O Ano da França no Brasil

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O Ano da França no Brasil se aproxima. Estima-se que todos os eventos previstos para ocorrerem neste ano, entre 21 de abril e 15 de novembro, sejam vistos em todo o país por cerca de 40 milhões de brasileiros.

Quando se fala da França muitos brasileiros pensam logo em alta costura, moda e gastronomia. Cada região se identifica com seus mais renomados produtos. Bordeaux e Bourgogne com seus vinhos maravilhosos e o nordeste da França com suas champagnes inigualáveis. A Bretanha com as mundialmente conhecidas huîtres (ostras) de Cancale e a região do Périgord com seus deliciosos foies gras, que até hoje fazem jus ao comentário do rei Henrique VI: “Boa comida e bons vinhos, a Dordogne é o paraíso sobre a terra…”

Para outros, Paris surge como o principal roteiro de viagem. A cidade Luz, cortada pelo célebre rio Sena, está entre um dos destinos mais sonhados dos brasileiros.

Os amantes da música e do cinema lembram-se de Edith Piaf, de Charles Aznavour, de Brigitte Bardot e de Juliette Binoche. Os saudosistas jamais esquecem dos filmes de Jean Cocteau,  Jacques Tati, e  François Truffaut. Catherine Deneuve continua para muitos a maior expressão da beleza feminina. Atualmente a Carla Bruni, por onde passa com seu charme e brilho próprio, ofusca até o elétrico presidente Sarkozy.

Os intelectuais não cansam de fazer as releituras das obras de Saint-Exupéry, Gustave Flaubert, Voltaire, Charles Baudelaire, Émile Zola, Guy de Maupassant,Victor Hugo, Sartre, Simone de Beauvoir… a lista preencheria todo o espaço desta crônica…

Os historiadores ficam em êxtase discorrendo sobre o período da monarquia francesa, sobre Napolão Bonaparte e principalmente sobre a revolução francesa que influenciou e pautou a conduta de inúmeras nações a partir do século XIX.

Os artistas entram em transe relembrando as obras primas dos principais de Degas, Gauguin , Manet, Monet, Pablo Picasso, Renoir e Toulouse-Lautrec, entre tantos outros.

O certo é que a França, os franceses e as francesas exercem certo hipnotismo em todos nós.

Mas a França não é só isso. É muito mais. Na verdade, utilizando-se das palavras de Olivier Poivre d’Arvor, diretor da CulturesFrance, “um dos principais objetivos do Ano da França no Brasil é trazer a cultura francesa contemporânea, mais desconhecida, atingindo também as camadas mais populares do Brasil”.

Toda a programação do Ano da França no Brasil está calcada em três principais pilares:

França de hoje – criação artística, inovação tecnológica, pesquisa científica, debate de idéias, dinamismo econômico;
França diversa – diversidade da sociedade francesa, de saberes e regional (regiões da França metropolitana e ultramar);
França aberta – busca de parcerias franco-brasileiras que devem inspirar os projetos, parcerias franco-brasileiras com outros países do mundo (África, Caribe, América Latina) e debates sobre os grandes temas da globalização.

O mais importante do Ano da França no Brasil é desenvolver e consolidar as relações culturais, políticas e econômicas entre os dois Países. E aqui no Maranhão, sobretudo em São Luís, precisamos aproveitar o momento histórico para consolidar a condição de sermos a única capital brasileira fundada pelos franceses.

Dentro de três anos São Luís vai comemorar os quatrocentos anos de fundação. Precisamos materializar os nossos laços de relacionamento através da efetivação de maiores convênios de cooperação técnico-científica e criar vínculos mais fortes entre a França e São Luís.

A Aliança Francesa recentemente inaugurou sua nova sede instalada na Casa França Maranhão no centro histórico da cidade e tem dado sua efetiva contribuição na difusão da cultura francesa com atividades as mais diversificadas possíveis.

O domínio da língua francesa passa a ser um diferencial de competência e habilidade para todo profissional que se habilite a um posto de trabalho em qualquer empresa.

Por falar nisso, lembro que em meados de século passado, havia uma freira canadense que ensinava francês no Colégio Pinheirense. Contam que “Castrol”, um de seus ex-alunos, teve que vir continuar seus estudos na capital e aqui chegando, começou logo a se gabar que dominava o idioma de Voltaire.

Na primeira prova oral da turma, o professor retirou de dentro de um pequeno saco de tecido, um papelote dobrado com uma frase escrita em francês, para que fosse traduzida pelos alunos.

− Le lion c´est le roi des animaux! Leu em voz alta o professor, ao retirar o primeiro ponto.

Antecipando-se a todos, Castrol levantou o braço e emendou:

− O leão quis urrar e desanimou… 

Não vamos desanimar. Nunca é tarde para aprender o francês.

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Programa da « Semana da Francofonia 2009 » de 16 até 23 de março

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realejo_final.jpgReproduzo no espaço deste blog a matéria que recebi da Aliança Francesa sobre a Semana da Francofonia:

“A XIV Semana da Francofonia acontece entre os dias 16 e 23 de março, em comemoração ao Dia Mundial da Francofonia, instituído no dia 20 de março. O termo Francofonia abrange todas as pessoas que, em todo o mundo, falam e tem  como língua materna, língua oficial, língua administrativa ou ainda como língua de ensino o idioma francês.

A Aliança francesa de São Luís, em comemoração a este evento promoverá as seguintes atividades:

1. Concurso de fotografias “A Francidade na São Luís de hoje”

A cidade de São Luís foi fundada pelos franceses em 1612. Será que na São Luís de hoje pode-se encontrar alguma marca, símbolo ou signos da França?

