Uma porta à procura de uma casa

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Tempos atrás, recebi um convite para conhecer um velho casarão colonial no Centro Histórico da cidade.
Chicão, meu amigo, mostrava-me objetos antigos espalhados pelos cômodos da casa de seu pai no sobrado da ladeira de Santo Antonio. Imagens sacras, plafonds, porcelanas, fotomobils, cristais da Bohemia e de outras praças, prataria, petisqueiras de jacarandá com vidros bisotados, enfim, um autêntico antiquário.

Cada uma daquelas peças carregava, com certeza, uma história de vida daqueles que a possuíram por algum momento. Enquanto percorria aquele amontoado de objetos, fiquei a imaginar cenas que essas peças teriam presenciado ao longo de sua existência no convívio com seus antigos proprietários. Porém, mesmo absorvido pelos meus pensamentos, ao cruzar o corredor principal da casa, minha atenção foi atraída por algo que teria sido, há muito tempo, uma porta. O perfume do cedro ressecado pelo tempo ainda recendia pelo ambiente. Mesmo na penumbra do confinado espaço, meus olhos brilharam! Aquela porta teria enfeitado o sobrado de alguma família nobre de São Luís.

Entre tantos achados interessantes, acabei por adquirir aquela porta. Contratei um caminhão e, num sábado ensolarado, cheguei à minha casa, eufórico, com o achado.

Beth, minha mulher, ao ver aquele emaranhado de peças soltas, velhas e empoeiradas, não deixou por menos:

− O que uma porta velha vem fazer na minha casa? Onde vou colocar uma quinquilharia dessas?…

Logo depois que aqui chegamos fomos morar em uma casa ampla, moderna, feita sob medida para criar os nossos filhos. Embora nascidos no Rio de Janeiro, havíamos decidido criá-los numa cidade menor, mais segura e no aconchego dos amigos e da família. É bem verdade que aquela porta nada tinha a ver com a nossa casa… Mas tentei tranqüilizá-la alegando que era uma peça centenária, rara, histórica e que eu iria restaurá-la.

Chamei Curió, um mestre na arte da marcenaria de restauro, que passou quatro meses dedicando todo o seu esforço e maestria na recuperação daquela preciosidade. Tal qual uma Fênix, a porta ressurgiu de suas mãos ainda mais bela e imponente e no aguardo de um espaço nobre para abrigá-la. Até minha mulher passou a admirá-la. Mas, insistia na pergunta:

− E agora, o que vais fazer com ela?

− Vou fazer uma casa para abrigar esta porta! Respondi prontamente.

Por curiosidade, resolvi partir em busca da origem da porta. E não é que o destino devolve à família Soares a porta que um dia havia lhe pertencido?! No casarão da Rua do Passeio, quase na esquina do Canto da Viração, essa porta deixou-se abrir para dar passagem a ilustres figuras de São Luís que freqüentavam a casa de seu antigo proprietário. Pertenceu ao renomado médico e primeiro deputado federal, constituinte de 1946 e filho de Pinheiro, Dr. Odilon Soares.

O tempo passa e, de repente, os nossos filhos crescem, saem para estudar, casam e batem asas para fazer suas próprias vidas. Assisti dias atrás o filme de Daniel Burman, “O ninho vazio”, que trata da experiência vivida por muitos casais ao se depararem com o fato de que, de repente, começam a ficar sozinhos quando os filhos partem para assumir o comando de seus próprios destinos.

A nossa casa, alegre com a algazarra dos filhos e de seus amigos, começou a ficar silenciosa. E enorme! O azul da piscina já não mais refletia o sorriso dos meninos e os nossos objetivos e prioridades começaram a se transformar.

Recentemente, Turíbio Santos, um arquiteto amigo ao nos visitar deparou-se com aquela porta encostada em uma das paredes de nossa morada. Encantou-se. Manifestamos a ele o desejo de construir uma nova casa, desta feita adaptada às necessidades dos novos (ou velhos) tempos. O projeto foi gestado, decidimos construir um novo ninho e dentro em breve estaremos nos mudando para o nosso novo lar. Nosso e da porta. Que irá se abrir novamente para receber com carinho os amigos mais chegados.

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La Bluette – II

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A notícia já viajou o mundo.

Recebo informações provenientes de um renomado historiador Pablo Hernadez Ortega, de Las Palmas, na Espanha.

O site listado a seguir é rico em detalhes sobre a aventura da travessia do oceano Atlântico pelo la Bluette.

http://www.johnratcliffe.eu/LUCIADEHERRERA/III_TRABAJOS/IIIT08_naves/IIIT081_veleros/III0812_clandestinos/IIIT08124_bluette/index.htm

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La Bluette

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 Tão logo entrou em cartaz no Brasil o filme Rede Social, minha caixa de e-mail não sossega com a chegada de inúmeras mensagens convidando-me para fazer parte do Facebook. A Internet, através das redes sociais, tem permitindo disseminar notícias e garimpar informações numa velocidade surpreendente. A um simples comando suas idéias podem ser compartilhadas e difundidas mundo afora.

