EM 02.10.2009
Meu nome é Joaquim. Mas eu também me chamo Nagib, e é o meu duplo – ou antes, é aquele de quem sou duplo – é o meu pai Nagib Haickel a quem primeiro contemplo neste salão, esperando por mim, sentado ali, na fila da frente, entre aquelas duas mulheres maravilhosas: minha mãe, Clarice, e minha filha Laila. O presidente desta cerimônia autoriza meu discurso de posse na Academia Maranhense de Letras. Eu me levanto. Meu pai não se contém: antes que eu chegue à tribuna, ele já está de pé, aqui, diante de mim. Eu ainda não começo a falar, e o velho me arrebata a palavra, dedo em riste, enchendo o mundo com o seu vozeirão:
– Só porque tu escreves umas coisinhas por aí tu acha que é escritor, é? Tu acha que é poeta? Poeta coisa nenhuma! Tu nem bebe! Poeta é Zé Chagas, poeta é Nauro, que metem grogue. Escritor é Jomar, que aprecia as cervejas louras e as mulheres morenas. Tu nem sabe o que é bebida, rapaz! Como é que tu pretende saber o que é poesia?
Neste recinto solene, senhores acadêmicos, minhas senhoras e meus senhoras, aquele que orgulhosamente se intitulava um “caboclo do Pindaré, acostumado a comer tapiaca e mandubé” repete uma repreensão das mais severas que dele recebi. O caso foi há muito tempo: eram os idos de 1984. Ele andava aborrecido com o fato de eu preferir ficar fazendo a revista Guarnicê, ao invés de tomar conta dos negócios da família. Sua fúria transbordou, quando eu e Paulinho Coelho nos esquecemos de fechar o registro geral da água, no velho depósito de cimento que Nagib Haickel tinha pelas bandas do Desterro. Depósito inundado, cimento molhado, prejuízo contabilizado.
Como todo mundo sabe, meu pai não fazia por menos em termos de emoção e muitas vezes se obrigava ao papel de ator em lances cheios de dramaticidade. Na verdade, porém, ele estaria felicíssimo neste momento, rindo em seu próprio íntimo, com o bom humor que lhe fez a fama, e saboreando dentro de si o contentamento de perder a parada para o filho:
– Esse menino chegou mais longe do que eu podia imaginar. Para quem tinha extrema dificuldade em ler, para quem não sossegava um só instante, o lucro foi grande. Pois não é que ele conseguiu enganar a todos esses acadêmicos, gente culta e instruída?
Era assim que meu pai fingia que pensava, mas não era assim que ele pensava, de fato. O seu orgulho só encontraria repique no júbilo deste seu duplo, aceito membro da Academia Maranhense de Letras, acolhido por figuras da envergadura do Presidente José Sarney, amigos dele que foram professores de seu filho, como José Maria Ramos Martins, Alberto Tavares, José Joaquim Ramos Filgueiras, José Carlos Sousa Silva e Sebastião Moreira Duarte. Ele também se sentiria em casa, ao contabilizar o número de velhos amigos seus da Assembléia Legislativa e da Câmara dos Deputados, com quem seu filho irá conviver, como Benedito Buzar, Sálvio Dino, Evandro Sarney, Joaquim Itapary, Neiva Moreira e Edison Vidigal. Com toda certeza, Nagib Haickel brincaria com seu querido amigo Milson Coutinho e com o também desembargador Lourival Serejo, recomendando-lhes que tomem conta desse “menino”, sentindo-se também envaidecido de ver seu filho compartilhar a mesa com amigos dele como Ubiratan Teixeira, Carlos Gaspar, Hélio Maranhão, Mont’Alverne Frota, Carlos de Lima, Américo Azevedo, Ivan Sarney, Waldemiro Viana, Laura Amélia e Manuel Lopes. Não sei ao certo se ele teve o prazer de conhecer José Louzeiro, Lino Moreira, Sônia Almeida, Joaquim Campelo, Antônio Martins, Clóvis Sena, Ceres e Ronaldo Costa Fernandes, Alex Brasil, Magson da Silva, José Ewerton e Ney Bello Filho, uns porque cedo foram morar fora do Maranhão, outros porque, sendo de outra geração e de outro meio, não tiveram contato com ele. Em especial, quando visse aqui José Chagas e Jomar Moraes, contra os quais me comparou em total desvantagem minha, Nagibão sorriria desconcertado, franziria a testa, morderia os lábios, choraria miudinho e escondido: tamanha é a glória desses nomes, que dela, por simples contágio, algum tanto sobrará para seu filho.
Minhas senhoras e senhores:
A Cadeira que, a partir de hoje, chamarei minha na Academia Maranhense de Letras é de Inácio Xavier de Carvalho e Ribamar Pereira, e pertenceu sucessivamente a Luiz Viana, Amaral Raposo e Nascimento Morais Filho.
