Quando eu me propus a realizar adaptações dos contos de Ney Bello Filho para o cinema, resolvi fazer isso de forma que pudéssemos utilizar três de suas histórias de forma simultânea, paralela e complementar. Usei nesse intento contos que tivessem alguma similaridade em tema ou em forma. Os escolhidos foram “O retrato e a certidão”, “O camundongo n° 6” e “Diversos de mim mesmo”.
Convoquei para me ajudar na difícil tarefa de adaptar aqueles ricos e densos textos, repletos de referências, no campo da literatura, da filosofia, da teologia, as roteiristas Julia Antuerpem e Angélica Coutinho, sem as quais esse trabalho tão teria o sucesso que tem alcançado. Por fim se juntou a nós, meu parceiro de longa data, Coi Belluzzo, que além de ajudar nos roteiros, foi junto comigo produtor e diretor dos filmes.
O certo é que acabamos realizando, ao invés de um, cinco filmes, graças aos recursos que utilizamos na pré-produção, na produção e na finalização do material.
“A mulher do pai” é a adaptação de “O retrato e a certidão”. Este é o único dos cinco filmes que pouco tem em comum com o texto original, isso pela grande dificuldade que encontramos ao trabalhar um texto literário tão cheio de referências. A riqueza da literatura às vezes inibe o cinema, que sendo uma arte visual, entrega por esse meio as informações e os sentimentos, o que a literatura faz através das palavras e das figuras de linguagem.
Já “O camundongo n° 6” e “Diversos de mim mesmo”, são transcrições mais fiéis e literais dos contos que lhes inspiraram.
“Diversos de mim mesmo” foi o primeiro a ficar pronto e foi inscrito em alguns festivais de cinema e sua aceitação está sendo extraordinária, tendo sido até agora selecionado para 5 festivais e tendo ganho um prêmio, o de melhor roteiro em um festival de Las Vegas.
Depois de vários exercícios de montagem, juntamos “O camundongo n° 6” e “Diversos de mim mesmo” e criamos um outro filme, maior e mais robusto, “Maktub”, que fala de dois momentos da vida do mesmo personagem, Levi, e que aborda temas importantes dos contos de Ney: A busca da identidade e o direito a morte.
Sendo o segundo dos cinco filmes a ser finalizado, “Maktub” também foi o segundo a ser inscrito em festivais e já foi selecionado para três festivais, tendo sido em Tokyo, escolhido como melhor curta-metragem da competição.
Por fim, tendo sempre o mesmo personagem como centro das ações, juntamos os três filmes, o que resultou no instigante “A mulher, o rato e Deus”, um recorte da vida de um homem atormentado, que busca encontrar suas raízes, encontrar a si mesmo e encontrar a paz.
Esse processo mostrou-se extremamente econômico, porque com os recursos de um filme, realizamos primeiramente três, para em seguida juntá-los em mais dois.
Gostaria de agradecer ao meu querido amigo Ney Bello Filho, que nos deixou completamente livre para “brincar” com sua obra e criar sobre ela, imagens que deram luz e movimento a sua literatura.
Também preciso agradecer ao maravilhoso grupo que trabalhou comigo nesta produção, com a qual muito aprendi, principalmente sobre a incrível capacidade que os personagens têm de se autodeterminarem.
Está foi a primeira vez que realizei um filme cuja ideia original não era minha. A princípio foi uma tarefa difícil, mas depois que criei uma relação pessoal com os personagens, depois que os transformei em meus, pude melhor entende-los e tive mais liberdade de contar suas histórias… Pelo meu ponto de vista.