José Sarney, a ilha e o mar
Com a perda recente do poeta Ferreira Gullar e, pouco antes, do escritor Josué Montello, permanecem na vitrine do reconhecimento nacional e internacional à literatura dos maranhenses vivos, três escritores não residentes em São Luís: os igualmente poetas e romancistas José Sarney e Ronaldo Costa Fernandes, e o poeta Salgado Maranhão. Em paralelo, num período relativamente curto, foram-se também vultos de grandes escritores e/ou intelectuais radicados em nossa terra: Nauro Machado, José Chagas, Ubiratan Teixeira e Jomar Moraes. Foram perdas irreparáveis que provocaram inevitáveis fissuras no bloco sustentador de nossa literatura e cultura.
Torna-se assim oportuno e até urgente, a cada dia, que as entidades literárias se congreguem no esforço de prestar justas homenagens àqueles cuja envergadura conquistada com seus talentos, os mantêm na linha de frente da exposição daquilo que a histórica vocação literária do Maranhão fez por merecer.
Essas homenagens do povo maranhense a seus filhos ilustres ganha contornos especiais no caso de José Sarney, por completar 90 anos , ser membro das Academias Maranhense e Brasileira e ter tido, em paralelo à sua vitoriosa trajetória intelectual, uma relevância política que nenhum outro maranhense alcançou (conhecida amplamente por todos, não cabendo, aqui, repetir) . A pergunta, óbvia, que salta aos praticantes de literatura, como eu, diante dessa trajetória, é como ele conseguiu conciliar a pujança de sua atividade política com uma também marcante realização literária.
A leitura do livro O dono do mar, que aprecio de forma especial por ter crescido junto ao mar ( meus saudosos pai, Juvenil Ewerton, e avô, José Ewerton, possuíam barcos de pesca) sugere algumas soluções como respostas. Certamente lhe é inata uma imaginação fértil que permite conciliar a crueza do embate cotidiano com o onírico; da exata percepção da realidade, com o místico. Esse pragmatismo, que é necessário a todo homem do mar para sobreviver e confrontar os perigos da natureza , derrama-se no romance em contraponto ao diálogo com as lendas e o sobrenatural, numa simbiose perfeita.
Ora, o mar é próprio da ilha, quem ama sua ilha ama o mar, com uma cordialidade e uma devoção que surgem como uma sina em qualquer atividade a que se proponha quem nela nasceu , fazendo sobrevir, no romance, curiosamente, uma das características mais decantadas do caráter do escritor e político José Sarney: a Cordialidade.
Neste caso, o romance O Dono do Mar a expressa também. Dos embates e da violência contra a dura realidade das águas brotam permanentes gestos de aproximação e cordialidade com o mar, suas lendas, e suas representações.
José Ewerton Neto é autor de Pequeno Dicionário de Paixões Cruzadas, livro de contos, lançamento em breve.