Inácio Xavier de Carvalho, nascido em 1871, deixa dúvida se era apenas uma pessoa. Nesta Casa foi fundador e é patrono. Ao mesmo tempo e por igual, é do Maranhão, é do Amazonas e é do Pará. Andou ainda por Minas Gerais, e encontrou, por fim, a imortalidade no Rio de Janeiro, em 1944, próximo de completar 73 anos de idade. Formado em Direito pelo Recife, em 1893, exerceu-se como magistrado, jornalista, poeta, professor de Literatura. Pelo que, de sua lavra, se sabe esparso em periódicos e publicações circunstanciais, será correta a conjectura de que ainda falta reunir escritos seus deixados nesta sua cidade natal, assim como em Manaus, onde se demorou pouco, e em Belém, onde permaneceu por mais tempo.
Sua obra compõe-se de apenas três títulos, que a poucas páginas se estendem: Frutos selvagens, Missas negras e Parábolas para bolas. Frutos selvagens é de São Luís, Missas negras é de Manaus, Parábolas para bolas é de Belém.
Frutos selvagens é de São Luís, 1894: “um dos poucos resultados positivos da época de efervescência vivida [aqui] entre fins do século XIX e princípios do século seguinte” – segundo avaliação de Jomar Moraes.[1]
Parábolas para bolas é do Pará, 1919, e é logo aqui arrolado, por suas características, que não nos ocupam em maior análise. Não se trata de livro em sentido próprio: é apenas um folheto de 32 páginas, composto de seis pequenas narrativas alegóricas, cinco sonetos e uma ode a Rui Barbosa (recitada pelo autor, num comício em Belém, por ocasião da campanha civilista daquele candidato à Presidência da República), textos a que só a ironia e o desapontamento com a política conferem sentido de unidade.
Missas negras é de Manaus, 1902, e constitui, desta vez, não apenas o que de melhor escreveu o poeta Inácio Xavier de Carvalho, mas também uma fotografia das mais vivas de uma época em transição, de intervalência e sobreposição de estéticas, de esgotamento e ânsia sem rumos, tempo de maré vazante, à espera da sigízia que, entre nós, por amor de nosso isolamento, tardaria por bem ainda meio século, até a geração de Tribuzi e Gullar. Xavier de Carvalho realiza obra de mimetismo tardio, não só em relação às matrizes francesas em que se inspira, mas em face ao simbolismo retardatário de portugueses e brasileiros. Os 37 poemas que fazem as suas “Missas Negras sem hóstias e sem vinho” povoam-se de Revoltas Supremas, Crenças Apagadas, Risos Pretos, Pecados Brancos, Alvas Grinaldas, Mágoas, Quimeras, Desventuras, “bando esquelético de Crenças”, “Sonho nu de Descrente”, Estranhas Rotas, Másculas Derrotas – substantivos e adjetivos todos em maiúsculas, conforme exigia o tributo da importação provinciana a que o Poeta se obrigava. O título Missas negras lembra o de Missal, de Cruz e Sousa, poema (em prosa) de nove anos antes, e aparece quando já mortos o próprio Cruz e Sousa, Mallarmé, Antônio Nobre e Verlaine. Mas, em que pese a essa nota de rebate epigônico, nem por isso deixou Inácio Xavier de Carvalho de pagar sua conta pela luz com que pretendeu iluminar a “tristíssima e caliginosa noite” – como lhe chamou Antônio Lobo – na qual “o Maranhão ressonava […] num fundo sono, próximo da morte”, conforme o viu e sentiu Humberto de Campos. Até a mais afinada inteligência que por então nos restava, o mesmo Antônio Lobo, não o compreendeu, tanto quanto é verdade que a inteligência brasileira – Machado de Assis incluído – não fez boa recepção à literatura representada pela aluvião finissecular de nossos pós-românticos, simbolistas, impressionistas, decadentistas. Em carta escrita, em 1908, ao jornalista Sebastião Sampaio e a qual deu muito o que falar, eis em que termos o Mestre maranhense exara a sua crítica a Missas negras: “[…] livro filiado à corrente simbolista, tal como andou em geral compreendida e praticada no Brasil, isto é: consistindo quase que essencialmente no culto exagerado do disparate, na idéia e na forma. E foi exatamente essa preocupação de escola que, a meu ver, prejudicou sensivelmente o trabalho do poeta, sem dúvida alguma, de produzir obra muito mais valiosa, se em tempo se houvesse libertado dos esterilizantes empecilhos que tal preocupação irresistivelmente lhe opôs à elaboração estética”.
A bem de Antônio Lobo, o mais vigilante e atualizado de nossos intelectuais, diga-se que sua percepção de literatura pautava-se, como a de qualquer um naqueles tempos, pelo figurino francês, mas não absorvia os padrões renovadores sugeridos, da mesma França, já desde as Flores do mal, de Baudelaire. A mal de seu temperamento enfermiço, para quem a polêmica constituía uma espécie de compulsão erógena, leve-se em conta que sua apreciação sobre Inácio Xavier de Carvalho se faz em clima de mútua desavença, veiculada pelos jornais Pacotilha, O Maranhão e Diário do Maranhão, da capital maranhense, e engatilhada pela Folha do Norte, de Belém do Pará, conforme nos diz Carlos Gaspar em trabalho recém-publicado sobre Antônio Lobo.