Após o término da Segunda Guerra Mundial, muitos europeus encheram-se de esperanças e tentaram construir uma nova vida longe de suas pátrias. Deixaram para traz os horrores da Guerra e bens materiais e trouxeram apenas o coração cheio de saudades da família.

No início de 1949 partia da Espanha com destino à Venezuela, um veleiro trazendo uma pequena leva de imigrantes recrutados para trabalhar na exploração de madeiras no Novo Mundo. Charles Dell´Eva e Lúcia Paullete, dentre muitos outros, faziam parte desse grupo.

La Bluette era o nome da embarcação. Após uma conturbada travessia do Atlântico sob fortes ventos e tempestades o barco é desviado de sua rota original e sofre graves avarias. Sem o astrolábio, navegaram dias e noites perdidos e sem rumo na imensidão do mar. Era 18 de fevereiro de 1949 quando avistaram, ao longe, a luz de um farol. Na manhã seguinte ancoraram na baía de São Marcos em São Luís do Maranhão.

Durante a Guerra, enquanto trabalhava como enfermeira no Hospital da Cruz Vermelha em Paris, Lúcia Paullete seguia um rigoroso tratamento orientado pelo Dr. Jassoneneix para livrar-se de um fibroma. Anos mais tarde, ainda sem ter se curado do tumor, embarcou na Espanha munida de fortes doses de Ergotamina para agüentar a longa travessia. Sobreviveu às inúmeras hemorragias ao longo da viagem e chegou a São Luís pesando míseros 40 quilos.

Hospedados no Hotel Central Charles e Lúcia decidiram por permanecer em São Luís em busca de cuidados médicos que ela tanto carecia. Lá conheceram Dr. Pedro Braga filho. Por ele foram apresentados ao Sr. Francisco de Paula Gomes que lhes acolheu e propôs uma alternativa de trabalho.

Charles! Perguntou Paula Gomes. − Você saberia fazer tijolos e telhas?

Et porquoi pas!? Apressou-se em responder Charles.

Foi assim, em companhia de Auguste e Guy, dois compatriotas companheiros da árdua travessia, que iniciaram a vida no Brasil amassando barro e transformando em telhas e tijolos na Olaria situada às margens do Rio Bacanga no sítio do “Tamancão”.

Alugaram uma residência no distante bairro da Alemanha – Casa Veneza – que Charles descrevia como “longe de tudo e perto de nada”… Após meses de tratamento e repouso absoluto Lúcia engravidou e as hemorragias voltaram a ser freqüentes. Atendida pelo doutor Bacelar Portela, ela foi informada que deveria ser submetida a uma delicada intervenção cirúrgica. A criança estava bem, no entanto os exames mostravam a presença não de um, mas, de dois fibromas que deveriam ser removidos imediatamente para garantir a vida do bebê.

Naquela época era uma cirurgia de alto risco. Marcada para o Hospital Português, a operação, assistida pela Irmã Bernadette do colégio Santa Teresa, foi realizada e considerada um grande sucesso da medicina. Além do mais, a barriga aberta surpreendeu a equipe médica. Tratava-se não de dois, mas de apenas um tumor e dois bebês…

Joanna Alice, esse é o nome de um daqueles bebês, nascidos em São Luís do Maranhão numa plena terça feira de Carnaval, em 14 de fevereiro de 1949, data essa em que se comemora, na França, o Dia dos namorados.

É de Joanna Alice o mais recente e-mail que recebo, em busca de mais informações que possam completar essa interessante história de vida.

Nesse mesmo mês de fevereiro as fortes chuvas que desabaram sobre São Luís destruíram a Olaria do Bacanga levando com ela, além dos tijolos e telhas, os sonhos e as esperanças de Charles.

Para quem enfrentou as tormentas em alto mar e vivenciou os horrores da Guerra não seriam as águas de fevereiro que iriam afogar a obstinação de Charles. Desolado, mas com a ajuda de seus amigos de São Luís, empreende um novo negócio: Em julho de 1950, Inaugura o restaurante “A Brasileira” na Rua Godofredo Viana entre a Rua Grande e a Rua da Paz.

Durante quase dois anos a Casa passa a ser conhecida como “o restaurante dos franceses” e é freqüentada pelos artistas famosos, intelectuais e até o ex-presidente Getúlio Vargas tem seu nome registrado no Livro de Ouro do restaurante.

(Quem conhecer mais detalhes sobre o Bluette fineza informar para [email protected])

P.S.: A foto da embarcação é do historiador Pablo Hernandez Ortega, de las Palmas – Espanha.

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A ceia de bagre

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De tanto ouvir falar das belezas dos verdes campos de Pinheiro dois amigos meus resolveram vir, de bem longe, me visitar aqui no Maranhão. Mas queriam ir até Pinheiro!

Do terminal da Ponta da Madeira até o porto do Cujupe, do outro lado do continente, a travessia já é uma viagem. No meio da baía, as pequenas gaivotas acompanham o Ferry Boat. O comandante Edson acelera os motores. Uma enorme espuma branca se forma na popa da embarcação e, sobre ela, os pequenos peixes fazem a alegria dos pássaros.