O concurso é aberto a todos. Basta enviar uma foto até o dia 16 de março à meia-noite mostrando com originalidade lugares e nomes evocando ou representando a França e/ou a francofonia!

Regulamento: enviar um e-mail a [email protected] com o assunto: “A francofonia na São Luís de hoje”, anexar a foto (uma por candidato, em formato JPEG com a melhor resolução possível) e indicar o nome, sobrenome, endereço, telefone do candidato. A foto tem que ser feita em São Luís (indicar o lugar) e atual. O vencedor ganha uma bolsa de estudos de 50% para um curso de francês na Aliança francesa no segundo semestre de 2009.

Divulgação dos resultados: sairá no dia 20 de março na Aliança francesa durante a festa em comemoração ao Dia Mundial da francofonia.

2. As 10 palavras da Francofonia

Durante a semana da francofonia todos os estudantes da Aliança irão participar de um evento mundial chamado “as 10 palavras da francofonia” e que tem como objetivo criar textos, desenhos, canções, poemas, jogos, fotos, peças de teatro etc. Com as dez palavras escolhidas pelo Ministério da Cultura e da Comunicação da França com a temática seguinte: “Amanhã”

3. Festival de Cinema: “Contos, Rimas e Melodias, da Boca à Orelha”

Durante esta edição da semana da francofonia, a Aliança exibira três filmes para entrar no mundo da oralidade. É através de contos, rimas e ritmos que descobrimos universos inesperados. Viajar a Madagascar, atravessar o imaginário dos seus contadores (Angano, Angano) e a dedicação do grupo mítico “Mahaleo”. Mergulhar no coração de São Paulo, nas improvisações dos ‘repente’ dos poetas retirantes do Nordeste do Brasil (Saudade do Futuro).

  •  Dia 16 de março as 19h30: “Angano…Angano – Contos de Madagascar” (França/Madagascar, 1989)
    De César Paes, Marie-Clémence. Cores. Duração 65’.
    Em Madagascar, país de tradição oral, a história se conta em poesia. A palavra é dada aos contadores para que eles falem sobre a origem e a história da ilha, dos seus habitantes, conhecidos pelos contos, mitos e lendas.
  •  Dia 17 de março as 19h30: “Mahaleo” (França, 2005)De César Paes, Marie-Clémence, co-realização de R. Rajaonarivelo. Cores. Duração 100’.
    Mahaleo é a formação musical mais popular de Madagascar. Os sete músicos do grupo sempre rejeitam o show business, apesar dos 30 anos de sucesso. Estes precursores do blues malgache são também médicos, cirurgiões, agricultores, sociólogos ou deputados… Guiado pela força de suas canções, o filme é um retrato de Madagascar hoje em dia.
  • Dia 18 de março, as 19h30: “Saudade do Futuro” (França, 2000)
    De César Paes, Marie-Clémence. Cores. Duração 94’.
    Os músicos do nordeste cantam seus desejos de ir para São Paulo. A cacofonia urbana se mistura à música e os repentes, antecessores do Rap, contam a metrópole com humor e em rimas.

4. Dia Mundial da Francofonia dia 20 de Março
 
A partir das 20 horas, na sede da Aliança francesa, será celebrado o Dia Mundial da Francofonia.
Além das apresentações das atividades realizadas com as “10 palavras da francofonia” e divulgação do resultado do concurso de fotografias, haverá um show musical com o instrumentista francês Jean-Marie Olive, que se apresentará tocando realejo. O realejo é uma espécie de órgão mecânico portátil que tem um ou vários foles, com um teclado, funciona por meio de uma manivela a acionar simultaneamente os foles e um cilindro dentado munido de pontas de bronze que abrem as válvulas dos tubos do órgão, para a produção das diferentes notas. www.wikipedia.org)”.

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Trema na lingüiça

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olinda2.jpgAs primeiras notícias acerca do carnaval remontam às festas de Osíris no Egito. Com o recuo das águas do Nilo, os egípcios comemoravam com grande euforia o início das plantações nas margens do rio.

Os carnavais alcançaram o auge da orgia, do excesso, da desordem e do desperdício durante o Império Romano por ocasião da Bacchanalia. O Bacanal era o Festival romano que celebrava os três dias de cada ano em honra a Baco, deus do vinho.

De lá para cá, com suas máscaras requintadas, o tradicional carnaval de Veneza influenciou o mundo inteiro, conquistando aqui, no Brasil, a simpatia de multidões de animados carnavalescos.

O samba no Rio de Janeiro, com seus desfiles opulentos, o frevo de Olinda, o axé na Bahia e, aqui em São Luís, os tradicionais Blocos e mais recentemente o Bicho Terra, arrastam foliões por todas as praças e becos das cidades.

O assunto me faz refletir sobre o clima formado em torno do carnaval que atiça a criatividade de muita gente.

Meu tio Jurandy Leite, por exemplo, sempre foi um animado folião e tem sido destaque do Bloco do Agenor há mais de 25 anos. Neste carnaval, teve até música de sua autoria inscrita no festival Nacional de Marchinhas do Rio Janeiro. Intitulada Lula prometeu, Lula vai me dar, a marchinha chegou a ser selecionada entre as dez mais animadas deste ano de 2009.

“Eu quero meu café, meu almoço e meu jantar
Lula prometeu, ele vai me dar
Mas até agora, almoço e não janto
Nem emprego eu tenho para trabalhar
Mas eu não perco a esperança de ganhar
Lula prometeu, ele vai me dar
Ele vai dar, ele vai dar …
Vai dar o meu café, meu almoço e o meu jantar…”

E não é de hoje que Jurandy é chegado à música. Tempos atrás, comprou um piano de cauda e o instalou numa pequena sala, transformada em estúdio, no piso inferior do casarão da Godofredo Viana, onde funciona, ainda hoje, o Cartório de imóveis. Contratou professor e, em pouco tempo, tornou-se um aluno exemplar. Chegou até a gravar dois cd´s em parceria com Jesus Cristo (trechos bíblicos e música de Jurandy Leite…)!

