Empregada doméstica

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empregadadomestica_textonovo_compactado.jpgNeste ano de 2008, comemoram-se os 25 anos de regulamentação da Lei nº 5.859, feita através do Decreto 71.885. A partir dessa data as empregadas domésticas passaram a ter direito a receber pelo menos um salário mínimo mensal, 13º salário, repouso semanal remunerado e férias anuais de 20 dias, além de benefícios como licença-gestação, aviso prévio e aposentadoria. Antes disso, a relação existente entre patrão e empregado era completamente diferente do que se pratica no dias atuais.

Durante quase quarenta anos, Chica, como era chamada a empregada de Dona Alice, conviveu na casa de um ilustre pinheirense. Permanecido durante todo esse tempo, no seio da família, trabalhando e fazendo “de um tudo” para agradar os patrões.

Naquele tempo, as empregadas domésticas eram quase umas escravas. Não recebiam salário mínimo, décimo terceiro, vale transporte e, muito menos ainda, férias remuneradas. O trabalho doméstico era trocado por “casa, comida e roupa lavada”, além de algumas roupas usadas que ganhavam dos patrões e, quando muito, uma pequena quantia em dinheiro para os gastos pessoais.

Com a morte de Chica, uma prima de Francelino recomendou Raimundinha para substituir a antiga empregada.

Num certo dia pela manhã, Raimundinha, que já havia trabalhado em outras casas de São Luís, apresentou-se para iniciar sua nova jornada de trabalho. Assim que Dona Alice começou a mostrar a casa e orientar quanto aos serviços a serem realizados, Raimundinha decidiu, naquele momento, colocar as coisas no seu devido lugar: Não poderia lavar louça e muito menos roupa, pois o sabão de coco provocaria a quebra das suas unhas… Não iria passar roupa pois o calor do ferro de engomar poderia lhe causar constipação… Varrer a casa, nem pensar! Sua coluna ficaria “imprestável” no dia seguinte…

Dona Alice ouvia atentamente as justificativas de Raimundinha. Embora torcesse a cara e virasse os olhos a cada uma das condições apresentadas, estava se conformando com as exigências da nova empregada pois acreditava que, com o tempo, as duas poderiam se dar muito bem.

Acontece que, da varanda da casa onde estava sentado numa cadeira de embalo, Francelino ouvia aquele diálogo “estranho” com muita atenção. De início, não queria participar, mas, percebendo que as exigências de Raimundinha iam muito além do que seria aceitável, resolveu interferir na conversa.

Francelino Pereira, por ocasião do episódio, devia ter seus já 60 anos bem vividos e era conhecido pelo seu gênio irascível. Autoritário, magro e de baixa estatura, arreliado como poucos, e com um timbre de voz por demais característico, chamou Raimundinha até a varanda onde se encontrava fumando o seu cigarrinho de fumo de corda.

– Minha filha! Disse Francelino, com sua voz fanhosa: – Pelo que ouvi, tu não lavas louça, não lavas e não passas roupa, não varres a casa… Eu te pergunto uma coisa:

– Tu sabes tocar piano?

– Sei não sinhô, seu Francelino.

– Então não serve!!!

Disse ele dando por terminado aquele diálogo surrealista e prestando um grande serviço a Dona Alice.
 

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O estressado

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resiliencia.jpgAtualmente o stress profissional tem sido associado aos profissionais que exercem cargos em grandes empresas, altos executivos e, outros ainda, que desempenham suas funções em ambientes de trabalho onde a cobrança pelo resultado é feita de forma incessante.

Diferentemente do que muitos imaginam, o stress não está restrito apenas a esses profissionais. Muitas outras pessoas, longe do corre-corre das grandes metrópoles e da pressão por resultados, apresentam os mesmos sintomas.

Recordo-me de um conceito aprendido na UnB, chamado resiliência, que trata da capacidade dos corpos em resistirem aos choques e, após a deformação inicial, retornarem à condição original.

Hoje, os psicólogos apoderaram-se da terminologia e classificam como “resiliente” aquele profissional que se recupera e se molda a cada “deformação” (obstáculo) situacional. Ou seja, quem é mais “resiliente” é menos estressado.

Mas como justificar a presença do stress em pessoas que moram no campo, que têm uma vida simples e pacata, sem maiores compromissos com metas pré-estabelecidas?

