Como sempre faço, hoje acordei bem cedo e vim para o escritório, vomitar nas teclas do computador o que represei durante a noite no rio que há entre minha mente e aquilo que comumente chamamos de alma.
Vinha com algo quase pronto em minha mente, mas ao abrir meu computador, deparei-me com uma mensagem de meu primo Marco Aurélio, que veio a calhar com tudo que senti ao acordar neste quadragésimo quinto dia de quarentena.
Depois de ler e reler a mensagem de Corélio resolvi mudar um pouco o que iria escrever hoje. O que desejo agora, é responder aquela mensagem de meu primo e aproveitar para falar com todos que por acaso venham a ler o que aqui escrevo.
Meu primo querido, acho que nunca disse isso a nenhum de vocês, de maneira tão clara e direta como vou dizer agora, mesmo que também nunca tenha tentado de qualquer forma ou por qualquer maneira esconder, mas ao ler essa tua mensagem me deu vontade de dizer: Eu amo muito todos vocês, minha família. Gostaria que todos soubessem disso.
Amo meus avós, meus pais, meus irmãos, meus filhos, meus netos, meus sobrinhos, meus tios, meus primos. Amo as pessoas que vivem ao nosso redor e que tanto gostamos de tê-las conosco. Amo meus amigos, dos mais próximos aos mais distantes. Amo meus colaboradores de todas as naturezas. Amo os desconhecidos, e hoje vejo que amo até aqueles pelos quais pensei que nutrisse indiferença, mágoa, desamor ou mesmo desprezo, já que ódio é um sentimento que fomos ensinados a não nutrir por ninguém.
Se há uma coisa boa nisso tudo é o fato de que sentimentos negativos parecem que estão cada dia que se passa, se esvaindo. Espero que se não todos, porque alguns já se foram, a maioria de nós possamos sair ilesos desse caos em que o mundo se encontra.
Fiquem bem.
PS: Como sou teimoso, impertinente como bem me qualificou desde que era apenas um menino, minha querida mãe Teté, vou escrever agora aqui o que acordei com vontade de escrever.
Já faz quarenta e cinco dias que estou de quarentena e começo a ficar cansado dessa rotina. Hoje pela primeira vez senti um medo maior que de costume. Imaginei o que sentiria e faria se alguém muito próximo a mim adoecesse e ficasse mal. Imaginei se eu ficasse mal. Imaginei-me numa UTI, entubado, imóvel, sem poder me coçar! Imaginei o que aconteceria com as pessoas que tanto amo se eu lhes faltasse ou se uma delas me faltasse. Mas como sou um conhecido egoísta, prefiro que eu lhes falte que elas a mim.
Atenção meu irmão Nagib, tu entre todos está proibido de adoecer, pois na hora do pega pra capar és tu quem resolves tudo.
Quanto a mim, caso aconteça comigo o pior, exijo que não permitam que seu seja enterrado em uma cova comum. Façam com meu corpo o que meu pai queria que fizéssemos com o dele e não conseguimos fazer. Cremem-me e joguem minhas cinzas na confluência dos rios Anil e Bacanga, bem em frente ao cais de São Luís, como última forma de declarar meu eterno amor por minha cidade.
Amo todos vocês.
JH.