Outro amigo que se transforma por ocasião dos carnavais é Nelson Almada Lima. Quem o vê, com aqueles cabelos prateados, aquela elegância, voz empostada e serenidade que lhe são peculiares, desconhece que por traz disso tudo existe um grande folião. Diretor de Escolas de samba, um dos fundadores do Bloco do Agenor, somente nas festas carnavalescas é que Nelson consegue curtir a música nos mais altos decibéis. Fora desse período, só música clássica.

Certa feita, José Carlos Martins, na época diretor da Companhia Progresso do Maranhão, acabara de instalar um potente som em sua residência, e reunia os amigos para um agradável happy hour às sextas feiras. Luis Raimundo Azevedo era diretor da CODERMA e convidou Nelson Almada Lima para subirem a Montanha Russa e tomarem um uísque na casa de Zé Carlos.

Ao chegarem, foram logo apresentados ao novo som. Zé Carlos, entusiasmado, aumentou o volume ao máximo e, aproximando-se do ouvido do Nelson, ingadou:

− Que tipo de música você mais aprecia?

Nelson, com sua voz compassada e grave, respondeu: − Baixa… de preferência baixa!!

Mas, voltando ao título do artigo…

Em Olinda, o Bacalhau do Batata e as Virgens de Olinda recebem, no período do reinado de Momo deste ano, a companhia de um novo bloco. O Trema na Lingüiça será mais um a animar os foliões de Pernambuco. Nem sei se, agora com a nova reforma ortográfica da Língua portuguesa, a lingüiça leva trema ou não; mas que muita gente vai tremer na lingüiça neste carnaval, isto vai!

E o frevo vai embalar as multidões nas ladeiras de Olinda. E é pra lá que eu vou neste carnaval. 

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Os Camaleões e os Chicos-Pretos

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Guardo algumas recordações do período em que fui deputado. A política me permitiu conhecer com mais profundidade a realidade de meu Estado, contribuir para melhorar as condições de vida de muitas comunidades e presenciar fatos que somente o exercício do mandato nos permite.

Lembro-me de um episódio ocorrido no município de Guimarães. As forças políticas locais encaravam as eleições como uma verdadeira guerra. Os grupos não se toleravam. Os Camaleões, como eram conhecidos, usavam roupas verdes e os Chicos-Pretos só vestiam encarnado.

De um dos lados, Celso Coutinho, grande liderança local. Já havia sido prefeito em outra ocasião, ex-presidente da Assembléia Legislativa do Maranhão e acabava de vencer as eleições municipais. Seus correligionários, vestidos de vermelho, tremulavam as bandeiras na porta da Prefeitura, esperando a hora de marcharem, todos juntos, para a Câmara dos vereadores. O novo prefeito iria levar a mensagem do Poder Executivo.

O prédio da Câmara estava ocupado pelos camaleões seguidores de Agenor Gomes e do Dr. Artur Farias, que comandavam a outra banda política de Guimarães. Completamente lotado, o salão nobre da Casa fervilhava sob o comando do vereador Mariano, recém-eleito presidente da Câmara. Ferrenho adversário de Celso, o vereador, com sua inseparável camisa “verde cheguei”, estava ansioso pela chegada do novo prefeito ao seu “terreiro”.

O clima não podia ser mais tenso!

O prefeito e seus seguidores chegaram ao local debaixo de vaias e foguetes. Foi um empurra-empurra cruel. Acalmados os ânimos, a Mesa foi montada, e o vereador Mariano iniciou o discurso de boas vindas (na verdade de más vindas) ao Prefeito, que, desacatado, resolveu abandonar o recinto.

De volta à Prefeitura, em passeata, seguido pelos seus eleitores, o novo prefeito dirigiu-se ao gabinete e, de uma canetada só, demitiu uma enorme quantidade de funcionários da Prefeitura nomeados pelo ex-prefeito, seu adversário.

Dois anos antes, nas eleições proporcionais, o grupo derrotado havia apoiado Zé Jorge e Gastão Vieira, este filho da terra, como seus representantes na Assembléia Legislativa e na Câmara dos deputados.

Era dia primeiro de janeiro de 1997. Como havíamos perdido as eleições municipais, tomei um avião monomotor em São Luís e decidi prestigiar o nosso grupo político.

Tão logo o avião aterrissou (o prédio da Câmara ficava na cabeceira da pista), fui recebido pelas nossas lideranças, que me relataram o que acabara de acontecer.

Resolvi ajudá-los e tentar, com o novo prefeito, contornar a situação criada pelas demissões. Alguns me advertiam que não deveria ir até a Prefeitura, pois correria o risco de “levar uma sova” dos Chicos-Pretos.

Mas eu tinha certeza de que o Celso Coutinho, por mais radical que pudesse parecer, não permitiria que tal agressão se consumasse. Fui. Conhecia o prefeito por intermédio de meu tio Jurandy Leite, seu amigo e ex-parlamentar de mesma Legislatura e, assim como ele, dono de Cartório em São Luís.

Formamos uma comissão (vereador Wilson, Nilce e mais duas professoras) e fomos recebidos pelo prefeito em seu gabinete.

Sentado na cadeira, cercado de assessores, vereadores e outras lideranças, o prefeito passou a me relatar os insultos que havia recebido, durante a campanha, de alguns funcionários do Município. Dizia ele que, de agora em diante, essas pessoas J A M A I S trabalhariam com ele.