Na cidade onde nasci, em Pinheiro, no Interior do Maranhão, contam que um padre italiano, ainda atuante nos dias de hoje, decidiu deslocar-se para uma de suas desobrigas, até uma pequena comunidade localizada à margem direita do rio do Turi, denominada Cacau. Para chegar até lá, teve que sair por volta das duas horas da manhã e percorrer uma verdadeira maratona: acordar mais cedo ainda do que de costume, retirar o caminhão da garagem da Casa dos padres, fazer subir na carroceria o cavalo, sem esquecer da sela, arreios, brida, etc… Além de levar consigo o “padre João”, um auxiliar negro, que era o seu guardião e sua sombra. Toda sua paramenta para a cerimônia religiosa já estava separada desde a noite anterior.

Após muita dificuldade, chegou ao povoado do Pimenta por volta das cinco horas da manhã e foi obrigado a fazer o percurso de mais 15 Km até o Cacau, montado em seu cavalo, e demorando mais outras três horas para chegar ao local da missa e do batizado, que haviam sido anunciados e eram esperados por todos com muita ansiedade.
 
Capela abarrotada, sol escaldante, o padre começou a se impacientar, mas cumpriu todo o ritual da missa, pregando a palavra do Senhor para aqueles pobres camponeses. Logo em seguida, iniciou a cerimônia do batizado e teve que se contentar com aquele “chororô” das crianças que nunca haviam visto um padre, muito menos vermelho, de olhos azuis e falando aquela língua esquisita.

Terminada a cerimônia, por volta das onze horas, o missionário já estava se preparando para montar em seu cavalo e fazer o caminho de volta quando avistou ao longe alguém lhe acenando e gritando para que ele esperasse. Era um casal, ela montada em um burrinho, carregando no colo uma criança de uns dois anos e o marido, a pé, com outros dois meninos, de quatro e cinco anos. Todos negros retintos. Aproximaram-se do padre e pediram que ele fizesse o batizado dos três.

O padre negou-se a fazê-lo dizendo que todos sabiam do horário e que eles deveriam ter chegado na capela às 7:00 h e ainda por cima, a missa já havia acabado!

Os pais imploraram que ele reconsiderasse a posição e batizasse os meninos, nem que fosse ali fora mesmo, pois outra oportunidade daquela só no próximo ano…

Mesmo morto de cansado e com vontade de retornar, o padre decidiu, então, improvisar o local para a cerimônia do batismo. Cobriu a sela do cavalo com a toalha branca, tirou do alforge a batina branca e a estola, colocou uma porção de água benta dentro do cálice e perguntou:

– Como é, mesmo, o nome do menino?

– Pedro. Diz a mãe.

– Pedro, pedra, nome do discípulo de Cristo! Bonito nome! Diz o padre, com aquele sotaque italiano carregado. – Eu te batizo, Pedro, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ide em paz, e que o Senhor vos acompanhe.

– O próximo! Pergunta o padre. – Qual o nome do menino?

O pai, respondeu: – Paulo!

– Que belo nome, Paulo!  Também discípulo de Cristo, eu te batizo, Paulo, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ide em paz, e que o Senhor vos acompanhe.

Por último, o padre indagou pelo nome do menorzinho, ao que a mãe respondeu:

– Uóxito.
 
– Washington?!
Espantou-se o padre. – O primeiro, Pedro, discípulo de Jesus, o segundo Paulo, também um de seus seguidores. E por que Washington? Questionou o padre.

– É porque nóis gosta muito da letra “u”….

Ao que o padre, inconformado com a escolha do nome, e irritado ao extremo, respondeu:

– E por que não colocou urubu, que tem três “us”…?

É uma pena que o padre, engenheiro por formação e missionário religioso por vocação, não soube aplicar os conceitos da resiliência como ferramenta de auto-ajuda no controle do seu próprio stress…

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Guia de Arquitetura e Paisagem de São Luís

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guia-para-o-ze-jorge-7.JPGHá cerca de 30 anos, quando comecei a viajar para o exterior, sempre que chegava a alguma cidade, encantava-me com os livros e guias à disposição dos turistas. Na França, daquela época até os dias de hoje, ter em mãos os guias Michelin é segurança garantida para uma boa viagem.