A contenda ocorreu no ano de 1907 e teve como causa imediata a chegada, a São Luís, do jornalista fluminense Rafael Pinheiro, vindo do Pará para aqui fazer conferências sobre assuntos variados. Antecipou-o, no entanto, a notícia de seus desentendimentos com homens de letras do Estado vizinho, fato bastante para deixar de sobreaviso os intelectuais desta terra, e mais ainda, na percepção de alguns, porque seria Antônio Lobo quem lhe daria as boas-vindas e o apresentaria aos maranhenses. Sobre uma conferência, programada com pompa e circunstância para ser pronunciada no Teatro local, com a presença do governador Benedito Leite, Agostinho Reis, redator da Pacotilha, informa ao jornal de Belém que alguns bilhetes de entrada haviam sido distribuídos gratuitamente, com a finalidade de preencher cadeiras vazias no salão do evento.
Os efeitos da notícia, desfavoráveis ao visitante e a seu anfitrião, foram glosados por Inácio Xavier de Carvalho, editorialista d’O Maranhão e propiciam fazer-se um close sobre o cotidiano das duas figuras envolvidas na querela, de seus pequenos interesses e da vida pequena de São Luís, naquela primeira década do século XX, e bem assim sobre o que, de literatura, se criava nesta Província naqueles tempos.
O autor das Missas negras – diz Antônio Lobo – “tem um talento especial para troçar e descompor em verso. Mas também é só: tirando isso, o rapazinho [o tal “rapazinho” contava já 36 anos de idade] é de uma imperícia de fazer dó, quer se exprima em linguagem métrica, quer não. […] Na prosa é o mesmo descalabro e a mesma lástima. Se o moço se quer exprimir em linguagem sem metro e sem rima, ou é para se dar ao desfrute ou para dizer tolices. […].
“Ora, Sr. Antônio Lobo! Que pretensão a sua!” – a de um “espírito nulo e acanhado”, […] “coréico ou paranóico, […] um doente físico, […], o quanto basta para torná-lo irresponsável pelo que diz e escreve”. Xavier de Carvalho nega a crítica de seu oponente, lembrando que Guerra Junqueiro o saudou como “camarada literário” e que sua poesia foi recebida amigavelmente no mundo das letras por José Veríssimo, Artur Azevedo, Medeiros Albuquerque, etc.
Interessante para bem retratar o espírito da época é perderem ambos tempo e papel em agressão recíproca, a propósito de um terceto de Missas negras, em que o verbo ladrar é usado como transitivo direto:
E em complemento após da Glória Tua
Ficarás lá por cima como a Lua
E eles embaixo como o cão que a Ladra!
Antônio Lobo, escritor da velha cepa, não percebeu que a transgressão à regência verbal é o que enriquece e dá força ao verso de seu adversário. Dois anos depois dessa polêmica, ele ainda reafirma a mesma incompreensão da estética simbolista e, sobre a poesia de Inácio Xavier de Carvalho, emite a mesma opinião expressa a Sebastião Sampaio: “I. Xavier de Carvalho” – são suas palavras em Os novos atenienses – “é, incontestavelmente, uma organização poética de primeira ordem. De um alto poder de idealização e de expressão estética, sabe, aos seus temas emotivos, aplicar com maestria todos os recursos técnicos da sua arte. A única falha que teríamos a lamentar na sua obra, se acaso aqui tentássemos exercer a crítica, seria exatamente o malbarato de tão belos requisitos artísticos, no cultivo do verso simbolista, tal como andou compreendido pelos sibilinos e intraduzíveis decadistas franceses e pelos seus dignos imitadores brasileiros”. (p. 60).
Na verdade, o que há para se lamentar em Xavier de Carvalho é que ele tenha chegado tarde e repetitivo, o que, só por isso, não implica em inferioridade literária. Sonetista exímio, algumas de suas criações mereceriam acolhida franca em qualquer antologia da língua vernácula. Sua poesia revela uma tentativa de introspecção que transcende ao seu próprio eu, para desvelar a alma humana em angústia universal. Os tempos que se anunciam serão de Freud, Joyce, Pound, Proust. Inácio Xavier de Carvalho tem o pressentimento da mudança. Poderemos dizer não apenas que sua obra, mínima, ficou pelo meio do caminho, mas que ele é todo um meio de caminho. Epígono por um lado, é mal e mal percebido como o prógono que poderia ter sido: culpa da Província que tardou tanto em abrir os sentidos para os paradigmas da modernidade.
De fundador da Academia e titular da Cadeira nº 9, Inácio Xavier de Carvalho foi transformado em patrono da Cadeira nº 37, fundada por José de Ribamar dos Santos Pereira.
