Por falta do que publicar neste dia dos pais de 2008, e por sugestão de uma amiga, recorro ao meu mestre Sebastião Moreira Duarte, a quem pedi que me ajudasse na missão de escrever a biografia de meu pai, Nagib Haickel, primeiro por não me achar competente para tanto, segundo para não cair em tentação de só incluir as boas passagens da vida do homem que junto com minha mãe, me deu a vida e a possibilidade de desfrutar de tudo que nela pude aprender.
Aqui vão as primeiras paginas o livro ainda não acabado, Nagib Haickel: O Caboclo do Pindaré, uma biografia para muitas vidas.
Outro que não eu deveria trazer a público os feitos e a figura de Nagib Haickel – e não faz mal que, de saída, escorra por estas linhas o surradíssimo chavão da velha retórica, usado e abusado ainda, sob tantos disfarces, em ocasiões as mais indisfarçáveis. Em primeiro lugar, porque o nosso assunto atravessará rios e igarapés da política, arte, como poucas, em que a retórica e o disfarce aparecem como dois bêbados de mãos juntas, que se sustentam em recíproca solicitação. E, na verdade, porque a história de Nagib Haickel caberia ser contada por seu filho Joaquim Haickel, que a tem na ponta da língua e dos dedos, sendo, ele mesmo, homem público e escritor de mérito indiscutível.
A razão de assim não ter acontecido é simples, podendo dizer-se coisa de fatalismo muçulmano: meses atrás, entreguei a Joaquim Haickel o livro Do miolo do sertão, “autobiografia” de meu tio Chico Rolim, por mim escrita. Estão ali narradas as peripécias de um menino pobre do Nordeste brasileiro, órfão de pai aos dois anos, que, a custo de muito otimismo e irradiação humana, superou-se no que lhe negavam a natureza e a geografia de seu meio, para afirmar-se empresário realizador e político respeitado, ainda mais porque ele não ocultava as bases telúricas de sua formação, de que se valia, aliás, para encenar o folclore político que lhe marcou a existência.
– Trouxe-lhe este livro – eu disse a Joaquim – porque acho que aí está um pedido: o mesmo que eu fiz com meu tio, você pode fazer com seu pai. Conte-nos a história de Nagib.
Minhas palavras pareciam haver despertado, quem sabe, recôndita “sugestão”, que meu amigo guardava em seu íntimo, não tendo talvez encontrado, até aquele ponto, a forma ou fórmula exata de externar. Para motivá-lo um pouco mais, comecei a ler em voz alta alguns parágrafos do livro que lhe ofertara. Joaquim me ouviu por alguns minutos, surpreendendo-me com sua resposta:
– Por muitas razões, começando por nossa extrema proximidade, eu não tenho como escrever a história de meu pai. Mas acabo de encontrar a pessoa que vai fazer isso.
Eu? Mas quase não o conheci. Via-o, à distância, algumas vezes, nos meus tempos de juventude, no final dos anos 60, em alguma casa de comércio da velha São Luís, ou nas cadeiras numeradas do Estádio Nhozinho Santos, torcendo pelo Moto Clube. Em qualquer circunstância, falando alto como se estivesse brigando ou gritando como um desesperado. Aquilo era ameaça de morte a sufocar-me em minha timidez: eu nunca pude trocar um bom-dia sequer com Nagib Haickel. Ele me fazia medo. Soube, depois, do modo original como ele desenvolvia seus negócios e como praticava a política. Não me seria difícil imaginar seu comportamento pitoresco em um e outro desses campos de atividade. Mas nem no Maranhão eu me encontrava, ao tempo em que Nagib atingia as culminâncias de sua carreira, tão cedo e súbito interrompida.
– Por isso não se preocupe. Eu lhe farei suprimento do que for preciso para o trabalho: documentos, pessoas-chave a quem entrevistar, algumas de quem nos obrigaremos a colher informações preciosas, que, do contrário, se perderiam. E irei acompanhar, do começo ao fim, toda a empreitada.
Fica dito e esclarecido, então, que, assim como no caso de Chico Rolim, compareço apenas como ghost writer destas memórias, que pertencem a Joaquim Haickel e a toda sua família, a quem, de princípio, manifesto o melhor de meus sentimentos de apreço e cordialidade, sobretudo pela liberdade de pesquisa e opinião que, desde o início, antes mesmo que a pedisse, me foi dada como garantia.
Cumpre, apenas, para concluir, especular – se tudo tem sua razão de ser – por que, afinal, me caiu aos ombros a incumbência de que ora venho dar conta. E me ocorre pensar que, não havendo travado com ele relações pessoais, Nagib Haickel, entregue aos meus cuidados, poderia estar contando com a dupla vantagem da investigação mais aturada e da imparcialidade menos comprometida. Quanto à primeira, posso assegurar que fiz quanto me foi possível, sobretudo no esforço de preencher clarões que, ainda assim, permanecem como lacuna, até mesmo para familiares do biografado. A imparcialidade, como se verá, em que pese supor-se facilitada por nosso distanciamento, não terá sido de todo alcançada, e nem sei, afinal, se haveria de constituir elemento de interesse na história desta figura singularíssima, que se retratava em público como a imagem gorda do transbordamento e do mais generoso exagero.
S. M. D.
Dep. Joaquim, fui aluno de Sebastião na faculdade, e uma coisa interessante que ele gostava de colocar nas aulas, era que ele queria ser mais velho pra ter vivido mais momentos historicos, e agora lendo em seu blog um pouco de quem foi seu pai, disperta muita curiosidade em mim pra saber mais sobre ele e demais figuras politicas do mesmo tempo.
Desejo sucesso elaboração da biografia.
Resposta: Muito obrigado!
Dep. Joaquim, a publicação desta biografia com certeza será de grande valia para a história do Maranhão. Desejo sucesso!
Dinalda