Após a retomada do julgamento nesta quarta-feira (2), a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela proibição de doações de empresas a partidos políticos e campanhas eleitorais. A decisão final, no entanto, foi adiada porque o ministro Gilmar Mendes pediu vista (mais tempo para analisar o tema).
Quando o julgamento for retomado, o que não tem previsão para acontecer, caso a proibição das doações empresariais seja confirmada, os ministros terão que decidir a partir de quando vale a decisão.
Dos 11 ministros do Supremo, seis já se manifestaram pela derrubada da permissão para que empresas financiem campanhas: Luiz Fux, Joaquim Barbosa, Dias Tofffoli e Luís Roberto Barroso, que votaram em dezembro do ano passado, e Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski, que proferiram voto nesta quarta. Teori Zavascki, que no ano passado pediu mais tempo para refletir sobre o tema, votou nesta quarta por manter as doações empresariais.
“O financiamento de partidos e campanhas por empresas fere profundamente o equilíbrio dos pleitos, que nas democracias deve se reger pelo princípio do ‘one man, one vote’. A cada cidadão deve corresponder um voto, com igual peso e idêntico valor. As doações milionárias feitas por empresas a políticos claramente desfiguram esse princípio multissecular.”
Ricardo Lewandowski, ministro do STF
Ainda faltam os votos de quatro ministros (Gilmar Mendes, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Celso de Mello). Até o final do julgamento, todos os ministros podem mudar os votos, embora isso seja improvável.
O ministro Gilmar Mendes pediu para adiar o debate porque, na avaliação dele, trata-se de uma “questão complexa”. Para Mendes, somente os partidos menores seriam prejudicados com o fim das doações de empresas.
“Os partidos que estão no poder e que já têm recursos só precisam de mais algumas centenas de milhares de CPFs para novas distribuições. Certamente haverá pessoas pobres que doarão seu salário porque receberão dinheiro para isso. Basta ver o fenômeno de doação para saber como isso opera. Os partidos que tiverem base de raiz vão operar com essa lógica e já operam. O dinheiro não é problema. O problema é encontrar CPFs para fazer essa distribuição”, disse Gilmar Mendes.
Mais cedo, em evento no Superior Tribunal de Justiça (STJ), Mendes havia afirmado que proibir doações de empresas não inibiria o repasse não contabilizado, o chamado caixa dois.
Os partidos que estão no poder e que já têm recursos só precisam de mais algumas centenas de milhares de CPFs para novas distribuições”
Ministro Gilmar Mendes, que pediu mais tempo para analisar o caso
Mesmo depois do pedido de vista, o ministro Marco Aurélio Mello, que preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pediu para antecipar o voto e afirmou que o financiamento de campanhas por empresas “viola os princípios republicanos”.
“O poder financeiro acaba tendo influências sobre as decisões políticas do país. [O financiamento empresarial] macula todo o processo político desde a base de formação de alianças partidárias até o resultado das eleições deliberativas”, afirmou Marco Aurélio. Depois, o ministro disse esperar que o pedido de vista de Gilmar Mendes não se torne um “perdido de vista”.
O ministro Ricardo Lewandowski também pediu para antecipar o voto.
“O financiamento de partidos e campanhas por empresas fere profundamente o equilíbrio dos pleitos, que nas democracias deve se reger pelo princípio do ‘one man, one vote’. A cada cidadão deve corresponder um voto, com igual peso e idêntico valor. As doações milionárias feitas por empresas a políticos claramente desfiguram esse princípio multissecular, pois as pessoas comuns não têm como contrapor-se ao poder econômico.”
O que está em discussão
O Supremo analisa uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) protocolada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em 2011. No começo do julgamento, no ano passado, entidades defenderam o fim do financiamento empresarial a campanhas e a Advocacia Geral da União (AGU) considerou que o debate deve ser feito no Congresso e não no STF.
Atualmente, o financiamento de campanha no Brasil é público e privado. Políticos e partidos recebem dinheiro do Fundo Partidário (formado por recursos do Orçamento, multas, penalidades e doações) e de pessoas físicas (até o limite de 10% do rendimento) ou de empresas (limitadas a 2% do faturamento bruto do ano anterior ao da eleição).
Cinco ministros do Supremo consideraram também inconstitucional o percentual de 10% do rendimento para doações de pessoas físicas e foram contrários à regra que autoriza que os próprios candidatos façam doações conforme critérios estabelecidos pelas legendas. O ministro Marco Aurélio votou para manter o percentual de 10%.
O relator da ação, ministro Luiz Fux, propôs, em relação às doações de pessoas físicas e dos próprios candidatos, que as regras podem continuar válidas por dois anos e que, dentro desse prazo, o Congresso Nacional deve votar novos critérios. Caso em 18 meses nenhuma mudança tenha sido feita, o ministro votou para que se autorize o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a criar uma regra provisória. O plenário ainda debaterá a proposta.
As pessoas jurídicas doam frequentemente a mais de um partido com ideologias opostas. […] As principais financiadoras são empresas com aproximação extremamente significativa com o poder público.”
Luiz Fux, relator da ação no STF
Contra a doação empresarial
Ao defender seu voto, o ministro Luiz Fux destacou que a exclusão das empresas do financiamento de campanhas não prejudicará a democracia.
“As pessoas jurídicas doam frequentemente a mais de um partido com ideologias opostas. O pior é que os dados constataram que as doações [empresariais] tornam mais evidentes as campanhas com sofisticadas produções, além do que criam desigualdades de pessoas jurídicas. […] As principais financiadoras são empresas com aproximação extremamente significativa com o poder público.”
Barroso, que também já havia votado pelo fim do financiamento por parte de empresas, voltou a afirmar que o sistema atual permite “relação promíscua de grandes empresas com governos” e “troca de favores que gera a corrupção”. “Evidentemente, não pode ser o modelo que queremos chancelar”, afirmou o ministro.
Ao votarem no ano passado, Joaquim Barbosa e Toffoli também foram contrários às doações empresariais. O ministro DiasToffoli citou levantamento do G1 durante seu voto, que mostrou que dos R$ 751,8 milhões recebidos em 2012 (ano de eleições municipais) por 27 partidos para financiamento das atividades partidárias e das campanhas, mais de 95% vieram de empresas privadas. Toffoli afirmou que os dados mostram “a influência do poder econômico nas eleições”.
Longe de negar a existência de interesses condenáveis em contribuições a partidos, não se pode ver nesse fato fundamento suficiente para a conclusão radical de que toda e qualquer doação é inconstitucional”
Teori Zavascki, que votou pela manutenção das doações de empresas
A favor das doações de empresas
Para o ministro Teori Zavascki, que votou nesta quarta, não é papel do Supremo definir se as empresas podem ou não fazer doações, mas sim do Legislativo. Ainda na avaliação do ministro, o financiamento empresarial não fere a Constituição.
“Embora reconhecendo a inadiável necessidade de alteração no atual estado de coisas, nem por isso se pode concluir que as contribuições financeiras são irregulares, só por serem de pessoas jurídicas. Longe de negar a existência de interesses condenáveis em contribuições a partidos, não se pode ver nesse fato fundamento suficiente para a conclusão radical de que toda e qualquer doação é inconstitucional.”