O fim de tarde se aproximava quando dobramos a ponta do Farol em direção ao Cujupe. De repente, a exuberante natureza nos surpreende e coloca à nossa frente um bando de guarás. O reflexo da luz do sol poente na plumagem daquelas aves nos fez enxergar um encarnado único, indescritível e de rara beleza, que nem os mais renomados mestres da pintura seriam capazes de reproduzir.

Ficamos a contemplar, por cerca de 30 minutos, bandos e mais bandos de guarás, cada qual guiado pelo seu líder, cruzando sobre nossas cabeças em direção a seus dormitórios.

Aos poucos o verde escuro do manguezal mudava de cor. Como numa pintura impressionista, o mangue ao nosso lado começava a tingir-se de rubro pela chegada dos guarás e pequenas manchas formadas pelas garças brancas enriqueciam a beleza do quadro. A revoada dos recém chegados, que desciam até as margens para lavar os pés, agitava a paisagem. Chama atenção que embora passem o dia inteiro à cata do sarará e do maraquanim, enterrando os pés no barro preto do mangue, nenhum guará se atreve a dormir de pé sujo; todos, sem exceção, lavam os pés antes de se recolherem aos braços de Morfeu.

Mais tarde, hospedados em uma pousada à beira do campo em Pinheiro, nós acordamos bem cedo para contemplar o nascer do sol que refletia sobre aquele manto de água a perder de vista. Um verdadeiro oceano de água doce animado pelo vôo rasante dos bandos de marrecas, jaçanãs e japiaçocas.

Munidos de uma caneca de alumínio e um pouco de Nescau fomos tirar o leite das duas vacas que se encontravam ao lado. Sentados num pequeno mocho de três pernas e espremendo as tetas da vaca o leite mungido jorrava fazendo espumar aquele saudável milk shake.

No salão uma grande urupema recheada de cupu, bacuri, ingá, murici, pitomba, carambola, tamarindo, abacaxi (de Turiaçu, penso eu) enfeitava a mesa do farto café, regado com sucos de manga, cajazinho e caldo de cana tirado da engenhoca. Um beijú com queijo de São Bento e um bom copo de juçara, amassada na hora, completava o petit déjeuner.

Alugamos uma pequena canoa e fomos conhecer a Barragem do Pericumã, uma das raras eclusas existentes no Norte do país. No Lago Grande, encontramos Sr. Antão, um tradicional pescador, que nos ofereceu a oportunidade de fazermos, à noite, uma pescaria de bagre. Aceitamos a oferta com uma condição: Iríamos comer os bagres que fossem pescados. Lançado o desafio, encomendamos o restante do jantar. E convidamos alguns amigos para fazerem parte da “ceia de bagre”.

Quando o sereno começou a cair, o Senhor Antão passou pela Pousada para nos levar ao cais da Faveira. Devidamente orientados, todos com camisas de mangas compridas para nos proteger das muriçocas, e com as lamparinas na mão, embarcamos em duas pequenas canoas, onde delgadas varas de pescar já se encontravam à nossa espera.

Enquanto remávamos em direção ao pesqueiro, pelas águas serenas do Pericumã, o breu da noite era iluminado apenas pelo brilho intermitente dos pirilampos.

As cozinheiras ficaram em casa fazendo os temperos e aguardando ansiosas pela chegada dos bagres que iriam ser “tratados” ainda vivos e preparados para a ceia.

As iscas (bichos de coco babaçu) eram larvas branquinhas e enrugadas que pareciam ter sido feitas sob medida para serem enfiados nos anzóis. A cada mergulho do anzol nas águas mornas do rio um bagre era fisgado e jogado no fundo da ubá.

Sentados no estreito banco da canoa ficávamos imaginando a festa do retorno. O vinho (lá em Pinheiro é o vinho tinto) para acompanhar a ceia já estava posto no gelo e em mais algumas horas iríamos degustar a nossa própria pescaria. Imaginem! Comer aquele peixe que iria pular, ainda vivo, para dentro da panela! E, de lá, para o nosso prato!

Já remávamos de volta quando o tempo começou a fechar. Um grande relâmpago ao largo tingiu de prata aquela imensidão de água e prenunciava um enorme trovão.

Sacudido pelo o barulho do trovão acordei de mais um dos meus sonhos. Um sonho que poderá se transformar em realidade. Afinal de contas, um maranhense acaba de assumir o Ministério do Turismo e o incentivo às atividades turísticas pode ser uma solução para desenvolver algumas das regiões de grande potencial turístico de nosso Estado.

(Photo by Edgar Rocha)

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O paletó branco

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Não sei se de tanto ver gente de branco nas festas de final de Ano ou se desmaiei após as comemorações… o certo é que acordei, no primeiro dia do ano, relembrando o sonho que tive na noite do reiveillon.

Como costumo sonhar colorido, chamou-me a atenção que todo esse meu sonho tenha se passado, tal qual os filmes de Charles Chaplin, em preto e branco.

