72% das pessoas sofrem de algum distúrbio relacionado ao sono, sendo a insônia uma das principais queixas
“Faz uns cinco anos que eu não sei mais o que é dormir direito.” É assim que Jorge Almeida, 55, descreve sua luta diária contra a insônia. Profissional de TI em uma grande empresa em São Luís, ele enfrenta noites intermináveis, nas quais o sono se tornou algo raro e superficial. “Fico deitado na cama, olhando o teto ou me revirando de um lado para o outro, mas o sono não vem”, lamenta. O impacto desse distúrbio em sua vida pessoal e profissional é evidente. “Às vezes, me sinto ansioso, estressado sem motivo. E, nos últimos meses, tenho percebido que meu humor mudou. Estou mais irritado, explodindo por coisas pequenas, principalmente no trabalho”, relata.
A insônia de Jorge reflete uma condição crescente na população brasileira. Segundo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), 72% dos brasileiros sofrem de algum distúrbio relacionado ao sono, sendo a insônia uma das principais queixas.
A privação de sono pode indicar alterações na saúde física ou mental. Como sintoma, a insônia pode estar associada a questões psiquiátricas, como transtornos de humor, de ansiedade ou de personalidade. Como patologia, pode ocorrer cerca de três vezes por semana e persistir por três meses ou mais. De acordo com a Associação Brasileira do Sono (ABS), nos casos crônicos, a insônia costuma ter duração média de três anos, podendo estar presente entre 56% a 74% dos pacientes em ocasiões isoladas ao longo do ano e em 46% deles de forma contínua, o que pode implicar riscos para o desenvolvimento de outras doenças.
Além dos impactos emocionais, como a ansiedade e irritabilidade, Jorge também notou mudanças no desempenho no trabalho, algo crítico para um profissional de TI que depende de concentração e agilidade mental. “Com esse sono desregulado, sinto que minha capacidade de focar e resolver problemas está se perdendo” observa. As consequências, porém, vão além do ambiente de trabalho. Jorge admite que suas relações familiares também foram afetadas.
A professora Milca Moraes, especialista em medicina do sono e docente do curso de Medicina da IDOMED Fameac, esclarece que esses impactos são comuns em pessoas que sofrem de insônia crônica. “Indivíduos que apresentam uma qualidade de sono ruim, dificuldades para dormir ou que dormem menos do que o necessário podem ter uma maior ou menor ativação de regiões importantes do cérebro associadas às nossas emoções”, explica. De acordo com a especialista, o ciclo de sono prejudicado aumenta a sensibilidade ao estresse e pode levar ao desenvolvimento de transtornos de humor, como depressão e ansiedade.
Milca também destaca que, entre os transtornos de saúde mental mais comumente associados aos distúrbios do sono, estão a depressão, o transtorno de ansiedade generalizada e o transtorno bipolar. Estudos recentes apontam ainda uma ligação entre a insônia crônica e condições mais graves, como a esquizofrenia. “Pacientes com insônia crônica apresentam maior risco para o desenvolvimento de transtornos de humor, como depressão e ansiedade generalizada,” ressalta. Essas pessoas enfrentam dificuldades para iniciar e manter o sono, o que altera a arquitetura do sono e provoca um ciclo prejudicial à qualidade de vida.
A especialista alerta para os riscos de não tratar a insônia adequadamente. “A insônia crônica pode aumentar o risco para o aparecimento de episódios depressivos, especialmente em indivíduos que já apresentam depressão.” O ciclo de sono interrompido pode elevar os níveis de hormônios ligados ao estresse, como o cortisol, agravando o quadro de quem já sofre de transtornos mentais.
Para combater esses efeitos, ela recomenda a adoção de uma rotina de higiene do sono. “Isso inclui praticar regularmente exercício físico, reduzir a exposição a telas próximo ao horário de dormir e não abusar de bebidas que contenham cafeína”, enumera. Esses hábitos, somados a uma alimentação balanceada e terapias como a cognitivo-comportamental, podem melhorar significativamente a qualidade de vida de quem sofre de insônia.
Jorge ainda não procurou ajuda médica, mas reconhece essa necessidade. “A cada dia que passa, fica mais difícil”, comenta. Como aponta a especialista, tratar a insônia é essencial não apenas para garantir noites mais tranquilas, mas para preservar a saúde mental e emocional. “Essas são algumas das estratégias que podem ser utilizadas para a melhora do sono e da saúde mental,” conclui a especialista.