Cinema Brasileiro em Toronto

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Já estive em muitas cidades nesse mundão de meu Deus, mas poucas são tão bonitas quanto Toronto. É uma beleza diferente. Não se parece em nada com o Rio de Janeiro, Paris ou Barcelona, nem com Veneza, Budapeste ou Praga, as mais belas entre as cidades que conheço. Fez-me lembrar de Nova York, um pouco mais de Boston, mas realmente não é como nenhuma delas. Toronto é assim, um lugar que há dentro de nossas cabeças, no nosso inconsciente coletivo, um lugar onde qualquer um de nós gostaria de viver. Não sei se é o lugar perfeito, mas me parece o lugar ideal.

Fui a Toronto participar de um dos importantes festivais de cinema brasileiro fora de nosso país. Foram cinco dias de imersão no cinema brasileiro. Assisti aos melhores longas e curtas metragens brasileiros de 2009 e o meu “Pelo Ouvido” estava entre eles. Senti-me orgulhoso, confesso. Não havia naquela seleção filmes mais ou menos, todos eram ótimos, oriundos do sul do Brasil e um maranhense estava entre eles.

Mas o que quero dizer-lhes é outra coisa. Nada sobre Toronto ou sobre meu filme ou mesmo sobre cinema especificamente. Quero lhes falar das histórias que vi através dos filmes. Gostaria de falar de todos, mas não tenho como fazer isso, não há espaço nem tempo, limites que nos perseguem onde quer que estejamos, façamos o que fizermos.

Espaço e tempo não separaram algumas das histórias desses filmes, as uniram. Refiro-me especificamente à sessão do sábado dia cinco de setembro, dia da raça brasileira. Raça, formada por nativos indígenas amarelos avermelhados, por europeus brancos azulados, invasores e conquistadores e por africanos negros acinzentados escravos.

No dia da raça, em Toronto fizemos uma homenagem a um Brasil forte, mostrando que nosso cinema está em condição de igualdade com os cinemas dos países mais importantes nessa arte, nessa indústria.

O espaço escolhido foi um antigo e maravilhoso cinema de rua. Lembrei do nosso Éden. Até cortina havia.

Em três sessões assistimos três curtas e três longas, sendo sempre um curta antecedendo um longa.

“Enfim Dois” de Thiago Vieira é um corte epistemológico na vida idiossincrática de um jovem casal. Um retrato fiel do dia a dia deles. Coisa que acontece com qualquer um e que se não aconteceu ainda com certeza acontecerá um dia. Grande filme. Depois vimos “Loki – Arnaldo Batista”. Um filme que enquanto documentário sobre o criador do Rock brasileiro, demonstra que se pode tranquilamente, com beleza e competência falar de uma coisa sem que ela seja o foco do assunto. Nesse filme eu chorei. Muito. Ele não fala de outra coisa que não seja de amor. Amor em suas infinitas formas e manifestações. Tenho certeza que o diretor e os produtores desse filme jamais pensaram em fazer algo desse tipo. Isso é coisa que não se planeja fazer, simplesmente se faz e quando se vê, se fez algo único. Loki, ou melhor, Arnaldo Batista, nome que para muitos não diz nada, é uma homenagem ao amor. Não percam e chorem sem vergonha.

Depois disso vimos “Blackout” e “Se nada Mais der Certo”. O primeiro, um curta que se poderia chamar de limão em mão de quem sabe fazer uma maravilhosa limonada. Daniel Resende é um craque formado numa dessas escolas de gênios. De uma história simples, um tanto inverossímil, num cenário que é um depósito, ele nos mostra um filme que nos faz não desgrudar da tela. Cinema feito de técnica. Equação cinematográfica, não tem como dar errado.

“Se nada Mais der Certo” do conceituado diretor José Eduardo Belmonte mostra a relação de três sujeitos que se encontram na curva descendente de suas vidas e armam um pequeno golpe que acaba sendo bem sucedido… Mas, “Se nada Mais der Certo”…

Por fim assistimos o meu “Pelo Ouvido”, que é uma elegia às mulheres e ao seu sentido preferido (?), a audição, contando de forma delicada e poética o amor de Keyt por seu marido Charlie, que ficou cego, surdo e o que para ela é pior, mudo.

E para o final da noite estava reservada outra surpresa. Se havia chorado com Arnaldo ao ver na tela o amor retratado, agora com “Simonal – Ninguém Sabe o Duro que Dei” choraria, mas de raiva pela covardia, pela hipocrisia, pela arrogância, pela burrice das pessoas, de todas, inclusive a minha, a nossa, que estamos acostumados a engolir verdades prontas, confortáveis e cômodas.

Simonal é um filme que como Arnaldo, fala de nós, de nosso país, das gerações das décadas de 60, 70 e até de 80, tempos maravilhosos que só agora começamos a entender e desmistificar.

No filme sobre Simonal não há espaço para o amor, o que se vê é o duro que ele teve que dar na vida, sempre. O seu carisma, o sucesso que ele fazia, como controlava o público, e onde ele foi parar por culpa sua, de seu despreparo, de sua arrogância, de sua ingenuidade, da covardia de seus amigos e principalmente da ação de pessoas que se acreditavam defensores do correto, do bem e enquanto sectários, facciosos, maniqueístas e intolerantes eram também parte integrante do mal.