Não podendo encarnar-me na voz do barítono que foi Ribamar Pereira, para aqui solfejar as 217 poesias que, segundo Mário Meireles, deixou musicadas o primeiro ocupante da Cadeira 37 – algumas inclusive traduzidas para o francês, o espanhol e o italiano – eu me desculparei por lhe fazer apenas rápido aceno biobibliográfico:
Nascido em São Luís em 17 de setembro de 1898, estudou primeiras letras no famoso Instituto Rosa Nina. Poeta, jornalista, teatrólogo, orador. Bacharel em Direito pelo Pará, foi assistente judiciário do Proletariado e 1º promotor Público da Capital, no Maranhão; consultor jurídico da Caixa de Aposentadorias e Pensões de Serviços Públicos dos Estados do Piauí e Maranhão. Representante, no Maranhão, da Casa dos Artistas, da Associação do Teatro Nacional e da Associação de Cronistas de Arte. Colaborou assiduamente na imprensa de São Luís e do Acre, Belém (Folha do Norte), Fortaleza, Recife (Jornal Pequeno), Bahia (A Tarde), São Paulo, Amazonas e Rio de Janeiro. Foi professor Catedrático da Academia de Comércio do Maranhão, da Escola de Agronomia do Maranhão, da Faculdade de Direito do Maranhão e de outros estabelecimentos secundários em São Luís. Membro, também, do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão. Faleceu a 23 de abril de 1959.
Sobre Luiz Viana, muito não direi, para não me arriscar a cometer erros perante familiares e parentes seus, que ainda agora nos circundam. Nascido a 29 de setembro de 1889, duas ilustres casas de São Bento entroncam-se em seu nome: a dos Lobatos e a dos Vianas. De rápidos apontamentos biográficos que dele colhemos, entende-se que foi excelente em tudo: como estudante, professor, médico, jornalista, educador, homem de letras, cientista, administrador público. A esse respeito, façamos leitura das palavras de quem o conheceu e sucedeu nesta Casa: “Se quisermos definir, com justiça e justeza, a vida científica, a vida literária de Luiz Viana” – fala Amaral Raposo – “cumpre-nos afirmar haver sido ele um pêndulo de ouro, oscilando sem hiatos e sem pausas, durante mais de meio século, entre a paixão absorvente do estudo e o fanatismo incessante do ensino.
“Mais do que tudo, ele foi mestre. Mestre consumado em nossa língua, foi, igualmente, em italiano, em francês, em inglês e alemão, tal como atestam quantos mais íntima e frequentemente o conheceram.”[2]
Quanto ao perfil humano daquele meu antecessor, nada melhor que recolher o testemunho de quem faz, na vida acadêmica, a sequência da linhagem humana e intelectual de Luiz Viana: “De tio Luís – diz o romancista Waldemiro Viana – me fica na memória um retrato paradoxal: enquanto meu pai e seu irmão mais novo, Fernando Viana, me falava do seu extremo rigor (ao ajudar meu avô na educação dos cinco irmãos), na condição de primogênito, a calar os mais novos ante um simples franzir de cenho, eu, que já o conheci no ocaso de sua vida, guardo dele a lembrança de um doce velhinho, extremamente culto, a dar-nos, bonachão, qualquer explicação sobre qualquer assunto, cuja dificuldade desaparecia face à aula ministrada.
“As disciplinas de sua predileção eram Português e História Natural. A esse respeito, por sinal, lembro de uma entrevista que concedeu à TV Difusora (a única, àquela época), por ocasião de sua posse na Cadeira 37 da Academia Maranhense de Letras. Perguntado sobre o porquê dessa preferência, respondeu, orgulhoso: “História Natural, por natural propensão; Português, por ser maranhense“.
“Iniciou suas atividades literárias com o livro de crônicas lançado no Rio, O Dia, do qual não tenho quaisquer notícias. Foi articulista de vários periódicos maranhenses, em destaque o jornal Pacotilha, do qual chegou mesmo à direção.
“Poeta esparso, deixou uns quantos sonetos, de lavra rebuscada e métrica perfeita. Tive oportunidade de ler-lhe uns contos eróticos, ainda na flor da idade, aos doze, treze anos, que me serviram como incremento para fantasias de toalete.
Sucedeu-o Amaral Raposo, “um dos últimos abencerragens que enfrentam com denodo os sarrabulheiros do idioma […]. Enfant terrible… garoto levado da breca… Fascinado, desde jovem, pela grandeza do estilo ruibarboseano, tudo o que lhe tem saído da pena irrequieta e candente reflete, tem refletido sempre a influência do grande baiano” – é o que dele afirma Fernando Viana, que lhe deu as boas-vindas na Cadeira 37 desta Casa.
E é, outra vez, ao filho de Fernando Viana, a quem mais uma vez invoco, para falar da figura humana que fez companhia inesquecível a muitos dos presentes, mas a quem, por um lapso de geração, não cheguei a conhecer:
Depõe Waldemiro Viana: “A desenxabida revista de origem americana Seleções do Reader’s Digest, de leitura quase obrigatória em certa fase da vida de todos nós, sessentões, trazia um quadro fixo intitulado Meu Tipo Inesquecível, onde um escritor qualquer escrevia sobre alguém que o impressionara sobremaneira.