Reforçou Celso: ̶- Deputado Zé Jorge, essa moça que faz parte de sua comitiva e que está aí, ao seu lado, é MINHA funcionária…

-̶  Eu não sou sua funcionária! Retrucou a moça imediatamente. ̶ Eu sou funcionária da PREFEITURA!

-̶  Mas eu sou o PREFEITO!…

O clima da reunião começou a esquentar.

-̶ O senhor acredita, deputado ? Continuou Celso. ̶ Que essa moça tem um cachorro?!?!

Fiquei em dúvida, sem entender qual seria o problema, ao que o prefeito continuou:  – E o senhor sabe como se chama o cachorro dela?

– CELSO COUTINHO! Bradou o prefeito, esmurrando a mesa.

-̶ E já estou arrependida de tê-lo feito… Retrucou a professora, a essa altura cercada e protegida por seus correligionários.

O tempo fechou e a reunião acabou ali mesmo.

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O audacioso

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rede_o-audacioso2.jpgVez por outra, lanço mão em meus artigos de deliciosas estórias ocorridas em Pinheiro. Muitos de meus leitores se impressionam com o vasto repertório delas e, outros até duvidam que possam ser verídicas.

Mas, que posso fazer, se elas insistem em acontecer? Compartilhar com meus leitores é claro!

Mundiquinha Silva era professora de Geografia. Daquelas que passava a aula toda discorrendo sobre os acidentes geográficos. Descrevia-os com tamanha riqueza de detalhes que nós imaginávamos estar, com ela, percorrendo os mais longínquos rincões deste planeta. Falava rápido. Quase engolia as palavras. Baixinha, magrinha, não levava desaforo para casa.

Certo dia chegou aos ouvidos dela que seu marido estava de caso com “uma nigrinha”. Disseram que o maridão marcava ponto, duas vezes por semana, no Motel Bem-te-vi, com uma jovem estudante do Colégio Pinheirense.

Casada com Bitencourt, há mais de quarenta anos, formavam um casal exemplar na cidade. Freqüentavam as melhores festas, dançavam como poucos (o marido era um verdadeiro pé de valsa) e estavam presentes em todos os eventos sociais de Pinheiro.

Dizem os mais velhos, que Carlos Roberto Bitencourt, era um verdadeiro galã quando jovem. Com mais de 1,80 m, olhos azuis (descendência talvez daqueles franceses que instalaram a Usina Providência na Chapada), Bitencourt estudou em São Luís e cultivava as academias de ginástica da capital. Tinha, quando jovem um físico de atleta.

Mundiquinha pensava que, agora com seus 72 anos, careca e barrigudo, (dizem que a idade esbandalha qualquer coisa…) ele iria se acomodar balançando a pança numa daquelas redes de linha de São Bento. Ledo engano! De repente, Bitencourt ficou alegre. Acordava muito cedo e, assobiando, ia tomar seu banho de cuia na beira do poço. Depois, sentava-se numa cadeira de embalo e ficava na porta da casa, observando todos que iam para feira. Dava conta até do padre que passava, ao raiar do dia, para rezar a missa na igreja de São Benedito.

Um belo dia, o bispo da cidade passou, bem cedinho e cumprimentou-o:

– Bom dia seu Bitencourt! Já acordado a esta hora? Tão cedo! Exclamou o Religioso italiano.

– Hum! Resmungou Bitencourt. Já acordei, fiz barba, tomei café, já caguei e me banhei. E, se tivesse viajado, já tinha voltado…

Mas o fato é que a traição de Bitencourt havia deixado Mundiquinha fora de órbita: Brigou, estrebuchou, expulsou o marido do quarto, ameaçou se separar e foi preciso muita conversa das filhas, das netas, e até de uma prima quase irmã, para que se acalmasse um pouco.

Final de tarde, as cadeiras na porta para aquele tradicional bate papo quando, vez por outra, passava um assobiando:

– Fi, fifiu… Fi, fifiu…

Era o suficiente para Mundiquinha associar os assobios ao nome do Motel Bem-te-vi e a briga recomeçar.

Já havia se passado mais de três meses. Bitencourt, expulso do quarto conjugal, continuava dormindo na rede na varanda da casa, quando ela decidiu ter uma conversa particular com ele, incentivada pelos conselhos da sua prima Cocota:

– Diquinha, tu vais te separar dele?… então pra que essa zanga? Homem é assim mesmo… Isso é coisa passageira… já acabou! Fala com ele… Nada que uma boa conversa não resolva. Insistia Cocota.

O conselho foi aceito e num certo dia, quando ele acabava de tomar o banho matinal, ouviu, do quarto, o chamado de Mundiquinha. Imaginou que a mulher havia “amolecido” e que fariam as pazes.

Veio rápido. Enrolado num roupão branco, com aquela proeminente barriga, mais parecia um beiju de tapioca de goma.

Mundiquinha passou a chave na porta do quarto e disse:

– Escuta bem Bitencourt. Tu deves agradecer a Cocota esta chance que tu vais ter, meu filho. Ela insistiu muito comigo para nós termos esta conversa. – Mas, antes de tudo, Carlos Roberto, (ela só o chamava assim quando queria dar uma dura nele) quero que tu saibas, meu filho, que eu te admiro muito! Tu és um homem muito corajoso Carlos Roberto! Audacioso, mesmo!

Bitencourt já estava se sentindo todo prosa, quando ela continuou:

– Como é que tu, com essa idade, com essa barriga enorme, tens a coragem de tirar a roupa na frente daquela rapariga de 20 anos, com um pintinho deeesse tamanhinho?

Concluiu Mundiquinha gesticulando com o polegar direito apoiado na metade do dedo indicador.

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Muitos anos de praia

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O Jornal la Baguette, da Alliança francesa, está circulando com o seu segundo número.