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Ausências presentes ou presenças ausentes.

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Semana retrasada, em duas ou três ocasiões passei mal durante as sessões da Assembléia Legislativa. Minha pressão bateu em 16 por 10, o que me fez procurar um médico.

O doutor Carlos Gama acredita que ainda não é chegada minha hora, mas como em dezembro vou entrar na casa dos 50, aconselhou-me a começar a fazer algumas concessões: diminuir açúcar e sal, carne vermelha e gorduras saturadas, doces e carboidratos. Em suma, devo começar a ser outra pessoa. Confesso que não será uma tarefa fácil, porque sou viciado em comida, principalmente refrigerante (leia-se Cola Jesus) e pão com alguma coisa dentro, de preferência qualhada e azeitona.

Estou fora de São Luís há uma semana, mas de forma alguma estive ausente. Os meios de comunicação, em que pese o péssimo serviço das operadoras de telefonia, a cada dia nos propiciam viajar e ainda assim estar presente. Estou mais ou menos tão bem informado quanto alguns que não viajaram.

Aproveitaria minha estada em São Paulo para fazer mais alguns exames. Mas aproveitaria principalmente para participar em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Toronto de três festivais de cinema para os quais meu filme “Pelo Ouvido” foi selecionado e nos intervalos aproveitaria para ir aos melhores restaurantes (comer pouco), assistir a ótimas peças de teatro e conviver com alguns dos melhores amigos.

Foram poucos dias, mas parecia uma eternidade. Lembrei-me de meu amigo Paulinho Coelho que nos primeiros dias fora de casa sentia banzo e queria voltar imediatamente. Lembrei-me de outro amigo Paulo, o Nagem, que aprecia mais uma viagem que qualquer coisa nessa vida.

Mas eu não posso dizer que viajei. Como poderia ter feito isso se minha cabeça estava aqui em São Luis: Com minha família; na Assembléia Legislativa, atendendo a todos e resolvendo problemas pelo telefone; na Academia Maranhense de Letras; na Minerva, na confecção de meu livro; em nossas empresas; na Fundação Nagib Haickel; na Mirante; no MAVAM, projeto em parceria com o IPHAN; nos problemas políticos que não se resolvem; na obra de minha casa no Araçagy; nos almoços com os amigos; no basquete das segundas e sextas; nos encontros aos sábados no posto de Dudu e aos domingos na casa de Jomar…

Outra coisa que me dava certeza que poderia até estar fora de São Luís, do Maranhão, mas que continuava em casa. Era o fato de Jacira estar comigo. Isso me faz sentir estar sempre em casa, onde quer que eu esteja.
Nessa viagem reencontrei velhos amigos: Antonio Fagundes e Clarice Abujamra com quem fomos ao teatro e jantamos em deliciosos bistrôs de Higienópolis, onde ela reina e come apenas legumes e verduras. Essa linda mulher, pessoa magnífica a quem eu havia conhecido em Cartagena, no começo do ano, apresentou-me seu pai, João, um paulista de um metro e noventa e um e 91 anos. Homem fascinante.

Reencontrei Lili Coster, assistente de direção em meu filme; Eucir Sousa, o Charlie de “Pelo Ouvido” que está um uma peça engraçadíssima, “Amigas, pero non mucho”, um retrato fiel de um grupo de mulheres de meia idade da maravilhosa São Paulo; Zita Carvalhosa do Kinoforum; Paulo Mendonça, do Canal Brasil; César Cabral, diretor de Dossiê Rebordosa; Francisco Colombo, outro maranhense presente no festival, com o seu “Reverso”; Iza Albuquerque, Darcimeire Coelho, Leda Stopassolli, Surama Castro, meu querido amigo, de quem tanto me orgulho, Allan Kardec Duailibe e principalmente José Louzeiro, a quem eu fiz uma homenagem na apresentação de meu filme no Festival Ibero-Brasil do Rio de Janeiro, onde outro amigo que reencontrei foi o homenageado: Chico Dias, grande ator!

Tive a oportunidade de conhecer muitos curadores de festivais internacionais e a sorte de sentar ao lado da simpática atriz Alice Braga, a quem tratei de dar logo uma cópia de meu filme, na ilusão de que ela o assistindo, goste, e aceite ser a estrela de meu próximo trabalho no cinema.

Mas não, apesar disso tudo, não conseguia me desligar daqui.

Liguei diariamente para saber como iam as coisas e qual não foi a minha surpresa quando soube por minha Ananda que na última quinta, dia 3, o deputado Edivaldo Holanda, justo ele, com quem me alterei antes do mal-estar, três semanas atrás, o mesmo Edivaldo com quem tenho digladiado, ele em ataque incessante ao governo e eu, em defesa. Justamente ele lembrou-se que amanhã, dia 7 de setembro, além de 187 anos da proclamação da Independência do Brasil, fará 16 anos do falecimento de meu pai, o deputado Nagib Haickel, ex-presidente da Assembléia Legislativa do Maranhão, único a morrer no exercício do cargo, representando o Poder Legislativo na festa comemorativa da nossa independência, no município de Coroatá.

Vejam como são as coisas. Apesar de meu adversário, Edivaldo teve o nobre gesto de lembrar e citar meu pai quando faz aniversário a sua morte. Como não respeitar um homem deste?

