Já era tarde. Estava exausto. Havia passado o dia inteiro andando, visitando vários estúdios de cinema em Hollywood. A noite estava sendo uma daquelas em que o sono teima em não vir. Foi então que aproveitei para colocar em dia minhas reflexões filosóficas, há muito tempo esquecidas, impondo a mim mesmo a tarefa de escolher três palavras que resumissem e simbolizassem o ideal de realização profissional de uma pessoa.
Deveriam ser três substantivos que consequentemente definissem os adjetivos de seu sujeito.
Durante algum tempo percorri as ruelas de meus conhecimentos e as alamedas de minha memória em busca das tais palavras. Munido de uma lanterna, como um Diógenes moderno, buscava não a verdade ou um homem honesto, mas, sim, coisas indispensáveis para que alguém pudesse ser tido como uma pessoa realizada, de sucesso.
Não demorei a chegar às palavras que para mim representam esse ideal. O complicado é que as tais vieram até mim acompanhadas de outras três, que se não são sinônimos destas, são complementos indispensáveis.
As palavras que para mim melhor simbolizam o sucesso e a realização profissional são capacidade, oportunidade e trabalho.
Para que uma pessoa tenha sucesso na vida, ela precisa ser capaz, tem que desenvolver sua incumbência efetivamente, com eficiência e eficácia. Essa pessoa deve ter a oportunidade de demonstrar sua capacidade, no lugar certo, no momento certo, para as pessoas certas. E por fim, que isso seja um trabalho, que ela o encare como fruto de seu esforço e pelo qual ela tenha devoção e consequente recompensa por realizá-lo.
Em seguida me vieram quase que como por sugestão mediúnica as outras três palavras, complementos de que falei anteriormente: talento, sorte e dedicação.
Não consegui dissociar capacidade de talento. São palavras siamesas. Estão irremediavelmente ligadas por uma conexão lógica e sintomática. Quem é capaz tem talento. Faz acontecer.
Da mesma forma ocorre com oportunidade e sorte. Quem tem oportunidade é porque teve a sorte de tê-la. Tem sorte aquele a quem não faltam oportunidades. Enquanto outros, muitas vezes até bem capazes e talentosos, não possuem a sorte de uma única oportunidade.
Por fim, a palavra trabalho, que de pouco vale se não estiver associada a uma outra: dedicação. Palavra que complementa o esforço do trabalho, que dá a ele o espírito e a nobreza que ele precisa para figurar entre as boas coisas da vida. Trabalho sem dedicação é algo mecânico, coisa de autômatos, não de humanos.
Imediatamente busquei exemplos no dia a dia.
Como já disse havia percorrido naquele dia vários estúdios e pude ver pessoas capazes e talentosas que não tiveram a sorte de ter uma oportunidade. Vi outros trabalhadores incansáveis, que ou não tinham a verdadeira dedicação ou faltava-lhes capacidade ou talento, ou tendo essas qualidades, faltava-lhes a sorte de uma oportunidade.
Conheci muita gente do cinema naquele dia. Mais que conhecer os estúdios, os cenários, as produções, conheci pessoas, gente que trabalha na arte que eu mais admiro.
Procurei ver neles pedaços de seus ofícios. Busquei reconhecer a luz no iluminador, as expressões no make-up, o produto no produtor…
Comprovei que nos bastidores as coisas são realmente mais cinzas. A cor está na luz de quem a vê.
Dias depois, estávamos passando pela calçada da fama quando vimos na porta do Teatro Chinês a movimentação da avant premier de “Gangster Squade”, com Sean Penn, Nick Nolte, Josh Brolin, Ryan Gosling, e Emma Stone. O glamour daquilo tudo fez até eu, que não sou de tietagem, parar para ver.
Naquela outra noite pude continuar meu exercício filosófico sobre a realização profissional.
Quando voltávamos de Los Angeles, embarcou em nosso avião o ator Rodrigo Santoro. Voltei a pensar naquelas palavras. Esse rapaz tem grande talento e capacidade, teve a sorte de ter tido a oportunidade de demonstrá-la para as pessoas certas, no lugar certo e trabalha com dedicação para merecer seu sucesso.
Bem, já que nem todos nós somos talentosos e capazes, que tenhamos pelo menos a sorte da oportunidade de tentar. Caso contrário, só nos restará o trabalho, que normalmente sendo assim, mecânico, não virá acompanhado da devida dedicação.
Essa é a vida!
Como sempre excelente texto.
Um abraço fraterno.
Márcia Soares.