HAICKEL: POETA DE IMAGENS
Fiquei muito honrado pela publicação no Caderno Alternativo, do Jornal O Estado do Maranhão, de sábado, dia 31, do artigo abaixo, escrito pelo meu querido amigo e confrade José Neres, sobre a minha pequenina obra literária e cinematográfica.:
HAICKEL: POETA DE IMAGENS
José Neres
(Professor. Membro da AML e da Sobrames/MA)
Há pessoas que parecem ter o poder de multiplicar o próprio tempo e de captar ideias e energias do entorno para transformá-las em trabalho, nos seus mais variados aspectos. Tais figuras geralmente são inquietas e procuram com o olhar (e demais sentidos) algo que possa ser feito para a concretização de seus sonhos e de seus projetos.
Esse perfil pode encaixa-se perfeitamente no modo de ser de diversos homens e mulheres de ontem, hoje e sempre. E, mesmo que traçado em rápidas pinceladas, é possível identificar essas características na figura de Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel, ou simplesmente Joaquim Haickel, como é mais conhecido esse acadêmico, poeta, cronista, contista, cineasta, roteirista e produtor maranhense que tem se dedicado a levar arte e informação a todos os lugares por onde passa e por onde suas obras possam chegar.
A produção artística de Joaquim Haickel é ampla e multifacetada, atingindo não apenas diversos gêneros como também variadas linguagens, com entrecruzamento intersemiótico de textos, sons e imagens. Em muitos momentos, sua obra literária e sua produção cinematográfica se mesclam, como é o caso do conto Pelo Ouvido, que foi adaptado para o cinema dando origem a um curta-metragem homônimo, possivelmente uma das melhores produções de sua autoria.
Uma das facetas mais antigas de Haickel, porém também uma das menos divulgadas atualmente, é a que se refere à poesia. Trabalhando com os versos desde a segunda metade da década de 70 do século XX, o escritor teve várias experiências com a linguagem poética, participou de grupos literários, fundou e dirigiu a Revista Guarnicê e, em 1981, publicou o livro O quinto cavaleiro, além de já haver participado de várias antologias e coletâneas.
A poesia de Joaquim Haickel quase sempre é escrita em primeira pessoa e trazem incrustadas nos versos as marcas de suas vivências. Às vezes, os versos aparecem impregnados de um tom metalinguístico, como é o caso do poema Tatuagem, que traduz poeticamente uma inscrição simbólica desenhada no corpo do poeta. Não são raras as vezes em que o eu lírico demonstra um tom de amargura e de decepção para consigo próprio e algumas pessoas e situações. Contudo, há espaço também para um erotismo entrecotado de mergulhos em uma fria realidade, conforme ocorre no poema Desenho, no qual uma relação amorosa é abruptamente interrompida pela amada, que decide seguir por outros caminhos. Aliás, essa presença/ausência da pessoa amada é uma das marcas dos versos desse poeta ludovicense.
Na prosa de ficção, o escritor optou pelas narrativas curtas em forma de conto. É perceptível o interesse de Joaquim Haickel em burilar seus contos na busca de soluções estéticas que valorizem uma economia de palavras sem prejuízo para o enredo ou para a carga dramática que pode emanar de situações corriqueiras transformadas em pequenas obras de arte. Na concepção do autor de Garrafa de ilusões, todos os acontecimentos cotidianos podem ser vertidos em obra de ficção. Desse modo, uma mulher solitária viciada em colecionar coisas que vão de bonecas e caixas de fósforo até autógrafos de artista e latinhas de refrigerante, despede-se do mundo de modo solitário, como mostra o conto A Colecionadora. De modo análogo, com criatividade e labor com a palavra, a história de um homem que enlouquece após saber que o pai fora assassinado pode ter uma releitura em estilo realista, como ocorre em Início e fim de Mundico Amansa Burro.
Apaixonado pela Sétima Arte, Haickel parece escrever seus contos como se estivesse desenvolvendo um roteiro para um curta-metragem. Essa característica ajuda o leitor a visualizar gestos, expressões, ambientação e até mesmo os caracteres físico das personagens, o que leva o leitor a se sentir mais próximo do texto.
Como cronista, Joaquim Haickel prefere trabalhar as sutilezas do cotidiano, principalmente os intrincados jogos da política. Usando um estilo cotidiano, quase em tom de conversa com o leitor, ele esmiúça o momento político local, brasileiro e internacional, ora arregimentando aplausos por sua aguçada visão do ecossistema político, ora levantando polêmicas e servindo como base para questionamentos de terceiros.
Porém, não obstante ter um percurso de décadas de dedicação à palavra escrita, atualmente o autor de A Ponte é mais lembrado por sua premiada produção cinematográfica e pelo incessante trabalho de resgate e divulgação das fontes audiovisuais no Maranhão.
Sozinho, ou em parcerias, esse cineasta, que é visivelmente influenciado pelo que de melhor há na arte cinematográfica mundial, vem produzindo documentários que tentam trazer ao conhecimento do público em geral figuras injustamente esquecidas, como é o caso do escultor Celso Antônio e de vários escritores, entre eles os fundadores da Academia Maranhense de Letras, instituição da qual faz parte desde 2009.
Entre seus laureados filmes, um dos principais é Pelo Ouvido, uma produção de pouco menos de 18 minutos e que vem carregada de poeticidade e de momentos dramáticos entre um casal apaixonado em uma sólida relação amorosa, mas marcada por conflitos internos. Vale a pena conferir essa obra disponível na internet.
Há muitas outras facetas de Joaquim Haickel que poderiam ser destacadas, inclusive suas atuações políticas que até hoje são relembradas e destacadas até mesmo por seus antigos adversários. De modo geral, seja legislando, produzindo ou escrevendo, Haickel pode sempre ser visto como um artista do verbo e da imagem.