“Se eu tivesse que escrever nessa seção, o meu tipo inesquecível certamente seria o genial jornalista, poeta, articulista e – sobretudo – irascível gozador Amaral Raposo.
“Tenho-lhe, viva, na retina a imagem: meia altura, físico de antiatleta, era meio barrigudo, braços finos, amareloso, olhos esbugalhados, beiçola decaída a sibilar assobios completamente desafinados, cabeleira rareando e em perpétuo desalinho. Tinha por característica o hábito de emitir, após a ingestão da dose de conhaque usual, uma espécie de gorgolejo esquisito, que o identificava à distância.
“Humor cáustico, para cada situação tinha uma contundente crítica. Recordo-me de uma situação constrangedora por que passei, quando, aluno do 3º Científico do Colégio São Luís, fiquei entre dois fogos, por ocasião do lançamento de um livro didático pertinente à matéria, do meu professor de Português de então.
“Na apresentação da obra, esse professor cometeu a infelicidade de iniciá-la com a expressão: “Dos teclados de minha máquina…” Foi o quanto bastou para Amaral Raposo, impiedoso, num artigo de jornal, massacrar o pobre coitado, naquele seu humor ferino, a indagar quantos teclados terá a máquina desse mentecapto? E a dar-se ao trabalho de ler detidamente a obra, somente para criticar-lhe os erros gramaticais.
“E eu é que, em classe, suportava as diatribes do mestre, que tinha pleno conhecimento da minha amizade com o seu implacável crítico.
“Tocava um violão divino, mas uma execução sua geralmente gerava polêmica e descontentamento. Isso porque, perfeccionista, não admitia qualquer ruído externo, quando da execução de seus solos.
“Dispersivo, muito pouco ficou da obra do genial poeta de Só. Somente as piadas, blagues, observações cáusticas que o notabilizaram, e respostas prontas, que confundiam (ou desmoralizavam) o inquiridor… como, por exemplo, aquela dada a uma senhora, já um pouco além de balzaquiana, que o atormentava com insistentes elogios (o poeta era avesso a eles) e que, a certa altura, perguntou-lhe, coquete:
“- Quantos anos o senhor me dá, poeta?
“A resposta seca e um tanto ríspida:
“- Nenhum, dona: a senhora já tem muitos!”
Volto-me, por fim, a desdizer o que disse Afrânio Peixoto e repetiu José Sarney, que um acadêmico são dois discursos, o segundo dos quais ele não poderá mais ouvir. José do Nascimento Morais Filho marcou de tal modo a sua passagem pelo cenário maranhense da segunda metade do século XX, que é difícil o imaginarmos desaparecido, sem mais nem menos, de nosso convívio, sendo bom examinarmos se ele não se acha camuflado em meio a esta audiência, prestando atenção a este segundo discurso a seu respeito, conferindo palavra por palavra de seu sucessor na Casa à qual um dia ele voltou as costas para sempre.
A seu modo, ele também terá sido “um garoto levado da breca”, podendo intuir-se, quase, venha esse timbre a firmar-se como identidade da Cadeira 37 neste carrancudo Cenáculo da Inteligência Maranhense. Um “aloprado”, não tivesse essa palavra sofrido a deformação semântica causada pela apropriação indébita de sentido que dela fez o presidente da República. Se não – com a única exceção de Graça Aranha, no famoso episódio de sua conferência na Academia Brasileira, em 1924 -, de qual outro “aloprado” há notícia de rompimento com uma Instituição que, para não poucos, é a capa, ou a carapaça, com que se cobrem e se escondem em sua espera e passagem para os umbrais da imortalidade?
Na Igreja do velho regime, o gesto supremo de coragem para o sacerdote era atirar a batina às urtigas, abandonar as obrigações sagradas do culto. À moda antiga, o homem de Deus tornado aos hábitos de simples cidadão era apontado como apóstata, palavrão mais pesado que o de herege ou cismático, denúncia de infidelidade pública e permanente, defecção imperdoável, tipo especial de sacrilégio equivalente à morte em vida, e o qual dificultava por demais – se não mesmo impossibilitava de todo – os atos e práticas da vida comum: contrair matrimônio, exercer uma profissão, ser aceito em sociedade.
De que outra imagem poderemos nos valer para, em comparação, pesar e medir a “aloprada” coragem de Nascimento Morais Filho, quando se arrebatou do propósito de largar para sempre a companhia de seus pares na Academia Maranhense de Letras? A apostasia era um absurdo na teologia do catolicismo. A renúncia continua sendo um absurdo na metafísica das academias. Ainda hoje diz o Regimento desta Casa, em seu art. 46: “É perpétuo o título de acadêmico.” E mesmo com a vigência da Constituição de 1988, cuja garantia de liberdade associativa obrigou a reescrever-se a norma interna acadêmica, eis o que foi acrescentado ao caput de referido artigo:
“§ 2º O acadêmico que renunciar […] terá seu nome excluído de todos os registros da Academia, passando a figurar como período de vacância aquele em que pertenceu à Instituição.