As comemorações de Ano Novo variam de cultura a cultura e são celebradas em diferentes datas. Na China, o Ano Novo chinês, é festejado com a chegada da primeira Lua Nova depois do inverno. Entre 15 de janeiro e 15 de fevereiro os chineses comemoram a data com muitos fogos de artifício e o vermelho predomina na coloração das roupas e enfeites das cidades.

Para os muçulmanos a passagem do Ano Novo também tem data diferente: 6 de Junho, foi quando o mensageiro Maomé fez a sua peregrinação de despedida à Meca.

Por sua vez, o “Rosh Hashanah”, Ano Novo judaico é, também, uma festa móvel no mês de Setembro, onde a tradição manda comer peixe porque ele sempre segue para frente.

Aqui no Brasil, a cultura popular recomenda muita fartura e nada de comer quem cisca para trás. Frango, galinha e peru nem pensar! E a ceia deve ser iniciada, logo após a meia-noite, com uma boa porção de lentilha, para que não falte dinheiro durante o ano que está chegando.

O primeiro dia do Ano é dedicado à confraternização. É hora de fazer um balanço da vida e de começar o ano com as contas acertadas, de zerar as dívidas e devolver tudo que se pediu emprestado ao longo do ano. E, também, de usar o branco.

A cor branca significa pureza, sinceridade e verdade, além de elevar as vibrações e trazer energia positiva para enfrentar os novos desafios.

Há aqueles que atribuem a roupa branca a uma influência das tribos africanas que vieram para o Brasil durante o período da escravidão. Reverenciam Yemanjá e jogam flores e oferendas no mar.

O assunto dominante neste final de Ano foi a posse dos novos governantes. Tanto em Brasília, como aqui no Maranhão, a montagem da equipe de governo tem gerado muita expectativa na classe política e alimentado as manchetes dos Jornais.

Somente essa mistura de Ano Novo com política talvez possa justificar a presença, em meu sonho, de um personagem de terno branco que sempre acompanhava o José Sarney em suas andanças pelo Interior do Maranhão.

Dele, lembro apenas a história ocorrida em Pinheiro, por ocasião das eleições de 1962, quando deviam ser eleitos os representantes do Poder Legislativo. Meu avô Chico Leite apresentava o jovem José Sarney, como candidato a deputado federal, que se encontrava acompanhado de uma enorme caravana.

No palanque “Candinho Pé de Bola” animava a platéia e anunciava a comitiva. Embora portador de uma pequena deficiência na fala, com sua “língua presa”, ele era presença obrigatória em todos os comícios eleitorais.

Desta feita, com o microfone na mão, Candinho anunciava e pedia “uma calorosa salva de palmas” a cada um dos candidatos apresentados:

− Para vereador, Dedeco Mendes…, para deputado estadual, o médico amigo do povo desta terra, Dr. Antenor Abreu…, para deputado federal, nosso conterrâneo e filho mais ilustre de Pinheiro, Dr. José Sarney, para senador da República, Dr. Clodomir Millet…

Fez uma pausa ao identificar ao lado de Sarney um senhor de estatura mediana, gordo e impecavelmente vestido em um terno bem talhado de linho acetinado branco. Perguntou, baixinho, quem era esse cidadão. Sopraram-lhe o nome, que de pronto foi apresentado, para o deleite da multidão.

− … E, para presidente da República, Dr. Gaaaspariiiiinho! Entoou com forte acento.

Tão incrível quanto a nossa mente, que consegue misturar num mesmo sonho, de forma atemporal, personagens e imagens que nada tem em comum, é a capacidade que as palavras têm de, a partir de uma simples idéia, ser manuseadas, ganharem vida e transformadas em uma estória. 

Feliz 2011.

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O camarão da Luzia

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Éramos um grupo de três casais. Resolvemos fazer uma trilha, a pé, entre Santo Amaro e os Atins em Barreirinhas. Os raios do sol começavam a aparecer quando, ao raiar do dia, partimos em direção ao litoral. À nossa frente o horizonte e mais ao longe dunas e mais dunas de areia branca. Nós e somente nós. A imensidão daquele deserto, salpicado de lagoas de água doce, nos fazia ver o quanto somos insignificantes neste Universo. Dar um mergulho nas cálidas águas da Lagoa da Gaivota na espreita da aparição do sol por entre as dunas é uma dádiva divina e um espetáculo de rara beleza.

Após umas duas horas de caminhada no sentido leste chegamos ao mar. Do outro lado a África. Catando conchas, brincando com os bandos de maçaricos na areia branca da praia, molhando os pés na água morna do mar, caminhamos por mais algumas horas quando, sedentos, avistamos uma habitação na linha do horizonte. O fim da tarde se aproximava. Distante, tremulando pelo calor do ar ainda quente, a casa parecia flutuar. Ao longe a miragem parecia um mosteiro perdido naquela imensidão de paz. De perto, era apenas uma palhoça.

Hoje, sentado no aconchego de minha casa, nem sei se posso chamá-la de habitação…

Por entre as montanhas de sable e o oceano a miragem tinha um endereço: O Bar da Luzia. Barraco de taipa, chão de areia socada, coberta de palha de carnaúba e perdido naquela remota paisagem, ostentava uma placa de identificação: Restaurante!

