Como uma música

São Luís, 6 de dezembro de 2009

Minha caríssima amiga Roseana,

O primeiro e principal motivo desta, é apenas e tão somente para reiterar algumas coisas que já tive oportunidade de dizer-lhe em outras ocasiões e acho indispensável, que como seu amigo lhe diga mais uma vez.

Sei que você gosta muito de música e se bem me lembro, aprecia especialmente as do Chico. Pois bem, quando me sentei para começar a escrever esse texto, tentei lembrar-me de uma música que poderia cantar pra você, para bem exemplificar o que eu gostaria de dizer, e a primeira música que me veio à mente foi uma da lavra daquele seu ídolo, que passo a transcrever alguns trechos: “… Aqui na terra ‘tão jogando futebol / Tem muito samba, muito choro e rock’n’ roll / Uns dias chove, noutros dias bate sol / Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta / Muita mutreta pra levar a situação / Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça(…) Meu caro amigo eu não pretendo provocar / Nem atiçar suas saudades / Mas acontece que não posso me furtar / A lhe contar as novidades(…) É pirueta pra cavar o ganha-pão / Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro(…) Eu ando aflito pra fazer você ficar / A par de tudo que se passa(…) Muita careta pra engolir a transação / E a gente tá engolindo cada sapo no caminho / E a gente vai se amando que, também, sem um carinho / Ninguém segura esse rojão(…)”

Feita essa introdução musical, passo a relatar os últimos acontecimentos, para que você possa ter uma pequena noção do que está se passando “aqui na terra”.

Em quase 28 anos de política, tempo de sete mandatos, eu nunca havia perdido nenhum amigo ou correligionário. É bem verdade que o assédio e o assalto eleitoral pelo qual passamos nos últimos seis anos inverteram a regra e tentaram subverter a lógica das coisas “aqui na terra”, mas agora essa subversão é internacorpore, acontece nas nossas vísceras e devo lhe dizer que causa extremo desconforto.

Três anos atrás, quando de mais uma reeleição, fui privado do apoio efetivo de dois prefeitos, dirigentes de dois importantes municípios onde atuo politicamente. O governo de então bateu a suas portas oferecendo vantagens a seus municípios que eles não poderiam recusar, sob pena de prejudicarem seus munícipes. Entendi o que aconteceu, mas não aceitei e permaneci fazendo política naqueles lugares, até porque, mesmo sem o apoio oficial, tenho trabalho que me credencia para buscar sozinho ou acompanhado de apenas umas poucas pessoas, o respaldo eleitoral de que preciso para continuar a realizar meu trabalho, que se encerrará apenas quando o sábio e soberano povo de meu Estado assim resolver, e revogar a procuração que me outorgou pela primeira vez quando eu ainda era um jovem estudante de Direito, em 1982.

Nos últimos tempos, sofri duas defecções que muito me abalaram e que me fizeram por um instante duvidar que fosse uma coisa boa continuar na política. Um certo prefeito e uma certa líder política resolveram que não mais iriam me apoiar, resolveram que melhor do que eu, um colega nosso, do mais alto gabarito e de grande competência, lhes representaria muito melhor do que eu. Acontece que se esse meu amigo, a quem realmente estimo, não fosse secretário do Governo, nem o prefeito, nem a líder política, iriam procurá-lo para oferecer apoio. Isso só acontece, infelizmente, por causa do cargo que ele temporariamente ocupa e das vantagens que tal cargo pode oferecer. A culpa aqui é muito menos do meu colega e muito mais dos políticos, mas principalmente do sistema que se implantou de seis anos para cá em nosso Estado. Que fique bem claro que isso não acontecia assim, dessa forma, acintosa, descarada, absurda, antes do governo Zé Reinaldo. Que fique claro que isso é artifício de quem não tem condição de se colocar ao julgamento popular sem o uso desses artifícios.

O segundo e decisivo motivo que fez com que lhe escrevesse essa carta, foi o absurdo fato de eu ter perdido uma amiga de orkut. É, eu tenho um perfil no orkut! Perdi essa amiga pelo simples fato de eu ter ligado para a mãe dela, que vota comigo há 12 anos, e ter comentado que haviam me dito que ela estaria pedindo votos para um outro candidato e ela me respondeu que estava fazendo isso porque este havia lhe dado um cargo comissionado no governo. Fiquei atônito, sem saber o que dizer, pois que eu saiba, fui eu quem pleiteou junto ao Governo que ela ocupasse um cargo na administração pública. De uma hora para a outra parecia que alguém era mais legítimo do que eu junto àquela amiga, parecia que eu era o usurpador da história. A pessoa ficou furiosa comigo, o marido dela me ligou indignado e a filha me excluiu do orkut. Veja só como são as coisas!

Bem, como já disse o poeta, ”A coisa aqui tá preta…”

Sem mais para o momento,

Reitero meus protestos de estima e consideração, reafirmando minha amizade, que se não é estreita e pautada pelo convívio diário, é verdadeira e sólida.

Joaquim Nagib Haickel
Deputado Estadual, membro da Academia Maranhense de Letras e da Academia Imperatrizense de Letras

Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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