Ainda sobre a Reforma Política
Partindo-se do pressuposto de que nenhuma ação política tem aprovação unânime, que sempre alguém estará de alguma forma, em qualquer estância ou âmbito insatisfeito com a decisão que vier a ser tomada. Levando-se em consideração que qualquer mudança inicialmente é desconfortável e incômoda. Tendo em vista que esse quadro se agravará ainda mais quando tais novas regras tiverem que acontecer num setor onde as práticas atuais, desgastadas e corroídas, estão arraigadas de forma tão profunda ao sistema. Sabendo disso tudo, mesmo assim e principalmente por termos essa consciência é que devemos agir de maneira rápida e objetiva, no que diz respeito à reforma política e eleitoral de nosso país.
Tenho conversado bastante com todas as pessoas que posso sobre esse assunto. Políticos de todos os matizes, de todas as esferas e áreas de poder, juristas e professores, mas principalmente com cidadãos comuns, para que possa sentir de forma mais ampla o que pensa quem irá ser atingido frontalmente pelas medidas que o Congresso irá tomar nos próximos meses.
A reforma política e eleitoral é a mais emergencial ação que devemos exigir de nossos governantes. É lógico que as reformas tributária, fiscal, econômica e previdenciária são importantíssimas também, mas elas de pouco adiantarão se não forem feitas na esteira da regularização e moralização da representatividade popular, requisito indispensável para a legitimidade de qualquer ato que se tome em uma democracia.
Em minha opinião, devemos enfrentar de frente os problemas, sem que se tentem soluções paliativas, para resolver esse ou aquele problema específico, sem casuísmos ou remendos legais que venham a beneficiar esses em detrimento daqueles ou vice versa.
A realidade deve ser o pano de fundo de qualquer reforma. De fundo e de frente também. Em termos de lei, não se deve, não se pode fazer nada que agrida a realidade. De nada adiantará uma regra, uma lei, que seja linda e maravilhosa em sua intenção e em sua concepção, se ela não puder ser posta em prática, ou se sua prática resultar em uma distorção de sua função e não em seu objetivo, como por exemplo, o voto em lista.
É amplamente sabido que o eleitor brasileiro vota na pessoa, no candidato, mesmo que faça sua escolha dentro de um partido, mesmo que essa escolha seja feita dentro de uma corrente desse partido, mas a ligação do eleitor é com o seu representante, hábito que vem do fato das pessoas se identificarem preferencialmente com seus representantes executivos, prefeitos, governadores e presidentes da República.
Para provar que é assim que acontece, basta perguntar a um eleitor em quem ele votou no cargo de vereador ou deputado e em resposta se ouvirá quase sempre um “não lembro”, se perguntarem ao mesmo eleitor para quem ele votou em prefeito ou governador ele muito provavelmente não terá esquecido.
No caso do voto em lista ele poderá até se lembrar do partido em que votou, mas jamais saberá qual parlamentar escolheu para representá-lo, mesmo a lista estando publicada, pois seus representantes serão escolhidos na verdade pelos partidos, que nem sempre indicarão pessoas que passariam pelo crivo popular direto.
Quanto à circunscrição do eleitor e de seu voto, o município deve continuar a ser seu referencial, mas deve-se acabar de uma vez por todas com o tráfico de eleitor estabelecendo-se uma ampla, geral e total revisão e requalificação eleitoral. O eleitor estará vinculado ao seu domicílio real e a partir daí, deve estabelecer-se as mesmas regras válidas para os candidatos que quiserem mudar de domicílio eleitoral, que em minha opinião deveria ser igual à metade dos tempos dos mandatos vigentes.
O voto distrital traz em si o voto majoritário, pois leva o distrito a escolher um entre vários nomes postos em votação. Sendo assim, sou favorável à ampliação da base distrital para o tamanho total da unidade municipal, no caso dos vereadores e da unidade da federação, no caso dos deputados. Nesse caso, os vereadores e os deputados mais votados nos municípios e nos estados serão os eleitos, fato que já ocorre em quase 80% dos casos, mesmo com o voto proporcional.
A coincidência dos mandatos, em minha modesta opinião, será a medida mais moralizadora e barateadora dos pleitos em nosso país. Fazer-se uma eleição de seis em seis ou de cinco em cinco anos para vereadores, deputados estaduais congressistas, governadores e presidente da República, irá baratear enormemente os custos das campanhas eleitorais e fortalecer os partidos, principalmente se junto com essas medidas vier uma outra norma, a fidelidade partidária, inclusive em relação ao voto, tornando-o vinculado para todos os cargos.
A diferença fundamental entre deputados federais e senadores é que os primeiros representam o povo e os segundos são representantes dos estados. Câmara dos Deputados e Senado Federal compõem o Congresso Nacional, logo deputados federais e senadores são congressistas, mesmo que uns hoje sejam eleitos por voto majoritário e seus mandatos sejam de oito anos, enquanto os outros tenham mandatos de quatro anos e sejam eleitos através do voto proporcional. Unificar a votação para o Congresso, mantendo o sistema bicameral, com eleições gerais, onde os senadores seriam os congressistas mais votados e seus substitutos seriam os com votações subsequentes, me parece a forma de resolvermos o problema não só dos suplentes de senadores, mas também de possibilitar uma reforma parlamentar, eliminando o caráter executivo do Senado.
Com eleições gerais, coincidência dos mandatos, vinculação de votos, sem reeleição para cargos executivos, com o voto majoritário para o Legislativo e o financiamento público das campanhas sob a responsabilidade dos partidos, haverá o fortalecimento destes sem que se estabeleça uma ditadura partidária e acredito que com essas medidas teremos grande melhora em nosso sistema eleitoral e político e consequentemente mais legitimidade na escolha de nossos representantes e garantia de consolidação de nossa democracia.