Acomodei-me num pequeno mocho e pedi uma cerveja gelada… Ahhhh! Que maravilha!

A dona da casa chegou-se até a mim e perguntou em que podia nos ajudar. Deu-nos o cardápio. Costeleta de bode ao molho de coco, peixe frito e churrasco de camarão. Fiquei curioso. Jamais imaginei comer algum dia na minha vida um churrasco de camarão. Pedi pra ver como era feito o tal churrasco.

Ultrapassei uma meaçaba que separava a sala da cozinha e pude ver a habilidade da Luzia enfiando, um após outro, cabeça contra rabo, aqueles imensos camarões, recém tirados do mar, temperados na hora pelas mãos hábeis de suas duas filhas. Nos espetos feitos de talo de pindova, os camarões eram besuntados num molho de alho socado, tomate, cheiro verde, e azeite de coco. Numa grelha improvisada, ela equilibrava os espetos de camarão sobre o fogareiro de barro feito com os restos das casas de cupim. As brasas que crepitavam ao sabor da brisa soprada do mar se encarregavam do resto.

Não creio que era a fome, mas, certamente, nunca comi um camarão tão saboroso igual a esse! Os chefes Alain Ducaisse, ou mesmo o Ferran Adrià comeriam de joelhos e implorariam à Luiza a receita desse manjar dos deuses. Sartre e Simone de Beauvoir, amantes da boa cozinha, se vivos ainda estivessem, batizariam esse prato com o nome de Crevettes a soixante-neuf.

Enquanto saboreava a iguaria meus olhos viajavam pelas paredes da palhoça. Via pequenos textos grafados nos mais diferentes idiomas: grego, italiano, francês, inglês, indiano, espanhol, alemão, japonês… Todos enaltecendo o encanto da paisagem, a passagem por esse paraíso e escritos por aventureiros que se lançaram ao mundo em busca de um pedaço de paz.

Completamente exausto da caminhada e sem forças para continuar, sugeri a meus amigos dar um tempo e quem sabe fazermos uma parada para continuar no dia seguinte. Para nosso encantamento, como se o mar se abrisse para dar passagem, uma enorme bola prateada surgia no horizonte. Era noite de lua cheia.

Na boca da noite, para meu conforto, e com o auxílio de duas lamparinas que teimavam em ficar acesas, pude constatar que o restaurante era também uma pousada! Em não mais que 70 cm de largura por um metro de altura, pendurada num armador de rede, uma pequena tabuleta anunciava a tabela de pernoite: Cama – R$ 10,00; rede nova – R$ 5,00 e rede usada – R$ 3,00…

Nem me recordo mais se tinha rede nova para todos. Aproveitando o assunto, deixo como sugestão ao novo Governo da presidente Dilma: a criação do Programa Rede Nova para Todos…

 O certo é que cantarolando Estrela do Mar de Caymmi “um pequenino grão de areia, que era um pobre sonhador, olhando o céu viu uma estrela, imaginou coisas de amor…” adormeci contando as estrelas no céu.

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O sabonete de andiroba

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O Natal se aproxima. Haja tempo para tanta confraternização. É período de dar e de receber presentes. Além do carinho de amigos, e de outros mimos, um presente me deixou pleno de alegria. Um sabonete de andiroba.

Leio nos Jornais que a governadora Roseana está reeditando a experiência das Gerências Regionais.

Tive a oportunidade, no início de seu segundo mandato, de implantar a Gerência de Desenvolvimento de Rosário. Um grande desafio a enfrentar para potencializar o crescimento dessa região, pobre, composta por 11 municípios, a maioria deles isolados devido à falta de acesso rodoviário.

Lembro de uma tentativa de agregar valor a uma atividade quase extinta no município de Axixá. Na bacia do rio Munim muitas famílias ainda vivem devido ao extrativismo das sementes da andiroba.

Carapa Guyanensis (esse é o seu nome científico), conhecida como o mogno branco, quase teve sua extinção decretada pela derrubada das florestas em busca da obtenção da madeira.

Graças às propriedades medicinais de suas sementes, essa frondosa árvore resistiu ao tempo e ainda podem ser observadas manchas verdes formadas pelos frondosos andirobais na região entre Axixá e Cachoeira Grande.

Rica em vitamina E, antiinflamatório, antisséptico, cicatrizante, repelente de mosquitos e muitos outros atrativos, a andiroba ainda é a fonte de renda para muitas famílias. O sabão de andiroba, feito de forma rudimentar, continua sendo produzido e comercializado na região.

Àquela época, visitei algumas pequenas “fábricas”, conversei com as catadoras, e pude verificar o quão importante era buscar uma alternativa para preservar os andirobais sem tirar o sustento dessa gente.

Fala-se tanto das quebradeiras de coco, mas é completamente desconhecida a atividade das catadeiras de sementes de andiroba. Imaginem a epopéia dessas mulheres embrenhando-se nas matas, ao raiar do dia, com um cofo nas costas, em busca das sementes que se espatifam no chão ao caírem das alturas.