Também de grande utilidade eram os guias da Fodor’s. Mais tarde vieram os outros guias ilustrados, por Países e por Cidades, com uma riqueza de informação sem igual.

Os guias da rede Relais & Chateaux e Relais du Charm complementavam as informações para quem buscasse melhor aproveitar dos encantos que uma viagem proporciona.

Mas, sempre que os via, perguntava a mim mesmo, quando a cidade de São Luis teria o seu próprio guia. Recentemente, a Folha de São Paulo adquiriu os direitos de reprodução e vem publicando belos exemplares sobre os mais importantes destinos turísticos.

Pois bem! Chegou a vez de São Luís.

Foi lançado, em edição bilíngüe, durante esta semana, o Guia de Arquitetura e Paisagem de São Luís.
Graças a um acordo de cooperação celebrado em 2004 entre o Governo Brasileiro e o Governo Espanhol, a Agência Espanhola de Cooperação Internacional, representada pela Junta de Andaluzia, desenvolveu juntamente com a Prefeitura de São Luís do Maranhão esse belo trabalho.

Fruto desse entendimento, apenas as cidades de Potosí, na Bolívia, conhecida pelo seu vasto patrimônio arquitetônico, com destaque especial para a Catedral Gótica e a Casa da Moeda; Havana, em Cuba, com seu Centro histórico repleto de monumentos barrocos e neoclássicos; Morelia, ex Valadollid, no Mexico, com sua rica arquitetura em estilo barroco; a cidade do Panamá, e agora São Luís do Maranhão, podem se orgulhar de disponibilzar para o mundo seus patrimônios arquitetônicos e culturais, suas riquezas e suas histórias.

O Guia de São Luís é um rico documentário sobre a cidade e seus arredores. Destaca a evolução de sua arquitetura, com seu rico acervo colonial e chama a atenção pela sua requintada apresentação, com fotos de Edgar Rocha que, com sua sensibilidade, é capaz de enxergar os feixes de luz que dão vida aos belos casarões de São Luís.

Os textos, elaborados pelas mãos de Valdenira Barros, Phelipe Andrés, Grete Pflueger, José Antonio Lopes, Marluce de Carvalho, Frederico Burnett, entre outros, enriquecem essa obra, que faz inveja a todas as outras capitais brasileiras.

Parabéns!

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Folha de Pindoba

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pindoba-011.jpgDias atrás, estava eu numa sapataria da Rua de Santana quando notei a presença de uma moça que, pelo modo de vestir e falar, deduzi ser uma moradora daqueles povoados bem distantes. Pareceu-me ser a primeira vez que ela visitava uma cidade grande. Olhar curioso, falar manso, com fortes traços indígenas, matuta daquelas bem autênticas, sua expressão facial e o brilho de seus olhos denunciavam o encantamento com tudo que via nas prateleiras da loja.

Queria comprar um par de sapatos para dar de presente a uma filha que ia ser batizada e, ao ser indagada pelo vendedor sobre qual era o “numero” do sapato, ela não soube dizer. Mas, prontamente, abriu a bolsa e lá de dentro sacou um pedaçinho de folha de pindoba que servia de medida do pé da menina, desenrolou e passou às mãos do vendedor.

Faço esse registro, pois o uso da folhinha de pindoba como gabarito de medida, era um costume muito usado nos tempos passados.

Aplicação mais curiosa ainda da folha de pindoba, como padrão de medição, também vem de um personagem do Interior do Maranhão.

Dr. Chico Cunha, médico ginecologista, certa feita consultava uma moça num Posto de Saúde na Mata do Boi, hoje município de Bela Vista. Chamava-se Rosilda. Mãe de 11 filhos (seis meninas e cinco meninos), dois deles nascidos no mesmo ano e formando uma escadinha de 1 a 12 anos. Ela falava sobre as dificuldades para criar essa “ruma de filhos” sendo dona de casa e o marido, um pobre lavrador do mato.

Rosilda vinha pedir ao doutor Chico para ligar as trompas dela, pois eles moravam no “Centro”, sem energia e sem televisão, e que a única diversão que tinham era fazer filhos… Disse ainda ao doutor que ao sair de casa para ir ao Posto de Saúde o marido recomendou:

– Rosilda, já que tu vai fazer essa tal de ligadura, pede pro doutor dá uma apertadinha na “perseguida”.