Com um formato bem interessante, parece um baguete francesa, o Jornal passa a ser o veículo informativo aos francófonos e traz notícias acerca das atividades da Aliança Francesa em São Luís.

Quero aproveitar o espaço deste Blog para divulgar um artigo escrito pela professora Marilia de Laroche, da Aliança Francesa de São Luís, relatando um episódio ocorrido vivenciado por ela quando de sua permanência na França:

” Morávamos em Nice, no sul da França. No Natal de 2002 eu comprei uma super bicicleta BMX para meu filho. O menino nem cabia de tanta felicidade. Íamos para o Parque du Château, para o Parque de Villegrenier, levávamos os pequenos para andar de bicicleta pelas ruas de Saint Roch e ele podia andar tranqüilo pelas ruelas do centro histórico. A BMX custou uma pequena fortuna, algo como uns mil reais. Morávamos em um prédio de seis andares e tínhamos um espaço aberto e protegido onde cada morador podia guardar sua bicicleta ou seu carrinho de bebê.

Quando foi em janeiro, um dia, voltando com meus filhos da escola, estranhei o fato de o portão de acesso ao prédio estar aberto. Fui até o local das bicicletas e …..!!! Das três bicicletas do prédio, só a do meu filho tinha sido roubada. Olhei pra ele e vi a carinha de quem ia chorar.

Ah! Que a gente ia tentar achar aquela bicicleta! Eu não trabalhei tanto pra dar uma bicicleta pro meu filho pra um ladrão roubar. Pedi à minha vizinha que subisse com os meninos e que ficassem protegidos em casa que eu ia dar uma olhada pelas ruas do “Vieux”.

Eu pensava… Se foi a turminha da área…. não vão ficar dando bobeira por ai com a bicicleta … Eles vão vender a bicicleta, eu pensei. Onde? Pra quem? Caixa Convertor !

Caixa Convertor era uma loja, recém-inaugurada, que comprava e revendia de tudo usado!

Vocês podem perguntar, mas tem ladrão na França???

É claro que tem ladrão na França! Ladrão é uma praga que tem em tudo quanto é lugar, infelizmente. O que difere é talvez a maneira como atuam: Com mais ou menos grau de violência. Enfim…

Fui apressada (e com a adrenalina em química bizarra dentro de mim) em direção do estabelecimento.  Pela vitrine eu vi, vocês não vão acreditar! Mas lá estava o ladrão segurando a bicicleta em frente ao guichê! Abri a porta de vidro e entrei, rindo da situação. Era incrível como meus pensamentos tinham me levado para aquele lugar! Umas seis pessoas aguardavam para vender violão, torradeira, bibelôs… Eu entrei, dei uma olhada na bike e disse para o atendente que nesse exato momento devolvia a identidade ao jovem ladrão (ele não tinha mais que uns 19 anos).

– Monsieur, appelez la police, ce vélo est à mon fils, il  vient d’être volé de notre garage !

Exclamações se elevaram no recinto:

–  Oh! mas o que é isso ?!

Ainda rindo (eu realmente não parava de rir, feliz (e nervosa) por ter encontrado a bicicleta do meu filho), insisti !

– Moço, chama a polícia, essa bicicleta é do meu filho e acabou de ser roubada por esse rapaz.

̶  Que é isso madame ? Disse-me o ladrão

̶  Vamos ali fora que eu mostro pra senhora umas três mil bicicletas como essa. 

̶  Mas essa é a do meu filho!

̶  Madame, a senhora está acusando o rapaz só porque ele é árabe? Disse me um dos seis clientes na salinha de recepção.

– Eu não chamei ele de árabe, eu chamei ele de ladrão ! Ele é ladrão porque acabou de roubar a bicicleta do meu filho.

Moço chama a polícia!

̶ Non, eu não vou chamar a polícia. Esquivando-se talvez da punição, respondeu-me o funcionário da loja.

Aí eu já não ria mais:

̶–  O senhor chama a polícia nem que seja prá dizer que tem uma louca aqui dentro da loja!

A salinha ficou em silêncio!

Uma senhora bem francesa que tentava ali vender um secador de cabelos disse-me:

–̶  Mas madame, não é porque ele é árabe…  A senhora tem certeza que essa bicicleta é sua?

E o ladrão:

–  ̶“Eu posso até buscar a nota-fiscal”

̶  Essa é boa! Disse eu. Pois eu posso provar que essa bicicleta é minha!  Ela tem o nome do meu filho escrito no quadro.

Foi um burburinho imenso de surpresa. Todos ficaram de boca aberta quando eu mostrei o lugar onde se lia Bruno no quadro metalizado.

O ladrãozinho aproveitou a confusão e saiu de lá correndo.

Pedi que me entregassem a bicicleta e os três funcionários me negaram.

Pensei com meus botões: Se eles compram coisas roubadas, pra eles o melhor é sumir com minha bicicleta e com a identidade do ladrão.

Fui correndo até a polícia. Já eram quase dezoito horas, o comércio ia fechar e a delegacia não era assim tão perto dali. Chegando ao comissariado uma policial me informa que não havia nenhuma equipe disponível. Nesse exato momento chegam três policiais à paisana que perguntam pra ela qual era o meu problema. Eu aproveitei para contar eu mesma o que acabara de me acontecer.

–̶  Caixa Convertor comprando coisa roubada para revender? Disse contraindo a sobrancelha um dos policias, que logo tomou a decisão:

–  Essa é pra nós, les gars!

E saíram os três voando na joaninha deles em direção à loja. Eu tive que fazer o trajeto todo novamente, bufando feito uma condenada, pois eles não quiseram me levar (é proibido transportar civís em carro de polícia, principalmente em eventual perseguição).