Carregando o que podem, elas retornam para casa no final do dia para armazenar no quintal de casa, aquela ruma de sementes.
Findo o período da colheita inicia-se o processo de fabricação do azeite. Um tonel de 200 litros é cheio de água com as sementes e posto a ferver durante dias. Escorrida a água, as sementes estão cozidas e prontas para a retirada da massa. Durante essa etapa, as mulheres reúnem-se num terreiro sentadas em frente umas às outras, entoam cantos populares e, cada uma, munida com uma pequena ferramenta tal qual uma meia colher de alumínio, retira a massa branca dentro das sementes. Trabalho de dias e dias!

Exaustas, cada uma retorna à sua casa, levando aquela polpa branca já oxidada pelo tempo. Com as mãos calejadas pelo trabalho, elas amassam aquele bolo e deixam repousar por cerca de trinta dias em uma prancha de madeira (às vezes um casco de uma velha canoa) inclinada.

A massa inerte fermenta e, de repente, como se estivesse chorando sob o sol torrente, lágrimas de um azeite dourado começam a pingar. É o mais puro óleo essencial de andiroba. Trinta dias de trabalho para produzir 20 litros de azeite.

Consegui alguns litros dessa preciosidade e enviei para um químico, amigo meu, no Rio de Janeiro.

Certo dia, estava na sede da Gerência, quando recebi, pelo Correios, um pacote. Ao abri-lo, deparei-me com uma quantidade de sabonetes, nas mais diversas cores, perfumes e formatos. Eram sabonetes de andiroba manipulados com esmero pelo meu amigo Pimentel. E cada qual com a sua receita ao lado. Confesso que fiquei emocionado. Como engenheiro, fiz a minhas contas e vi que podia oferecer uma alternativa de renda sustentável para aquela gente.

A singela capelinha no povoado Rio Grande encheu-se de gente naquela noite. Havia convidado a comunidade para uma reunião aonde iria apresentar a idéia de montar uma Associação das mulheres catadoras de andiroba e implantar uma pequena fábrica de sabonetes.

Todos atentos enquanto eu discorria sobre a possibilidade de agregar mais renda à atividade dessas mulheres. De que forma? Transformando o azeite em sabonete: Uma lata do azeite, mais uma de açúcar, meia de álcool, uma de barrilha, duas de água, umas pitadas de corante e outras mais de “cheiro”. Aquecida a mistura, deve-se buscar o ponto e colocar o sabonete líquido nas devidas formas para esfriar. Depois de cortados um a um, e devidamente embalados, estariam prontos para a comercialização.

Ao fazer as contas, eu mostrava que se elas vendessem a lata de azeite elas apuravam R$ 25,00. Se utilizassem o mesmo óleo e gastassem mais R$ 100,00 com os outros ingredientes, fabricariam 800 sabonetes que poderiam ser vendidos, cada um, a pelo menos R$ 2,00.
Nesse momento, abri a caixa e fiz circular pelo salão da capela todos aqueles sabonetes fabricados pelo meu amigo Pimentel. Um alvoroço geral! Esperei a platéia se acalmar, recolhi os sabonetes (muitos deles não retornaram a caixa de origem…) e abri a reunião para as perguntas.

Sentado num banco bem ao fundo da igreja, um senhor já idoso, meio cético, indagou-me no alto de sua sabedoria.

− Mas, doutor! Se esse negócio é tão bom assim como senhor tá mostrando, porque que o senhor faz pro senhor mesmo?…

Expliquei a minha atuação enquanto gestor, justifiquei o papel da Gerência e o interesse do Governo em desenvolver a região. A Associação foi criada e o projeto elaborado. O Sebrae foi envolvido na capacitação e no desenvolvimento das embalagens e o governo liberou os recursos. A comunidade construiu a fábrica, adquiriu os equipamentos e começou a fabricar os sabonetes.

12 anos depois, recebo de presente de Natal um sabonete de andiroba. Com aquela mesma embalagem, continua sendo fabricado pela mesma Associação. Exemplos como esse poderiam estar sendo potencializados em todo o Estado do Maranhão aproveitando-se de nossa imensa riqueza vegetal.

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Fiat Lux

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A Cemar se prepara para comemorar a marca das 280 mil ligações do Programa Luz para Todos.

Mais que levar energia aos lares de 1.4 milhões de maranhenses esse marco representa uma valiosa contribuição para a melhoria da qualidade de vida dessa gente simples que mora nos rincões mais distantes do Estado.

O recente estudo do PNAD mostra que antes do programa de universalização da energia elétrica apenas 65% da população maranhense tinha acesso à geladeira. Hoje esse número chegou a 90%. Mais saúde para toda essa gente que vai se alimentar de forma mais saudável.
Acertou em cheio o presidente Lula ao priorizar esse Programa Social.

Chega a ser curioso, emocionante mesmo, a expectativa das pessoas ante a chegada da luz elétrica.

Lembro de um episódio, que me comoveu, ao participar da inauguração de um pequeno sistema de energia para atender o povoado de Beira do Campo nas imediações do rio do Turí.

