Em busca do padre Antônio Vieira
Depois de mais de um ano de preparativos e pesquisas, estamos começando a trabalhar num documentário sobre a vida e a obra de Antônio Vieira Ravasco, o nosso padre Vieira.
Nessa Jornada irei contar com o indispensável apoio de Coi Belluzzo e Antonio Abreu Freire. O primeiro, dividindo comigo a responsabilidade de produzir e dirigir esse filme. O segundo terá a tarefa de juntamente comigo escrever uma escaleta, um roteiro mínimo, que só será concluído na ilha de edição, onde me encontrarei novamente com Coi que estará ao lado de Vini Martins na finalização desse trabalho. A direção de fotografia ficará sob a responsabilidade de Cleisson Vidal e a produção executiva será de Ariana Chediak. Na fase inicial do trabalho contei com o apoio de Cássia Melo que elaborou o projeto para apresentarmos no Ministério da Cultura, para que pudéssemos nos credenciar ao financiamento da Lei Rouanet.
Meu objetivo, ao idealizar esse documentário, em que pese o que preconiza seu título, ainda provisório, não é estabelecer prioritariamente quem foi o padre Antônio Vieira, mas possibilitar uma observação privilegiada dos muitos Vieiras que sabíamos de antemão que encontraríamos no decorrer da pesquisa. Essa observação será conseguida graças aos depoimentos de pessoas que se dedicaram a estudar sua obra e pesquisar sua vida.
É bom que se ressalte que a existência desses vários Vieiras é constatada não apenas através da leitura dos textos de quem se dedicou a analisar e escrever sobre esse importante personagem da historia de Portugal e do Brasil, mas também lendo-se o próprio Vieira se chega a essa conclusão.
A realização desse filme deve-se não apenas ao fascínio que sempre tive pela história de Vieira, mas pela constatação de que ela conquista a atenção de todos que têm a oportunidade de conhecê-la.
Quem se propõe a conhecer Vieira, imediatamente descobre que se trata de um homem multifacetado e ao mesmo tempo uníssono: há a pessoa de Vieira; há o Vieira padre, e dentro deste há um verdadeiro escaninho de onde saem o Vieira missionário, o Vieira herético, o Vieira orador sacro, o profético… Há o Vieira político que dá origem ao Vieira ambicioso, ao oportunista, ao maquiavélico, ao intriguento… E há vários outros Vieiras.
Da observação, da analise e do consequente conhecimento de todos esses Vieiras, acabará por surgir o nosso personagem, que longe de ser coerente traz em si as incertezas comuns aos seres humanos, exacerbadas pela vaidade, por uma ambição imensa, por um senso de oportunidade incomum e por um pragmatismo que beira o maquiavelismo.
Mas não pense que estou destratando o nosso personagem. Não. Longe disso. O Vieira que iremos encontrar em sua jornada de 89 anos, depois de mais de uma dúzia de travessias atlânticas, tendo sido suas embarcações duas vezes tomadas de assalto por corsários, e tendo ele naufragado em outras duas oportunidades; tendo sido condenado pelo Santo Ofício e conseguido do papa um brevê que impedia de ser alcançado pelo longo braço da Inquisição; tendo ele tramado e tecido planos de expansão de seu país e advogado o retorno dos judeus a Portugal por interesses meramente financeiros; defendido os índios brasileiros da escravidão e não tendo a mesma preocupação com os negros africanos… Tendo feito tudo o que fez, tendo feito até mesmo algumas coisas não recomendáveis a um homem de bem, a um sacerdote, ele parece jamais ter feito qualquer coisa visando proveito pecuniário ou próprio, nunca agiu em defesa primeira de seus interesses individuais, mas sim de uma coletividade, quase sempre em defesa de seu país ou da missão da qual estivesse incumbido.
Vieira foi antes de tudo um patriota. Tão patriota que tentava sê-lo ao mesmo tempo patriota português quando imaginou entregar Pernambuco aos holandeses, e patriota brasileiro quando em ato continuo se preparava para retomá-lo deles.
Antônio Vieira é um personagem marcante não apenas no contexto do século em que viveu, mas sua importância transcende seu tempo e o espaço que nele ocupou, transformando-se num dos mais importantes personagens da história, certamente o maior dentre os representantes dos povos de língua portuguesa.
O Vieira que saltará das telas em que nosso filme for exibido não será um Vieira definitivo, será apenas um Vieira que abrirá a porta que nos levará a uma dimensão que nos possibilite ir em busca dos personagens que fizeram a nossa história passada, para que com isso possamos construir as bases, os fundamentos da nossa história presente e realizarmos, como profetizou Vieira, “A Historia do Futuro”.