Vou continuar me opondo aos posicionamentos políticos de Edivaldo, pois não concordo com eles, mas não posso deixar de ver nele um homem de bem.

Gestos nobres como esse me fazem continuar na política. São certezas como essa, de que não importa que discordemos, desde que nos respeitemos, que me fazem não desistir da vida de parlamentar.

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Repercutindo

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Semana passada o Jornalista Marco D’ Eça publicou a matéria abaixo, para a qual eu fiz o comentário que se segue. Acontece que por algum motivo – não acredito que seja censura – meu comentário não foi publicado. Por isso e porque não consigo falar com Marco ao telefone, é que repercuto aqui, em um blog de muito menor audiência, tanto a matéria quanto o comentário, pois acredito que seja importante dar minha opinião. 
 
Bia Venâncio, José Sarney e Sarney Filho…
Sex, 28/08/09  por Marco D’Eca | categoria Geral 

A prefeita de Paço do Lumiar, Bia Venâncio (PDT), esteve hoje com o presidente do Congresso Nacional, senador José Sarney (PMDB), em Brasília.

Na capital, solidarizou-se com o senador e pediu emendas para o município de Paço do Lumiar.

A própria Bia reconhece as críticas que recebe pelo apoio que dá à família e a pressão sectária para se manter na “oposição”.

– Tenho sido alvo de muitas críticas, principalmente pelo meu apoio à família Sarney – lamenta.

Mas não recua e mantêm a relação que sempre cultivou.

– Não me preocupo. Sou mulher de coragem, acredito nesta família, sei dos benefícios e do que já fizeram pelo Maranhão – declara.

A prefeita de Paço do Lumiar esteve no gabinete de Sarney acompanhada do deputado Sarney Filho (PV), a quem sempre apoiou.

O parlamentar afirma que sempre confiou em Bia Venâncio.

– Sei do compromisso da Bia com o a população luminense.  Estamos de mãos dadas com ela neste processo e iremos ajudá-la no projeto de desenvolvimento do município – afirmou.

Bia Venâncio assumiu a Prefeitura de Paço do Lumiar em janeiro. De lá para cá, sempre manteve relacionamento amistoso com a família Sarney.

E nunca escondeu seu apoio ao governo Roseana Sarney (PMDB) desde que este foi iniciado, em abril.

Apoio este agora mais claro do que nunca…

Caro Marco, todos sabem que tenho defendido Zé Sarney intransigentemente. Faço isso porque sei de tudo que há por trás dessa manobra sórdida da grande imprensa nacional, que tenta atingi-lo para enfraquecer a posição do presidente Lula e de sua candidata a sucessão, além de aproveitar a oportunidade para enxovalhar mais um pouquinho o já combalido poder legislativo nacional. Há quem diga, e eu acredito, que boa parte dessa crise tem sido fomentada na tentativa de tentar inviabilizar a implantação da refinaria de petróleo que a Petrobras irá instalar em Bacabeira. Não importa, por um ou por outro motivo defendo Sarney com convicção de que isso tudo é uma grande armação.

Tenho orgulho de dizer que faço parte do grupo liderado por Sarney, que aprendi com ele algumas coisas do que sei e algumas das quais pratico na minha vida como parlamentar. Já disse em outras oportunidades que Sarney não é nenhum santo, ninguém o é, principalmente nesse negocio de política. No entanto não escondo de ninguém que me dou o direito de discordar de quem quer que seja quando assim achar necessário. Agora é uma dessas ocasiões: Não vou dizer que é inadmissível que fatos como esse que você narra nessa matéria, diga-se de passagem, muito bem feita e igualmente bem remunerada pela assessoria de imprensa que você claramente presta a Prefeitura Municipal de Paço do Lumiar. Não, isso é plenamente admissível sim, pois ninguém rejeita apoio. Nenhum político rejeita apoio político, principalmente numa hora como essa. Sarney não poderia fazer diferente. Receber a prefeita Bia (Aroso ou Venâncio?) faz parte da liturgia que Sarney tanto presa. Da minha liturgia faz parte o “jus espeniandi”. Reclamar para que não se diga depois que eu não avisei. Quem avisa amigo é. A prefeita Bia é do PDT, votou em Jackson e até outro dia, dizia coisas bem diferentes do que diz hoje, coisas que não vou reproduzir aqui.

São por fatos como esse que o povão, as pessoas não respeitam os políticos. Eles não conseguem entender como hoje somos de um lado e amanhã já somos de outro “desde criancinha” (coloquei o verbo “ser” na primeira pessoa do plural nesta frase, apenas por uma questão de deboche, para homenagear o grande Emanuel dos Santos Aroso).

Bem Marco, fica aqui o meu protesto. Protesto mais legitimo que o de qualquer um feito aqui em seu prestigiado e prestigioso blog, pois é embasado na coerência que eu tanto busco para minha vida, tanto política quanto pessoal.

Observação: Pouco tempo depois de postar aqui esse material, o Jornalista Marco D’ Eça postou o meu comentário em seu Blog e então passamos e conversar por lá.  Se você se interessar por esse assunto veja-o com mais detalhes no http://colunas.imirante.com/platb/marcosdeca/

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O tempo, o vento e outras coisinhas mais*

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A infância é invenção de adulto esperto e saudoso.

