– Não existem editais sistemáticos para o cinema maranhense, nem leis de incentivo locais. Por isso, nossa produção, ao contrário de outras cinematografias nordestinas, como a cearense e a pernambucana, é tão escassa – reclama Frederico, que este ano realizou em São Luís a primeira edição do Festival Lume, uma mostra competitiva com atrações do exterior. “Meus curtas anteriores, Litania da velha (1997), Infernos (2006) e Vela ao crucificado (2009), percorreram dezenas de mostras internacionais, o que nos dá mais entrada no mercado externo. A ideia é que meu filme tente um circuito de festivais internacionais paralelamente ao lançamento”, completa.
Pela falta de registros de longas ficcionais maranhenses, O exercício do caos vem sendo encarado como a estreia do estado no terreno que mais movimenta a aposta dos exibidores. Filmado por uma equipe de 15 pessoas, todas da região, sem astros no elenco, o longa registra o cotidiano de um homem (vivido por Auro Juriciê) e suas três filhas (interpretadas pelas irmãs Thalyta, Tahiná e Isabella Sousa) no interior do Maranhão. Eles vivem no fundo de uma fazenda, fazendo farinha e trabalhando na roça. Além dos quatro personagens, há a presença de um capataz, um sujeito misterioso, que ronda os protagonistas e explora tudo o que eles podem oferecer.
Horror – “Por tratar de um tema fantasmagórico e por ser cheio de símbolos e silêncio, O exercício do caos remete diretamente aos filmes de horror clássicos, como Repulsa ao sexo, de Polanski, e Madre Joana dos Anjos, de Jerzy Kawalerowicz. Mas esse horror psicológico remete também ao drama pessoal dos personagens, envolvidos em solidão, morte e loucura. É um filme composto por planos longos e por experimentalismos e situações absurdas, que remetem também aos documentários e aos primeiros filmes de ficção de Werner Herzog”, diz Frederico, lembrando que há uma nova geração de cineastas brasileiros flertando com tramas nas quais o medo é componente essencial.
Um exemplo é Trabalhar cansa, de Marco Dutra e Juliana Rojas, que representou o Brasil na mostra Un Certain Regard de Cannes, e estreou em setembro. Há ainda Strovengah – Todos os olhos, de André Sampaio, exibido em outubro na Semana dos Realizadores, que lança âncora na praia do suspense. “Acredito que existe um cinema brasileiro de horror forte e autoral. O cinema de José Mojica Marins, por exemplo, é um cinema verdadeiro, feito com garra e originalidade, sem medo de errar e de se criar. Mojica não é a referência maior no meu trabalho, mas seu modo de filmar e sua paixão pelo cinema são referências”, diz Frederico.
Em 2008, um outro jovem diretor maranhense, o jornalista Cícero Filho, arriscou-se na direção de longas, só que numa produção piauiense: a comédia Ai que vida!, que fez sucesso no Nordeste em vendas por DVD. Cícero já finalizou um novo longa: Flor de Abril. Já no terreno documental, o Maranhão tem representantes como Murilo Santos, realizador do média Divino artista. “No cinema maranhense, além da falta de patrocínio e de apoio do governo, temos limitações técnicas, pois não há equipes formadas. Os processos de finalização acabam no Rio ou em São Paulo”, diz Frederico. “Mas, na luta e na garra, nossas tentativas seguem”, diz.
Fonte: Rodrigo Fonseca/Da Agência O Globo
Sinto-me honrado em ser citado nesta matéria que enfoca um importante momento na história da produção audiovisual local, a realização do primeiro longa-metragem maranhense de ficção. Se o Maranhão agora “tenta a sorte”, e com grandes possibilidades de sucesso a partir do empreendimento do jovem cineasta Frederico Machado, o mesmo não ocorreu no final da década de 1970, quando o superoitista Carlito Silva “arriscou-se” – como sublinha Rodrigo Fonseca ao falar de Cícero Filho – iniciando as filmagens daquele que seria o primeiro filme longa metragem em Super-8 do Maranhão, quiçá do norte e nordeste. Infelizmente seu filme “Meu Filho Doutor” permanece inacabado.
Em 2007 tive a sorte de ser procurado pelo antropólogo Rodrigo Ramassote do IPHAN, interessado em digitalizar e lançar em DVD o meu curta “Tambor de Crioula” de 1979, como uma das ações de salvaguarda dessa expressão recém registrada como Patrimônio Imaterial do Brasil.
Arrisquei em ampliar a proposta e incluir no DVD um novo documentário a partir do reencontro com personagens do antigo filme. Com recursos próprios e apoio da Superintendência Regional do IPHAN, após quase dois anos de trabalho concluí o “Afinado a Fogo: O Tambor de Crioula Revisitado”. Com 72 minutos, o documentário foi apresentado em versão reduzida após a exibição do antigo curta, na solenidade de lançamento do DVD no Cine Praia Grande.
Na “terra de curtas e de médias-metragens documentais”, as circunstâncias envolvendo a temática do “Afinado a Fogo: O Tambor de Crioula Revisitado” me levaram involuntariamente a fugir à regra e realizar um documentário com um tempo de duração que, segundo a ANCINE, se enquadra na categoria de longa metragem.
Enquanto curtametragista, Frederico Machado assim como outros jovens cineastas locais, já vêm honrando o Maranhão com importantes premiações. Acredito que essa sua nova e ousada experiência não fugirá à regra e certamente fará escola nesta terra “sem tradição de longas-metragens de ficção”, como bem identifica Rodrigo Fonseca na matéria.
Murilo Santos
O cineasta Frederico fez justiça nesse artigo de âmbito nacional. o seu nome (Murilo Santos) pela contribuição que vc., entre outros de sua geração, tem dado ao cinema brasileiro, tendo como ponto de partida o Maranhão. Infelizmente, falta visão da iniciativa e pública e privada que [juntas] ainda não tiveram a sensibilidade de perceber que o cinema é a sétima arte. É uma das fontes enriquecedoras de conhecimento e transformadora de uma sociedade. Gente criativa e conhecedora do assunto não falta no Maranhão.