“§ 3º Verificada a hipótese prevista neste artigo, será considerado antecessor do novo acadêmico eleito o antecessor imediato do que houver renunciado.”
Decreta-se nesses parágrafos a sentença de morte do acadêmico, medida decerto copiada dos regulamentos militares, pois só nos quartéis se encontrará paralelo a tamanho rigor, quando alguém é expulso de suas fileiras.
Observe-se que, para melhor análise, estamos distinguindo e separando os atos do fato: a renúncia e a causa da renúncia. A renúncia foi uma demonstração livre, consciente e voluntária de estoicismo suicida. Mas, para Nascimento Morais Filho, foi a pena de prisão perpétua para garantir a própria liberdade. Essa, a causa remota de sua drástica decisão. Ele disse em um de seus livros:
liberdade
foi o que a natureza programou para o meu ser:
– a ordem
a que obedecem as minhas células.[3]
E mais adiante:
limpei com o povo
a minha consciência!
com o povo
tonifiquei meu ser!
agora, canto:
– liberdade! liberdade! liberdade![4]
Não importando esmiuçar-se nenhuma causa remota da ruptura de meu antecessor com a Academia, transpareça, ao invés, a motivação imediata que lhe acendeu razões para isso: o capricho por assegurar à velha Confraria a essência de sua pureza genética. Que o sacrifício de José do Nascimento Morais Filho assim seja visto e assim se guarde como lição pelos tempos a vir. A esta centenária Oficina convergem homens e mulheres que, bem ou mal, forcejam, sobre tudo e primeiro que tudo, pela expressão artística através da escritura. Mais que simples diferença específica no quadro genérico dos que malham a palavra na forja de seu labor cotidiano, é esse o seu apanágio supremo. Elevando-se a tal plano a vigilância dos guardiães desse templo, não há confundir-se zelo com prurido, ou escrúpulo com teimosia. A pedagogia dessa cláusula pétrea foi legado e é cobrança deixada pelos Doze Fundadores, conforme deduzimos pelo exemplo de Antônio Lobo, no relato de Carlos Gaspar, já mencionado.
Mas não foi sem exercitações antecedentes que a trajetória de Nascimento Morais Filho culminou com a sua morte neossocrático-acadêmica nesta outra velha Atenas. “Eu sou um lutador”. A frase tantas vezes repetida por seu ilustre pai e que até ontem líamos colada ao busto daquele grande jornalista, na Praça do Panteon, a seu filho também é repassada, através da bagagem cromossômica, como súmula de sua agitada biografia.
José do Nascimento Morais Filho nasceu em São Luís, a 15 de julho de 1922. “Sua forte vocação de agitador de idéias” – eu repito palavras de seu primo Jomar Moraes – “revelou-se muito cedo, quando, na liderança de um grupo de jovens e com a participação de figuras consagradas da cultura maranhense, fundou e dirigiu a Centro Cultural Gonçalves Dias, sem dúvida o mais importante movimento cultural de São Luís na década de 40”,[5] de que fizeram parte Ferreira Gullar, Bandeira Tribuzi, Lago Burnett, Dagmar Desterro, Vera Cruz Santana, José Filgueiras, José Bento Nogueira Neves e outros mais.
Fala um de seus colegas daquelas priscas horas, Lago Burnett: “Sempre considerei Zé Morais e Bandeira Tribuzi os polos fundamentais de nossa geração. Morais nos ensinou a cultivar os clássicos; Tribuzi, sem desprezá-los, nos acenou com a viabilidade de novos rumos. Mas ambos tinham, e ainda têm, a visão social do caso literário. Ambos sabiam e sabem que não se faz literatura sem povo, porque, em última instância, é para o povo que a arte se destina e é do povo que ela nos chega, em estado bruto.”
A formação desse líder haverá de ter sucedido de forma tumultuária como o correr de seus dias. A exuberância de seu espírito não lhe terá deixado tempo e paciência para a realização de estudos intensivos, sistemáticos e aprofundados em qualquer campo de saber. Em mais de um de seus livros, ele mesmo deixa esculpido o próprio perfil intelectual: “Por natureza, formação e tradição de família: poeta, prosador e professor. / Por acaso: Fiscal de Rendas do Estado do Maranhão – função que também, ‘por acaso’ fê-lo encontrar e conhecer o outro Nascimento Morais Filho: o folquelorista” [sic, sistematicamente].