A adolescência foi inventada por algum louco varrido.

A maturidade é invenção de adolescentes ansiosos.

A velhice é coisa da cabeça de crianças velhas ou de velhos que nada aprenderam na vida. 

* Por não ter nada pra dizer sobre outras coisas ou por já estar cansado de dizê-las e repeti-las para quem não deseja ouvi-las, digo apenas isso neste domingo de agosto.

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Um Pedaço de Ponte – Parte VI

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Dando continuidade ao texto “Um Pedaço de Ponte” leia a seguir: 

A Filó do Malaquias

Numa cidade de beira de estrada, perto de um posto rodoviário. 

– Oi, seu Malaquias O senhor por aqui?  Aconteceu alguma coisa?  Há algo que eu possa fazer pelo senhor?

– É, seu Dotô Delegado, eu vou-me-indo! Mas o problema é cum a Felomena, eu acho qui a véia Felomena indoidou. Puxa, Dotô, o sinhô precisava de ver cuma era a Filó quando nova. Dotô! A Fíló tinha os quadri mais bunito de todo o município, e a pele de Filó era toda macia como seda.  Adorava alisar, ela acariciava, acarinhava, e ela gostava, fícava toda trêmula, suas junta estalava toda.

E os zoío, os zoíô da Fíló, ham! Dotô, os zoíô da Filó eram grande com um negro todo especiá.  Ela nunca foi traiçoeira, não.  Nunca foi arisca.

Dotôl Quando me alembro da língua da Filó, fico todo arrepíadiiimmmm, ela gostava de passar a língua no meu gurgumim traseiro, qui assim, na minha nuca.

Eu num posso me esquecê do rebolado dela in ninhum instante.  Ham! Aquele seu rebolado… Era como se calçasse sandálía alta e um vestido justo.  Seu bailado era prefeito, ham!  Meu Deus!!!

– Mas o que aconteceu com Dona Filomena, seu Malaquias?

– Ela tomô dori, Dotô, sumiu que nem deixô rastro.

– Mas ela foi embora e não dísse nada?  Coísa alguma?

– É… uma coisa eu seí, Dotô, ela deu nos pé onte, antes  aquela chuvarada, pois é a única forma de se explícar…

Eu fíco pensando na Filó e começo a ficar com uma vontade… Montar nela, naquele seu corpo macio e gostoso.

– Não se preocupe, seu Malaquias, nós vamos ajudar a achar D. Filó, o senhor não tem idéia de onde ela possa estar?  Um irmão!? Um parente!?

– Não, não.  Ela não tinha ninguém, todos os parente dela tão morto.

– Mesmo assim, vamos achá-la pro senhor.  O senhor deve estar sentindo muito a falta dela, não?

– Sim! Sim! Estou, sim!

– Eu prometo pro senhor, juro pela bênção de Deus, que antes do anoitecer nós vamos achar sua Filó amada, seu Malaquias.

-Assim espero, pois ela não cumeu, deve de tá com muita fome.

–     Dê-me licença um instante seu Malaquias, vou colocar todos os carros na linha para que o senhor possa dar uma descrição mais detalhada da Dona Filomena.

–     Tá bem, Dotô, mas não vai ser muito fácil.

– Atenção, todos os carros, aqui é o delegado Juca. Atenção, senhora desaparecida, seu marido vai dar a descrição dela. 

Pronto, seu Malaquias, pode falar.

– Bem, pessuá, minha Feló é maiada; branca e marrom. Tem chifre curto, é robusta e gorda. É holandesa.  Tem quase uma tonelada. É meiga, sensive. Tenho pressa de encontrá ela.

Ham, sim, ia me esquecendo, ela precisa de um reforço contra aftosa, e também passar bicarbonato de sódio nas tetas que a Claudete feriu em sua última refeição… Claudete é uma bezerra que a mãe morreu e a Fíló coidou dela.

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Nunca é demais repetir…

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Nos meses de março e abril últimos, escrevi textos que foram bastante comentados em todas as esferas políticas de nosso estado.

Entre as coisas que escrevi anteriormente, as que me pareciam mais importantes eram justamente aquelas que diziam respeito à forma de como deveríamos encarar os imensos desafios que naquele momento tínhamos pela frente. Hoje, ainda acredito que se agirmos com eficiência e agilidade ainda possa haver tempo de fazermos algo para minorar alguns desses problemas, tanto os que herdamos das administrações passadas, que são muitos, quanto os que nós mesmos criamos em tão pouco tempo.

Lembro de um discurso que pronunciei na Assembleia Legislativa, no qual fiz uma brincadeira com o nome do ex-governador. Disse que em que pesasse o fato de eu acreditar que o governador Jackson Lago fosse uma homem bem intencionado, seu governo antes de ser LAGO era na verdade um verdadeiro arquipélago, composto por muitas ILHAS. Porções de poder cercado de interesses políticos subalternos por todos os lados. Foi isso que acabou sendo o rápido e desastroso governo do PDT e é exatamente isso que poderá se tornar o atual governo, um governo arquipélago. Deveríamos aprender com a história, principalmente com os exemplos, com os erros dos outros e jamais repeti-los.

