Com a palavra Bruno Duailibe
Nosso cronista convidado andou meio ausente do universo das crônicas, mas ressurge tratando de um assunto que tem imperado as atenções (e as preocupações) dos maranhenses ultimamente: a violência. Pauta, portanto, mais que oportuna, que ele conduz num texto lúcido, reproduzido agora por Hot Spot.
Educação para a paz
Lendo e pensando sobre a violência, não me ocorreu substantivo que melhor a caracterizasse senão ubiquidade. A sensação de mal-estar e insegurança que ela gera nos marca em todos os lugares, o tempo inteiro, abrange diversas classes, etnias, gêneros, manifesta-se em múltiplas modalidades e dissemina-se a tal ponto que todos têm uma ocorrência de violência para contar.
Quando inevitavelmente um ato violento acontece, fere-se não somente a carne e a alma de quem é vitimado, mas também constrange-se quem apenas toma conhecimento da vilania. É que, a meu ver, a violência e suas manifestações maculam as potencialidades de participação social que cada membro da sociedade possui; ela dilacera, em suma, a cidadania. Por isso, a sua recorrência põe em xeque o papel das instituições democráticas para a resolução de conflitos e para a pacificação social, pairando a ideia de que suas condições de exercer o controle social desvaneceram na exata medida em que as cidades cresceram.
Esse descrédito não emerge por acaso. Já dizia Max Weber, pioneiramente, que o Estado dominaria o homem utilizando o monopólio da violência. Assim, ao nos reunirmos em uma sociedade, visamos desfrutar segurança comunal, e, para tanto, cedemos parte da nossa liberdade. Num cenário de crescente violência, os membros da sociedade têm a impressão de que mais uma parcela de liberdade terá que ser cedida e que a contrapartida da segurança é irrisória. A impressão que fica, por conseguinte, é a de que comprometemos inutilmente dois dos valores essenciais e indispensáveis para uma vida digna e relativamente feliz: segurança e liberdade.
Em conhecida entrevista concedida ao projeto “Fronteiras do Pensamento”, afirmou Zygmunt Bauman: “Segurança sem liberdade é escravidão. Liberdade sem segurança é um completo caos”. Ainda segundo ele, não existe, todavia, uma fórmula perfeita que permita equilibrar esses elementos. Desse modo, mais segurança implica em concessão de parcela de nossa liberdade e esta derroga parcela de nossa segurança. Mas o que fazer se esses valores estão sendo neutralizados pela violência?
Nos debates públicos, essa questão é tratada como uma guerra na qual os criminosos são vistos como verdadeiros inimigos que devem ser combatidos preponderantemente pela atividade policial. Ou melhor, encarcerados, para que cessem ilegalismos e desvios sociais danosos à sociedade. Segregação, castigo e punição são as respostas e os mecanismos primários de combate à violência. E se é certo que a violência pode refletir uma faceta instintiva do homem ou um comportamento adquirido, não é menos exato sustentar que ela também pode surgir das características da história social da comunidade em que ela eclode, pois, sua solução não brota de um único caminho.
Refletindo sobre as diversas características desse mal, algumas vozes sugerem que a educação para a paz é a arma que precisamos para que sejamos exitosos no combate à violência, cicatrizemos as feridas de nossa cidadania dilacerada e construamos a paz, em suas múltiplas manifestações. Não se trata tão somente de fomentar o conhecimento, mas de permitir uma formação humanista completa, com a interiorização da experiência social e cultural dos homens, bem como a promoção dos valores, atitudes e comportamentos que refletem o respeito à vida humana.
Sob essa perspectiva, educar para a paz é contribuir para que as futuras gerações deixem de optar pela violência, permitindo que cada membro social reconheça a dignidade, os direitos e os deveres que encerram cada indivíduo e cujos valores devem ser respeitados de modo mútuo. É também conciliar a harmonia do indivíduo com o meio ambiente e reatar, assim, a ligação do ser humano com o universo e o próximo. Esses fundamentos, certamente, não impedirão que surjam conflitos, mas serão essenciais a fim de ensejar resoluções criativas e pacíficas para os problemas.
É claro que esse método não tem êxito imediato. Porém, nenhum outro pode alcançar triunfo tão frutífero para todos que habitamos a casa da humanidade, edificando paz, estimulando a cooperação e vivenciando a harmonia.
Bruno A. Duailibe Pinheiro
Advogado. Graduado pela Universidade Federal do Maranhão. Pós-Graduado em Direito Processual Civil no ICAT-UNIDF