Sua obra versificada compreende: Clamor da hora presente, que, da estréia em 1955, chegou a quatro edições, até 1992; Azulejos, de 1963; e Esfinge do azul, de 1972 e 1996, títulos todos extraídos na capital maranhense. Considerada sob a mira da eternidade, como o deverá ser a partir de agora, e vista em conjunto, será produção que não convida a uma aposta de permanência: é obra de leitor de poesia, criação ao rés da palavra, palavra ao rés do chão, ademais de tributária de intenções que suplantam a realização poética, tais como a retórica do libelo político e a denúncia engajada. Sabe-se o quanto é difícil escapar a esse ardil, sobretudo nos tempos de juventude, e quando se luta e se labuta em esquinas miseráveis do Planeta, onde muitas vezes se pratica a literatura com intenção de tocar fogo no mundo. Mas também é sabido que a poesia comprometida – particularmente a poesia de partido – exige uma sobrecarga inventiva apenas alcançada por raros poetas de alto nível: Castro Alves, Maiakowski, Neruda, Gullar. Pois não basta a emoção: é necessário que a emoção seja recolhida em silêncio – lembra-nos há quase dois séculos o crítico inglês.
Ouçamos, a propósito, uma voz que veio de longe, na qual palavras de entusiasmo e estímulo entremeiam-se à percepção sincera – sempre respeitosa e amigável – sobre os versos de meu antecessor: “Acabo de receber o seu livro Clamor da hora presente e muito agradeço ao amigo” – escreve-lhe da Bélgica Gaston-Henry Aufrère (Carta de 1.10.1955). – “Li os seus poemas com muito prazer, porque eu [também] sou poeta d’avant-garde que não fica indiferente ao andar das castas laboriosas do mundo. Saúdo no meu amigo um jovem poeta do povo, um desta falange dos escritores progressistas que tem a coragem de suas idéias e escreve a sua mensagem em nome do povo e dos trabalhadores, espoliados pelos capitalistas. […] Talvez a poesia de meu amigo não tenha sempre o vôo sublime que convém. Não importa! O que conta é a idéia!” E noutro lugar, depois de afirmar que o nosso Zé Morais levanta o seu Clamor “em trombeta épica”: “Quando a poesia de Morais Filho estiver purificada de algumas banalidades e lugares comuns, haverá de estar no nível da de um Maiakowski e de um Ritsos, e o Brasil terá um grande poeta.” [6]
Podemos adivinhar o que responderia o destinatário de tal mensagem a seu correspondente e a todos os demais leitores: “Prefiro ser o último, sendo eu, a querer ser o primeiro, sendo outro” – é esse um de seus Pensamentos, colhido em lista do livro Esfinge do azul.
Versos de Nascimento Morais Filho serviram de letra para a música de compositores como Ribamar Fiquene, Antônio Vieira, Lopes Bogéa e José de Ribamar Passos (Chaminé), mistura intersemiótica que certifica, de per si, seu desejo de ser simples e direto, no intuito de alcançar o ouvinte comum, deixando à vista o quanto seus escritos se entendem com a linha da oralidade.
E foi essa preocupação com a oralidade, com auscultar o coração de sua gente e com ele sintonizar-se, que o levou à cultura popular. São de sua lavra neste campo: Pé de conversa, de 1957, O que é o que é?, de 1972, e Cancioneiro geral do Maranhão, 1º v., 1976. Seu entusiasmo pelo folclore o fez conceber projetos grandiosos, não realizados: uma Enciclopédia do Folquelore [sic, sistematicamente] Maranhense, um Cancioneiro geral do Maranhão, de que saiu, em 1º volume, uma coletânea de nossas quadras poéticas tradicionais, apanhadas de antigos periódicos e da voz do povo, trabalhos que, no tocante à sua terra, ele pretendia corressem em paralelo ao empreendimento de Câmara Cascudo para todo o Brasil.
