Sempre fui fascinado pelo conhecimento e desde cedo busquei os meios necessários para matar essa imensa sede, tão inerente a meu jeito de ser, saciando-a no inebriante líquido cintilante do saber.
Primeiramente usei os mais velhos como fonte de aprendizado. Eu ficava horas ouvindo as conversas de minha mãe e minhas tias, ou de meu pai, primeiro com seus empregados, depois com seus amigos e posteriormente com seus correligionários políticos. Acabei aprendendo por imersão. Mais tarde foi o rádio e a televisão que me abriram as portas da informação.
Já na escola, os professores e as aulas eram os veículos de sapiência mais imediata e coordenada. Lá tive contato com um objeto que já conhecia desde casa e que logo em nosso primeiro encontro, havia aguçado minha curiosidade: o livro.
Minha mãe me ensinou as primeiras letras, mas eu apresentava séria dificuldade em aprender a ler e escrever corretamente, tanto que até hoje não escrevo com letra cursiva, só com letras de forma. Então ela chamou para me ajudar nos estudos, uma jovem professora que morava numa casa próxima da nossa, de então. Chamava-se Terezinha e não era Terezinha de Jesus, era de Joaquim.
Minha mãe e Dona Terezinha me fizeram ser o que sou hoje. Elas abriram as janelas do mundo para mim através do conhecimento, dos estudos e dos livros.
Por outro lado, meu pai tinha uma irmã caçula chamada Rosemary. Nós a chamávamos de tia Rosinha. Ela era especial, pois era diferente das outras mulheres com quem convivíamos em nossa infância. Ela era mais jovem e em que pese não ser uma mulher de feições finas e angelicais, como deveriam ser as tias, tia Rosinha tinha pernas bem torneadas, coxas grossas e quando ela colocava um shortinho e se metia a jogar futebol conosco, mesmo que ainda fôssemos muito infantis, sentíamos algo estranho. Quanto mais o tempo passava, mais sensações estranhas nós sentíamos em relação a isso.
Mas não será sobre minha iniciação sexual que comentarei hoje com você. Acontece que tia Rosinha, quando minha avó Maria Haickel morreu, veio morar conosco, e como possuía muitos livros, eles vieram com ela.
Meu pai já tinha alguns livros em casa. Alguns até bastante curiosos, como o relatório da Comissão Warren do Congresso americano, sobre a morte do presidente John Kennedy, o livro de auto-ajuda, “Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas”, de Dale Carnegie e três livros de um tal Caryl Chesmann, “A Face Cruel da Justiça”, “A Lei Quer que eu Morra” e “2455 – Cela da Morte”. Depois vim saber por meu “tio” Stenio, mistura de ama-seca, guru e irmão mais velho, que o escritor daqueles livros era um famoso bandido americano, o bandido da luz vermelha.
Desenho todo esse cenário para chegar no dia em que fui apresentado por tia Rosinha ao objeto que talvez tenha sido o maior responsável pela minha formação cultural e intelectual. Trata-se de uma pequena coleção de livros, contendo dez volumes, chamada “Trópico – Enciclopédia Ilustrada em Cores”.
Em nossa casa tivemos várias enciclopédias, entre elas O Mundo da Criança, O Tesouro da Juventude, a Delta Larrouse, a Britânica, a Mirador e a Delta Júnior. Tia Rosinha trouxe consigo esta e também uma outra, a Enciclopédia Prática Jackson. Anos depois ela colecionou os fascículos “Nosso Século”, que viria a ser minha segunda obra de referência.
Eu as li todas. Teve uma época em que lia compulsivamente. Lia enciclopédias como quem lesse um gibi. Nessa época eu lia até bula de remédio e lista telefônica. Mas os livros que eu mais gostava, que mais me fascinavam, eram os livros da Enciclopédia Trópico, cheios de ilustrações, capazes de me fazer fixar com mais facilidade o que lia.
Devo ter folheado e lido aqueles dez volumes, cada um de uma cor, um verde, um amarelo, um azul, um avermelhado, um o roxo… Isso pelo menos umas mil vezes até ter crescido o suficiente para largá-los e me dedicar aos esportes e às garotas. Bons tempos aqueles!
Durante muitos anos não soube que fim tomaram aqueles livros. Nós nos mudamos, saímos do Outeiro da Cruz para o Olho D’água e alguns dos velhos livros da família se extraviaram.
