Uma dor inexplicável.

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Acidentes de automóveis me chocam de maneira definitiva: o James Jean, o do meu tio Wilson , o de San Martin Sauaia, o de Aírton Senna, o do filho do meu amigo Altevir, e agora o que vitimou minha com-cunhada, Márcia.
Uma saveiro tentou desviar de um buraco na estrada, perdeu o controle e chocou-se de frente com uma bleizer. Isso tudo debaixo de um desses dilúvios que, nessa época do ano são comuns por aqui.
O carro menor conduzia produtos inflamáveis e após o choque incendiou-se matando tragicamente o condutor. O maior teve seu motor deslocado para dentro da cabine dos passageiros, matando, instantaneamente uma jovem e bela mulher; balairina, casada, mãe de dois filhos, filha de pais amorosos, irmã de bons irmãos e amiga de pessoas leais e dedicadas.
Promotora de justiça, 35 anos, Márcia Sandes Farias, nenhuma dor deve ter sentido. Nada, se comparado com a dor que o fato causou.
O irmão dela que viajava junto, teve algumas fraturas, o mesmo ocorreu com o marido, meu cunhado, que ficou em coma durante dias, devido o forte impacto que sofreu na cabeça.
Acidentes ocorrem diariamente, gente morre diariamente, diariamente pernas, braços, quadris, colunas são quebradas nas estradas, mas nunca havia acontecido tão perto, talvez por isso me choquei tanto.
Em que pese o amor e o parentesco, nós não mantínhamos um relacionamento muito próximo: eu sempre envolvido com os problemas das minhas empresas ou da política, Tonhão tratando de sua granja, Ivana pintando ou cuidando das meninas e Márcia, alem de cuidar dos dela, era promotora publica e trabalhava no interior.
Esse raio, essa tragédia caiu perto demais de nós, queimou nossa carne, quebrou nosso ossos, colocou em xeque a nossa fé: “tanto bandido, tanto marginal, tanto filho da puta pra morrer e ao invés disso quem nos deixa é alguém doce, inteligente, bondosa.” – comentava alguém revoltado.
Chega-se a pensar que Deus tirou umas férias ou quem sabe uma licença prêmio. Bem que ele merece. Mas se ele é onipresente, onisciente e onipotente como dizem, ele poderia muito bem estar num paraíso qualquer, de férias com a família e ao mesmo tempo lá, próximo a cidade de D.Pedro para não permitir que aquela tragédia acontecesse.
Não é blasfêmia não, eu creio fortemente em Deus, o Deus do bem e dos bons, o Deus daqueles que como Moema, Márcia, Ronaldo, Marco Túlio e tantos outros têm procurado ajudar a família nessa hora que mais precisam, creio no Deus do Joaquim, covarde, que tinha tanto medo de me aproximar de Tonhão quando este ainda não sabia que Márcia morrera e mais medo ainda de ser indagado por ele: “como vai Márcia, onde ela esta?”.
Por isso me guardo, rezando do meu modo muito particular, conversando com Deus, mesmo não conseguindo ouvir suas respostas, mas digo a ele tudo que sinto e que penso. Não sou capaz de ouvi-lo responder-me mas tenho certeza que ele me ouve e me responde de alguma forma. Esse Deus do Joaquim egoísta e covarde que se recusa a ir ver o seu colega de jaguarema que se tornou seu cunhado, só para não vê-lo sofrendo, não pela dor física, suportável, passageira, mas pela dor da perda irreparável que o acompanhará para sempre. Eu acredito muito nesse Deus, apesar de ser humano o suficiente para reconhecer que as vezes não consigo entende-lo e até chego a duvidar.
Depois dessa dor covarde e egoísta, uma dor inexplicável que estou sentindo, minha única preocupação passa a ser a dor dos pais inconsoláveis, a dor de Davi e Juliana, sem mãe e a dor de Tonhão que não tem mais aqueles olhos verdes, a sua energia, e doce mulher, meio-mãe, meio-irmã, talvez a única pessoa no mundo que realmente lhe respeitasse com granjeiro, lhe defendesse como pessoa e lhe compreendesse como homem.

1 comentário para "Uma dor inexplicável."


  1. Carla

    Deputado, sofrer um acidente e vê-lo de perto é a maior pressão psicológica que passei. Já sofri dois acidentes de carro e há menos de um mês, sofri um outro de moto. As lembranças imagéticas de cada instantes te faz perceber como a vida é frágil e passageira. Para as pessoas que sobrevivem a um acidente o emocionante e confortante é saber que, apesar de toda a dor do momento, os parentes e amigos estão felizes por te ter ao lado e viva. A partir de uma situação como esta, percebe-se que a vida vale a pena e que a alma nunca deve ser pequena. A alma deve ser grande e muito grande. E a alma grande é que os que ficam, depois de acidente, devem ter para suportar a dor.

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