Um governo arquipélago é aquele em que cada secretaria ou órgão estadual é uma ilha, algo estanque, separado de todo o resto, onde o secretário ou gestor é o mandatário maior, onde ele, antes de operar a máquina estatal, trata de seus interesses políticos individuais. Onde para trabalhar lá, se precise ser de uma determinada igreja, ser filiado aquele partido, ter um certo sobrenome, ser proveniente de uma região específica ou se comprometa a votar em um certo candidato.

Não sou louco ao ponto de imaginar que um político não pense em sua eleição ou reeleição. Isso nunca! É legítimo que façam isso, mas que façam isso dentro de um critério mínimo de competência, decência, ética e comprometimento com as diretrizes de seu grupo.  

É importante que se diga, até agora, a culpa de tudo isso que está acontecendo não é de modo algum da governadora Roseana. Ela só terá alguma culpa se permitir que esse tipo de coisa continue acontecendo, e se isso persistir, será o fim. Não haverá nenhuma diferença entre o nosso governo e os dois anteriores. Será nesse momento que uma nova força política se apresentará como salvadora do estado e a população descrente, optará pelo novo. Esse filme é antigo, eu não o vi, mas o conheço.

O atual governo teria que ser de reconstrução, de estabilização, de restabelecimento da ordem na administração dos negócios de estado e do estado.

Nós políticos, principalmente os com mandato eletivo, teríamos sim que participar efetivamente da construção desse novo cenário, mas deveríamos antes de tudo termos consciência do que fazer e de como fazê-lo. 

Alertei para que ninguém se jogasse numa busca frenética pela indicação de cargos no governo, pois para cada cargo haveria um perfil correspondente e esse deveria ser minimamente respeitado, pois não vivemos mais o tempo do jabuti trepado. Não há mais espaço para desculpa de enchente ou mão de gente. Ao contrário disso confundimos colocações políticas estratégicas com concessão de empregos a políticos. Existem pessoas no governo que simplesmente ocupam um cargo mas não produzem nada, nem administrativa nem politicamente. Algumas dessas pessoas precisam ser colocadas para trabalhar!? Tudo bem! Mas não necessariamente onde o foram, pois ali atrapalham mais que ajudam. Uma coisa é o cargo, outra é a função que ele representa.

Quem por acaso faz parte da administração direta e executiva do estado deveria ter a consciência de que só lhe é possível estar ali porque há uma estrutura política que o sustentou, que o sustenta e o mantém. Por sua vez, os políticos, de todos os tamanhos e em todos os níveis, têm que ter consciência de seu valor dentro dessa estrutura, mas seria bom que soubessem que esse valor não pode jamais colocar em risco a estabilidade administrativa do governo, nem a paz, a harmonia, a tranquilidade interna de nosso grupo político.

Disse que gostaria de ver vários de meus colegas políticos, com ou sem mandato, participando do governo, mas ressaltei que queria que partisse em primeiro lugar deles e que ainda assim recebam orientação expressa da Governadora Roseana Sarney, de que o cargo que viessem a ocupar não lhes pertenceria, mas sim ao povo do Maranhão, do qual nós somos temporariamente os procuradores. Que tivessem consciência de que deveriam tratar os assuntos administrativos de maneira clara e reta, que os assuntos políticos fossem prioridade, que tivessem preferência desde que não conflitassem com os administrativos, que estivessem de acordo com a legalidade, com a justiça, com a coerência, com o bom senso e principalmente com o interesse público.

Finalizei dizendo que a montagem da base de apoio do governo seria uma obra delicada, que demandaria muita atenção, dedicação e cuidado. Que aqueles que sempre foram conosco teriam que ser tratados com toda deferência e consideração. Quem quisesse vir apoiar que viesse, mas que ficasse claro que a contrapartida desse apoio jamais aconteceria à custa do sacrifício de quem sempre foi leal e companheiro. Isso também não tem sido observado. Velhos, grandes e leais amigos estão se sentindo preteridos.

Tudo isso foi escrito e dito por mim há mais de quatro meses atrás, já prevendo o cenário de hoje. Exatamente porque acredito que o que disse anteriormente continua sendo verdade hoje, nunca é demais repetir.

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Imagens do lodaçal

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Recebi o texto abaixo, o li e por instantes fiquei atônito. As palavras quando bem colocadas tem uma força tão grande que nos faz ir com elas. Se usadas da forma correta o maestro das palavras pode nos fazer dançar ao som de sua sinfonia, nos fazer concordar ou discordar dele se for o caso, pode fazer conosco como faz o títere com seus fantoches.

Leia o texto que me foi enviado e mais abaixo leia a continuação desse texto feita por mim, na tentativa de trazer você de volta da viagem que o jornalista Clóvis Rossi nos proporciona com esse seu texto inteligente, mas caolho, faccioso, sectário, maniqueísta.

Primeira imagem: Luiz Inácio Lula da Silva abraça Fernando Collor de Mello.
Ajuda-memória: Fernando Collor de Mello vem a ser aquele cidadão que, além de ter sido o único presidente afastado do cargo por falta de decoro em um país em que o decoro é artigo raríssimo, pagou a uma mulher para dizer na televisão que seu adversário (justamente Lula, naquele momento) quis obrigá-la a abortar da filha que ambos tiveram (Lurian).
Esse tipo de atitude é tão indecente, indecorosa, delinquencial que desqualifica qualquer pessoa para a vida pública (a rigor, também para a vida privada).
Não é, portanto, passível de perdão. Lula até poderia aceitar o apoio de Collor para fazer parte da maioria governista. Aceitou o apoio de tantos outros desqualificados que, um a mais, um a menos, nem se notaria.
Daí, no entanto, a abraçá-lo publicamente e a elogiá-lo vai uma distância que, percorrida, desqualifica também a vítima de antes.

