No dia 18 de novembro do ano passado, em uma rápida passagem por Brasília, as filipetas, outodoors, blogs, orkut, o rádio e a TV anunciavam que o cantor e compositor Caetano Veloso estaria estreando sua nova turnê do seu mais novo disco Cê. O encontro com os fãs candangos aconteceria na Academia Music Hall, um lugar acima da média nacional.
Logo veio o questionamento. Será que devo pagar um ingresso fora da minha realidade econômica e assistir ao show ? Pensei, pensei, e cheguei a conclusão de que seria uma necessidade, pois não prestigiava o artista no palco há um bom tempo e também achava que seria difícil vê-lo cantando em São Luís.
Aproveitei a noite saudável de sábado, na capital federal, e me presenteei comprando o ingresso para ver Caetano em cena. Chegando lá, me posicionei entre as 3,6 mil pessoas que lotaram a Academia. Foi uma estréia auspiciosa. A impressão de “Cê” no palco, após as 22 cançôes do roteiro, mais os dois números do bis, misturando 11 das 12 canções do disco lançado há pouco mais de dois meses com clássicos de sua carreira, foi similar à deixada pela audição do CD.
A ambientação e a abordagem foram roqueiras, mas o que se ouviu foi música no seu sentido mais amplo, e caetânica. Coube, em quase 1h50m espetáculo, também samba, frevo, balada, canção, num show que ecoou realmente auspicioso.
Cercado dos mesmos jovens e ótimos músicos que gravaram o recente disco Pedro Sá (guitarra), Ricardo Dias Gomes (baixo e piano Rhodes) e Marcelo Callado (bateria). Com um pano de fundo que variava entre o roxo e o vermelho, e tocos de madeira pendurados no alto, funcionando como móbiles, mudando de cor conforme a ituminação, Caetano abriu a noite com as duas primeiras cançôes de “Cê”, “Outro” e “Minhas lágrimas”. Para depois recriar um frevo de Moraes Moreira, “Chão da praça”, e voltar ao disco “Transa”, de 1972, com “Nine out of ten”.
Ele dedicou a canção, com letra em inglês (e algumas frases em português), aos músicos que participaram do disco Jards Macalé (que estava rompido com Caetano desde aquela época, alegando não ter recebido então o crédito como produtor), Tutty Moreno, Aureo de Souza e Moacir Albuquerque justificando que “Transa” teve o mesmo formato de um grupo básico agora retornado em “Cê”. Antes de iniciar a canção seguinte, “Um Tom”, lançada no disco “Noites do Norte”, Caetano homenageou o violoncelista e arranjador Jaques Moretenbaum, dizendo que devia a ele a seguranca com que trabalhava com os mùsicos de “Cê”.
Depois da gestação no estúdio de “Cê” e de mais de três meses de ensaios, Caetano e banda estavam entrosados e o show fluiu bem, mesmo que a acústica da Academia Music Hall tenha jogado contra, com um eco nos momentos mais pesados da bateria e do baixo.
Em “Um tom”, a guitarra de Pedro Sá (que consegue ao mesmo tempo uma ambientação etérea e rock ao repertório, com os timbres de seu instrumento) demorou a entrar, e foi preciso a intervenção de um técnico para ajustes. Detalhes que não atrapalharam o todo, num roteiro que alternou antigas e novas canções como “Um homem velho” antes da recente “Homem” e uma inédita, escrita nos ensaios para a turnê: “Amor mais que discreto”, precedida pela música que o inspirou,”Ilusão à toa”, de Johnny AIf.
Para o habitual momento de voz e violão do meio de seus shows, foi reservada apenas a antiga “A voz do violão”, de Francisco Alves e Horácio Campos. Ela teve direito à uma longa preleção de Caetano, que lembrou dos comentários irados de leitores do blog do colunista do GLOBO Jorge Bastos Moreno (presente na platéia) no Globo Online a uma entrevista entre o primeiro e o segundo turnos da disputa presidencial, na qual ele disse ter votado em Alckmin no primeiro turno, mas ressalvou que poderia mudar para Lula. Para Caetano, o melhor deles foi : “O pior é agüentar ele tocando violão! “.
A maioria do público ficou em pé, em frente ao palco, onde se misturavam jovens, maduros e velhos, e lá estava eu, entre os muitos cantando junto até as canções do novo disco em alternância com os sucessos. “Como 2 e 2” (que ele escreveu para Roberto Carlos) ganhou vigor em sua roupagem balada-rock; sambas como “Sampa” e “Desde que o samba é samba” ficaram bem em tratamento elétrico, ou híbrido, como o samba “Musa híbrida”, um dos destaques do novo disco, com seu andamento quebrado. Ele apresentou “O herói”, de quilométrica letra, mais falada que cantada, abordando a questão racial no Brasil..
Para o bis, mais um clássico do disco “Transa”, “You don’t know me”, e uma segunda dose de “Outro”. Depois da capital federal, a turnê seguiu para Belo Horizonte (dia 25), Florianópotis (dia 30), Porto Alegre (2 de dezembro), São Paulo (6 de dezembro), e chegou ao Rio dias 19 e 20 de dezembro, no Circo Voador, entre outras cidades brasileiras e gringas.
Pois bem, tudo não passa apenas uma criação da minha mente fértil, ou seja, uma mera coincidência que se transformará em realidade no próximo dia 26, no Ginásio Castelinho, quando irei assistir de verdade ao encontro com esse Homem Velho e Moleque, que deixa a vida e a morte para trás/ Cabeça a prumo segue o rumo feito um camaleão, polêmico e contextualizado feito uma antena Parabólica.