Zygmunt Bauman é tema de novo texto de Bruno Dauilibe

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Após um bom hiato longe dos teclados, o cronista Bruno Duailibe – cujos textos são reproduzidos neste blog – está de volta. Desta vez, trazendo considerações a respeito do pensamento de Zygmunt Bauman, sociólogo polonês de extrema importância para o contexto atual, que nos deixou no início deste ano.

A crônica em forma de homenagem aborda, entre outras ponderações, sobre o consumismo pós-moderno tão analisado por Bauman. Junto dela trazemos o vídeo “Man” de Steve Cutts, ilustrador e animador inglês, cujas ideias – vocês vão conferir no mini filme – calham perfeitamente com o tema da crônica. Dá play pra conferir e depois, delicie-se com mais este texto de Bruno – publicado na edição de O Estado MA do último fim de semana.

Da juventude na sociedade do consumo

Atento às inúmeras modificações às quais assistiu no curso de seus 91 anos, o já saudoso Zygmunt Bauman partilhou com clareza as características do homem e do mundo contemporâneo. Para ele, vivemos numa sociedade líquido-moderna, cujos membros estão sempre apressados em obter os produtos que lhes oferecem bem-estar e a descartar rapidamente aqueles que já não mais os satisfazem como outrora. Não há tempo para a solidificação da relação e as realizações pessoais não devem ser perenes, já que se modernizam de modo constante, de acordo com novas e imprevisíveis necessidades, desejos ou impulsos.

Nesse modo líquido de viver, todos estão voltados para o tempo presente, negligenciando o que virá, a ponto tal que o citado sociólogo em entrevista divulgada em 19.02.14, na página eletrônica da Revista Época, afirmou que poderíamos falar no “fim do futuro”. É que, na exata medida em que somos protagonistas e agentes do hoje, deixamos de pensar na virtuosidade de nossa conduta e de agir para alcançar um projeto de sociedade.

Assim deduzir não é exagerado, se pensarmos que as características da sociedade-líquida são reforçadas para as gerações que chegam à sociedade consumista e que devem estar plenamente integradas a ela quando atingirem a idade adulta. Bauman explica que, para tanto, as crianças contemporâneas são moldadas, desde o berço, para serem consumidores ávidos e informados que atenderão à necessidade de incentivar as relações de consumo para além de propulsionar o crescimento econômico.

Atingir tal fim não é difícil quando as crianças observam seus pais e passam a ser concebidos como seres conscientes e capazes de escolher por um marketing especializado que está pronto a estimular incessante insatisfação e novos desejos. Como resultado, o mercado de produtos infantis se expande e meninos e meninas passam a influenciar diretamente no que será consumido pelos seus genitores.

Por outro lado, à proporção que são estimuladas a perceber que precisam obter um produto para ser um tipo determinado de pessoa, passam a se sentir inadequadas socialmente quando não conseguem obtê-lo, já que o ser, a felicidade e a dignidade humana encontram-se diretamente relacionados à capacidade de ter bens de consumo. Não é difícil supor que, alfim desse processo cíclico de consumismo, os laços emocionais e de formação de identidade sejam atrelados a objetos e marcas.

E na base da pirâmide social, os efeitos das garras da sociedade líquida não são menos perversos. Os jovens excluídos sentem-se desvalorizados no meio social e carregam o estigma de uma vida sem realizações, sem significado e sem prazer. Com o incremento dos objetos de desejo que passam a rodeá-los, podem ainda nutrir sentimentos de raiva, humilhação, incitando o impulso de destruir o que não podem ter. Porém, no mais das vezes, os excluídos são ignorados. O mesmo ocorre com outros estilos de vida, os quais também podem ser julgados como repulsivos e dolorosos.

O ângulo estreito por meio do qual a maioria dos membros da sociedade consumista enxerga a vida não permite que se vislumbre mudanças sociais, nem que se perceba que o ritmo imprimido pelo mercado fatalmente conduzirá à exaustão dos recursos disponíveis, com débitos incalculáveis para o meio ambiente e para os frenéticos consumidores que habitarão o mundo.

Essa preocupante visão de Bauman, descrita em “Vida líquida” (Zahar, 2009) e tecida igualmente em “Sobre educação e juventude” (Zahar, 2013), não dever ser, contudo, motivo para desespero. É que, segundo mencionou na citada entrevista de 2014, falar e escrever sobre as características da sociedade pós-moderna não expressava pessimismo, mas o olhar de um homem esperançoso.

Tanto assim que entendia que a juventude poderia tomar as rédeas desse curso, recuperando o interesse e a atenção para os aspectos comuns da vida e portando-se de forma diferente do modo como a maioria se comporta, através de uma “revolução cultural” capaz de gerar plena libertação da indução às compras e aos gastos. Na composição desse cenário, a educação, sempre ela, continua a exercer o papel dominante de preparar os jovens para a realidade que terão que enfrentar, tornando-os conscientes quanto ao adestramento que sofrem e desenvolvendo mentes menos obtusas aos fragmentos de informação que circulam essencialmente pela rede de computadores.

Pensando fora do círculo vicioso do estilo de vida líquido, esses jovens poderão vislumbrar que a coexistência humana e a vida social constituem o bem comum para, assim, semear as soluções dos problemas criados na sociedade do consumo. Eles podem até ser poucos, imperceptíveis, invisíveis no começo até, porém, se direcionados por um propósito comunitário, poderão, quem sabe, construir um futuro para a maioria.