Segunda imagem, a de ontem: Fernando Collor de Mello cumprimenta José Sarney.
Ajuda-memória: Fernando Collor de Mello vem a ser aquele cidadão que com maior virulência atacou o governo Sarney, a ponto de chamá-lo de ladrão, pelo que jamais pediu desculpas.
Sarney nunca escondeu o profundo rancor que sentia pelo seu desafeto, que, aliás, só se elegeu porque era o mais vociferante crítico de um presidente que batia recordes de impopularidade.
Ao abraçar Collor e aceitá-lo na sua tropa de choque, Sarney implicitamente dá atestado de validade aos ataques do Collor de 1989 e, por extensão, junta-se a ele na lama.
Que Collor, o indecoroso com condenação tramitada em julgado, ressurja com os mesmos tiques e indecências de antes compõe à perfeição o lodaçal putrefato que é a política brasileira.

Estaria tudo certo se algumas imagens antes nós não tivéssemos visto Luis Carlos Prestes fazendo acordo com Getúlio Vargas.
Ajuda-memória: Olga Benário, judia, comunista, mulher de Prestes, grávida de sua única filha, Anita Leocádia, havia sido deportada para a Alemanha Nazista pelo governo Vargas (Felinto Muller) há menos de dois anos. Em 1946, mesmo assim o nosso mais expressivo líder comunista, celebra um grande acordo político do qual sai eleito o senador mais votado do país naquelas eleições. Imagine só que asco, que nojo…

Na verdade nunca senti nem asco nem nojo deste caso. Desde cedo entendi que existem preços que temos que pagar para alcançarmos os objetivos que almejamos. Luis Carlos Prestes foi meu primeiro professor de pragmatismo mesmo que nem tanto dialético, coisa que nada tem a haver com esse maquiavelismo torto que existe por aí.
Existem meios e fins e acreditem, eles não se misturam jamais meu camarada.

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Um Pedaço de Ponte – Parte V

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Dando continuidade ao texto “Um Pedaço de Ponte” leia a seguir: 

A última rolada de Rolando ou último vôo de Zé Curica 

      Rolando era o verdadeiro nome do homem que havia rolado a Ladeira do Comércio, em total estado de embriaguez, numa madrugada, outro dia, mas todos só o conheciam por Zé Curica. Saber seu apelido não ajudou muito a um jornalista recém-chegado a São Luis naquela ocasião, pelo contrário, fiquei mais confuso, não sabia se esse apelido era dado às pessoas que têm as pontas dos pés voltadas para dentro ou para fora.  No estado em que o encontrei não dava pra ter certeza.

Fui ao local e vi o corpo. Mesmo morto ele tinha uma cara muito simpática e parecia estar vindo de uma noitada de farra e divertimento ali pelas das redondezas, 28 e da Palma. Na verdade, soube depois que ele morava lá, na Rua da Palma. Ele, Maria Clara, Euzébla, Cândida, Das Dores, Carmita, Antônia, Zuleide e Karla, ou melhor, Raimundo Carlos Gonçalves da Silva, um veado do primeiro time da ZBM*.

Pelo que tudo indica, Zé Curica era mesmo filho de puta.

Fazia alguns meses e vinte e nove anos que Zé Curica vivia por aquelas velhas ruas de paralelepípedos, por aquelas ladeiras e por aqueles batentes de pedra de cantaria. Por lá todos o conheciam; o português do Lusitano, o “Carcamano” do Ferro de Engomar, uma ou outra mulher da vida, e até o dono do “Jornal Pequeno” dentre outros.

Quem sabe, ou ouviu falar, diz que a mãe dele era uma das meninas da Maroca, e seu pai, salvo engano, era um oficial do navio mercante espanhol “Colombo”, um tal de Gimenez.

Mas voltar 30 anos no tempo é demais. Não deve ter sido muito diferente pra ele sua adolescência, sua infância, sua meninice, da vida que levava até anteontem.

Zé Curica fazia de tudo um pouco, e é lógico que fazia muito melhor quando não estava com umas e outras pela cara.  Era sapateiro, pedreiro, carpina e tudo mais que dava pra ser. Soube que uma vez quase morre ao tentar consertar a instalação elétrica do velho sobrado onde morava, juntamente com aquela penca de mulheres e um veado.

Todo esse circo morava em um picadeiro, ou melhor, num poleiro, num prédio na Rua da Palma.  O aluguel era pago com o suor do rosto de Zé Curica, das pernas, coxas, barrigas, lombos e camas das mulheres.  Até Karla ajudava no que podia.

No mais, tudo era normal: um homem amargurado, meia dúzia de mulheres se vendendo; um veado regendo a sinfonia.

O cenário: as donas com as carnes à vista, o fedor, o lixo, a aparência da cidade para aquelas bandas.  Uma cidade que dormiu um sono sem fim.  Um sonho de passado com cores fostes de esquecimento.