Antes do preparo da paciente para realizar os exames Rosilda abriu a bolsa, retirou uma folha de pindoba e passou às mãos do Doutor Chico.

– O que é isso dona Rosilda? Perguntou, surpreso, o médico!

– É a medida da “natureza” de meu marido que eu trouxe pro senhor ver.

– Mas pra que que eu quero isso?! Disse Chico Cunha livrando-se da folha de pindoba.

– É pro senhor tirar a medida…

Chico assustou-se com o comprimento da “natureza do marido” de dona Rosilda mas, mesmo assim, indagou?

– Só por curiosidade, dona Rosilda! – Quando a senhora tirou a medida, a “natureza” estava viva ou estava morta?

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Honesto e Corajoso

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passsarinho.jpgLembro-me que, quando menino, cheguei em casa com uma moeda achada no colégio Odorico Mendes, onde estudava. Todo feliz com o achado, contei ao meu pai, que me fez voltar ao local e devolver o dinheiro que não era meu…

Neste final de semana o programa Fantástico, da Rede Globo, destacou a nobre atitude de dona Claudete, proprietária de uma Casa lotérica em Santa Catarina, que buscou a ganhadora de um grande prêmio para devolver-lhe o bilhete vencedor que havia sido jogado no lixo.

Quando, nos dias de hoje, a imprensa transforma em notícia uma atitude honesta tomada por algum cidadão, me faz lembrar de um amigo. Dizia ele que antigamente os pais ensinavam aos filhos o que deveriam fazer ao longo da vida para se manterem íntegros segundo os conceitos de honestidade. Depois chegaria o tempo em que os pais passariam a seus descendentes os ensinamentos daquilo que é correto fazer, mas acrescentariam: não façam dessa maneira, pois serão tachados de tolos, e não prosperarão! Mais tarde, dizia ele, chegaria ainda o tempo em que esses valores iriam mudar e os pais já ensinariam exatamente o contrário…

Nego-me a acreditar que os valores da honestidade chegarão a tal ponto.

Atualmente, a maioria das pessoas abomina a desonestidade, mas muitas delas acham que uma pequena dose de desonestidade nas suas próprias vidas é uma maneira fácil de se dar bem na vida.

Existe um ensinamento chinês que diz: “Se para vencer, estiver em jogo a sua honestidade, perca. Você será sempre um Vencedor”.

Pelos idos de 1960, em São João dos Patos, no Interior do Maranhão, havia uma borracharia bastante conhecida, muito mais devido a seu proprietário do que, propriamente, pela qualidade dos serviços ofertados. Seu dono, Chico Manchão, era um negrinho sapeca de sorriso generoso, dentes brancos como alvaiade e espirituoso como poucos. Um dedo de prosa na borracharia de Chico Manchão era quase uma obrigação diária para meia dúzia de desocupados e fofoqueiros da cidade.

Tinha como hábito, nos dias de domingo, sair pelas redondezas da cidade armado com suas gaiolas e alçapões para caçar pequenos passarinhos.

Num certo domingo ensolarado, Chico retornava da passarinhada lá pelas quatro da tarde, equilibrando-se em sua bicicleta, carregando quatro alçapões onde, dentro deles, curiós e patativas invejavam os demais pássaros que gorjeavam livremente pela mata.

Pedalava por entre os caminhos sinuosos de uma pequena estrada vicinal, tal qual caminho de saúva, quando de repente, foi ofuscado por um facho de luz que quase o fez estatelar-se pelo chão. Desceu da bicicleta e, acostumado a espreitar os pássaros, caminhou pé ante pé em direção à luz. Qual não foi a sua surpresa ao flagrar um casal bem conhecido na cidade, ambos pelados, dentro de uma D-20 prateada.

Assustados com a incômoda presença, os dois começaram rapidamente a se vestir.

Chico Manchão identificou o subgerente do Banco do Brasil que corria em sua direção, ainda afivelando o cinto na calça, metendo a mão no bolso e retirando a carteira:

– Chico! Meu amigo! Falou o alto funcionário do Banco. – Te dou mil cruzeiros pra tu não ter visto nada! Amanhã bem cedo tu passa lá no banco que eu te dou mais mil. Mas… Pelo amor de Deus, Chico, não conta pra ninguém!