Quando lá cheguei, eles já tinham recuperado a bicicleta e o gerente estava tendo que entregar a identidade do ladrão e preencher a ficha de ocorrência  e ele ainda responderia em processo por interceptação.

O mais velho dos policiais à paisagem me pede então para contar a história desde o começo e ao final me perguntou:

–̶  Mas, o que deu na cabeça da senhora pra pensar assim em marcar a bicicleta e acertar na Caixa Convertor?

De malandragem a gente aprende a se prevenir… Quarenta anos de praia, dezessete de Rio de Janeiro, seu policial !”

NB: Caixa Convertor – nome fictício
Marilia de Laroche
Professora da Aliança francesa

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Lula e o calção encarnado

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lula2.jpgAo longo dos últimos anos, o Brasil vem conquistando posição de destaque na economia mundial.

Em 2001 foi incluído como parte integrante do BRIC (grupo econômico inventado pelo Jim O’Neill do grupo Goldman Sachs: Brasil, Rússia, Índia e China). Este bloco econômico emergente vem despontando no cenário mundial pela pujança de suas economias e pelas elevadas taxas de crescimento vivenciadas na última década. O Brasil é voz cada vez mais ouvida nos Fóruns internacionais.

No entanto, em que pese sua força hegemônica indiscutível no continente Sul Americano, o País não tem feito valer sua importância nos embates regionais. Vez por outra tem cedido aos caprichos dos vizinhos comandados por lideranças populistas e antidemocráticas. Exemplos recentes como a crise do gás da Bolívia, o estremecimento das relações com o Equador e os freqüentes arrojos do Hugo Chaves, da Venezuela, precisam ser “peitados” pelo presidente Lula. Este sim, grande liderança política com credibilidade internacional.

Em contra partida, acompanhamos pela imprensa internacional a postura independente e dura do chanceler Celso Amorim na defesa da quebra dos subsídios agrícolas impostos pelos Países desenvolvidos. Mas, de nada adianta isso, se nos embates mais simples não somos capazes de sequer fazer valer nossos contratos previamente acordados com os Países vizinhos.

Para cada situação há que se adotar uma estratégia diferente.

Está sendo preparado pelo Palácio do Planalto, um encontro de cúpula das lideranças Sul-americanas para discutirem a oferta de energia para o Continente. Espera-se que saibamos defender e fazer valer nossos interesses.

O Ex-deputado Jurandy Leite, meu tio, gaba-se que quando criança era conhecido em Pinheiro como campeão de briga de rua, muito comum entre os meninos daquela época. Adotava, para isso, diferentes táticas para encarar uma briga.

Quando via que o opositor era fraco, não conversava muito. Não era nem preciso fazer a risca no chão para esperar que o outro cuspisse do seu lado (Isso era o mesmo que cuspir na cara da mãe!). Partia logo para cima, enchia de “bogue” o adversário e saía vitorioso sob os aplausos dos colegas. (Para quem não conhece o termo, o dicionário popular maranhense esclarece que bogue é o mesmo que soco).

Por outro lado, quando não conhecia o adversário, ficava analisando e lançava mão de outra estratégia. Para intimidar, ameaçava tirar a camisa desabotoando botão após botão, dizendo que só brigava sem camisa e que, quando retirasse o último botão, iria sobrar “sopapo pra tudo o quanto é lado…”

Conta Jurandy, que ele ganhou muita briga sem brigar, pois o adversário desistia ao longo da cerimônia da retirada dos botões…

Como a fama de “bom de briga” havia se espalhado pela cidade, vira e volta Jurandy era ameaçado por um outro garoto que queria desbancá-lo do ranking.

Para essas situações desenvolveu outra tática. Quando percebia que o adversário era mais forte que ele, e que certamente iria apanhar, caso partisse para os finalmente, Jurandy apelava dizendo:

 – Eu só brigo com o meu calção encarnado! (do Latin incarnatu, cor de carne, vermelho).

Como não estava preparado… teria que adiar a briga. Chegava até a mandar buscar o calção em casa, que nunca aparecia… Com isso adiava a briga e a surra que levaria com certeza.

Segundo suas próprias palavras, o presidente Lula não é muito chegado ao hábito da leitura e prefere tomar conhecimento dos fatos através de seus assessores de confiança.

Neste caso, espero que seus assessores atendam ao desejo presidencial e façam chegar aos ouvidos dele os ensinamentos de um caboclo bom de briga.

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Contribuição do Woody Allen para 2009

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Para aqueles que imaginam novas situações para o Ano Novo, que tal adotar esta pérola escrita pelo Woody Allen!
“Na minha próxima vida quero vivê-la de trás pra frente.
Começar morto para despachar logo esse assunto.
Depois acordar num lar de idosos e ir-me sentindo melhor a cada dia que passa.
Ser expulso porque estou demasiado saudável, ir receber a aposentadoria e começar a trabalhar, recebendo logo um relógio de ouro no primeiro dia.
Trabalhar por 40 anos, cada vez mais desenvolto e saudável até ser jovem o suficiente para entrar na faculdade, embebedar-me diariamente e ser bastante promíscuo, e depois estar pronto para o secundário e para o primário, antes de virar criança e só brincar, sem responsabilidades.
Aí viro um bebê inocente até nascer.
Por fim, passo 9 meses flutuando num spa de luxo com aquecimento central, serviço de quarto a disposição e espaço maior dia a dia, e depois
– Voilà! – desapareço num orgasmo”.

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Nihil sub sole novi

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350px-pol_radom_castle_nihil_novi.jpgTodos nós esperamos que do poder Judiciário possam sair decisões que preservem os direitos individuais do cidadão e da coletividade.

Durante esta semana, nos surpreendeu a manchete de um dos principais jornais do País: “Procuradoria “vê balcão de negócios” no Tribunal de Justiça do Espírito Santo”.

