O audacioso

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rede_o-audacioso2.jpgVez por outra, lanço mão em meus artigos de deliciosas estórias ocorridas em Pinheiro. Muitos de meus leitores se impressionam com o vasto repertório delas e, outros até duvidam que possam ser verídicas.

Mas, que posso fazer, se elas insistem em acontecer? Compartilhar com meus leitores é claro!

Mundiquinha Silva era professora de Geografia. Daquelas que passava a aula toda discorrendo sobre os acidentes geográficos. Descrevia-os com tamanha riqueza de detalhes que nós imaginávamos estar, com ela, percorrendo os mais longínquos rincões deste planeta. Falava rápido. Quase engolia as palavras. Baixinha, magrinha, não levava desaforo para casa.

Certo dia chegou aos ouvidos dela que seu marido estava de caso com “uma nigrinha”. Disseram que o maridão marcava ponto, duas vezes por semana, no Motel Bem-te-vi, com uma jovem estudante do Colégio Pinheirense.

Casada com Bitencourt, há mais de quarenta anos, formavam um casal exemplar na cidade. Freqüentavam as melhores festas, dançavam como poucos (o marido era um verdadeiro pé de valsa) e estavam presentes em todos os eventos sociais de Pinheiro.

Dizem os mais velhos, que Carlos Roberto Bitencourt, era um verdadeiro galã quando jovem. Com mais de 1,80 m, olhos azuis (descendência talvez daqueles franceses que instalaram a Usina Providência na Chapada), Bitencourt estudou em São Luís e cultivava as academias de ginástica da capital. Tinha, quando jovem um físico de atleta.

Mundiquinha pensava que, agora com seus 72 anos, careca e barrigudo, (dizem que a idade esbandalha qualquer coisa…) ele iria se acomodar balançando a pança numa daquelas redes de linha de São Bento. Ledo engano! De repente, Bitencourt ficou alegre. Acordava muito cedo e, assobiando, ia tomar seu banho de cuia na beira do poço. Depois, sentava-se numa cadeira de embalo e ficava na porta da casa, observando todos que iam para feira. Dava conta até do padre que passava, ao raiar do dia, para rezar a missa na igreja de São Benedito.

Um belo dia, o bispo da cidade passou, bem cedinho e cumprimentou-o:

– Bom dia seu Bitencourt! Já acordado a esta hora? Tão cedo! Exclamou o Religioso italiano.

– Hum! Resmungou Bitencourt. Já acordei, fiz barba, tomei café, já caguei e me banhei. E, se tivesse viajado, já tinha voltado…

Mas o fato é que a traição de Bitencourt havia deixado Mundiquinha fora de órbita: Brigou, estrebuchou, expulsou o marido do quarto, ameaçou se separar e foi preciso muita conversa das filhas, das netas, e até de uma prima quase irmã, para que se acalmasse um pouco.

Final de tarde, as cadeiras na porta para aquele tradicional bate papo quando, vez por outra, passava um assobiando:

– Fi, fifiu… Fi, fifiu…

Era o suficiente para Mundiquinha associar os assobios ao nome do Motel Bem-te-vi e a briga recomeçar.

Já havia se passado mais de três meses. Bitencourt, expulso do quarto conjugal, continuava dormindo na rede na varanda da casa, quando ela decidiu ter uma conversa particular com ele, incentivada pelos conselhos da sua prima Cocota:

– Diquinha, tu vais te separar dele?… então pra que essa zanga? Homem é assim mesmo… Isso é coisa passageira… já acabou! Fala com ele… Nada que uma boa conversa não resolva. Insistia Cocota.

O conselho foi aceito e num certo dia, quando ele acabava de tomar o banho matinal, ouviu, do quarto, o chamado de Mundiquinha. Imaginou que a mulher havia “amolecido” e que fariam as pazes.

Veio rápido. Enrolado num roupão branco, com aquela proeminente barriga, mais parecia um beiju de tapioca de goma.

Mundiquinha passou a chave na porta do quarto e disse:

– Escuta bem Bitencourt. Tu deves agradecer a Cocota esta chance que tu vais ter, meu filho. Ela insistiu muito comigo para nós termos esta conversa. – Mas, antes de tudo, Carlos Roberto, (ela só o chamava assim quando queria dar uma dura nele) quero que tu saibas, meu filho, que eu te admiro muito! Tu és um homem muito corajoso Carlos Roberto! Audacioso, mesmo!

Bitencourt já estava se sentindo todo prosa, quando ela continuou:

– Como é que tu, com essa idade, com essa barriga enorme, tens a coragem de tirar a roupa na frente daquela rapariga de 20 anos, com um pintinho deeesse tamanhinho?

Concluiu Mundiquinha gesticulando com o polegar direito apoiado na metade do dedo indicador.

1 comentário para "O audacioso"


  1. José Ramalho de Castro Rodrigues

    Sr. Zé Jorge:

    A nossa baixada tem causos e mais causos. É uma região riquíssima de recursos naturais, bem como de persongens hiláricos e pictorescos. É como se fosse uma grande comédia ao ar livre. É incrível e maravilhoso esses fatos do nosso povo nativo. Quando tiveres oportunidade, caso possível, informe seu e-mail que enviarei alguns causos do município de Bacuri.

    José Ramalho de Castro Rodrigues
    [email protected]
    Func. TCE-MA
    professor de Biologia

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