Sua atividade multifária o fez pesquisador muito a seu modo, sem maiores desvelos metódicos e com a indisciplina própria de seu temperamento. Por seu esforço em procura de papéis velhos do passado maranhense, fez reeditar o livro A metafísica da contabilidade comercial (1986), de Estêvão Rafael de Carvalho, e o jornal O Bentevi (1986), indispensável para quem se dedique a rastrear a história da Balaiada. Muito especialmente, o Maranhão e o Brasil lhe ficarão para sempre devedores por ele haver ressuscitado o nome de Maria Firmina dos Reis, promovendo-lhe a edição fac-similar do romance Úrsula e fragmentos de outros escritos da notável escritora conterrânea. Como acontece, compreensivelmente até, com muitos estudiosos que exageram na paixão por seus achados, Nascimento Morais Filho sobrevalorizou o próprio feito. Por sua singularidade e seu pioneirismo, Maria Firmina dos Reis há de constar necessariamente na história da cultura maranhense, na sociologia de nossas idéias, de nossas práticas sociais, e não bem de nossa literatura. “Poetisa medíocre e ficcionista desimportante” – a avaliação é de Jomar Moraes – “Maria Firmina ds Reis não tem, mesmo nos limites da literatura maranhense, a significação que recentemente pretenderam atribuir-lhe”.[7]
Mas quem, tendo vivido no Maranhão da década dos 80, desconhece o movimento insistente, resistente e renitente, que foi o Comitê de Defesa da Ilha de São Luís? Difícil inventar iniciativa mais ao gosto de José do Nascimento Morais Filho, de sua opção ideológica, pela qual ele cresceu, sobrepujou-se de suas humanas proporções, agigantou-se como paladino da causa ecológica, da qual, àqueles tempos, mal se tinha notícia. O gigante assim constituído vestiu-se em pele de leão e deitou a sua ira sobre o deserto de nossa indiferença. O poeta arrebatou-se em fúria de profeta, passou a alimentar-se de gafanhotos, voltou-se furibundo contra uma poderosa multinacional e contra o governo que lhe fazia concessões, no mínimo, desnecessárias e descabidas. E não esqueçamos que ainda andava em vigência o governo fechado do Regime Militar. Nada o intimidava. Ele soube arregimentar adeptos, sobretudo entre os mais jovens, atacou, foi contratacado, fez comícios, passeatas, manifestos, bradou aos quatro ventos, bateu às portas dos tribunais, e, perdendo, sagrou-se campeão. Não importa se quase três décadas depois, parecem demasiadas ou infundadas as suas invectivas, se a indústria pesada que ela pesadamente acusava tem ganho até prêmios internacionais por seu cuidado no manejo ambiental em São Luís. Perguntemos: como seriam as coisas, se tão veemente não houvesse sido o seu protesto? Chuvas de ácido sulfúrico não caíram ainda sobre a velha Upaon-Açu, graças a Deus. Mas o que poderia ter feito uma grande empresa cujo objetivo maior e primeiro que todos é o lucro, e a qual demos tudo ou quase tudo, se o brado de Nascimento Morais Filho não se cristalizasse no tempo e no espaço, levado em eco pela viração que sopra nesta Ilha sobre nossas cabeças e nossas consciências, advertindo-nos que, também no plano ecológico, o preço da liberdade é a eterna vigilância?
Grande Zé Morais! Que responsabilidade a minha: refazer os laços que rompeste com a tua Casa, Casa da família Morais, de teu pai, de teu irmão, de teu primo, reunir-te aos teus pares, que tanto ganharão por teu convívio… Reavivar e reviver os teus ideais de liberdade, manter aclamada e acolhida a causa pela qual tanto te empenhaste. De onde estiveres, assiste-me, dá-me as forças que tiveste, para que eu também me agigante a mim mesmo e seja fiel a teu compromisso.
Em minha toada de chegança a este recinto lembrei meu pai. Permitam-me agora que eu a encerre, prestando homenagem à outra pessoa, uma das quais mais quero bem nesta vida. Dona Clarice Pinto Haickel, minha mãe que completa exatamente hoje 80 anos, – idade que não acredito poderei alcançar – e essa é a razão de eu haver escolhido esta data para oficialmente ingressar neste templo sagrado.
A cerimônia desta noite é o presente que um filho deposita jubilosamente nas mãos de sua mãe, porque a ela lhe pertence, todo, inteiro.
Mãe, meu presente para ti, nesse teu aniversário, é a honra e o reconhecimento que homens e mulheres da Academia Maranhense de Letras demonstraram a teu Jotinha por eventuais méritos seus. Méritos, se os tenho, devo-os ao Deus, que me ensinaste a honrar e respeitar, e depois dele, a ti, mais que a ninguém, pois tudo que sou, tudo que alcancei nessa vida, devo a ti. Ao que me ensinaste, ao que me possibilitaste aprender, as cortinas e portas que abriste para que eu pudesse ir, sem jamais me distanciar de teu carinho e de teu amor.
Que presente poderia dar para alguém que fez tudo por mim. Que além de me fazer por amor a um homem, me criou, quase que a sua imagem e semelhança?
Eu cresci, sou grande, mas todo esse meu tamanho é pequeno para conter o amor e a gratidão que tenho por te, pois de nada adiantaria as oportunidades que meu pai me proporcionou se não viesse junto com elas a tua doçura e a tua bondade.
Poderia continuar aqui falando a noite toda, as mesmas mil e uma noites em que lias para mim, antes de dormir. Se mais não falo, é porque a emoção não me deixa – e porque emoções oceânicas não cabem no estreito estuário da palavra.
Por fim, mesmo incorrendo em blasfêmia, tenho certeza que meu bom e misericordioso Deus me perdoará por mais isso … “a te, toda honra e toda a gloria, agora e para sempre…”
[1] Jomar Moraes, Apontamentos de literatura maranhense, p. 14.
[2] Amaral Raposo, Revista da AML, ano 8, v. 19, jun-1998, p. 85.
[3] Nascimento Morais Filho, Esfinge do azul, p. 89.
[4] Idem, ibidem, p. 91.
[5] Jomar Moraes, Perfis acadêmicos, 3ª ed., p. 108.
[6] Gaston-Henry Aufrère, Le Thyrse – Revue d’Art e de Littérature – IV série, mai 1956, nº 5, in Esfinge do azul, p. 18.
[7] Jomar Moraes, Apontamentos, cit., p. 136.