Goebbels, Bohr e Pirandello

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Credita-se a Joseph Goebbels, ministro da propaganda da Alemanha nazista de Adolf Hitler, a frase “uma mentira repetida mil vezes torna-se uma verdade”. Tem gente por aí que faz muito isso, mesmo que jure que não.

Abraham Lincoln, presidente dos Estados Unidos da América, disse que: “Pode-se enganar todos durante algum tempo, pode-se enganar alguns durante todo tempo, mas não se pode enganar a todos por todo o tempo”.

Em sua genialidade, o autor de 1984 e Revolução dos Bichos, o inglês George Orwell, disse que: “Em tempos de fraude universal, dizer a verdade se torna um ato revolucionário”.

Certa vez Jesus tentou mostrar a seus discípulos o que era realmente verdade: “Digo-lhes a verdade: não foi Moisés quem lhes deu o pão do céu, mas é meu Pai quem lhes dá o verdadeiro pão do céu”.

O parabólico e metafórico nazareno queria simplesmente dizer que o adorado deve ser o detentor do poder e da glória, não seu agente, não seu obreiro.

Quando esse mesmo Jesus disse que ele era o “caminho, a verdade e a vida”, quis dizer mais do que entendemos em suas palavras traduzidas do hebraico ou do aramaico. Ele, em verdade, nos dizia que só se terá redenção, só se chegará na glória divina sendo como ele, sendo minimamente bom em tudo em nossas vidas, tendo em nós mais as boas qualidades do que as más. Mas afinal de contas o que é mesmo verdade?

O pouco lembrado Niels Bohr, um dois gênios da humanidade, explica filosoficamente não apenas a mecânica dos elementos, e por analogia, a mecânica da vida. Disse ele que existem verdades triviais e grandes verdades. Disse também que o contrário das verdades triviais é claramente falso, mas que no caso de uma grande verdade, seu contrário é também verdadeiro. Essa afirmação bagunçou minha cabeça. Passei muito tempo digerindo o que disse Bohr, que antes só conhecia das aulas de física e de química.

Havia então duas constatações a levar em conta. A primeira é que, obrigatoriamente, um cientista, antes de tudo, teria que ser um humanista, um filósofo. A segunda, se for realmente verdade o que disse Bohr, teria que reformular minha opinião sobre o demônio, o satanás. Para mim ele não existe. É tão insignificante perto de Deus, onipotente, onipresente e onisciente, que nem cogito sua existência. Em minha concepção, o que há é o livre arbítrio humano, que na maioria das vezes, quando posto em prática, assemelha-se muito ao trabalho do coisa ruim.

Pois bem, sendo Deus uma grande verdade, satanás, segundo Bohr, também o é. Confesso que não gosto dessa ideia, ela dá margem para muita especulação.

Em meu socorro aparece Nietzsche, mas acaba por bagunçar ainda mais minhas ideias, afirmando que toda verdade é simples.

Meu pai, que não era nem cientista nem poeta, dizia que algumas verdades eram tão preciosas que precisavam ser garantidas por uma série de mentirinhas. Ele dizia umas coisas bem interessantes para um homem de pouco estudo. Uma vez, falamos sobre isso em uma de nossas viagens pelo interior desse Maranhão. Foi no intervalo do ensaio do discurso que iria proferir naquele dia e a eterna transmissão de um jogo de futebol entre Arsenal e Manchester, que ele ouvira pelo rádio, quando eu ainda nem era nascido.

Falou sobre como agir na política, como deveríamos nos portar enquanto políticos, fez uma comparação entre o mundo do comércio e o da política, mundos onde ele habitava. Disse ele que “a verdade é uma mercadoria complicada de se transportar e mais ainda de se negociar”. Disse que ela “tem que ser dita de tal maneira “acreditável”, se assim não for, parecerá simplesmente mais uma mentira”.

Foi com ele que aprendi que é infinitamente melhor se dizer a verdade, pois dá menos trabalho, é menos cansativo e mais prazeroso. Que só se deve lançar mão da mentira quando for impossível usar a verdade. E ele mesmo completou: “O difícil é sabermos quando”.