– Siô! Dois mil cruzeiros é muito dinheiro pra mim! Mas, fique com seu dinheiro que eu não vou agüentar.

– Mas, não vai agüentar o quê? Indagou o subgerente.

– Eu tô sendo honesto com o senhor! Eu não vou agüentar doutor! A língua vai coçar e eu vou ter que contar…

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Amigo é pra essas coisas…

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chargecandidato.jpgAs eleições se aproximam e os candidatos começam a se mostrar. Alguns já conhecidos, outros nem tanto, porém todos em busca do assento na cadeira de prefeito ou de vereador.

O momento é oportuno para as discussões de temas que interferem na vida de cada cidadão e os postulantes precisam apresentar suas propostas e convencer os eleitores.

A tarefa é bem complexa e o candidato deve vencer inúmeros obstáculos.

Primeiro de tudo, necessita de muita disposição!

Para ser ungido como candidato, o interessado deve costurar suas alianças políticas, passar pelas convenções, elaborar estratégia de campanha, contratar pesquisas de opinião pública para identificar os anseios da comunidade, definir suas propostas e seu discurso e partir para a luta.

Há tempos, recebi um arquivo pela internet e vejo agora a oportunidade de divulgá-lo. Trata-se de um texto escrito por um nordestino de nome Jessiê Quirino, que havia sido sondado para candidato a prefeito de uma cidade lá na Paraíba.

Para os candidatos e especialmente aos meus amigos que estão no páreo, o texto transcrito a seguir poderá auxiliá-los a tomar a melhor decisão:

“Cabra pra ser político no Brasil precisa de no mínimo, minimorum, dos seguintes adjutórios:
Primeiro, começar a juntar dinheiro pra depois, começar a juntar gente.
Desatar “nó cego” de convenção, escutar caqueado dificultoso de partidário que só tem um voto e olhe lá!
Engolir muita rimunheta de cabra falso, filho da puta e pidão.
Prometer como sem falta e faltar como sem dúvida.
Ficar refém da língua do povo, fazer conchavo com reservista da ditadura.
Levar fama de ser corno, baitola e ladrão.
Acompanhar enrolamento de papel de justiça.
Pagar cana pra pingunço desocupado.
Agüentar fazimento de pouco de eleitor embriagado.
Levar fama de ter descabaçado moça donzela.
Gritar “Aleluia!” em igreja de crente, alegrar sessão espírita, assistir meia missa e sair comungado.
Botar no braço menino novo de fundo cagado.
Batizar menino feio e chorão.
Dar de comer do bom e comer porcaria.
Almoçar em lata de goiabada.
Aplaudir discurso disvirgulado, sem rumo e sem ponto final.
Aturar gente furona e desconhecida dentro de casa.
Viver rindo e fumaçando pelo fundo feito ferro de engomar.
Acabar sua Hi-luxizinha na buraqueira.
Aturar babões civis e militares.
Tomar cerveja em copo de plástico, quente e de espuma murcha.
Beber whisky Drurys sem gelo, numa xícara de louça, com tira gosto de canjica.
Entregar taça de campeão pra time safado de ruim.
Chorar em velório de desconhecido.
Escrever bilhete em lápis de ponta quebrada.
Gritar “ô de casa!” em casa vazia.
Farejar poeira de bunda em palanque
Levar “dedada” no “cá pra nós” quando está carregado nos braços do povo.
Escutar destampatório de foguetão no pé do ouvido.
Apertar mão de cotó.
Ganhar abraço fedorento.
Enfiar a mão em saco de dentadura pra distribuir pra mundiça.
Comprar voto em dia de eleição e estelionatar voto em boca de urna.
Levar choque de microfone desencapado.
Cair do palanque e sair todo relado.
Apertar mão de eleitor oportunista.
E depois de eleito começar toda essa camumbebagem tudo de novo!?”

E aí, meu amigo, vai encarar?
Se a resposta for positiva: Boa sorte!

