígio e popularidade país afora. Mas, um estudo do Sesc (Serviço Social do Comércio) aponta que o samba é apenas o sétimo colocado no ranking de gosto musical do brasileiro – o sertanejo, a MPB e o pagode aparecem nas três primeiras colocações, respectivamente, numa constatação de que “há por aí muito mais gente ruim da cabeça ou doente do pé” do que se pode imaginar.

Sambistas do peso de Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz, Sombrinha, Moacyr Luz e Dona Ivone Lara rebatem a pesquisa brincando com a expressão “Me Engana Que Eu Gosto”. Por outro lado, os sambistas maranhenses Victor Hugo, do grupo Argumento, Neto Peperi, do Espinha de Bacalhau, e Boscotô, da Máquina de Descascar Alho, vão na contramão do pensamento dessa rapaziada e concordam com a pesquisa, denonimada de Públicos de Cultura, do Sesc, feita entre os dias 31 de agosto e 8 de setembro de 2013, por meio de 2,4 mil entrevistas realizadas em 139 municípios de 25 estados brasileiros.

Para Victor Hugo, a pesquisa tem fundamento em razão da ascensão de estilos como sertanejo e o funk no país. E se ela é rejeitada pelos sambistas de renome do Rio de Janeiro, é porque, segundo ele, os mesmos têm um “marketing” e uma história musical a favor deles. Victor complementa dizendo que esse privilégio não acontece com alguns dos novos sambistas do eixo Rio-São Paulo, e tampouco com quem faz samba em São Luís, do Maranhão. Victor disse que tocar na cidade tem que sobreviver ao mercado e, isso, só acontece quando o músico prioriza a unanimidade.

– A pesquisa é rebatida por alguns sambistas de nomes porque eles conseguiram se legitimar pelo profissionalismo, a história com o samba e, por isso, foram absorvidos pelo mercado. Por onde passam tem público, independente do samba está ou não em sétimo lugar no gosto musical do brasileiro. Mas, ainda, tem sambistas no Brasil que se ressentem dessa falta de espaço. E o exemplo somos nós que fazemos samba em São Luís. Portanto, a pesquisa tem fundamento haja vista o sertanejo e o funk serem os estilos musicais em evidência no Brasil, na atual conjuntura musical, especificamente no Maranhão, e em São Luís. Tudo aqui virou um grande sertão. A MPB de barzinho não vinga mais. Enfim, uma coisa é a música e a outra é o mercado musical. E no que diz respeito a São Luís assumir uma identidade musical é difícil tendo em vista o mercado escasso, principalmente, para quem vive da noite. Nós temos dois CDs gravados de samba. Mas, na noite abrimos o leque musical para sobreviver ao mercado e atender o que a “massa” está pedindo. Fazemos isso, mas acreditamos no samba de raiz, na força e história que ele tem junto às matrizes africanas existentes em São Luís e outras capitais brasileiras e da penetração que o gênero ainda tem a diversos segmentos da sociedade – argumenta.

Imponente

Embora defina como soberano e o gênero mais “brasileiro dos brasileiros”, Neto Peperi diz que o samba sofre de preconceito, principalmente, o definido como de raiz, e atribui uma“mea culpa” a mídia e os críticos especializados de plantão.

– Ainda existe um preconceito muito grande o samba, principalmente o tratamento que recebe da mídia e dos formadores de opinião. O samba identifica o brasileiro em qualquer lugar do mundo. Mas, é lamentável que o estereótipo criado em cima do gênero, onde como se o samba não fosse música brasileira, a tal da MPB – justifica.

Boscotô concorda com a pesquisa, mas acredita na força do samba, destacando a produção do samba local e o público cativo e consumidor do gênero na ilha.

– Embora a pesquisa aponte o samba como o sétimo no gosto do brasileiro, não podemos esquecer que o samba está em todos os quintais desse país. É difícil um fim de semana, uma festa de aniversário, ou o domingo de uma partida de futebol, em que o samba não está presente como fonte de diversão e uma paixão nacional. A força, a magia e a essência do samba nenhum ritmo consegue tirar. E São Luís tem um público representativo e consumidor de samba, esteja ele nas classes A, B, C, D ou E – defende.

Reinvenção

Diz a pesquisa que as várias vertentes do samba e suas diferentes ramificações seriam as responsáveis pela pulverização da opinião do público, em se tratando de preferência musical. Relativizando entre a tradição e a contemporaneidade do samba, surge o pagode romântico, talvez, por isso, o samba tenha ficado um pouco nessa penumbra. Perdeu-se um pouco aquela referência do samba nos moldes tradicionais da escola de Paulinho da Viola, Elton Medeiros e Noel Rosa.

O samba com essas características pode ter dado lugar ao pagode, gênero de vendagem muito alta, num tempo em que isso não existe mais. Além disso, parte dos compositores migrou ou foi atraído por ele. Digamos assim, será que o pagode pode ser chamado a decupação do samba, ou se é primeiro, segundo, terceiro ou o sétimo da lista, o gênero está acima de todas essas discussões ?

Para Victor Hugo, que faz esse link entre o samba e o pagode quando está no palco, o mais importante é enxergar o gênero como imponente e que “nunca vai morrer”.

– Pode haver dez músicas de Luan Santana e uma de Zeca Pagodinho, com certeza vai prevalecer a essência musical de quem faz a obra com consistência e para resistir ao tempo. Isso o samba consegue devido a sua história no contexto cultural brasileiro, pelo batuque, a negritude e a sua poesia do cotidiano e de cunho social. Ele é soberano e nunca vai morrer – elogia.

Apelo

O samba é a grande música do Brasil. A sensação que se tem é que em algum momento, algúem vai tocar um samba, nem que seja no Carnaval ou fora do Brasil, como o representante máximo da Música Popular Brasileira. Na opinião de Boscotô, embora esteja cada vez mais popular em São Luís, o gênero, principalmente, da maneira como foi concebido e do seu jeito de ser, precisa ser refletido e executado com mais frequência no rádio local. E o apelo feito pelo músico passa pela valorização do samba produzido no Maranhão.

– Temos várias programas locais de samba, mas pouco exploram o samba de raiz. Contem a história do samba produzido no Maranhão. Que as pessoas tenham conhecimento de nomes como o Zé Pivó, Neto Peperi, César Teixeira, Cristóvão Alô Brasil, Chico da Ladeira, Patativa, Fuzileiros da Fuzarca, Turma do Quinto, Turma de Mangueira, Favela do Samba, Flor do Samba, enfim de muitos outros bambas que construíram a história musical desse Estado e que as pessoas precisam tomar conhecimento – sugere.

Celebração

No próximo dia 20, São Luís vai receber o Prêmio da Música Brasileira e a celebração em homenagem ao samba. O show ocorrerá no Teatro Artur Azevedo. O trio de sambistas locais foram unânimes em dizer que a festa em São Luís é viável, mas também exigem que seja um momento de reflexão de um gênero, que embora apareça como ‘o sétimo da lista’, em pesquisa, “o samba sabe o que tem de ser dito e o que tem de ser feito. Ele conhece a própria batucada. Está tudo certo”. Ele é o cara !”

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