Ação da polícia Federal havia recolhido ao xadrez, nada mais nada menos que o próprio presidente do Tribunal de Justiça daquele Estado.

O governador Paulo Hartung admitiu a gravidade das denúncias apresentadas, e chegou a relembrar a época em que o então presidente do Poder Legislativo era considerado o líder do crime organizado no Espírito Santo. Mas, saiu em defesa de seu estado, para protestar contra o “carimbo” da corrupção!

Os casos apontados seriam pontuais e não caracterizariam o apodrecimento do tecido social de seu Estado.

De fato, não podemos e nem devemos generalizar o episódio, senão lamentar que exatamente aqueles que deveriam dar o exemplo de imparcialidade, ética, honestidade e justiça, abusem do direito de fazer o errado.

Infelizmente, essa prática não é de agora!

Aproveitando o episódio, me vem à memória o meu avô Chico Leite que, se vivo ainda estivesse, estaria completando 104 anos neste mês de dezembro.

Com seu espírito oposicionista ele era uma voz constante na defesa dos oprimidos. Sarney Costa dizia estar o Maranhão àquela época “cheio de rábulas sem nenhuma qualificação”.

Incentivado por ele, Chico Leite decidiu estudar e, mesmo sem estar formado em Direito, submeter-se ao teste da OAB. Foi aprovado. Iniciou, a partir daí, sua presença no Judiciário maranhense, como advogado criminal, cível, eleitoral, enfim, de todas as causas, sobretudo como defensor dos pobres e dos injustiçados.

Durante muitos anos, Chico Leite recebeu orientação de grandes nomes do Judiciário maranhense, tais como Dr. Teodoro Rosas, desembargador Teixeira Júnior, Dr. Agnelo Costa e por último do Dr. Orlando Leite. Quando apareciam questões que ele não sabia como resolvê-las, por vezes recorria a Sarney Costa, seu primo, advogado àquela época, para trabalharem juntos.

Dessa forma, assimilou por muito tempo os conhecimentos de seu primo aprimorando seus métodos de trabalho.

Sempre andava às turras com os juízes da cidade elevando sua voz e exercitando sua pena para protestar contra a morosidade da Justiça e a presença de magistrados inoperantes. Não raro, recorria a sua verve poética para importuná-los, utilizando o expediente de deixar pequenas estrofes “esquecidas” dentro dos processos:

“Oh! Justiça de Pinheiro,Em que lugar tu te escondes, A gente clama por ti, Tu te calas, não respondes …. Vem, Justiça! Te imploramos, Ao nosso apelo atender, Pois, ninguém no mundo pode, Sem ti, Justiça viver”.

Em alguns momentos mais críticos, protestando contra a desonestidade de determinado magistrado, chegou a ponto de apelar até para a pichação de muros, extravasando seu grito de clamor pela justiça.

Teria contratado o velho Gereba para sair pela cidade grafitando nos muros mais alvos das residências:

O bom ladrão tem salvação! O juiz venal não tem perdão!

Neste 11 de dezembro, no auditório da Assembléia Legislativa do Maranhão o brilhante desembargador Nilson Coutinho nos brindou com uma primorosa palestra sobre a história do parlamento.

É verdade, desembargador Milson Coutinho, Nihil sub sole novi!

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A historia de uma casa, contada por ela mesma

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 “Boa Noite!

Deixem que a luz prateada desta lua, nascida anteontem, faça-me enxergar a realidade deste instante de encantamento!
Eu sou esta Casa.

Já estava adormecida… De repente, sonhei! Escutei passos na minha calçada… risos…vozes cantando! Acordei!

Descobri (encantada) que meu sonho esta se realizando. O silêncio do meu sono fez-se música, fez-se luz, fez-se alegria!Meu corpo (trêmulo) achava-se diante das recordações e das saudades!

Preciso contar-lhes a minha história:

Repito, EU SOU ESTA CASA, nasci no século passado. Foi um europeu – Américo de Almeida Gonçalves – nascido em Santa Cruz da Trapa em Portugal, que determinou a minha construção. Em meu corpo “corre” a argamassa de pedra, cal, barro e cimento de que fui feita.

Fui construída de frente para o nascente. Por isso o sol doura os meus terraços todas as manhãs. Os cômodos que ficam para trás, permitiriam que eu assistisse, diariamente, o pôr-do-sol, não fossem as edificações já existentes ali quando nasci. Dizia o Pequeno príncipe que “quando a gente esta triste gosta de ver o por do sol”. Asseguro-lhes que o pôr-do-sol nunca me fez falta porque sempre fui uma casa alegre! A alegria espalhou luzes e cores pelos meus aposentos. Sempre fui uma casa clara e colorida! A alegria pôs música até mesmo nas minhas dobradiças.

As paredes que subiram dos meus alicerces têm quase um metro de espessura! Sabem por que me tornei esta fortaleza? Para proteger e dar segurança àqueles que se aninhavam em meu interior.

Foi isso mesmo que ouviram. Eu fiz um ninho para recebê-los! Ninho de beleza, alegria, amizade, doçura e carinho!

Pela minha localização-trecho nobre da cidade-; pelo meu fino acabamento, pela minha imponência colonial. Conquistei prestígio e o título da CASA MAIS BELA DA CIDADE, por muitos e muitos anos!

A matéria prima do assoalho da minha sala principal, a madeira, veio da floresta amazônica (do Para) em dois tons: a Braúna, madeira negra… e o Pau-de-Cadeia-de-Marajó, madeira amarela. Ambas, madeiras de lei, raras, porque são fechadas à umidade e têm a característica de não apodrecerem.

Alguns dos meus números:

Data de Nascimento: Dezembro de 1954

Cômodos: 22, sendo 15 em cima e os demais nos porões.

