Deu no New York Times

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A cidadezinha de Beckman, situada no oeste do estado da Luiziana, foi sacudida por uma descoberta no mínimo surrealista. Os habitantes passaram os três últimos anos sofrendo com um incendiário que atacava de forma sistemática e profissional. Queimava carros, casas, trailers, escolas e até prédios públicos.
Mas uma coisa curiosa acontecia: o incendiário era cauteloso e cuidadoso, nunca houve nenhuma morte causada pelos incêndios. No máximo, o que aconteceu de mais grave foram algumas pessoas queimadas, e alguns braços quebrados.
Os incêndios eram semanais mas às vezes paravam, era como se o incendiário brincasse com a população. Às vezes havia dois ou três incêndios na mesma semana e por três vezes foram dois na mesma noite, o que fez a polícia imaginar que se tratava de uma gangue.
Os bombeiros de Beckman passaram a ser muito requisitados. Realmente davam conta do serviço. Faziam um trabalho irretocável e excepcional. Passaram a aparecer na mídia nacional e a dar entrevistas. Foram objetos de reportagens no “sixty minutes” e no “four-eight hours”, além de serem entrevistados por David Letterman, Jan Reno e Oprah Winfrey em seus talk-shows diversas vezes. Algumas redes de TV locais e nacionais acompanharam os bombeiros de Beckman em várias missões.
Os “Anjos do Fogo”, como passaram a ser conhecidos, eram liderados pelo capitão Richard McCain, um veterano da guerra do Vietnã, herói condecorado pelo Congresso por ter salvo três colegas atingidos por fogo amigo. Diz-se que é fogo amigo quando um soldado é alvejado sem querer, por balas de seus próprios companheiros. É um acidente comum nas guerras. Voltou para sua terra natal e, por ser um homem enérgico, foi convidado pelo prefeito para assumir o comando geral da segurança de Beckman. Porém logo se atritou com um superior e um subordinado. O procurador do condado e o xerife da cidade achavam muito estranha a forma de agir de McCain que, apesar de ajudar a manter a lei e a ordem, usava métodos um tanto estranho: fazia acordo com bandidos, acobertava assaltante, defendia alguns interesses muito específicos além de ter enriquecido muito rapidamente.
McCain não poderia destituir o xerife, seu subalterno, já que este é eleito pela população, muito menos o procurador.
Quando a situação estava incontrolável, o prefeito Robert Strasberg aproveitou a aposentadoria do comandante do corpo de bombeiros da cidade e transferiu McCain para aquele cargo, muito menor e menos importante.
Mas agora McCain era o centro das atenções, mais que qualquer um em Beckman, potencial candidato a prefeito. Mesmo em relação ao estado da Luiziana ele tinha tanto ou mais prestígio que o governador.
Pois bem, um congressista da Luiziana, nascido em Beckman, preocupado com a grande quantidade de incêndios e com o iminente descontrole da situação, aciona os serviços especiais do FBI, que infiltra na cidade um casal de agentes e um outro agente disfarçado de paramédico. Durante três semanas investigaram tudo na cidade, inclusive os dois incêndios que ocorreram e chegaram a poucas conclusões. A mais importante era que o incendiário agia quando os locais estavam vazios ou então de madrugada, ou ainda usando bombas incendiárias de efeito retardado.
Armaram então uma armadilha para pegá-lo, instalaram na casa onde moravam um sistema de câmeras com infravermelho acoplado a um sistema de transmissão via internet, e começaram a se misturar na sociedade local, passaram a ser vistos, criaram vínculos e fizeram amigos. Enquanto isso o outro agente, o paramédico, investigava as gangues, os subúrbios e os guetos.
Freqüentemente os Waltons, codinome do casal de agentes, deixavam sua casa a sós para tentar pegar em flagrante o incendiário ou os incendiários de Beckman. Até que, certa tarde, eles deixaram sua casa aberta e saíram rumo à cidade vizinha de Louis Ville, onde iriam ficar monitorando suas câmeras.
Lá pelas tantas, eles observaram que alguém havia entrado em sua casa. Esperaram, pois podia ser um simples ladrão, mas quando viram o homem plantando bombas de efeito retardado sob o fogão e na garagem, ligaram imediatamente para o seu parceiro em Beckman. O incendiário estava visto, porém não identificado pois estava com roupas negras e usando uma balaclava de ski (balaclava é uma espécie de capuz que envolve toda a cabeça, ficando apenas os olhos de fora, usada por esquiadores ou pilotos de automobilismo).
Imediatamente acionado, o outro agente chega ao local que ainda não começara a arder e dá voz de prisão ao incendiário, que reage à bala, mas é alvejado na coxa direita, ficando imobilizado.
Algemado o incendiário, desarmadas as bombas, chamados os “bombeiros”, a polícia e os paramédicos, qual não foi à surpresa de todos quando, após tirarem a balaclava que o camuflava, e o macacão preto que usava, apareceu ninguém menos que Richard McCain, o comandante do Corpo de Bombeiros de Beckman, um tanto sujo, ferido na coxa, mas com sua farda de autoridade.
Mais tarde outras investigações foram feitas e descobriu-se que McCain havia disparado nas pernas de seus companheiros do Vietnã para ter a glória de herói salvador, tendo ele atirado com a arma de um soldado caído morto ao seu lado por uma granada vietcong, precavendo-se contra o exame de balística, para que não fosse incriminado.
Agora a população de Beckman, na Luiziana, sabe que quem ateava fogo em suas casas e em seus carros era o mesmo herói que aparecia para apagá-lo.
Até hoje existem pessoas que não acreditam nessa história e algumas outras que preferem não acreditar.

1 comentário para "Deu no New York Times"


  1. Alvaro da Costa Ribeiro

    Tenho certeza que você está contando toda essa história americana pra falar de outro fato, algo local, nosso, que você não pode abordar diretamente. Mas o que será!? Não consigo nem imaginar!…

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