Sobre “Dois Papas”

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Minha intenção era fazer uma análise mais aprofundada sobre o novo filme de Fernando Meireles que traz à tela lascas das biografias de dois dos homens mais influentes de nosso tempo. Os dois papas simultâneos… Porém, uma publicação no Twitter de um amigo, me fez antecipar minhas considerações naquela mídia, que eu transcrevo aqui de forma mais apurada e mais bem acabada.

O amigo Leonardo Cordeiro publicou no Twitter: “No filme Dois Papas, além da história incrível sobre a renúncia de Bento XVI destaco o incrível relato do Papa Francisco sobre os efeitos da ditadura militar Argentina, logo aqui do lado. Pra que nunca mais se repita.”

Ao que eu comentei:

Todas as ditaduras são abomináveis, mas acho inacreditável que alguém, ao assistir a uma obra tão densa e rica, ressalte principalmente seu aspecto meramente político e não comente sobre a profundidade das duas personalidades nela dissecadas, o que na verdade é o assunto germinal e central do trabalho!

“Dois Papas” é, antes de tudo, a conversa de duas biografias de homens de origens diferentes, que ocupam o mesmo espaço de poder, encarando-o e exercendo-o de forma distinta, mas com a mesma intenção e o mesmo propósito, provando que o certo e o errado, o bem e o mal, são meros detalhes.

O espírito humano é naturalmente predisposto a simpatizar com personalidades como a de Bergoglio, que é normalmente simpático, alegre, bem humorado, ressaltando suas características latinas, e a antipatizar com personalidades e temperamentos como o de Ratizger, que é recluso, sisudo, sem bom humor, demonstrando claramente suas características germânicas. Mesmo assim, o autor do roteiro e o diretor do filme, nos mostram que não existem santos nem demônios, mas pessoas, seres humanos como diz Bento em uma certa passagem da obra!

Assisti “Dois Papas” achando que veria outra coisa! O que vi foi uma belíssima construção psicológica, um roteiro impecável, levado a cabo pelo mais talentoso dos publicitários que empresta sua arte ao cinema, na intenção de apresentar sua ideia da forma mais palatável possível, fazendo com que o espectador a “compre”, não sem antes questionar o merchandising da Fanta saboreada em plena sacristia da Capela Sistina!

Fiquei imaginando como foi construído aquele roteiro, que em minha modesta opinião merece um Oscar! Acho que Anthony McCarten colocou as biografias dos personagens frente a frente, pegou um martelo e um cinzel, ao invés de uma caneta, e foi esculpindo aqueles diálogos provavelmente improváveis, construindo uma série de conversas que jamais devem ter acontecidos, mas que mostram com fidelidade os pensamentos e posicionamentos daquelas figuras, que mais que outras, são mais platônicas que aristotélicas, sendo efetivamente socráticas.

A piada do jesuíta fumante bem retrata as personalidades dos dois papas. O argentino entende o pragmatismo, o aceita e até o busca. O alemão, teólogo dedicado a entendimento e ao conhecimento de Deus, não entende, acha bobagem, um mero jogo de palavras.

Roteirista e diretor não conseguem esconder sua preferência pelo argentino, mas como conhecedores das regras da boa narrativa, encerram o filme com a final da Copa de 2014. Alemanha 1 x 0 Argentina.

No filme, não poderia ter deixado de haver alusão à ditadura argentina! Ela é o ingrediente principal da construção da personalidade de Bergoglio, de sua vertigem e de sua redenção! Tudo o que ele é, é resultado direto da ditadura argentina, e é exatamente em consequência dela que nasce o Papa Francisco!…

Penso que ficou faltando arrematar com uma frase que meu bom amigo e ex-colega no parlamento maranhense, Aderson Lago, gostava de repetir: “Posso perder o amigo, mas não a piada”, mesmo que ela seja de gosto duvidoso. Então lá vai: o amigo Leonardo Cordeiro se lembra da ditadura argentina. Eu não esqueço dela nem das outras!… Mas ele e seus camaradas se esquecem propositalmente da ditadura cubana, que matou mais pessoas, causou muito mais dor e desespero e durou muito, muito mais tempo!…

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