Novamente: Assim é, se lhe parece.
Na última terça-feira encontrei com uma querida amiga que me disse que a sua filha estaria muito chateada comigo, pois, segundo ela, a mocinha, eu estava torcendo “descaradamente” para o Colégio Batista na final do basquete masculino contra a sua escola, o Reino Infantil.
Quase morri de rir, pois, exatamente por causa desse jogo, eu e a organização dos jogos fomos “acusados” pela treinadora do Batista, de estarmos favorecendo ao seu adversário, justamente o Reino.
Eu estudei no Colégio Batista por 11 anos e muito admiro e respeito aquela instituição, principalmente porque ela foi uma das responsáveis pela minha formação como pessoa e como cidadão, e por isso mesmo, por ter esta sólida formação de caráter, jamais torceria por alguma escola, não na condição em que me encontro, a de ocupante, temporário, do mais graduado cargo público de gestão esportiva de nosso estado.
Como secretario de Esporte e Lazer do Maranhão, responsável pela realização dos JEMs, não torço por uma escola, torço pela a realização de bons jogos, disputados em condições de igualdade, com escolas, professores e atletas competindo com garra, mas honrando o ideal olímpico.
Em meio à declaração da minha amiga, que me conhece há muito tempo e sabe que a sua filha está equivocada, me veio uma sensação que não sentia faz algum tempo. A presença marcante do mestre da literatura e da dramaturgia italiana, Luigi Pinrandello, autor da imortal obra, “Assim é se lhe parece”, onde desenvolve um enredo intrincado que tem como protagonista a verdade, ou melhor, as versões dela, cada uma mais verossímil que a outra. Cada uma mais plausível e possível que a outra, e a cada uma que nos é dado conhecimento, tendemos a acreditar nela, descartando e desconsiderando a anterior.
Em suas peças “Seis personagens à procura de um autor”, “Assim é, se lhe parece”, “Cada um a seu modo” e em seus romances “O falecido Matias Pascal”, “Um, Nenhum e Cem Mil” e “Esta Noite Improvisa-se”, Pirandello nos mostra algumas de nossas maiores características, sejam elas boas, como a generosidade, o desapego e o bom humor ou as más, como a hipocrisia e a intolerância.
Há duas das frases desse gênio que acredito estarem entre as melhores já ditas. A primeira é quando ele versa sobre os personagens, sobre as pessoas e diz que toda a criatura, para existir, deve ter o seu drama, ou seja, um drama do qual seja personagem e pelo qual é personagem. O drama é a razão de ser do personagem, a sua função vital, necessária para a sua existência.
Depois de citar uma das frases que mais retratam o pensamento de Pirandello, vamos aos fatos ocorridos na final do basquete disputada por Batista e Reino Infantil.
A partida transcorria normalmente, em que pese o nível técnico do jogo não fizesse justiça às duas equipes que são bem melhores do que demonstraram na final, acredito que isso aconteceu devido à tensão e o nervosismo. Faltando menos de dois segundo para o final da partida, um jogador do Reino faz uma jogada maravilhosa que acaba em uma enterrada monumental, fato que levou a torcida ao delírio e a imediata invasão da quadra de jogo.
Eu, que me encontrava do lado oposto ao acontecido, me aproximei pedindo que os alunos do Reino Infantil se retirassem da quadra, pois a partida ainda não havia acabado e disse-lhes que isso não era um comportamento correto. Foi por isso que a filha daquela minha amiga achou que eu estivesse torcendo pelo Batista, porque eu queria que a torcida do Reino se portasse como manda a regra.
Já a treinadora do Batista, que perdia por uma diferença de 22 pontos, aproveitou-se da invasão da quadra para tentar justificar seu mau desempenho e dirigindo-se a mim disse que iria retirar sua equipe do jogo por causa da invasão da quadra e mais, que a sua equipe havia sido prejudicada pela arbitragem.
Tentei mostrar a ela que o erro da torcida do Reino não justificaria o erro que ela iria cometer ao retirar o seu time de quadra, que se ela retirasse a equipe, os atletas e o colégio seriam prejudicados, ao que ela respondeu dizendo que eu era só o secretário e nem deveria estar ali. Fiquei imaginando o que diriam se eu ali não estivesse. No mínimo diriam que eu sou um secretario ausente, que não me interesso pelos jogos… Não levei em consideração a atitude da treinadora, procurei entender que ela estava passando por um mau momento.
Bem, mas a segunda frase de Pirandello que eu gostaria de comentar, em minha opinião é tão boa, talvez até melhor que a primeira, e acredito que nesse caso bastante oportuna. É quando ele mesmo se pergunta como podemos nos entender se nas palavras que digo coloco o sentido e o valor das coisas como se encontram dentro de mim, enquanto quem as escuta inevitavelmente as assume com o sentido e o valor que têm para si, do mundo que tem dentro de si?