Dona Apolônia, a matriarca da comunidade, na porta de sua casinha de parede de taipa e coberta de palha, veio até a mim para agradecer. Magra, curvada pelo peso da idade, acredito eu com mais de 80 anos, contava-me que o seu grande sonho era não morrer sem ter bebido um gole de água gelada. E me mostrava, emocionada, a geladeira recém adquirida.

Disse-me ela que no dia em que a luz chegou, ela passou a noite inteira acordada. Acendia e apagava a lâmpada do quarto…

– Mas, por quê? Indaguei.

– Ah, doutor! Apenas para ver o semblante de meu neto dormindo…

Ao lado do casebre de Dona Apolônia, o barracão comunitário mais parecia uma loja de eletrodomésticos. Era o Armazém Paraíba improvisando um show room levando crédito e facilitando a aquisição de geladeiras, aparelhos de som e TV, antenas parabólicas e ventiladores. 

Não é à toa que a média do consumo residencial no Maranhão tem crescido nos últimos cinco anos. De 90 Kwh/mês rapidamente alcançou o patamar de 105 Kwh/mês. Sinal de mais conforto e mais qualidade de vida para esse povo que há bem pouco tempo estava completamente fora do mercado de consumo.

Caminhei um pouco mais à frente e deparei-me com a escolinha comunitária. Pude perceber a alegria estampada no rosto de cada uma das crianças vibrando com a chegada da luz. Luz que vai iluminar a vida e jogar um foco de esperança no futuro de cada uma delas. Mesmo num barracão improvisado, abrigadas sob as folhas secas das palmeiras de babaçu e pisando no solo de chão batido, essas crianças estão recebendo outro sopro de luz. Luz do saber. Luzes que se unem para alimentar o sonho e garantir o amanhã dessa nova geração.

A grandiosidade do Programa Luz para Todos no Maranhão é expressa pelos números. Foram construídas cerca de 45 mil Km de redes de energia espalhadas em todo o Estado. O suficiente para dar uma volta inteira no Globo terrestre.

Estima-se que ainda existam 50 mil famílias não atendidas pelo sistema elétrico. Que elas fiquem tranqüilas. Até o final de 2011 as lamparinas não mais serão vistas iluminando as noites mornas do interior do Estado.

O maior desafio ainda ficará por conta daqueles moradores que escolheram viver nas ilhas costeiras do litoral. A eles está em curso o atendimento com fontes alternativas de energia. Afinal de contas, debaixo da linha do Equador, ignorar o aproveitamento da energia solar não faz o menor sentido.

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Energia pra dar e vender

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Leitores e amigos têm me cobrado atualizações sistemáticas no meu Blog.

Como desculpa, digo que ultimamente não tenho tido tempo… E que alguém tem que trabalhar (nesse caso o alguém está na primeira pessoa do singular), comento com humor.

No entanto, os leitores mais modernos argumentam que não precisa de um texto bem elaborado (na verdade, nem sei se os meus podem ser enquadrados nessa categoria!) e sim de pequenas notas, sucintos comentários, enfim, assuntos do dia-a-dia.

Pois bem! Vou tentar participar mais ativamente dessa mídia discutindo alguns assuntos que nos dizem respeito.

Por hoje vamos falar um pouco sobre energia!

Recentemente o Maranhão tem sido alvo de notícias positivas a esse respeito. A prospecção de petróleo offshore e a descoberta de grandes reservas de gás em Capinzal do Norte têm ocupado os noticiários dos jornais em todo o País.

A implantação da Refinaria de Petróleo em Bacabeira, capaz de processar 600 mil barris de petróleo por dia, só encontra similar no Kuwait onde está em fase de construção uma unidade com essa magnitude. Faça um pequeno sobre vôo sobre a área onde está sendo implantada a planta de refino. É de causar espanto a grandiosidade da obra! Apenas a fase inicial de preparação do terreno está a consumir quase um bilhão de reais.

O retorno do senador Lobão ao Ministério de Minas e Energia é uma garantia de que esse empreendimento será implantado dentro do prazo. Esse clima de euforia, retratado pelos elevados índices de crescimento da economia maranhense, vem sendo observado nos mais diversos segmentos. Apenas para ilustrar, o mercado de energia elétrica no Maranhão cresceu cerca de 17% neste ano de 2010, três vezes superior ao verificado no resto do País.

O Programa Luz para Todos no Maranhão já levou energia elétrica a mais de 270 mil residências no Interior do Estado. Mais energia representa mais consumo, mais produção e mais qualidade de vida para a nossa gente.

Nunca se construiu tanto como agora. O setor de Construção Civil apresenta resultados impressionantes, os preços dos imóveis estão subindo mais que os foguetes da Base de Alcântara e, encontrar atualmente um bom pedreiro está mais difícil que achar a agulha no palheiro.

O fechamento das comportas da Usina hidrelétrica de Estreito representa uma nova etapa de oferta de energia elétrica em abundância para o estado do Maranhão. Com uma capacidade de cerca de mil MW vai produzir energia suficiente para suprir todo o mercado da Cemar e da Alumar juntos.

Dentro em poucos dias assistiremos ao novo leilão de energia da ANEEL para o aproveitamento das águas do Rio Parnaíba a montante de Boa Esperança.

