Quando a performance de um ator coadjuvante é maior que todo um filme.

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Imagino que se o filme “Anora” tivesse sido roteirizado e dirigido por David Cardoso, Walter Hugo Khouri, Neville D’Almeida ou mesmo por mim, muita gente iria dizer que se tratava de uma simples pornochanchada com ingredientes americanos e personagens russos, mas como foi feito por um grande estúdio de Hollywood, dirigido por um cineasta famoso, ambientado em Nova York e Las Vegas, ele está merecidamente concorrendo em cinco das mais importantes categorias do Oscar de 2025, melhor filme, melhor diretor, melhor atriz, melhor ator coadjuvante e melhor edição.

O filme realmente merece pelo menos quatro dessas indicações. Talvez mereça até mesmo a indicação para disputar o Oscar de melhor filme, muito possivelmente por inexistência de algo menos ruim que ele.

Os primeiros cento e trinta e quatro minutos de “Anora” só existem para justificar seus cinco minutos finais.

As indicações para atriz, diretor e edição são até aceitáveis. A atriz, Mikey Madison, tem realmente uma performance muito boa, ajudada inclusive pela boa edição, que faz com que as difíceis cenas de sexo sejam executadas e vistas de maneira limpa, sem muita forçação de barra, sem demasiada apelação. É bem verdade que o filme tem momentos maçantes, mas penso que isso faça parte da intenção do roteirista que também é o diretor, para que o clima pisco sociológico do assunto fique mais bem delineado e marcado.

Uma vez, em uma entrevista, me perguntaram o que faz com que se diga que um diretor é bom e minha resposta foi no sentido de explicar que para mim, pode-se dizer que um diretor é bom quando ele realiza no filme aquilo que ele se propôs a realizar, não importando que nós gostemos ou não do resultado. Se um diretor consegue passar a sensação que ele deseja ao espectador, ele deve ser considerado um bom diretor. Em minha modesta opinião é o que acontece no caso de Sean Backer, em “Anora”, porém preciso dizer que no meu ponto de vista Walter Sales consegue isso e muito mais em “Ainda estou aqui” e nem por isso foi indicado ao Oscar de direção, mas deveria ter sido.

Em “Anora” há no entanto um indicado ao Oscar que é simplesmente extraordinário. Não posso dizer com toda certeza de que ele irá ganhar a estatueta, mas posso afirmar que se eu fosse um dos eleitores, votaria nele, sem a menor sombra de dúvida.

Trata-se do ator russo, Yuriy (Yura) Borisov, que desde o primeiro segundo em que aparece em cena, chama absurdamente a atenção até do espectador mais desatento, não sei bem ao certo se por sua presença quase ausente ou se por sua ausência incrivelmente presente.

No filme, Yuriy é Ygor, um imigrante armênio que é contratado para fazer serviços de segurança para seus patrícios. Esse tipo de personagem normalmente é um brutamontes ignorante, insensível, movido pela raiva e pelo dinheiro, mas o Ygor de Yuriy é diferente e isso o espectador sabe assim que o vê. Isso é tão verdade que quando ele apareceu em cena, eu disse para minha esposa que naquele personagem residia o ponto alto, o fechamento dourado do filme, e não deu outra.

Se há em “Anora” alguém que realmente mereça um Oscar, é Yuriy Borisov.

No frigir dos ovos “Anora” é um filme que foi indicado ao Oscar simplesmente por nos apresentar a desconstrução do mito da Cinderela, uma moça pobre, no caso uma prostituta, que tem a ilusão de conseguir um amor que a tire do lugar onde se encontra, fazendo com que ela passe a ter uma vida de princesa.

Há uma outra coisa que se pode dizer sobre “Anora”: Ele é a prova clara e patente que existe um tipo de filmes que é realizado quase que exclusivamente para competir em festivais, pois levantam temas psicossociais importantes.

1 comentário para "Quando a performance de um ator coadjuvante é maior que todo um filme."


  1. Antonio Guimarães De Oliveira

    Filmes são marcantes ainda para o homo sapiens… Seus atores coadjuvante ou não, são essências para um bom filme.Para por sua sempre análise.

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