Bruno Duailibe
Advogado. Graduado pela Universidade Federal do Maranhão. Pós-Graduado em Direito Processual Civil no ICAT-UNIDF

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Com a palavra… Bruno Duailibe

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Nosso cronista convidado brindou os apreciados de seus textos com um artigo inspirador no primeiro domingo de 2014, na seção de opinião do jornal O Estado MA. Leitura simples – nem por isso, menos sofisticada – e sensível, que Hot Spot reproduz agora, trazendo junto, como ilustração, um click tirado do Instagram do fotógrafo Marcus Studio. Uma foto poética, dentro da mesma atmosfera tocante do texto de Bruno. Boa Leitura!

Foto: Instagram @marcusstudio
Foto: Instagram @marcusstudio

“All the lonely people, where do they all belong?”

(Paul McCartney e John Lennon)

Dez maranhenses em 2014

Em pé, perto de uma esquina na Rua do Passeio, José espera há quatro horas que apenas um dos transeuntes passe e lhe compre uma das antenas de tv que balança ora da esquerda para a direita, ora ao contrário. Às vezes, se pergunta se haverá quem ainda se interesse por esse tipo de paramento, já que as televisões “mais fininhas” e de “imagem bonita” estão por todo lado. “- Alguém vai parar e vai comprar”, e ele vai ter como pagar o bandeco. [2014 vai ser um dia de cada vez].
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Luís caminha pela Rua dos Prazeres com quatro reais no bolso, que sobraram do reggae de ontem. Parando para tomar uma água de coco e tentar minimizar os efeitos da ressaca, ouve distante aquele “melô” que tentava, a todo custo, esquecer e que remetia a dolorosas memórias. Quando chega em casa, a música ainda está impregnada na sua cabeça e ele então decide que não irá mais sofrer por quem não merece. [Em 2014 muitas “pedras” vão rolar].
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Dona Maria caminha pela beira-mar e, pertinho do Cais da Sagração, lembra-se que ali conheceu Joaquim. Não foi nada além de um amor de carnaval, mas a sensação de que poderia ser mais do que isso perdura todo o percurso de volta para casa. Sozinha, em sua viuvez de um amor só, espera que alguém apareça em sua vida. [2014 vai ser um ano para apostar em novos amores].
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Na Rua do Alecrim vive dona Lindalva. Depois de 60 anos cozinhando para os “barões”, passa a maior parte do dia sentada numa cadeira de balanço. Do lugar onde se senta pode ver o programa que passa na tv e quem passa na rua. Com as pernas fracas, não pode ficar mais do que alguns minutos de pé, segundo os médicos. Por isso tem tempo de sobra para nutrir a expectativa de que um familiar venha lhe alegrar com uma visita. Muitas vezes, quase ninguém aparece. [2014 há de ser um ano pleno de júbilo].
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Em toda missa do meio dia está Seu Vitorino. Saquinho na mão, comunga com os cristãos que, como ele, querem expiar pecados. Na saída da missa, pede que a caridade pregada pelo padre compadeça seus fiéis. Ele precisa tomar, pelo menos, um cafezinho nesse longo dia que lhe resta nas ruas de uma velha cidade. [2014 será um ano de esperança em dias melhores].
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Margarida floresceu nas ruas e com quinze anos tem que pensar em como dar o leite ao menino que tem em seus braços. O jeito talvez seja vender o resto de sua juventude nas ruas do Reviver. O menino fica com a vó, enquanto ela ganha a vida. “- Ele vai ser um prodígio do futebol”. À noite, imagina que em 2030 seu filho vai segurar a taça de campeão do mundo. [2014 é um tempo de investir no futuro].
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Cambaleando nas ruas, Fábio ainda comemora a chegada de um novo ano. Ele vê que muita gente já está no batente, mas acha que merece mais um copo de cerveja. Faz uma parada estratégica no negócio de Seu Manuel e quatro horas depois, já bebeu dez garrafas. Pensa se o patrão ainda vai querer seus serviços amanhã. Se não quiser, já sabe que vai ter problemas com a patroa e que vai ter que dar um jeito de conseguir trabalho rápido. [2014 vai ser um ano para mudar de carreira].
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Valentina é bonita, inteligente e gostosa. Quer ser modelo. Andar nas passarelas, ser fotografada, aparecer nas capas de revistas do mundo todo. Maquia-se, arruma-se em frente ao espelho, tira diversas fotos no celular e posta na rede social. Espera uma curtida, enquanto cuida dos dois irmãos caçulas para a mãe trabalhar. Quer fazer um curso de modelo-manequim, em São Paulo, mas sua mãe mal lhe pode pagar a passagem para que ela chegue à escola. [2014 é o ano de tornar os sonhos em realidade].
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No primeiro dia útil do ano, Kátia vai à Rua Grande. Quer fazer compras para atrair todo e o melhor sentimento alheio. Pensa no sapato de que não precisa, imagina-se vestida com os modelitos que vê nas vitrines. Ela ficará linda na balada do próximo fim de semana. Não lhe custa nada se pode parcelar em doze prestações ou fazer um empréstimo. [2014 é um ano para organizar as finanças].
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Gilson não é um tipo bonito, tampouco é um sujeito incrível. Trabalhou duro no ano que passou e, finalmente, pôde dar a entrada no carro zero quilômetro. Aproveitou que sobrou um graninha e comprou o smartphone que foi lançado no final do ano pela apple. Assim, vai se sentir mais seguro para “chegar” nas gatas da festa. [2014 é um ano para confiar em si mesmo].
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Num começo de ano, as listas de desejos também servem para pôr a vida em perspectiva.

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