Comecei a escrever esse texto porque estava me indagando sobre minhas verdades, fato que me trouxe até aqui, a esse beco sem saída. Só me resta lançar mão de um grande amigo meu, um mágico das palavras, grande conhecedor do pensamento e da alma humana, Luigi Pirandello, que parece ter solucionado esse dilema com uma frase: “Assim é, se lhe parece”.

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A Porta dos Fundilhos

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Em meu último texto de 2019 disse que logo no comecinho do ano de 2020, eu iria “tentar analisar a mais rasa, vérmina, ignóbil e torpe manifestação da cultura cinematográfica humorística nacional. A engembrada e mal enjorcada produção levada a cabo, sem nenhuma tendência, pelos talentosos, mas não inocentes membros do grupo humorístico Porta dos Fundos, sobre a vida de Jesus. Uns espertalhões que se travestem de corretos para encherem os bolsos de grana”.

Farei isso, em que pese o interesse sobre este assunto ter se arrefecido. O assunto do momento é a indicação de “Democracia em Vertigem”, para concorrer ao Oscar de melhor documentário, categoria que tal filme não consegue alcançar, pois é no máximo um longo e faccioso filme de propaganda partidária e ideológica.

Mas vamos ver os fundilhudos!…

É bom que antes de mais nada, você que me lê agora, saiba que gosto de pensar que sou agnóstico, que não tenho uma religião, em que pese gostar de estudar todas, para tentar entender o que nos leva a buscar tanto uma explicação teológica sobre nossa origem e tudo que nos cerca.

O pessoal do Porta dos Fundos escolheu como tema de seu especial de Natal, uma versão bem ao seu modo, irreverente e escrachada, da vida de um personagem histórico, que não por acaso é a pedra fundamental de todas as denominações religiosas que formam a fé cristã, que congrega cerca de 35% da população mundial.

Em segundo lugar, pouco importa se você viu ou não viu essa repugnante montagem! Para que você possa entender de forma realmente correta, qualquer coisa sobre o assunto Jesus Cristo, do ponto de vista do cinema, é indispensável que veja alguns filmes, pois com o puro e simples conhecimento dessas obras você poderá saber como é ignóbil, torpe, despropositado, de mau gosto, coisa de quem não quer pendurar uma melancia no pescoço para aparecer, nem enfiar um espanador no rabo e sair na banda de Ipanema fantasiado de Papa-Léguas…

Assistam ao poético “O evangélio segundo São Mateus”, de Pier Paolo Pasolini (homossexual assumido); ao minucioso “Rei dos Reis”, de Nicholas Ray (narrado por Orson Wells); ao maravilhoso “Jesus de Nazaré”, de Franco Zefirelli (preste atenção em seu elenco estrelar); assista ao violento “A Paixão de Cristo”, de Mel Gibson.

Depois disso, assista ao fenomenal “A Última tentação de Cristo”, profundo mergulho de Martin Scorcese em busca de um Jesus verossímil e real, em que pese o diretor ter fraquejado ao usar o estereótipo louro e de olhos azuis para um judeu da Galileia, de 2000 anos atrás, protagonizado pelo impecável Willem Dafoe.

Só então assista ao extraordinário “A Vida de Brain”, de Terry Jones, que juntamente com sua trupe do Monty Python, dão vida a Brain Cohen e a personagens contemporâneos de Jesus, construindo um cenário paralelo ao do messias, sempre de forma criativa e bem humorada, de forma cômica, mas sem faltar com respeito de forma inaceitável para com as crenças de quem quer que seja.

Se você não quiser assistir todas as obras citadas, assista pelo menos as duas últimas, pois são nelas que residem a tosca justificativa do Porta dos Fundos realizarem seu filme escatológico, no sentido grego da palavra.

Usaram o tema do filme de Scorcese e a licença humorística do filme de Jones para montar um Frankenstein degenerado onde Jesus é um homossexual (Duvivier), seduzido por um Satanás de cabelos de Rick Wakemam (Porchat), Deus é um babaca arrogante e prepotente, Maria não tem nada de santa, trai o marido e fuma maconha…

O filme foi feito com o intuito único e exclusivo de causar polêmica e ganhar dinheiro. Nada tem de humor e muito menos de arte, ainda mais vindo de pessoas inteligentes e talentosas, como são os autores e protagonistas. Uma porcaria produzida sob os auspícios do artigo quinto da Constituição Federal que permite que qualquer cidadão, até os imbecis, digam o que bem entendam.

