A metáfora do Hoplita.

Às vezes precisamos dizer novamente o que já foi dito e o que já é sabido para que fique bastante claro que certa idéia e determinado posicionamento são indispensáveis.

Os filósofos gregos Aristóteles e Platão, desde sempre, se interessaram pelas questões militares. Muitos intelectuais da antiguidade passaram de uma forma ou de outra, por tais experiências.

Dentre os mais importantes estão nomes como o de Aristófanes, que apesar de não se ter certeza se ele participou de alguma batalha, é certamente o que mais conviveu com os combatentes, visto as detalhadas descrições presentes em suas peças. Em compensação, sabe-se que Sócrates participou de três batalhas, as de Potidéia, Anfípolis e Délion. Ésquilo combateu em Maratona contra os persas. Sófocles foi comandante das forças ateniense quando da conquista da ilha de Samos. E que quase todos os historiadores gregos tiveram longa experiência militar, principalmente Xenofonte e Tucídides, este último autor de A Guerra do Peloponeso.

Digo isso como preâmbulo, para poder falar de alguns dos guerreiros mais admiráveis da antiguidade. Os Hoplitas.

Os gregos, no século VIII a.C., inventam um novo tipo exército, constituído de um novo tipo de soldado. Agora teriam no lugar de mercenários e escravos, cidadãos livres empunhando armas em suas batalhas e guerras.

A chegada do Hoplita, soldado da infantaria que foi assim chamado devido ao escudo que carregava, causou uma grande revolução, pois homens livres defendem com muito mais interesse e compromisso não apenas suas propriedades e suas famílias, mas também a sua cultura e o seu modo de vida. Nascia assim o exército moderno e de certa forma também, uma parte da cultura e da sociedade moderna.

Os Hoplitas surgiram de uma nova categoria sócio-econômica, a dos pequenos proprietários rurais, que se beneficiaram do direito de possuir armas individualmente. A vontade desses pequenos fazendeiros gregos não era somente defender suas plantações, mas também a idéia, o princípio da inviolabilidade de seus domínios, de proteger a sua cultura e preservar sua sociedade.

No campo de batalha, o escudo dos Hoplitas servia tanto para proteger aquele que o portava quanto o homem situado imediatamente à sua esquerda. Aristóteles fez disto um dos maiores símbolos da democracia, da igualdade e da solidariedade. Abandonar seu escudo, deixando de assegurar a coesão da falange, era considerado um ato de extrema covardia e traição.

Os Hoplitas combatiam numa formação tática disciplinada, armados com espadas e lanças, muito bem protegidos. Com este modelo de exército, a vitória passou a ser um feito coletivo, ao contrário da antiga formação aristocrática, que a considerava um feito individual.

No entanto, há uma coisa muito curiosa que me chamou a atenção: A espada, a lança, o elmo, a armadura, o escudo e as roupas que os Hoplitas usavam, eram custeados por eles mesmos, pagos com seu próprio dinheiro, com seu próprio suor. E esses itens eram caríssimos. Custavam o dinheiro de uma vida.

Passados quase três mil anos desde que os gregos, muito sabiamente, organizaram um exército de cidadãos, de pais de família, de pequenos proprietários, de homens comuns e principalmente livres, me aparecem agora alguns comandantes, alguns generais, que ainda preferem comandar exércitos de escravos ou mercenários. Soldados que são obrigados a defender em primeiro lugar os interesses de seu senhor, a vida de seu mestre e só depois é que poderão pensar em si mesmos e em suas famílias.

Muitas guerras já foram perdidas e pelo que tudo indica, muitas ainda o serão, por falta de Hoplitas nas fileiras de exércitos comandados por generais que são verdadeiros Brancaleones, na pior evocação e concepção que se possa dar ao personagem central do filme de Monicelli.

Como os hoplitas gregos, alguns de nós, juntos, podemos formar um exército constituído de cidadãos livres, que pense certo e que defenda da melhor maneira, não apenas as nossas propriedades e as nossas famílias, mas principalmente a nossa cultura e a nossa forma de viver.

Do que se precisa, hoje, para formar um exército de bons guerreiros? De que eles sejam os donos de suas próprias armas. De que sejam realmente livres.

8 comentários em “A metáfora do Hoplita.”

  1. Aí “a porca torce o rabo” como dizem por aí, porquê afinal, as pessoas que se dão ao luxo de serem realmente livres na sua forma de pensar e nas suas convicções em diferentes esferas(cultural, religiosa, política, etc) na sua grande maioria não tem poder aquisitivo ou não se importam com coisas materiais o suficiente para possuir como vc mesmo diz em seu texto, suas próprias armas que na maioria das vzes custam uma vida, essas pessoas, as únicas armas que possuem são adventos justamente da sua liberdade e do seu despreendimento material (sua cultura, sua religião, seus valores morais, sua política exercida diariamente por convicção e não por palavras de ordem gritadas ao vento) mas a questão é, em um mundo em que as pessoas matam, morrem e tramam por poder aquisitivo, e o q é pior, não se envergonham de massificar suas idéias egoístas e absurdas, quem conseguirá enxergar esses valores e essas armas?
    Bjo

  2. ** O SEGREDO DAS BORBOLETAS **
    “Com o tempo, você vai percebendo que para ser feliz com uma outra pessoa, você precisa, em primeiro lugar, não precisar dela. Percebe também que aquela pessoa que você ama (ou acha que ama) e que não quer nada com você, definitivamente, não é o homem ou a mulher da sua vida. Você aprende a gostar de você, a cuidar de você e, principalmente, a gostar de quem também gosta de você. O segredo é não correr atrás das borboletas… É cuidar do jardim para que elas venham até você. No final das contas, você vai achar não quem você estava procurando, mas quem estava procurando por você!”
    (Mário Quintana).
    Lindo como os seus poemas. Um bom dia e bom começo de semana p/ vc.
    Bjo

  3. Já conhecia esse seu texto! Mas fica claro uma coisa, você é um dos poucos escritores que é bom de se ler até mesmo um artigo antigo, principalmente quando ele é oportuno como este é. Parabéns.

  4. Caro Joaquim,
    muito bom este texto; sou suspeito para falar pois adoro história. e tu colocas com propriedade as origens ocidentais do conceito de liberdade. Lembrei imediatamente de 300 de Esparta, de Frank Miller, que foi o filme mais interessante do primeiro semestre.
    forte abraço,
    James

    Caro amigo James, é uma honra receber seu comentário, pois segundo um amigo nosso em comum, poucas pessoas entendem tanto de filosofia, história, música, literatura e cinema quanto você.
    Volte sempre.
    Grande abraço,
    Joaquim Nagib Haickel.

  5. Parabéns pelo artigo. Mais uma vez você demonstra facilidade e praticidade para escrever, além de informações cada vez mais atuais.
    Um abraço.
    FORTUNATO MACEDO

  6. Maravilhoso, é uma pessoa rica em conhecimento ! todas as pessoas deveriam usar a inteligência para isso aí, expor ao mundo as pessoas coisas boas, que são capazes de nus dar conhecimentos e alegrias.

    Um abraço

    Maria Luzia

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Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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