Recentemente quando arrumava a mudança para minha nova casa, me deparei com dois volumes da velha enciclopédia, os outros se perderam. Desde esse dia venho me dedicando a resgatar esse pedaço de minha história. Visitei vários sebos, acessei via internet outra quantidade, até encontrar em Bauru a coleção completa, que acaba de chegar pelo correio.
Sinto como se tivesse novamente 10 anos. Sinto os mesmos aromas no ar, as mesmas vibrações.
O que leio nestas folhas amareladas que pertenceram a outras pessoas, foram folheadas por outros dedos, é a história de um Joaquim que não se perdeu no caminho.
Relembro de todas as sensações que tive quando lia aqueles livros. Sinto novamente a mesma excitação que senti ao ler as histórias bíblicas, as curiosidades científicas, os perfis biográficos, os fatos da história da humanidade e os resumos de livros importantes.
Alguém poderá me chamar de chato, que só falo de coisas que acontecem ou aconteceram comigo. Você poderá se perguntar, “o que ganho eu com esse relato?” Ao que responderei que tenho certeza absoluta que alguma história parecida com essa já aconteceu em sua vida e se até aqui não aconteceu, ainda irá acontecer. Sinta-se então retratado.
Joaquim, esta história que contaste, faz parte de toda a nossa vida. me identifiquei demais, pois asssim foi a minha trajetória, sempre aprendendo e ouvindo histórias dos nossos.
Joaquim, seu post me fez lembrar as inumeras horas que passei lendo as enciclopédias dos meus pais, tinha a CONHECER, a ABRIL, os GRANDES PERSONAGENS DA HISTORIA UNIVERSAL e os GRANDES PERSONAGENS DA HISTORIA DO BRASIL, sem contar os livros emprestados de amigos das coleção de MONTEIRO LOBATO e dos grandes clássicos da literatura infanto juvenil tais como Odysseia, Robson Crusoé, 20.000 léguas submarinas, Carlos Magno e seus cavaleiros, cada um de uma cor que longe dos tempos de videogames e internet faziam nossa imaginaçao viajar.
Obrigado pelas lembranças desses tempos maravilhosos! ê bin
rsrsrs
Grande abraço!
Roberto Pires
Resposta: ê binnmm!!! pa ocê tomben sô… rsrsrsrsrs
Muito bom! Você vai narrando e eu vou me lembrando de minha infância, de minha adolescência. Muito obrigado por me fazer dar esse passeio por aquele tempo maravilhoso.
Caro Deputado,
Me animei para fazer um comentário, muito especialmente sobre o 6º parágrafo, mas desisti. Mais uma vez voce nos brinda com uma bela crônica.
Olá Joaquim.
Com esse POST novamente me fizeste mais uma vez voltar ao passado.Usaste como sempre, palavras certeiras , apontadas como flexas no coração.Me levaram as lágrimas e a um breve sorriso .
Nesse processo imaginário , formado por engrenagens ,que perpaçam tempo, vida e personagens reais ,vais construindo histórias, acrescentando ingredientes ,formando uma mistura perfeita ,nos fazendo saborear de tuas deliciosas lembranças, elas mexem não só comigo mas com os demais leitores ,como se fossem nossas , as tuas histórias vividas ,Acredito que muitos teem essa sensação!
São lembranças gostozas da infância com sabor de um tempo que não se volta mais a não ser nas lembranças, que na imaginação parece que esse PASSADO não está tão distante. Foi um ontem bem pertinho de hoje ,cheinhos de doces sabores da infância bem vivida .
PARABÉNS!
Abraços.
ROSE DE CARVALHO
Joaquim mas uma vez me pego voltando há um tempo maravilhoso da minha vida a descoberta da leitura o amor aos livros infiltrado na familia pelo meu saudoso pai.Lendo o comentário do Roberto Pires passou pela minha cabeça uma retospectiva de todos os livros citados por ele, fasciculos de revistas da abril ,Seleções e conhecer que nos acompanhavam nos trabalhos escolares, grandes enciclopedias, coleções de Monteiro Lobato,Grandes romances da nossa literatura.Mas não relaxamos uma revista TEX e ZE CARIOCA>rsrssrsrs