Viva o estado democrático de direito e a plena democracia brasileira, que alguns dizem estar em vertigem!…

Por fim, gostaria de dizer que até para brincar, principalmente com assuntos tão sérios e controversos como religião, o brincalhão tem que ter capacidade de entender como fazê-lo e estar preparado para suportar as consequências, pois insulto, calúnia, injuria e difamação são tão crimes quanto agressão, violência e terrorismo!…

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Temporada de premiação

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No último domingo, dia 5, o Globo de Ouro deu início à temporada de premiações do cinema americano, que além deste evento, organizado pela Associação de Jornalistas Estrangeiros de Hollywood, conta com pelo menos mais outras sete festas de consagração dos profissionais da indústria cinematográfica.

O Globo de Ouro é um dos mais importantes eventos dessa natureza, ficando atrás do Oscar, dos festivais de Cannes, Veneza, Berlim, além do Britânico, e é tão importante quanto o Screen Actors Guild Awards e o Critics’ Choice Awards, promovidos respectivamente pela associação de atores de Los Angeles e pela associação de críticos de cinema dos Estados Unidos.

Além desses existem premiações das associações de produtores, diretores e roteiristas. Há o People’s Choice Awards, onde o espectador escolhe de forma direta os seus preferidos. Este prêmio tende a refletir o resultado das bilheterias, distinguindo os artistas mais populares e carismáticos. Há também o Framboesa de Ouro, criado em 1981 pelo publicitário John Wilson, como uma espécie de paródia ao Oscar, que escolhe os piores do cinema no ano.

O Globo de Ouro é tido como uma prévia do Oscar.

É importante lembrar que o Golden Globe divide drama e comédia e destaca também os melhores da televisão americana, o que pode confundir o espectador que não conhece bem seu sistema.

Quanto aos prêmios, a Netflix, apostava que suas três produções, O Irlandês, História de um Casamento e Dois Papas, indicados para melhores dramas, fossem faturar muitos Globos, o que não aconteceu.

Estes filmes concorrerão ao Oscar, mas em minha modesta opinião o único que tem alguma chance de abiscoitar algum prêmio este ano é Dois Papas, por seu roteiro adaptado, mas é difícil!

O prêmio de melhor drama de 2020 foi para 1917, que ainda não chegou ao Brasil, mas o tema, o diretor e o elenco, me fazem pensar que só pode ser um bom filme. Tanto que Sam Mendes desbancou Bong Joon-ho, Todd Phillips, Martin Scorsese e Quentin Tarantino, tendo este último sido escolhido melhor roteirista, superando ninguém menos que Noah Baumbach, Bong Joon-ho e Han Jin-won, Steven Zaillian, e o meu preferido, Anthony McCarten.

O filme escolhido na categoria de melhor musical ou comédia, em minha opinião, não é nem uma coisa nem outra, em que pese ser um extraordinário filme, um passeio na maravilhosa e um tanto adulterada máquina do tempo de Tarantino: Era uma vez… em Hollywood.

No caso dos melhores atores de drama, nenhuma surpresa. Venceu quem era praticamente invencível: Joaquim Pheonix, por Coringa e Taron Egerton, por Rocketman.

Na disputa de coadjuvantes, tudo se mistura. Atuações masculinas, dramáticas e cômicas nivelaram Tom Hanks, Anthony Hopkins, Al Pacino, Joe Pesci e Brad Pitt, mas quem levou o prêmio, merecidamente, foi o bonitão. No caso das mulheres, o altíssimo nível da disputa contou com Kathy Bates, Annette Bening, Laura Dern, Jennifer Lopez e Margot Robbie, ficando a representante do filme História de um Casamento com o único Globo conquistado por uma produção da Netflix.

No mais, (I’m Gonna) Love Me Again de Sir Elton Jonh ganhar como melhor música não foi surpresa pra ninguém, como também não foi surpresa Parasita ser o melhor entre os filmes não americanos. Dos filmes que concorriam e que eu assisti, nenhum teve uma direção de arte e uma trilha sonora que se igualasse a de Coringa, que faturou este prêmio.

Quanto às demais premiações, fica muito complicado eu comentar os prêmios atribuídos a filmes e séries para a televisão, pois grande parte não vi.

