Um tumulto conceitual precisa ser desfeito com urgência.
É que todos os jornais de hoje amanheceram noticiando superficialmente que inelegibilidade não é pena.
Alguns até acrescentam que essa lição fora garimpada da fala do Ministro Arnaldo Versiani, durante a sessão administrativa do TSE em que restou fixado o entendimento de que a Lei da Ficha Limpa pode ser aplicada para casos de condenação judicial anteriores à sua sanção, ocorrida em 04 de junho de 2010.
Até aqui nenhuma novidade. Sempre entendi que a lei nova estende o seu império a condenações pretéritas. Porém, não abrange toda e qualquer condenação decretada antes do advento da noviça lei.
Senão, viveríamos uma situação de regressus ad infinitum, o que é vedado em todos os ramos do direito.
Inclusive, em post do dia 16/06 deixei assentado que a interpretação da nova lei não pode ser feita “por atacado”.
A análise deve ser feita em conformidade com a minudência de cada previsão legal de inelegibilidade, conforme brilhante intervenção do Ministro Marcelo Ribeiro, na sessão de quinta-feira.
Em hipótese alguma o novo diploma legislativo pode atingir aquelas pessoas que já cumpriram integralmente o tempo determinado para durar a punição de inelegibilidade.
Admitir o contrário equivale a defender uma tese jurídica teratológica, herética, delirante, aberrante e desvairada.
O que o TSE decidiu é que os ditames da nova lei se aplicam a casos como o do Deputado Federal Paulo Maluf, que, antes da edição da recente lei, foi condenado por um órgão judicial colegiado (7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo), pela prática de ato doloso de improbidade administrativa, nos termos do artigo 1º, inciso I, alínea l, da Lei da Ficha Limpa.
No caso Maluf, o processo judicial ainda está em tramitação, sendo assegurado ao réu o pedido de efeito suspensivo ao STJ, a fim de ser afastada a sua inelegibilidade, conforme previsão expressa trazida pela novel legislação (artigo 26-C). Portanto, esse caso se encaixa como uma luva na moldura legal da Ficha Limpa.
Inequivocamente, a lei nova não pode alcançar pessoas como Joaquim Roriz, Marcelo Miranda, Cássio Cunha Lima e Jackson Lago.
Roriz porque, até o ano de 2007, não havia nenhuma lei cominando inelegibilidade para quem renunciasse ao mandato eletivo para escapar de processo de cassação.
Os ex-governadores porque já estão fora do prazo de inelegibilidade de três anos fixado na redação primitiva do artigo 1º, inciso I, alínea d, da Lei das Inelegibilidades, visto que foram eleitos em 1º de outubro de 2006, marco inicial do referido prazo de inelegibilidade.
Conforme asseverado na sessão do TSE, as causas de inelegibilidade são aferidas no momento da formalização do pedido de registro de candidatura, cujo prazo final para protocolização é o dia 5 de julho.
Com efeito, quando a Justiça Eleitoral for apreciar os pedidos de registro, em julho ou agosto de 2010, verificará que Roriz e os ex-governadores não estão incursos em nenhuma causa de inelegibilidade originada antes de 4 de junho.
Voltando ao assunto do início deste post, é claro que inelegibilidade é pena. Todavia, não é pena criminal, mas uma sanção de natureza cível-administrativa própria do direito eleitoral, conforme a locução expressa do artigo 22, inciso XIV, da Lei das Inelegibilidades.
É assim porque o instituto da inelegibilidade significa um impedimento constitucional ou legal ao exercício da capacidade eleitoral passiva (direito de ser votado).
Ademais, segundo o dicionário Aurélio, o vocábulo pena é sinônimo de castigo, punição, sanção etc.
Portanto, se a lei específica prevê a aplicação da “sanção de inelegibilidade” é porque inelegibilidade é pena.
UMA QUESTÃO IMPORTANTE É SABER SE POLITICOS COM CONTAS DESAPROVADAS OU JULGADAS IRREGULARES NO TCU OU TCE FICARÃO IMPEDIDOS DE CONCORRER, DE ACORDO COM O FICHA LIMPA. SERIA INTERESSANTE, DR. FLAVIO, O SR. DISCORRER SOBRE ESSE TEMA, POIS É GRANDE O NUMERO DE POLITICOS NESSA SITUAÇÃO.
UM ABRAÇO!
LAERCIO – PROF. UNIVERSITARIO
Resposta: os ex-gestores com contas públicas desaprovadas em caráter definitivo pelo órgão competente continuarão sendo considerados inelegíveis por expressa determinação legal.
A meu sentir, a única diferença é no tocante ao prazo da inelegibilidade. Se as contas foram desaprovadas antes do advento da lei da ficha limpa, o ex-gestor ficará inelegível por 5 anos, conforme a redação primitiva da lei. Se a desaprovação ocorrer após a sanção da lei da ficha limpa, o prazo de inelgibilidade será de oito anos.
Abraço.
Meu caro a sanção não foi aplicada, nem consta do acórdão. Neste caso a jurisprudência é no sentido que sua aplicação somente com o trânsito em julgado. O processo de jackson ainda não transitou em julgado, consta no site do STF recurso recentemente julgado (após a publicação da Lei Complementar nº 135). Neste caso o TSE e o STF tem entendimento que se aplica a nova lei. Estaríamos diante do prazo de 8 anos. O que vc fala tem sentido, mas não está levando em consideração a situação do processo de jackson. Faça esta reflexão.
Saudações
Resposta: você tem razão em parte. Eu sei que não é cabível a aplicação da sanção de inelegibilidade em julgamento de Recurso contra Expedição de Diploma (RCED), visto que a decisão judicial nele prolatada tem a natureza jurídica desconstitutiva. Desconstitui o diploma outrora outorgado. Não tem natureza jurídica condenatória, por isso não pode aplicar a pena de inelegibilidade. Só para lembrar, o diploma de Jackson foi cassado nos atos do RCED nº 671, o qual eu conheço bem. Todavia, a pena de inelegibilidade é um efeito reflexo da sentença (ou acórdão) proferida em RCED, por expressa previsão legal na legislação específica (Lei das Inelegibilidades). Mutatis mutandis, é o mesmo que acontece quando o TCU desaprova contas públicas. O responsável fica inelegível por oito anos, embora o acórdão do TCU não faça menção à essa penalidade.
Quanto ao recurso no STF, a questão da inelegibilidade não está judicializada.
Obrigado pelo acesso e pela participação.
prefeito suspenso por 8anos; o filho do prefeito pode candidatar-se a prefeito?
Resposta: desculpe, mas a pergunta está muito superficial. Me passe mais elementos. Abraço.