Possuo 17 portas e 32 janelas, todas as folhas duplas.

É esse, como vêem, o meu corpo físico. A minha decoração também foi realizada com apuro.

Os móveis que me mobiliaram tinham marca CIMO, eram de Imbuía, trazidos diretamente de Curitiba, para os meus salões.

Enquanto eu esperava a visita do Presidente Juscelino Kubstcheck, cortinas de organza de cor pérola, encimadas por bandôs de cetim, balançavam-se etéreas, das minhas janelas, constantemente, abertas.

Arranjos de flores espalhavam-se pelos meus aposentos! Um espelho de cristal reproduzia rostos felizes!

Um jardim onde floresciam rosas, dálias, jacintos e lírios via-se encravado por trás da varanda! Toalhas de puro linho – tecido nas aldeias de Portugal – cobriam minhas mesas para os almoços domingueiros. À chegada de visitantes mais especiais, o aparelho de porcelana fina e os talheres de prata, saíam do aparador da copa, em companhia das taças onde era servido o gostoso vinho do Porto. Trazido de Portugal em barris e engarrafado por Seu Américo, aqui, entre minhas paredes.

Tudo isso eu presenciei. Tudo isso eu vivi.

A família Gonçalves tinha algumas tradições gastronômicas:

Todo óleo usado no bacalhau era de oliva, português.

No carnaval preparavam-se pratos de “filhoses” que eram servidos, encharcados em uma calda de açúcar em ponto de fio.
Na Páscoa o bacalhau era à portuguesa e o banquete de frutos do mar era oferecido a todos os afilhados que apareciam para tomar a bênção, aos padrinhos.

As crianças no almoço e jantar não tomavam água, nem sucos ou refrigerante. Tomavam leite.

No Natal, depois da ceia, eram servidos: figo, ameixas secas, passas, castanhas portuguesas, nozes, tâmaras e avelãs.
Depois do falecimento de seu Américo, por herança, passei a pertencer ao seu filho caçula José Maria, casado com Marita, uma vez que aqui moravam desde o seu casamento.

Seis crianças povoaram meus quartos e salas! Brinquei com eles de esconde-esconde pelos terraços; de amarelinha pelos quintais cheios de fruteiras.

Até que um dia… Fui vendida. Decisão gerada entre dores, lágrimas e saudades.

Marita, viúva, já residia em S. Luis, mas… Veio despedir-se de mim.

Emocionada percorreu todas as minhas dependências. Chorava em silencio.

Ao entrar na sala “ouviu vozes rezando”. Aproximando-se do aposento da frente “viu um pequeno esquife, coberto com a bandeira dos escoteiros onde um boné de lobinho havia sido também, ali colocado, por Padre Risso, grande amigo do pequenino morto. Quatro escoteiros perfilavam-se como “escudeiros”, onde quatro círios choravam suas lágrimas de cera”. Fora a partida de uma das crianças da casa, para o céu.

Sacudindo essas lembranças tristes ela revê a sala de jantar, a cozinha, o quarto das crianças, o jardim e o quintal. Os pés de loucura estavam cobertos de flores… mas no quintal… as arvores abaixaram suas copas. Não queriam que ela visse suas lágrimas de orvalho!

Eu já fui jovem e bela!…Ali estava eu a constatar que depois que meus primeiros donos mudaram-se para S. Luis, as plantas eram os únicos seres vivos que me faziam companhia. Com elas recordava o que as pessoas diziam quando entravam em minha sala:

Sandra Mendes: – “Parece que estou entrando numa igreja”.

Iná Luiza: – “É uma satisfação visitar a casa de Marita. Sempre arrumada, clara, colorida, iluminada, linda e cheia de novidades”!

Pela minha soleira já passaram: padres, promotores, advogados e desembargadores, gerentes de banco e poetas, membros da Academia Maranhense de Letras, governadores, deputados, palhaço de circo, “Papai Noel”, jornalistas e repórteres de famosas revistas nacionais, como “O Cruzeiro”. Hospedei por três dias o representante do Presidente da República (Juscelino Kubstcheck) o senador Assis Chateaubriand e toda a sua comitiva. Minhas paredes (que tem ouvidos) já escutaram muitas histórias da Carunchinha cantadas por uma das avós que aqui moraram, a vovó Carmem, que narrava para os netinhos. A outra, a vovó Almerinda, à noite, para adormecê-los cantava lindas canções de ritmos tristes e dolentes.

Das minhas janelas alegrias, sonhos e sorrisos pulavam para o meio da rua e iam brincar com as crianças da vizinhança.
Fui palco de festas de aniversário com temas próprios, decoração de teto, convites impressos, escritos em versos; ceias de bagres; jantares. 1º comunhão, Festa de Páscoa, baile de orquestra, inesquecíveis Natais!

Acostumado às belezas da Europa meu dono construiu-me com o puro e o esmero com que se faz uma obra de arte.

E… como OBRA DE ARTE, já fui homenageada de várias formas:

FOTOGRAFIA: Vejam a minha foto, já fui modelo!

ESCULTURA: Aqui tenho a minha maquete, feitas pelo acadêmico da  APLAC, Erivaldo Moreira.

PINTURA: Pousei para esta tela. Olhem! Ela foi pintada por…

POESIA: Também fui musa inspiradora de poeta! Antonio Carlos Pereira Lobato, Patrono da APLAC, irmão de Marita, imortalizou-me em versos “A TUA CASA  MARITA””.
Esta crônica foi escrita por Marita Gonçalves, membro da Academia Pinheirense de Letras Artes e Ciências – APLAC, e lida por ocasião do terceiro aniversario da APLAC dia 21 de novembro de 2008.

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