Esperemos os outros eventos!…

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Sobre “Dois Papas”

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Minha intenção era fazer uma análise mais aprofundada sobre o novo filme de Fernando Meireles que traz à tela lascas das biografias de dois dos homens mais influentes de nosso tempo. Os dois papas simultâneos… Porém, uma publicação no Twitter de um amigo, me fez antecipar minhas considerações naquela mídia, que eu transcrevo aqui de forma mais apurada e mais bem acabada.

O amigo Leonardo Cordeiro publicou no Twitter: “No filme Dois Papas, além da história incrível sobre a renúncia de Bento XVI destaco o incrível relato do Papa Francisco sobre os efeitos da ditadura militar Argentina, logo aqui do lado. Pra que nunca mais se repita.”

Ao que eu comentei:

Todas as ditaduras são abomináveis, mas acho inacreditável que alguém, ao assistir a uma obra tão densa e rica, ressalte principalmente seu aspecto meramente político e não comente sobre a profundidade das duas personalidades nela dissecadas, o que na verdade é o assunto germinal e central do trabalho!

“Dois Papas” é, antes de tudo, a conversa de duas biografias de homens de origens diferentes, que ocupam o mesmo espaço de poder, encarando-o e exercendo-o de forma distinta, mas com a mesma intenção e o mesmo propósito, provando que o certo e o errado, o bem e o mal, são meros detalhes.

O espírito humano é naturalmente predisposto a simpatizar com personalidades como a de Bergoglio, que é normalmente simpático, alegre, bem humorado, ressaltando suas características latinas, e a antipatizar com personalidades e temperamentos como o de Ratizger, que é recluso, sisudo, sem bom humor, demonstrando claramente suas características germânicas. Mesmo assim, o autor do roteiro e o diretor do filme, nos mostram que não existem santos nem demônios, mas pessoas, seres humanos como diz Bento em uma certa passagem da obra!

Assisti “Dois Papas” achando que veria outra coisa! O que vi foi uma belíssima construção psicológica, um roteiro impecável, levado a cabo pelo mais talentoso dos publicitários que empresta sua arte ao cinema, na intenção de apresentar sua ideia da forma mais palatável possível, fazendo com que o espectador a “compre”, não sem antes questionar o merchandising da Fanta saboreada em plena sacristia da Capela Sistina!

Fiquei imaginando como foi construído aquele roteiro, que em minha modesta opinião merece um Oscar! Acho que Anthony McCarten colocou as biografias dos personagens frente a frente, pegou um martelo e um cinzel, ao invés de uma caneta, e foi esculpindo aqueles diálogos provavelmente improváveis, construindo uma série de conversas que jamais devem ter acontecidos, mas que mostram com fidelidade os pensamentos e posicionamentos daquelas figuras, que mais que outras, são mais platônicas que aristotélicas, sendo efetivamente socráticas.

A piada do jesuíta fumante bem retrata as personalidades dos dois papas. O argentino entende o pragmatismo, o aceita e até o busca. O alemão, teólogo dedicado a entendimento e ao conhecimento de Deus, não entende, acha bobagem, um mero jogo de palavras.

Roteirista e diretor não conseguem esconder sua preferência pelo argentino, mas como conhecedores das regras da boa narrativa, encerram o filme com a final da Copa de 2014. Alemanha 1 x 0 Argentina.

No filme, não poderia ter deixado de haver alusão à ditadura argentina! Ela é o ingrediente principal da construção da personalidade de Bergoglio, de sua vertigem e de sua redenção! Tudo o que ele é, é resultado direto da ditadura argentina, e é exatamente em consequência dela que nasce o Papa Francisco!…

Penso que ficou faltando arrematar com uma frase que meu bom amigo e ex-colega no parlamento maranhense, Aderson Lago, gostava de repetir: “Posso perder o amigo, mas não a piada”, mesmo que ela seja de gosto duvidoso. Então lá vai: o amigo Leonardo Cordeiro se lembra da ditadura argentina. Eu não esqueço dela nem das outras!… Mas ele e seus camaradas se esquecem propositalmente da ditadura cubana, que matou mais pessoas, causou muito mais dor e desespero e durou muito, muito mais tempo!…

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