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Um compadre muito esperto

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cumpadiesperto2viaj_048.jpgChegou o auge da estação invernosa e os campos de Pinheiro estão mais belos que nunca. As flores amarelas produzidas pelo “mata-pasto”, aparecendo no horizonte dos campos do rio Pericumã, nos dão a sensação de um grande manto dourado flutuando sobre as águas que teimam em lamber as casas ribeirinhas. As jaçanãs, japeaçocas, marrecas, socós e as garças com sua plumagem branca, enfeitam e dão vida a este cenário de rara beleza.

Contemplando os verdes campos de Pinheiro lembro-me de um fato pitoresco ocorrido na casa de um amigo meu de infância. Seu pai chamava-se Wilson Marinho, e era o dono da fazenda Teresópolis, antiga propriedade da família Gonçalves, portugueses desbravadores a quem devemos muito o desenvolvimento de Pinheiro.

Assentada sobre as terras de Peri-Mirim, do outro lado do campo, a fazenda Teresópolis dominava o horizonte e tinha uma das mais belas vistas de Pinheiro.

Certo dia, bem cedinho, no quintal da Casa grande, seu Wilson estava “dando de comer” aos animais domésticos, que se estranhavam uns aos outros na disputa pelos restos de comida que lhes eram atirados.

Diariamente, as pacas, cotias, patos, galinhas, perus, marrecos, catraios, cabritos, carneiros, porcos, além da revoada de pássaros, aproveitavam a farta alimentação matutina.

Acocorado bem ao lado, descalço e com um surrado chapéu de palha na cabeça, estava Zé Rodilha, compadre de Wilson Marinho.

Atento à movimentação dos bichos, Zé Rodilha botou os olhos numa pequena leitoa branca, toda roliça e lançou a proposta:

– Cumpadi. É muito bicho pra pouca comida! – Me dê essa bichinha pra eu “criar de meia”, que em pouco tempo nóis tem uma fazenda! Apontou ele para a leitoa que disputava com os patos uma tamboeira de milho seco.

Wilson passou a vista pelo terreiro e, vendo que tinha muitas outras leitoas para alimentar, coçou o queixo e concordou:

– Tá bom compadre, leve pra criar pra nós dois. Mas lembre-se, é de meia, hein?!

Zé Rodilha tratou logo de pegar a leitoa, botou a peia, arrumou uma vara, colocou nos ombros e partiu célere no rumo de casa.

Morava nas terras da fazenda e, ao chegar, falou para Rosilda, sua mulher, do negócio que havia feito com o compadre Wilson.

No dia seguinte, bem cedo como de costume, Wilson Marinho levantou-se e, ao abrir as portas de casa, já encontrou Zé Rodilha sentado na calçada.

– Compadre, chegou tão cedo! Por que? E ao observar um cofo ao lado de Zé Rodilha, indagou?

– O que é que o compadre traz dentro desse cofo?

– Meu cumpadi!  Aconteceu uma tragédia hoje de manhã cedo! Me levantei no “cagá dos pinto” pra dar de cumê pra nossa leitoinha e quando botei a “caroeira”   a bichinha se afogou toda, começou a ficar roxinha e a muié gritou:

– Mata logo, Zé! Pro cumpadi Wilson não ficar no prejuízo todo.

– Não tive outra coisa a fazer cumpadi, e com muita pena, mas muita pena, mesmo, tive que sangrar a bichinha… E vim logo cedo lhe trazer a sua metade…

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Os bem-te-vis

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298945-16735-12802.jpgNo final de semana que passou, recebemos alguns amigos aqui em casa para um almoço. Discorria eu sobre as vantagens comparativas de morar em uma casa versus em um apartamento. Sou daqueles que valorizam a natureza a ter que conviver com vizinhos…

Aqui em casa, dizia eu, posso armar uma rede na varanda, ficar lendo meus livros, jornais, escutando música. Posso observar os raios de luz que sangram entre as folhas do pé de sapoti, contemplar o quintal da casa, e os pássaros que ainda teimam em me visitar e me são companhia das mais agradáveis: são rolinhas-fogo-pagou, bando de ciganinhas que aparecem para beber água na piscina, as pipiras pardas, as azuis e até mesmo as de cor vinho com bico branco são presenças permanentes para compartilharem das minhas sapotis e outras frutas que cultivo. As corujas brancas que habitam o coqueiro e as algazarras dos bandos de vin-vins fazem parte, também, do meu viveiro aberto.

