Chegou o auge da estação invernosa e os campos de Pinheiro estão mais belos que nunca. As flores amarelas produzidas pelo “mata-pasto”, aparecendo no horizonte dos campos do rio Pericumã, nos dão a sensação de um grande manto dourado flutuando sobre as águas que teimam em lamber as casas ribeirinhas. As jaçanãs, japeaçocas, marrecas, socós e as garças com sua plumagem branca, enfeitam e dão vida a este cenário de rara beleza.
Contemplando os verdes campos de Pinheiro lembro-me de um fato pitoresco ocorrido na casa de um amigo meu de infância. Seu pai chamava-se Wilson Marinho, e era o dono da fazenda Teresópolis, antiga propriedade da família Gonçalves, portugueses desbravadores a quem devemos muito o desenvolvimento de Pinheiro.
Assentada sobre as terras de Peri-Mirim, do outro lado do campo, a fazenda Teresópolis dominava o horizonte e tinha uma das mais belas vistas de Pinheiro.
Certo dia, bem cedinho, no quintal da Casa grande, seu Wilson estava “dando de comer” aos animais domésticos, que se estranhavam uns aos outros na disputa pelos restos de comida que lhes eram atirados.
Diariamente, as pacas, cotias, patos, galinhas, perus, marrecos, catraios, cabritos, carneiros, porcos, além da revoada de pássaros, aproveitavam a farta alimentação matutina.
Acocorado bem ao lado, descalço e com um surrado chapéu de palha na cabeça, estava Zé Rodilha, compadre de Wilson Marinho.
Atento à movimentação dos bichos, Zé Rodilha botou os olhos numa pequena leitoa branca, toda roliça e lançou a proposta:
– Cumpadi. É muito bicho pra pouca comida! – Me dê essa bichinha pra eu “criar de meia”, que em pouco tempo nóis tem uma fazenda! Apontou ele para a leitoa que disputava com os patos uma tamboeira de milho seco.
Wilson passou a vista pelo terreiro e, vendo que tinha muitas outras leitoas para alimentar, coçou o queixo e concordou:
– Tá bom compadre, leve pra criar pra nós dois. Mas lembre-se, é de meia, hein?!
Zé Rodilha tratou logo de pegar a leitoa, botou a peia, arrumou uma vara, colocou nos ombros e partiu célere no rumo de casa.
Morava nas terras da fazenda e, ao chegar, falou para Rosilda, sua mulher, do negócio que havia feito com o compadre Wilson.
No dia seguinte, bem cedo como de costume, Wilson Marinho levantou-se e, ao abrir as portas de casa, já encontrou Zé Rodilha sentado na calçada.
– Compadre, chegou tão cedo! Por que? E ao observar um cofo ao lado de Zé Rodilha, indagou?
– O que é que o compadre traz dentro desse cofo?
– Meu cumpadi! Aconteceu uma tragédia hoje de manhã cedo! Me levantei no “cagá dos pinto” pra dar de cumê pra nossa leitoinha e quando botei a “caroeira” a bichinha se afogou toda, começou a ficar roxinha e a muié gritou:
– Mata logo, Zé! Pro cumpadi Wilson não ficar no prejuízo todo.
– Não tive outra coisa a fazer cumpadi, e com muita pena, mas muita pena, mesmo, tive que sangrar a bichinha… E vim logo cedo lhe trazer a sua metade…
Amigo ZÉ, o desprendimento e boa fé do Wison é presente felizmente na grande maioria dos homens, estes, que tal qual o Zé Rodilha usurpam da grandeza maior que deus deu ao homem que é acreditar sempre no próximo, com certeza encontraram um dia um igual a ele. Quantos Zé Rodilha já passaram por nossas vidas, quantos ainda irão passar. Alguem afirmou que se alguem nós engana a primeira vez a culpa é dele, porém a segunda ou terceira a culpa é inteiramente nossa.Para um sabido, um sabido e meio.Parabéns por mais esta aula de escrita.
Zé Jorge,
És muito especial. Portanto só posso registar aqui toda admiração.
Que beleza essa história.Quanto a maravilha das flores amarelas nos campos do rio pericumã, somente nos baxadeiros contemplamos essa maravilha chamada mãe natureza.