Cada vez mais os dias se aproximam da madrugada de outro dia.

Disseram-me os vizinhos de Zé Curica que, sempre que ele podia, dormia com uma das mulheres que moravam com ele e Karla no prédio do velho Alves.  Vizinhos mais mexeriqueiros disseram que “de vez em quando ele errava de cama e dormia com Karla”.

Havia um caso entre Zuleide, Curica e Karla.  Confirmavam as discussões, taponas, pontapés de todos os lados, puxões de cabelos e arranhões.

Zuleide estava grávida de Zé Curica, e Karla, com ciúme, colocou Racumin no prato dela. Depois, com ajuda das cordas da rede de Zé Curica, a bicha louca se enforcara no mirante do sobrado.

Um assassinato calado com suicídio.

Naquela noite, Curica tinha mais motivo para beber e se divertir que nunca.

Rolando foi rolando. Arrasado, bêbado, começou a cambalear no abrigo da Praça João Lisboa e só parou de rolar na porta do prédio onde funciona a Secretaria de Planejamento, na Rua João Gualberto. Isso aconteceu na madrugada de outro dia.

Ainda há pouco descobri que Zé Curica é o apelido usado para quem tem as pontas dos pés voltados para dentro. E mais, que o apelido de Rolando era Zé Curica, não porque ele tivesse esse defeito físico, mas porque nunca pode comprar um “papagaio” de Zezé Caveira* e usava papel de jornal para preparar suas “curicas”. 

* ZBM – Zona do baixo meretrício

* Zezé Caveira – Maior confeccionador de pipas e papagaios de São Luis

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Conversando com desconhecidos

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Um dos comentaristas do meu blog disse que não admite que eu atribua a exposição pública das vísceras do Senado a uma campanha orquestrada pela imprensa. Imprensa da qual, segundo ele, eu faço parte, trabalhando, aliás, em uma empresa pertencente ao principal acusado nesses escândalos. Por fim, recomenda que eu diminua o tom agressivo das minhas respostas, pois, segundo ele, sou inteligente e a agressividade é a linguagem dos tolos.

Quem realmente me conhece sabe o quanto fiquei à vontade para responder a esse comentário! Comecei respondendo em tom de brincadeira e disse a ele sinceramente que não me considerava uma pessoa agressiva “seu pô… (kkkkk)”. Que não discordava de que em algumas ocasiões eu chegava a ser duro, “bastante duro (kkkkk)”, mas que ele não se preocupasse, isso não acontecia todo dia ”(kkkkk)”.

Depois de achar que já havia descontraído a conversa disse-lhe que deveria alertá-lo sobre alguns equívocos. Que jamais acreditei que as mazelas do Senado fossem criações da imprensa, mas que a exploração facciosa e sectária desse assunto, sim. Imprensa que faz isso a serviço de interesses políticos inconfessáveis. Disse-lhe que não sou jornalista e muito menos empregado de quem quer que seja. Que meu mais forte vínculo com os proprietários da citada empresa não é nem o político nem o comercial, mas sim o vínculo da amizade. Que esse vínculo me obriga, prazerosamente, a jamais ser leviano, fazendo com que eu ceda ao elogio fácil ou à subserviência. Amizade para mim é coisa muito séria que não comporta esse tipo de concessão.

Procurei tranqüilizá-lo dizendo que não acredito de forma alguma que haja santo nesse negócio de política, mas que, no entanto, tenho certeza de que a melhor maneira de se analisar corretamente qualquer assunto não é agindo com sectarismo ou com facciosismo.

O comentarista então replicou dizendo que o Senado foi transformado num cabide de emprego, repleto de maracutaias financeiras e que acredita que o papel da imprensa seja realmente esse. Que em casos como o de agora é preferível pecar por excesso do que por falta. Diz que estabelecer, por meio da justiça, uma censura prévia à imprensa, só aumenta a discussão sobre os fatos. Diz que se há inocentes, que a verdade apareça. Comenta que a ausência da imprensa, cobrando de forma justa e comprometida com a verdade, é que propicia muitas dessas mazelas.

Mais uma vez meu interlocutor fez a minha alegria. Pedi então que ele se colocasse no lugar de alguém que se sinta impedido de ter acesso àquilo que a lei garante a todo cidadão. A ampla defesa. Pedi que ele se colocasse na iminência de ver um direito seu sucumbir frente a um direito menor. Um direito que fere de morte o sagrado direito à ampla defesa. Disse-lhe que se isso acontecesse com ele, ele não acharia correto e que procuraria a justiça para proteger o seu direito fundamental, que estaria sendo vilipendiado e que eu me colocaria intransigentemente ao seu lado.

Ao contrário do que disse ele, a inocência não tem que ser provada. É a culpa que deve ser provada. O ônus de provar essa culpa cabe a quem acusa e para tanto não deve nem pode, por lei, criar factóides, através vazamentos de interceptações telefônicas, de partes dos inquéritos ou dos processos. Não pode montar um processo, um inquérito, um julgamento respaldado nas manchetes dos jornais, das revistas, nas chamadas dos jornais das emissoras de televisão ou de rádio.

