Por: HAMILTON RAPOSO – MÉDICO PSIQUIATRA
Sempre demonstrei a minha preocupação com a forma de atendimento das instituições públicas e das comunidades terapêuticas aos usuários e dependentes químicos e a ausência quase que total com a prevenção. O que vale tratar e o que vale prevenir?
Nenhum país conseguiu acabar com o consumo de drogas e muito menos com o tráfico de drogas, quase todos voltados para a internação ou para a repreensão armada e violenta. Aqueles que tiveram algum tipo de êxito no controle e redução do uso e do comércio ilegal, o fizeram através de investimento na educação, legalização e discriminalização, basta conhecer a realidade destes países e comprovar esta afirmativa.
A história do consumo de drogas, didaticamente, se faz por etapas, e assim tivemos:
1a etapa: O homem inicialmente usava drogas por questões de sobrevivência, necessitava de uma força ou coragem para enfrentar as adversidades que existiam naquele período;
2a etapa: O homem procura no consumo de drogas o encontro com o divino, o encontro ou a proximidade com Deus, e porquanto, teria sido a igreja, a primeira instituição a combater ou demonizar o uso de drogas. Para a igreja, seria impossível este encontro transcendental, sem a interferência da igreja.A partir desta época é criada a teoria dos degenerados, que estigmatizada em definitivo o dependente químico e os doentes mentais, passando este tema a ter uma concepção extremamente moralista.;
3a etapa: Acontece com o surgimento do processo industrial e da modernização das práticas comerciais. O consumo de drogas se expande e adquire uma concepção terapêutica, diversas drogas entram ou passam a serem usadas no tratamento de diversas doenças ou sofrimentos. Posteriormente, o consumo de drogas adquire a forma lúdica, passa a ser usada de forma social ou recreativa, o homem encontra na droga o prazer para as suas adversidades.;
4a etapa: Após a segunda grande guerra, o mundo passa por grandes transformações sociais, políticas e econômicas. O mercado se expande, a indústria farmacêutica se desenvolve e surge as principais drogas recreativas.
Nenhum país do mundo foi capaz de conter o avanço ou o comércio ilegal de drogas. A partir da década de 1970 aumentou o consumo de drogas no mundo e todos os países iniciaram uma política repressiva, voltada exclusivamente para a violência, fato este que demonstrou ser ineficiente, e permanece ineficiente, como é ineficiente a prevenção e o tratamento.
A pergunta que segue se é possível viver em uma sociedade sem drogas?
E baseado nesta pergunta é que propomos práticas de intervenções nos três níveis de atenção da saúde:
1- Intervenção primária:
1.1- Foco da atenção é no experimentador ou no usuário ocasional
1.2- Objetivo: Retarda o início de experimentação de qualquer droga (lícita ou ilícita) ou eliminar o uso inicial ou ocasional.
1.3- A conduta de suporte será sempre socioeducativa.
1.4- Local de atenção ou de intervenção deve ser na escola, no trabalho ou noseio familiar.
2- Intervenção secundária:
2.1- Foco da atenção é para o usuário habitual
2.2- Objetivo: Eliminar o uso ou reduzir o consumo, ou evitar a progressão para o uso mais frequente e prejudicial.
2.3- A conduta de suporte é socioeducativa, psicológica e / ou médica caso seja necessário algum suporte terapêutico.
2.4- Local da intervenção deve ser na escola, meio-social onde o usuário se encontra ou locais em que frequenta, ou centros especializados.
3- Intervenção terciária:
3.1- Foco de atenção é para o usuário abusivo ou dependente.
3.2- Objetivo: Tentar a abstinência ou a redução do uso (frequência e quantidade) e diminuição dos efeitos da droga.
3.3- A conduta será sempre reabilitado, portanto multiprofissional, Atená médica, psicológica, terapêutica ocupacional e social.
3.4- Local da intervenção: Na família, empresa, escola e centro especializados.
“ Se não for possível interromper o uso de drogas, que ao menos se tente minimizar os danos ao usuário e à sociedade, causado por este uso”.
COMENTÁRIO
“Professor Hamilton além de professor nosso na área da psiquiatria tem grande relevância na prática clínica também, este texto é na verdade um manual de políticas públicas que devemos seguir como profissional e gestor, muito importante ser discutido e divulgado em tempos atuais”, relatou Dr. Marcelo Costa especialista em saúde mental e diretor O Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS-AD) Estadual.