À sombra de um gigante
Numa dessas madrugadas insones, procurando um filme para matar a noite, me deparei com um que havia visto na adolescência, do qual gostei tanto que o incluí na lista de filmes do meu livro inacabado, “365 filmes para não precisar de psicanálise”.
O filme era “À sombra de um gigante”, de 1966. Estrelado por Kirk Douglas, com Senta Berger, Angie Dickinson, John Wayne, Yul Brynner, Frank Sinatra e Topol, e dirigido por Melville Shavelson, um diretor pouco importante.
Aquela madrugada seria cruel para mim. Pelo menos para a parte de mim mais saudosista, mais romântica, mais juvenil, pois ao assistir novamente aquele filme, quase cinquenta anos depois de tê-lo visto, entendi a verdadeira importância que têm o meio e a mensagem, coisas abordadas de maneira exemplar pelo filósofo Marshall McLuhan, e discutidas por quase todos os comunicadores, desde então.
“À sombra de um gigante” conta a história de um coronel, David Daniel “Mickey” Marcus, um judeu não praticante e um militar um tanto insubordinado do Exército dos Estados Unidos, o principal arquiteto das políticas de assuntos civis das forças armadas americanas na Segunda Guerra Mundial, que mais tarde viria a ser o primeiro general de Israel.
O filme trata principalmente da participação de Marcus como conselheiro militar do incipiente exército israelense, antes mesmo da fundação do Estado Judeu.
Em que pese a história, seu contexto, suas causas e consequências serem muito relevantes, um filme de ficção, por menos alavancado que seja em uma figura real, traz ingredientes importantes para sua criação e estruturação.
O caso é que o Joaquim que com 15 anos, por volta de 1975, assistiu “À sombra de um gigante”, num Corujão da Globo, não conseguia, naquela época, ver a qualidade ruim da produção daquele filme. Aquele Joaquim só via o heroísmo, a honra, a nobreza dos personagens daquela história. Só via a mensagem, pois o meio pouco importava, perto de fatos tão significativos.
O Joaquim de 2022, aos 62 anos, tendo assistido tal filme há exatos quarenta e sete anos, ficou extremamente decepcionado, não com o conteúdo, com a mensagem, mas com o meio usado para expressá-la. A produção do filme é muito ruim. Chega mesmo a ser tosca, mas a mensagem continua intacta, mesmo que corroída pelo desgaste natural das comparações que automaticamente são feitas com os acontecimentos dos dias de hoje.
Sobre o final do filme, tive em 2022 a mesma sensação que tive ao vê-lo em 1975. O que mais importa para homens nobres e honrados, não é apenas o que eles fazem ou realizam, mas os exemplos que eles deixam.
Hoje constato que a produção de “À sombra de um gigante” é ruim, porém, ao rever esse filme, meu coração e minha mente se encheram de júbilo.
Naquela madrugada, por um instante parei para comparar aquele filme com a realidade e entendi que o que senti ao assistir novamente aquele filme, quase 50 anos depois, é exatamente o inverso do que tenho sentido ao assistir a propaganda eleitoral na TV. No caso da propaganda eleitoral, a constatação que se tem é que o meio, ou seja, a produção, ficou muito melhor e mais e sofisticada, mas a mensagem, principalmente dos candidatos ao legislativo, empobreceu e piorou de maneira assustadora.
No final a constatação que se tem é a de ser realmente muito difícil fazer sombra a um gigante.