Todos são inocentes até que se prove o contrário. É isso que prevê o bom e o justo direito, a boa e a justa lei. Agora, convenhamos, ter que se provar a inocência tendo que se enfrentar uma maciça e ampla campanha midiática, que tem como único intuito o de condenar previamente, moral e politicamente o arrolado!? Isso não é o que se possa chamar liberdade de imprensa e muito menos de estado de direito!

Não estou aqui simplesmente defendendo A, B ou C, defendo o que acho que seja o certo, para mim e para todos. Fazendo isso fico tranqüilo com minha consciência. É a defesa do amplo e do geral que me permite defender o particular e o objetivo, não o contrário. O direito individual está inserido indissociavelmente no direito coletivo e é conseqüência direta deste.

Cedo aprendi que devemos antes de tudo saber escolher quais são as causas que devemos defender, quais batalhas devemos lutar, isso para que não acabemos por lutar nas guerras dos outros, nem como mercenários nem como bucha de canhão.

Um dos aspectos mais fortes de um estado democrático de direito é exatamente esse, saber conviver com as diferenças sem querer-se simplesmente exterminar as discordâncias.

A palavra liberdade não pode ser usada jamais sem a sua complementar necessária e indispensável: Responsabilidade. Não existe liberdade sem responsabilidade. A liberdade dos irresponsáveis é a mesma que a dos tolos, dos sectários, dos escravos de todas as espécies.

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Um Pedaço de Ponte – Parte IV

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Dando continuidade ao texto “Um Pedaço de Ponte” leia a seguir:

Incêndios na Pensão Elite
         
          As labaredas iam a uns quinze metros e chegavam até ao teto da Distribuidora de Cereais do Maranhão, prédio colonial de três andares.

O fogo queimava com fúria as sacas de açúcar, de trigo, de arroz de Bom Jardim e de feijão de São João dos Patos. O milho pipocava.

Segundo testemunhas, começou no pátio interno, num depósito de casca de arroz, e se alastrou pelo prédio, até atingir um reservatório de óleo de babaçu e um quarto cheio de sacaria vazia.

Alguém comentou que o incêndio teria sido provocado pelos proprietários da firma, que se encontravam em sérias dificuldades econômicas.

Para os mais velhos e experientes, o incêndio foi causado pelo fogo de Helena: uma bela loura vinda de Marselha no começo dos anos trinta, quando apenas começavam seus vinte anos.

Helena foi trazida da França por Casimiro, dono da conceituada pensão Elite, que fora à Europa buscar mulheres para bem atender seus fregueses.

Casimiro já havia ido à Espanha, Portugal e até mesmo a Paris, mas iria a Marselha pegar o navio “Colombo” para voltar a São Luís.  Numa das docas do porto, sentada numa barrica, Casimiro avistou uma jovem com ar virginal e jeitinho meigo.
Tempos depois Helena era a sensação da Pensão Elite, em São Luis do Maranhão, onde destroçava e apaixonava a todos os homens que pelo menos lhe colocassem as vistas.  Também era conhecida por Senhorita de Guillon por seus eternos apaixonados, “ébrios de amor”.

Seu Francisco Carvalho, o “Carvalhínho”, era um desses apaixonados que nunca, e em tempo algum, conseguiria um beijo sequer da doce e meiga Srta.  de Guillon.  Quando muito, conseguia um olhar carinhoso e inocente, com meiguice e pureza, mas com total desinteresse.

Carvalhinho, “pra falar a verdade”, nunca viu ninguém, ou pelo menos ouviu falar em alguém que houvesse conseguido concretizar o amor com Helena, musa não só sua, mas de todos.

“Havia um mistério cercando aquela moça…” Carvalhinho falava, a intriga e o mistério invadiam nossos corpos pelos ouvidos.  “Nem mesmo Casimiro a tocava” Nunca se entregou a um dos seus apaixonados.

Nem mesmo as outras mulheres eram muito chegadas a Srta. de Guillon, e tudo dela era separado e importado de Paris.

Não durou muito o reinado de Helena, pois numa noite de chuva, relâmpagos e trovões, ela saiu até a sacada de seu quarto e colocou-se ao banho da madrugada. Isso aconteceu há cinqüenta anos, mas ainda hoje arde em Carvalhinho, ainda queima nos freqüentadores da velha Pensão Elite.

Ontem, olhando o fogo consumir, mais uma vez, a antiga Pensão, Carvalhinho lembrava e elucidava para nós o mistério Srta. de Guillon: “… Ali, meu jovem, um dos mais belos espécimes femininos que eu já vi teve seu corpo chamuscado e torrado por um raio. Entre os farrapos queimados de seu vestido, órgãos masculinos contrastando com belos e macios seios, queimados, é verdade, mas belos. órgãos masculinos contrastando com a falta de pêlos no rosto e nas pernas; com a cintura bem feita; com os quadris formosos e com os lábios que eram rubros e suculentos, agora inertes e frios”.

Aquela maravilha de mulher era um homem, vítima de um erro da natureza.  Mulher de cabelos, seios, quadris, rosto, lábios, mulher de alma e de quase todo o corpo.

Para Carvalhinho, aquele novo incêndio era o fogo da Srta. Helena de Guillon que ainda ardia nas paredes, nos corredores, nas salas, em todo aquele prédio.

O prédio queimou durante 36 horas.

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