Tem até os meus preferidos: dois casais de sabiás, que a cada ano no mês de maio, retornam para fazer os seus ninhos no topo das duas colunas, bem aqui dentro da varanda da casa.

Acompanhar, dia após dia, o incansável trabalho de construção dos dois novos lares é um prazer inigualável. Sou acordado diariamente pelo canto melodioso dos meus amigos sabiás.

E mais, tem ainda os bem-te-vis! Esses, mais numerosos, nos espiam do varal da área de serviço, dão vôos rasantes na piscina para se refrescarem e fazem ninho por toda a parte. Nesse sábado, mostrava aos meus amigos um casal de bem-te-vi que iniciava a construção de um ninho bem na ponta de um galho de um cajazeiro, a três metros do local onde estávamos.

Hoje, uma semana depois, observo que o ninho está pronto, os bem-te-vis se cortejam um ao outro e, em breve, a família estará mais numerosa. Um novo casal encherá de cantos o meu jardim.
E falando em bem-te-vi, faço questão de compartilhar com meus leitores um conto de Cecília Meireles, escrito há 45 anos, sobre os bem-te-vis.

“História de bem-te-vis                                                                                                             
          O ano passado, aqui nas mangueiras dos meus simpáticos vizinhos, apareceu um bem-te-vi caprichoso, muito moderno que se recusava a articular as três sílabas tradicionais do se nome. Limitava-se a gritar: “ … te vi! … te vi!…” com a maior irreverência gramatical. Como dizem que as últimas gerações andam muito rebeldes e novidadeiras, achei natural que também os passarinhos estivessem contagiados pelo novo estilo humano.

       Mas logo a seguir, o mesmo passarinho –  ou seu pai, seu irmão, como posso saber, com a folhagem serrada da mangueira? – animou-se a uma audácia maior. Não quis saber das duas sílabas, e gritava apenas, daqui, dali, invisível e brincalhão: “… vi! …vi!…”  o que me pareceu ainda mais divertido.

       O tempo passou. O bem-te-vi deve ter viajado; talvez seja cosmonauta, talvez tenha voado com o seu time de futebol… afinal tudo pode acontecer com bem-te-vis tão progressistas, que rompem com o canto da família e mudam os lemas dos seus brasões. Talvez tenha sido atacado por esses crioulos fortes que agora saem do mato de repente e disparam sem razão nenhuma contra o primeiro vivente que encontram.

       Mas hoje tornei a ouvir um bem-te-vi cantar. E cantava assim: “Bem-bem-bem… – te vi! ” Pensei: “É uma nova escola poética que se eleva das mangueiras!…” Depois o passarinho mudou. E fez: “Bem-te-te-te… vi!” Tornei a refletir: “Deve ser pequenino e estuda a sua cartilha…” E o passarinho: “Bem-bem-bem-te-te-te-vi-vi-vi…!

       Os ornitólogos devem saber se isso é caso comum ou raro. Eu jamais tinha ouvido coisa igual. Mas as crianças que sabem muito mais do que eu, e vão diretas aos assuntos, ouviram, pensaram e disseram: “Que engraçado! Um bem-te-vi gago!” Então, talvez seja mesmo só gagueira…”

Quanto a mim, fico cá com os meus botões, aguardando como será o canto dos meus novos vizinhos!

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O cofo de farinha.

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ze-cofo-238.jpgNas cidades do interior do estado, as rodoviárias acabam se transformando num grande ponto de encontro além de ser o maior entreposto comercial, onde os produtos manufaturados na zona rural, costumam chegar a cada manhã e são comercializados ali mesmo.

Nestes tempos de inverno é o milho verde, a melancia, a macaxeira, os peixes de água doce e outros tantos produtos frescos que só conseguimos, mesmo, nas pequenas cidades do interior.

Em São João Batista, na Baixada maranhense, terra conhecida como de muita gente “esperta”, certo cidadão, que não quero aqui nomear, acabara de comprar um cofo de farinha d´água e tratou de protegê-lo dos “amigos do alheio”, abrigando-o entre suas pernas.

Falando em cofo, esta é uma das raras palavras que só se encontram nos dicionários maranhenses. Alguém que não seja do Maranhão, por acaso, sabe o que é um cofo?

