A intrincada arte da política.

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Herdamos a noção original de arte da cultura grega que nos foi transmitida graças à colonização romana que aconteceu nos primeiros quinhentos anos da era cristã e se alastrou por quase todo o mundo.

Diz a tradição que eram seis as artes no tempo de Sócrates, Platão e Aristóteles: arquitetura, escultura, pintura, música, dança, e teatro, que era visto também como literatura, já que o hábito da leitura não era muito difundido e o conhecimento da escrita era bastante restrito. No final do século XIX, com a invenção das máquinas de fazer imagens em movimento surgiu o cinema, tido como a sétima arte, espécie de síntese apoteótica das seis artes primordiais.

No início da civilização humana havia uma grande aplicabilidade das artes no âmbito doméstico. A pintura de vasos, de estátuas, a construção de painéis e assoalhos de mosaico, todas essas coisas eram também consideradas arte, como realmente o são.

Em meio às artes decorativas helênicas existem duas que gostaria de usar como metáfora em minha abordagem de hoje: A arte da joalheria e a arte da tapeçaria.

Comparar metaforicamente a política com essas duas ocupações artísticas me dá oportunidade de voltar a dois dos assuntos que mais prezo: cultura e política.

Para mim o bom político pode ser comparado a um joalheiro ou a um tapeceiro, um artesão na melhor concepção da palavra, aquele que realiza o seu trabalho com conhecimento e arte.

O joalheiro assim como o político é um fundidor que domina o fogo e a forja onde derrete as substâncias com as quais trabalhará. Metais preciosos como ouro e prata. Ele escolhe e lapida as melhores e mais preciosas pedras coloridas. Ele planeja o que fará com antecedência e com cuidado. A improvisação nessa arte é um risco inconcebível. Enquanto você não domina a arte da joalheria, a improvisação é até aceitável, você está treinando, aprendendo, mas quando você coloca a sua oficina e começa o seu trabalho profissional, nada que não seja objetivo e prático é aceitável.

Assim é também em relação à arte da tapeçaria. Os melhores artistas dessa arte eram disputados pelos mais ricos e poderosos a elevado custo. Usando fios de lã, algodão ou outro tipo qualquer de fibra, tecidas em tramas perfeitas, manipulando agulhas, pinças e teares, os tapeceiros colocavam sua arte nos pisos e nas paredes de Atenas e Esparta sem se preocuparem com as divergências que reinavam entre eles.

Um bom tapeceiro poderia criar belas cenas de batalhas, iguais as que encontramos hoje nos museus decorando finos vasos de cerâmica, mostrando deuses, semideuses, heróis e personagens épicos que marcaram a história do povo que nos legou a filosofia, a antropologia, a sociologia e a política, isso sem falarmos da forma republicana de governo e do regime democrático, onde os cidadãos “iguais” e “livres” já decidiam os destinos de suas cidades-estados e de seus pares e escravos através do voto. Ainda hoje é mais ou menos assim.

A análise da história nos traz dificuldades incríveis. Talvez a maior delas seja a compreensão temporal dos fatos. Muita coisa que era comum, banal, simples, há 2.500 anos hoje é inconcebível. Coisas que eram práticas comuns 200 anos atrás não fazem o menor sentido nos dias de hoje. Ações que aconteciam normalmente há 50 anos, hoje caracterizam crimes inafiançáveis.

Em compensação, existem regras básicas que são imutáveis e olhe, não estou falando das leis da física, ciência na qual matemáticos e filósofos egípcios e gregos foram os precursores. Arte do conhecimento na qual romanos e árabes continuaram evoluindo, que ingleses e alemães aprimoraram e que hoje toda a humanidade pode desenvolver e desfrutar delas. Falo das leis básicas da antropologia, misturadas com as da sociologia, combinadas com as da psicologia, que acabam por resultar nas formas com que se apresenta a política, essa joalharia, essa tapeçaria, essa arte de construir “ambientes” onde as pessoas vivem e convivem.

Não falo aqui da política eleitoral e partidária, departamento menor dessa organização intrincada. Falo da política em lato sensu, a arte de conviver em sociedade, em grupo. Arte fundada na capacidade humana de compreensão e aceitação de suas causas, circunstâncias e limitações.

Um joalheiro ou um tapeceiro, assim como um político, quando bons em suas artes, são capazes de executar grandes obras.

O político, para se igualar ao artista, deve, antes de tudo, possuir e saber manejar os instrumentos de sua arte, tais como o raciocínio lógico, a coerência, a sensatez, a coragem, a honradez, a humildade e a sabedoria. Cada uma dessas coisas deve ser usada no momento certo e da forma exata, para que surtam o efeito desejado.

E qual deve ser o efeito desejado como resultado da arte da política?

Em minha opinião, o artista da política, incapaz de fundir joias ou tecer tapetes, incompetente para arquitetar prédios, pintar quadros, esculpir estátuas, compor músicas e cantar canções, coreografar danças ou escrever poemas e peças teatrais, tem como obrigação de artista desenvolver o ambiente onde as pessoas, beneficiárias dessas artes, possam viver em paz e harmonia, com dignidade e respeito.

Escrevendo esse texto eu tento desesperadamente convencer a mim e a você que me lê agora que aquilo que eu busco fazer com afinco e dedicação pode ser incluída na lista das artes humanas. Que a política pode realmente ser vista como a arte de harmonizar a vida das pessoas, fazendo com que elas, as pessoas, possam ter a real oportunidade de buscar e conseguir a tão almejada felicidade.

Posso, com esse texto, parecer ingênuo, mas prefiro ser assim que me juntar aos hipócritas ou aos cínicos.

Que aqueles que detêm, bem como aqueles que buscam o poder saibam que existem pessoas que “pensam”, e que elas estarão sempre preparadas para enfrentá-los… Empunhando as suas artes.

 

1 comentário para "A intrincada arte da política."


  1. Luis Carlos Martins

    Texto irretocável!
    Fico só imaginando se existem muitos outros políticos iguais a você no Maranhão ou no Brasil ou quem sabe até mesmo no mundo. Cronistas de seu nível,no Maranhão, são poucos.
    Li o texto sobre seu pai e achei também incrível, meus olhos marearam e senti um nó na garganta.
    Excelente também o texto que você fala de sua vaidade de não ser. Perca essa vaidade e nos ofereça a sua experiencia, a sua sabedoria e o seu trabalho pra ver se com elas contrabalanceamos o peso de tanta gente fraca e sem preparo para realizar as mudanças de que tanto precisamos.

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