À época em que o ex-ministro Cesar Cals inaugurou a Usina de Boa Esperança, os piauienses enciumados com o Maranhão, diziam que a energia ficou para o Maranhão e que eles ficaram apenas com a Esperança… Hoje a esperança é de todos. Mais energia para o Maranhão, para o Piauí e para o Brasil também.

Quando se fala em energia térmica, a Equatorial Energia já concluiu a sua planta industrial em Miranda do Norte e está com suas turbinas prontas para produzir 330 MW de energia com a queima de óleo pesado.

Por outro lado, a MPX acelera, aqui no Porto do Itaqui, a conclusão de sua usina capaz de gerar 360 MW a partir carvão mineral importado diretamente da reserva de La Guarija, na Colômbia.

Durante esta semana, recebi a visita do ex-ministro de Energia do Uruguay José Serrato acompanhado do diretor de uma empresa de Projetos energéticos da Galícia na Espanha, interessados em firmar uma parceria com a Equatorial Energia na produção de energia eólica.

Afinal, vento é o que não falta nas áreas costeiras do litoral maranhense.

Bons ventos sopram no horizonte do Maranhão. Amém.

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Folha de Pindoba

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Sempre que viajo pelo Interior do estado em companhia de técnicos do setor elétrico sou indagado sobre a pujança dos nossos babaçuais e sobre o seu aproveitamento. Muito se tem pesquisado a respeito, porém, até os dias atuais, ainda não se conseguiu desenvolver a cadeia produtiva a ponto de tornar economicamente viável sua exploração.

Nos últimos anos as pastagens vêm ocupando os espaços abertos a fogo no seio das florestas, os sabiás já não cantam como outrora e as quebradeiras de coco enfrentam uma luta sem trégua pela preservação de nossas palmeiras.

Recentemente, o Eike Batista encontrou uma das maiores reservas de gás natural em nosso estado. E sabem onde ela se encontra? Abrigada sob os densos babaçuais de Capinzal do Norte! E já tem gente achando que onde tem babaçu… tem petróleo… Vai ver que encontraram a verdadeira vocação das nossas florestas de coco babaçu…

Pensando nisso, uma cena chamou a minha atenção recentemente. Estava eu numa sapataria da Rua de Santana quando notei a presença de uma moça que, pelo modo de vestir e falar, deduzi ser uma moradora daqueles povoados bem distantes. Pareceu-me ser a primeira vez que ela visitava uma cidade grande. Sua expressão facial e o brilho de seus olhos denunciavam o encantamento com tudo que via nas prateleiras da loja. Olhar curioso, falar manso e com fortes traços indígenas, não deixava dúvidas. Era uma matuta daquelas bem autênticas.

Queria comprar um par de sapatos para dar de presente a uma filha que ia ser batizada. Ao ser indagada pelo vendedor sobre qual era o “número” do sapato, ela não soube dizer. Mas, prontamente, abriu a bolsa e lá de dentro sacou um pedaçinho de folha de pindoba que servia de medida do pé da menina. Desenrolou e passou às mãos do vendedor.

Para os incrédulos, mais uma das mil e uma utilidades do babaçu!

Faço esse registro, pois o uso da folhinha de pindoba como gabarito de medida era um costume muito usado nos tempos passados.

Aplicação mais curiosa ainda da folha de pindoba, como padrão de medição, também vem de um personagem do Interior do Maranhão.

Dr. Chico Cunha, médico ginecologista recém formado, certa feita consultava uma moça num Posto de Saúde na Mata do Boi, hoje município de Bela Vista. Chamava-se Rosilda. Mãe de 11 filhos (seis meninas e cinco meninos), dois deles nascidos no mesmo ano. Postos um ao lado outro formavam uma escadinha de 1 a 12 anos. Ela falava sobre as dificuldades para criar essa “ruma de filhos” sendo quebradeira de coco, dona de casa e o marido, um pobre lavrador do mato.

Rosilda vinha pedir ao doutor Chico para ligar as trompas dela, pois “eles moravam no “Centro”, sem energia (o Luz para Todos ainda não existia), sem televisão, e que a única diversão que tinham era fazer filhos…” Disse ainda ao doutor que, ao sair de casa para ir ao Posto de Saúde, o marido recomendou:

– Rosilda, já que tu vai fazer essa tal de ligadura, pede pro doutor dá uma apertadinha na “perseguida”.

Antes do preparo da paciente para realizar os exames Rosilda abriu a bolsa, retirou uma folha de pindoba e passou às mãos do Doutor Chico.

– O que é isso dona Rosilda? Perguntou, surpreso, o médico!

– É a medida da “natureza” de meu marido que eu trouxe pro senhor ver.

– Mas pra que que eu quero isso?! Disse Chico Cunha livrando-se da folha de pindoba.

– É pro senhor tirar a medida…

Chico assustou-se com o comprimento da “natureza” do marido de dona Rosilda, mas, mesmo assim, indagou?

– Só por curiosidade, dona Rosilda! – Quando a senhora tirou a medida, a “natureza” estava viva ou estava morta?

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