Pouco provável. O dicionário registra cofo como sendo um artefato utilitário confeccionado artesanalmente, presente na cultura do homem simples do interior do Maranhão. O cofo é uma espécie de paneiro, feito da folha da pindova, palha retirada das palmeiras de babaçu.

Na verdade, cofo é uma das raras palavras de origem francesa que foram incorporadas no nosso vocabulário pelos índios tupinambás e que permaneceu até os dias de hoje.

Quando os franceses viram os índios trançando os cestos de palha, logo exclamaram: couffe, couffe… O que em francês significa cesto. O mesmo que panier, paneiro. Com a evolução da linguagem, couffe acabou virando cofo.

Mas vamos voltar ao nosso amigo da rodoviária.

Um alqueire de farinha é bastante pesado para carregar na cabeça. Ele precisava levá-lo para casa e virou-se para o lado em busca de um carroceiro. Deu um pequeno descuido e quando retornou ao local já encontrou um outro caboclo segurando um cofo de farinha na cabeça parecido com o seu…

Você não viu um paneiro de farinha que estava bem aqui, nesse momento? Perguntou o nosso personagem ao outro caboclo que segurava com as duas mãos o cofo na cabeça.

–  Siô! Aqui só tem gente ladrão! Se a gente “arreia” no chão, nêgo rouba na hora! É por isso que eu não largo o meu…

E para espanto de meu amigo, saiu de fininho, carregando o cofo que acabara de surrupiar.

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Água milagrosa.

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Minha avó Cici dizia que Deus nos deu dois ouvidos e uma boca. Certamente para mais ouvir do que falar.
Desde criança me acostumei a ouvir histórias de “gente grande” com muita atenção. Atualmente, nas reuniões da Academia e nos encontros sociais, sempre que posso, relembro e conto algumas delas que armazenei ao longo da vida.
Quando falta assunto para o meu Blog lanço mão de algumas dessas deliciosas histórias.
Doutor Chico Cunha, médico ginecologista, tão logo se formou, decidiu-se por exercer sua profissão ajudando seus conterrâneos, passando muitos anos trabalhando pelo interior do Maranhão. Bem humorado e espirituoso, Chico sempre trazia casos ocorridos com suas pacientes.
Tempos depois, Chico Cunha acabou retornando a São Luís para exercer sua profissão como médico do Hospital Geral.
Pela sua larga experiência clínica acumulada ao longo de muitos anos de profissão (naquele tempo não existiam aparelhos de ressonância magnética, tomografia computadorizada e tantos outros exames de imagem), nada como uma boa conversa com o paciente para identificar o quadro clínico e facilitar o diagnóstico.
Lembro de um caso em que uma paciente, chamada Constância, consultava sobre certa dor “embaixo da passarinha”.
No ambulatório do Hospital Geral doutor Chico Cunha fazia as perguntas e ouvia atentamente as explicações de dona Constância.
– Mas, me diga o quê que a senhora está sentindo! Indagou Chico Cunha.
– Doutor, de manhã cedo, quando eu me banho, é só eu bazugar a cuia d´água, que do umbigo pra baixo, tudo fica duro (bazugar é um verbo que só existe no dicionário maranhense: o mesmo que jogar, atirar, lançar).
Chico não entendeu direito e perguntou:
– Mas que água é essa?
– Água do poço. Respondeu a paciente.
Chico, logo interessado pela água, perguntou:
– Onde é que fica esse poço, dona Constância?
– Fica lá onde eu moro. No Maracanã. Respondeu a paciente.
Chico se animou todo e começou a imaginar coisas…
– A senhora pode me dar um pouquinho dessa água para eu fazer uma experiência?
Ao que ela confirmou, prometendo trazer um vidrinho quando da próxima consulta.
– Um vidrinho não, dona Constância! Traga logo um litro…
Chico vasculhou a gaveta e encontrou umas amostras grátis que prontamente agradou dona Constância, receitou alguns remédios, marcou a data de retorno e, na saída, relembrou a paciente para não esquecer a água.
Chegando em casa, relatou o caso para o seu cunhado, o deputado Jurandy Leite.
– Chico! Exclamou Jurandy. – Vamos comprar é o poço, rapaz!
Não sei por que o negócio não foi feito, mas o certo é que mais tarde veio o Viagra e acabou o sonho dos dois enriquecerem às custas da água de dona Constância.

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